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CURSO DE DIREITO BACHARELADO

RAFAEL MARIANO BARBOSA SOUSA

ATIVISMO JUDICIAL, JUDICIALIZAÇÃO E OS LIMITES DEMOCRÁTICOS

BELÉM-PA

2021
1

RAFAEL MARIANO BARBOSA SOUSA

ATIVISMO JUDICIAL, JUDICIALIZAÇÃO E OS LIMITES DEMOCRÁTICOS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado,


em forma de Artigo Científico, como requisito
parcial para obtenção do grau de Bacharel em
Direito pelo Centro Universitário Fibra. Área de
Concentração: Direito Constitucional.

Orientador: Vicente de Paulo Tavares Noronha


Filho.

BELÉM-PA

2021
2

RAFAEL MARIANO BARBOSA SOUSA

ATIVISMO JUDICIAL, JUDICIALIZAÇÃO E OS LIMITES DEMOCRÁTICOS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado,


em forma de Artigo Científico, como requisito
parcial para obtenção do grau de Bacharel em
Direito pelo Centro Universitário Fibra. Área de
Concentração: Direito Constitucional.

Orientador: Vicente de Paulo Tavares Noronha


Filho.

Data de Aprovação: ____/____/_____

Banca Examinadora

_______________________________ - Orientador(a)
Membro:
Titulação:

_______________________________
Membro
Titulação

_______________________________
Membro:
Titulação:
3
ATIVISMO JUDICIAL, JUDICIALIZAÇÃO E OS LIMITES DEMOCRÁTICOS

Rafael Mariano Barbosa Sousa1

Vicente de Paulo Tavares Noronha Filho2

RESUMO

No presente trabalho acadêmico será analisado o tema: “Ativismo judicial,


judicialização e limites democráticos”. O interesse, por esse assunto, surgiu após
uma intensa observação sobre o cotidiano institucional do poder judiciário e seu
atual protagonismo em questões decisórias que vão além de suas funções típicas,
causando, de certa forma, reações na sociedade. A pesquisa foi realizada de
forma qualitativa, através de análise de bibliografias sobre a temática, como:
livros, artigos, teses e dissertações sobre o assunto, dando enfoque ao estudo de
casos, conceituações e reflexões históricas. Este artigo, visa ser um estudo de
caráter introdutório sobre a temática, a fim de servir como base para estudos
posteriores a serem desenvolvidos, considerando também a multiplicidade de
abordagens e enfoques que o assunto requer, por sua complexidade e
desdobramentos sociais. Avalia-se, da mesma forma, os efeitos práticos dessa
abordagem, na vida dos cidadãos, políticos e magistrados.

Palavras-chave: Ativismo, judicialização, limites democráticos, protagonismo.

1 Concluinte do Curso de Direito do Centro Universitário Fibra. E-mail: rafaelsousateologia@gmail.com

2 Advogado, Coordenador do Núcleo de Prática Jurídica do Centro Universitário FIBRA e professor de


Direito desta mesma IES. Especialista em Criminologia (FIBRA). Mestre em Ciência Política (UFPA).
E-mail: vicente_noronhafilho@hotmail.com
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JUDICIAL ACTIVISM, JUDICIALIZATION AND DEMOCRATIC LIMITS

ABSTRACT

The present study analyzes the theme of judicial activism, judicialization and
democratic limits. This theme comes like an interest area after an intense
observation about the institutional routine of the judiciary power and its current
leading role in decisive questions that go beyond its typical functions, causing,
somehow, reactions in society. The research was done in a qualitative way,
through bibliographic analyses about the topic, as well as: books, articles, thesis,
and essays about the theme, focusing on case studies, conceptualizations, and
historical reflections. This article intends to be an introductory study about the
topic, it aims to base succeeding studies that will be developed, considering the
multiplicity of approaches that the theme requires duo to its complexity and social
outspread that causes practical effects on citizens, politicians, and magistrates’
lives.

Keywords: Activism, judicialization, democratic limits, leading role.


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1. INTRODUÇÃO

O cotidiano institucional brasileiro tem passado por muitas mutações desde o


advento da Constituição de 1988. É notável a realidade do poder estampada nas
manchetes dos jornais e nos noticiários dos canais de televisão, visto que o Poder
Judiciário tem ocupado continuamente o papel de protagonista dos capítulos da
novela institucional brasileira.

Pelo motivo exposto acima, tem-se a necessidade de uma análise mais


criteriosa sobre o comportamento atual do judiciário brasileiro, chegando assim,
aos temas relacionados neste trabalho. Para isso, é importante pensar sobre
quais são as atuais definições de judicialização e ativismo judicial? Quais suas
origens e seu histórico? Qual a concepção constitucional do Brasil em relação a
esses movimentos em 1988? Quais os limites que devem ser observados no
sentido de manter a estrutura democrática? As respostas a essas perguntas
podem nos levar a um ambiente de equilíbrio nas questões decisórias, com
grande respeito às instituições que compõem a estrutura democrática.

A pesquisa é de caráter qualitativo e possui como fonte bibliográfica alguns


livros, artigos, teses e dissertações, os quais darão enfoque ao estudo de casos,
conceituações e reflexões históricas sobre a temática.

Portanto, este artigo visa ser um estudo de caráter introdutório, que poderá
contribuir para futuras reflexões sobre o assunto. Assim, foi considerada a
multiplicidade de abordagens e enfoques que ele requer por sua complexidade e
desdobramentos sociais, bem como os efeitos práticos na vida dos cidadãos,
políticos e magistrados.
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2. JUDICIALIZAÇÃO

O seio social é repleto das mais diversas formas de discussão, uma grande
parte delas diz respeito aos acontecimentos que são comumente publicados nos
jornais, despertando, por muitas vezes as paixões da sociedade e o seu
engajamento.

Nas últimas décadas – especialmente as últimas quatro décadas – os tribunais


e suas decisões passaram a fazer parte das primeiras páginas dos jornais de maior
circulação no Brasil. A vida institucional do judiciário é algo que já não cabe mais
em decisões proferidas a portas fechadas. Nada passa desapercebido das lentes
implacáveis dos canais de televisão.

O fenômeno denominado judicialização tem como uma de suas grandes causas


de surgimento, o processo de redemocratização do Brasil, tendo a promulgação
da Carta Constitucional de 1988 como seu ponto culminante. O novo ambiente
democrático trouxe de volta as garantias da magistratura, tirando o poder judiciário
do patamar de um departamento técnico e o elevando ao andar de um poder
político munido de força para a efetivação do sistema constitucional.

Seguindo a tendência do movimento internacional em âmbito constitucional, a


constituição de 1988 trouxe um sistema de maior abrangência de matérias,
elemento que nas constituições anteriores havia sido deixado para ser
comtemplado pelo legislador ordinário.

Um outro elemento, pelo qual percebe-se o advento da judicialização, está


ligado ao moderno e mais abrangente sistema de controle de constitucionalidade
do mundo. Tido como um sistema híbrido, ele combina o sistema americano e
europeu. Dessa forma, quando se apropria do sistema americano, tem-se no
sistema brasileiro a possibilidade do controle difuso, no qual um juiz ou tribunal
pode deixar de aplicar a lei (no caso a ele submetido) por considerá-la
inconstitucional. Assim também é possível, por apropriação do sistema europeu, o
controle por ação direta, que leva a matéria para ser analisada diretamente pelo
Supremo Tribunal Federal - STF.
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É importante ressaltar que a ampliação do art. 103, CF/88, que permite o direito
de propositura amplo, concede o direito de propositura de ação direta a vários
órgãos e a entidades púbicas e privadas (Associações de classe a nível nacional
ou confederações sindicais), levando a análise de várias questões de âmbito
político e moralmente relevantes ao STF, ganhando maior publicização. Neste
sentido afirma Eber Ferreira:

O texto constitucional de 1988 amplia o rol de legitimidade para propositura


de Ação Direta de Inconstitucionalidade, anteriormente reservada ao
Procurador geral da República, passando a ter legitimidade de propositura,
além da figura anteriormente detentora desta atribuição, o Presidente da
República, a Mesa do Senado, a Mesa da Câmara dos Deputados, a Mesa
da Assembleia Legislativa, o Governador do Estado, o Conselho federal da
Ordem dos Advogados do Brasil, Confederação Sindical, Entidade de Classe
em Âmbito Nacional, Partidos políticos com representação no Congresso
Nacional. (FERREIRA, Eber Meira. 2014, p. 55.)

É inegável que, por conta da ampliação dos critérios de publicidade, a


sociedade passou a participar, de forma mais intensa e acalorada, da vida
institucional do judiciário. Isso quer dizer que, pelo próprio movimento social, a
coletividade em suas mais diversas formas e subdivisões, passou a ver no
judiciário o instrumento pelo qual se demonstra possível, a concretização de
demandas e direitos, que estão sendo impedidos ou mesmo suprimidos pelas mais
diversas debilidades dentro da função legislativa e executiva do Estado.

Dessa forma, surge então o que se compreende como judicialização. Para


definir esse termo, utiliza-se a compreensão de Felipe Albertini Nani Viaro que em
seu artigo intitulado: “Judicialização, ativismo judicial e interpretação
constitucional”, afirma:

Em uma acepção mais ampla, a judicialização corresponde a um fenômeno


complexo em que, além do elemento jurídico, estão envolvidos elementos
políticos, institucionais, sociais, econômicos e também culturais, interagindo
em diferentes níveis e de variadas maneiras em cada cenário, estabelecendo
tendências de ampliação de normatização, expansão do espectro de
questões passíveis de deliberação pelos juízes e tribunais e de adoção de
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métodos jurídicos e judiciais em outras esferas, além das próprias esferas
judiciais. (VIARO, 2017, p. 234)

Nesse sentido, judicialização é um todo complexo que envolve todas as


questões mais delicadas existentes na sociedade, abrangendo dos aspectos mais
pormenorizados da vida institucional do Estado, até questões relativas ao cotidiano
das comunidades.

Compreende-se, a partir do pensamento de doutrinadores atuais, que a


judicialização tem sido trabalhada em dois eixos distintos:

2.1. JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA

A politização da justiça, como o todo tratado até aqui, está intimamente ligada
a ampliação dos limites jurisdicionais e da fortificação do Poder Judiciário nas grandes
democracias da contemporaneidade, nesse sentido, afirma Carolina Gattolin:

A expansão do Poder Judiciário nas democracias contemporâneas resulta do


desenvolvimento histórico das instituições democráticas e está associada ao
fim do comunismo no Leste Europeu à hegemonia dos Estados Unidos, que
propiciou a difusão do sistema norte-americano de revisão judicial entre as
novas democracias, e também à cultura dos direitos humanos disseminada
na Europa. (DE PAULA, 2014, p.103)

O presente eixo trabalha questões relativas a política institucional, focando sua


atenção no movimento estatal e na relação entre seus poderes, utilizando-se de
técnicas, argumentações e estruturas tipicamente judiciárias para tomada de decisões
e reestruturações, dentro dos outros poderes que compõe o Estado constituído. Nesse
contexto, Felipe Viaro afirma:

Pela perspectiva da judicialização da política, têm sido trabalhados temas


importantes como a constitucionalização e “domesticação da política” pelo
Direito; a incorporação das técnicas de argumentação e dos métodos de
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adjudicação e estruturas de organização tipicamente associados ao poder
judiciário para a tomada de deliberações também no âmbito do Poder
Executivo e Legislativo, e, sobretudo, a maior interferência do Poder
Judiciário na deliberação de questões essencialmente políticas. (VIARO,
2017, p. 234)

No mesmo sentido, afirma Carolina Gattolin de Paula:

Trata-se da judicialização de questões, por exemplo, relativas ao processo


eleitoral, ou as políticas econômicas adotadas pelo Poder Executivo. Essas
questões expandem os limites da Corte na interferência sobre questões
políticas, extrapolando os temas de direitos constitucionais e federalismo. (DE
PAULA, 2014, p.105)

Demonstra-se aqui, pelo termo “extrapolar os temas”, que mesmo não se


aprofundando no assunto, é possível extrair de forma dedutiva, a possibilidade de
risco ao movimento democrático, visto que a interferência não se dá especificamente
em questões contidas na competência do judiciário, mas alcança até mesmo medidas
econômicas, estritamente ligadas ao poder executivo e sua capacidade de governar
a nação.

2.2. JUDICIALIZAÇÃO DAS RELAÇÕES SOCIAIS

A judicialização das relações sociais aponta para um constante crescimento da


regulação através da expansão dos tratos normativos e diplomas legais, que resultam
na fragilização da esfera privada em detrimento do que conhecemos como
“publicização”. Dessa maneira, percebe-se de forma sensível um aumento da
utilização de técnicas e estruturas tipicamente judiciárias, aumentando assim, a
interferência do poder judiciário em questões sociais. Sobre isso, Felipe Albertini
reflete:
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Pela perspectiva da judicialização das relações sociais tem sido trabalhados
outros temas, tais como: O aumento geral de regulação, pela expansão da
normatividade e “publicização da esfera privada”, a incorporação de métodos
e estruturas tipicamente associadas ao Poder Judiciário no seio da vida
privada a das organizações particulares (...) o aumento de interferências para
o poder judiciário de deliberações de questões sociais, como o
correspondente incremento de demandas por serviços judiciários. (VIARO,
2017, p. 235)

Dessa forma, é necessário um olhar atento sobre a fragilização dos limites da


esfera privada, pois faz-se necessário ressaltar, que o avanço de características
públicas ao seio privado nos leva a correr grande risco. A fragilização da esfera
privada em detrimento do público é um constante risco de fragilização dos direitos
fundamentais e do sistema democrático.

3. ATIVISMO JUDICIAL

Nesta seção, se fará um breve estudo com base em conceituação e diferenciação


ao conceito de Judicialização, exemplificação, reflexão histórica e críticas ao sistema
conhecido como Ativismo Judicial. Dessa forma, serão estabelecidas bases
importantes para as discussões sobre as questões relativas aos limites e a
legitimidade democrática.

Em falar precipitadas sobre os assuntos abordados vemos que há uma


utilização errônea dos termos judicialização e Ativismo Judicial como expressões
essencialmente sinônimas. De fato, há um parentesco próximo entre esses institutos,
é o que aponta Luiz Roberto Barroso:

A judicialização e o ativismo judicial são primos. Vêm, portanto, da mesma


família, frequentam os mesmos lugares, mas não têm as mesmas origens.
Não são gerados, a rigor, pelas mesmas causas imediatas (BARROSO. 2009,
p.14.)
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Compreender o fenômeno jurídico denominado “ativismo judicial” é, em
primeiro momento, buscar uma análise profunda sobre a forma como a sociedade se
movimenta em suas mais diversas situações. É importante ressaltar que o ativismo
judicial se instala a partir do momento em que há uma dissociação entre os interesses
da sociedade civil e da classe política, causando assim uma retração das atividades
comuns ao poder legislativo e, por consequência, ao impedimento da concretização
de demandas sociais de forma efetiva. Logo, temos como uma definição mais
apropriada, as palavras de Erival da Silva Ramos:

Por ativismo judicial deve-se entender o exercício da função jurisdicional para


além dos limites impostos pelo próprio ordenamento que incumbe,
institucionalmente, ao Poder Judiciário fazer atuar, resolvendo litígios de
feições subjetivas (conflitos de interesses) e controvérsias jurídicas de
natureza objetiva (conflitos normativos). (RAMOS, 2010, p. 129)

A marca dessa definição está pautada especificamente no extrapolar do


exercício da função jurisdicional, para além dos limites impostos no ordenamento
jurídico que diz respeito as competências do Poder Judiciário.

No mesmo sentido, continua-se a conceituação com base na fala do Professor


Barroso:

A ideia de ativismo judicial está associada a uma participação mais ampla e


intensa do Judiciário na concretização dos valores e fins constitucionais, com
maior interferência no espaço de atuação dos outros dois Poderes. A postura
ativista se manifesta por meio de diferentes condutas, que incluem: (I) a
aplicação direta da Constituição a situações não expressamente
contempladas em seu texto e independentemente de manifestação do
legislador ordinário; (II) a declaração de inconstitucionalidade de atos
normativos emanados do legislador, com base em critérios menos rígidos que
os de patente e ostensiva violação da Constituição; (III) a imposição de
condutas ou de abstenções ao Poder Público, notadamente em matéria de
políticas públicas. (BARROSO, 2003, p. 14)

O ativismo judicial, como a manifestação de um protagonismo do poder


judiciário, deve ser pensado no viés da efetividade dos direitos fundamentais, levando
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em consideração que há a necessidade de respeitar os limites de natureza
constitucional, que assegura o pleno funcionamento do Estado Democrático de
Direito.

No que diz respeito às origens do ativismo judicial, é preciso fazer uma reflexão
histórica que remonta a Suprema Corte norte americana no século XIX, que em
primeiro momento, era favorável a práticas políticas que reforçavam a compreensão
ideológica americana dominante a época, que apontavam para movimentos de
segregação racial. Dessa forma, tem-se a título de exemplo, o caso Dred Scott v.
Sanford, que em decisão ativista, estabeleceu que pessoas de ascendência africana,
importadas e mantidas em regime de escravidão, bem como seus descendentes
(escravos ou não) não seriam cidadãos, logo não poderiam ser considerados sujeitos
de direito. Isso implicaria em não estarem sobre a proteção da Constituição dos
Estados Unidos e impossibilitados de realizarem a aquisição de cidadania. Também,
no referido caso, a decisão impediu que o Congresso Americano legislasse sobre a
abolição da escravidão nos territórios da União.

No que concerne às demandas que favoreciam os movimentos de segregação


racial, as decisões se inverteram a partir da década de 50, no período em que a
Suprema Corte foi liderada por Earl Warren, entre os anos de 1954 e 1969. Dessa
forma, a Suprema Corte assume protagonismo progressista, independentemente de
qualquer ato do congresso americano ou mesmo decreto presidencial, no combate às
antigas práticas políticas nos EUA, apontando, a partir de então, para uma série de
decisões que favoreciam a efetivação dos direitos fundamentais.

Fazendo a necessária depuração e sendo superada toda a crítica ideológica, o


movimento ativista, tanto progressista quanto conservador, aponta para a efetivação
dos fins constitucionais, através da atuação expansiva do judiciário ao espaço dos
demais poderes sem que, por muitas vezes, haja confronto.

Dentre as mais diversas compreensões, é inegável que não somente nos


Estados Unidos dos dias atuais, mas em todo o mundo, as Supremas Cortes e Cortes
Constitucionais têm assumido um protagonismo de extrema relevância, no que diz
respeito à política, discussão ou aplicação de políticas públicas e ainda, tudo que se
refere à vida dos Estados democráticos, como exemplifica Luiz Roberto Barroso:
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Os exemplos são numerosos e inequívocos. No Canadá, a Suprema Corte
foi chamada a se manifestar sobre a constitucionalidade de os Estados
Unidos fazerem testes com mísseis em solo canadense. Nos Estados Unidos,
o último capítulo da eleição presidencial de 2000 foi escrito pela Suprema
Corte, no julgamento de Bush v. Gore. Em Israel, a Suprema Corte decidiu
sobre a compatibilidade, com a Constituição e com atos internacionais, da
construção de um muro na fronteira com o território palestino. A Corte
Constitucional da Turquia tem desempenhado um papel vital na preservação
de um Estado laico, protegendo-o do avanço do fundamentalismo islâmico.
Na Hungria e na Argentina, planos econômicos de largo alcance tiveram sua
validade decidida pelas mais altas Cortes. Na Coréia, a Corte Constitucional
restituiu o mandato de um presidente que havia sido destituído por
impeachment. (BARROSO, 2009, p. 11).

Isso nos mostra que o movimento ativista não é um fenômeno de cunho regional
isolado, mas um fenômeno global que é fruto do amadurecimento democrático e das
opções constitucionais dos legisladores.

3.1. O ATIVISMO JUDICIAL NO BRASIL

Compreender o movimento ativista no contexto brasileiro é extremamente


importante, para discernir qual a realidade atual em relação aos movimentos mais
comuns do judiciário. Tendo em vista uma reflexão histórica já construída, partiremos
agora, para reflexões concretas em casos de robustez no contexto judicial brasileiro
vigente nos últimos anos.

O Ativismo Judicial no Brasil é, de maneira clara, uma opção constitucional, não


um exercício volitivo. É o que considera Barroso (2009, p.14): “A judicialização, no
contexto brasileiro, é um fato, uma circunstância que decorre do modelo constitucional
que se adotou, e não um exercício deliberado de vontade política. ”

No que diz respeito ao histórico institucional brasileiro, observa-se a ocorrência


de casos robustos que refletem as características ativistas no cenário judicial
brasileiro, sendo a demonstração do desenvolvimento do Poder Judiciário como um
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todo e de seu protagonismo nas questões de Estado e a reafirmação de seu papel
constitucional relacionado a questões políticas e as competências dos poderes.

É possível citar ações de maior robustez que demostrem o alcance decisório


do Supremo Tribunal Federal. São elas:

ADIn 3510 (Rel. Min. Carlos Britto) – Constitucionalidade das pesquisas


com células tronco embrionárias.

A Ação Direta de inconstitucionalidade foi proposta pela Procuradoria Geral da


República que questionou a constitucionalidade do Art. 5ª da Lei 11.105/2005 (Lei de
Biossegurança), que normatizava as pesquisas com células de embriões oriundos de
fertilização in vitro, desde que estivessem inviáveis ou congelados há mais de três
anos.

A ação foi julgada totalmente improcedente nos termos do voto do ministro


Carlos Ayres Britto, relator da referida ação, que sustentou não haver violação aos
princípios da dignidade da pessoa humana e do direito à vida, prevalecendo sua tese
por seis votos a cinco.

Pet 3388/RR (Rel. Min. Carlos Britto) – Demarcação de terras indígenas na


área denominada Raposa/Serra do Sol.

A presente ação foi proposta pelo Senador da República Augusto Afonso


Botelho Neto, que tinha como objetivo declarar a nulidade da Portaria 534 de 2005,
do Ministro da Justiça e do Decreto de Homologação de 25 de abril de 2005, do
Presidente da República.

O fundamento para o pedido está, entre outros motivos, na alegação de vicio


de procedimento, risco à segurança nacional, violação ao princípio federativo, falta de
proporcionalidade e risco de graves problemas econômicos ao Estado de Roraima.
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O julgamento foi interrompido pelo pedido de vistas do Ministro Marco Aurelio,
entretanto o tribunal já havia formado a maioria vinculada com a tese do relator, que
declarava o pedido improcedente e chancelava todos os atos questionados,
apontando para a continuidade da demarcação de terras. O julgamento encerrou em
19 de março de 2005 vencendo a tese do relator.

ADPF 144/ DF (Rel. Min. Celso de Mello) – Inelegibilidade e vida pregressa


de candidatos a cargos eletivos.

A presente ação, usada como exemplo, foi ajuizada pela Associação dos
Magistrados Brasileiros – AMB, tendo como fundamento a interpretação constitucional
do art. 14, §9 da Constituição da República de 88, que prevê o estabelecimento dos
casos de inelegibilidade por Lei Complementar.

Ocorre que as Justiças Eleitorais de vários Estados passaram a negar registros


de candidaturas a candidatos que possuíssem condenações em casos criminais ou
em esfera administrativa, independentemente do trânsito em julgamento. Essa
posição foi amplamente acolhida pelo Tribunal Superior Eleitoral, o que o colocou em
colisão direta com o pensamento da Associação dos magistrados Brasileiros.

O Supremo Tribunal Federal julgou o pedido no sentido de sua improcedência,


pautando-se na reserva de lei complementar, que violaria a divisão do poder funcional
de decisão judicial que viabiliza, na falta de especificidade em leis, outras hipóteses
de inelegibilidade, sendo também uma questão ponderável a violação dos princípios
de presunção de inocência de do princípio do devido processo legal.

4. OS LIMITES DEMOCRÁTICOS

Refletir sobre questões relativas à democracia é, de grande maneira, buscar


uma acomodação sólida para assentar nosso debate, pois a partir de uma ideia central
sobre o todo democrático e seus desdobramentos, pode-se chegar ao ponto nefrálgico
de todo o pensamento cunhado até aqui.
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Para que se possa chegar ao cume do debate que relaciona a judicialização e
o ativismo judicial com os limites democráticos, é necessário, antes de tudo e mesmo
que de forma breve, conceituar a compreensão de democracia. Dessa feita, utiliza-se
a afirmativa de Manoel Gonçalves Ferreira Filhos, que nos traz alguns princípios sobre
o pensamento democrático contemporâneo, os quais possibilitam cunhar uma
definição central. Assim, ele afirma:

A democracia contemporânea, do ângulo jurídico pode ser resumida nalguns


princípios. Ou seja: 1) ela tem o povo como fonte de todo o poder – princípio
da soberania popular; 2) todavia o povo não exerce o poder, mas faz por meio
de representantes – princípio representativo; 3) tal poder é, ademais, limitado
por freios e contrapesos e, sobretudo, pelo reconhecimento de direitos
fundamentais em favor dos seres humanos – princípio da limitação do poder.
(FERREIRA FILHO, 2010, p. 51)

A coletânea de princípios expostos aborda, em grande maneira, sobre a


soberania popular, tendo a população como o elemento geratriz de todo o poder.
Nesse sentido, esse domínio é exercido de forma indireta, ou seja, por representantes
que, por sua vez, passam a empunhar o cetro de poder no lugar do povo.

A definição principiológica citada acima, permite fazer uma análise


confrontativa entre os dois polos ora citados: de um lado o movimento de expansão
da jurisdição constitucional (judicialização e ativismo judicial) e de outro a legitimidade
democrática.

Em uma perspectiva de poder exercido pelo povo de modo indireto, ou seja,


através de representantes – Presidente da República eleito por mais de 40 milhões
de votos e 513 parlamentares eleitos por voto popular – é inegável questionar como
pode haver a preponderância decisória de um órgão não eletivo, como o Supremo
Tribunal Federal, sobre as decisões de entes popularmente eleitos. Onde estaria a
legitimidade para o exercício deste poder preponderante sobre as decisões de
representantes eleitos pelo povo? Como justificativa, serão citadas questões de cunho
normativo e filosófico.
17
4.1. JUSTIFICATIVA DE CUNHO NORMATIVO

Seguindo a tendência internacional, a carta constitucional de 1988 estabelece


em seu conteúdo uma série de poderes ao Judiciário e de maneira especial ao
Supremo Tribunal Federal:

A maior parte dos Estados democráticos reserva uma parcela do poder


político para ser exercida por agentes públicos, que não são recrutados pela
via eleitoral, e cuja atuação é de natureza predominantemente técnica. De
acordo com o conhecimento tradicional, magistrados não têm vontade política
própria. (BARROSO, 2009, p. 17)

Sob uma determinada ótica, o Supremo Tribunal Federal atua, por muitas
vezes, como um coparticipante do processo legislativo, partindo da perspectiva do
“dar sentido” a termos vagos.

Ao aplicarem as leis e a Constituição, o Judiciário se movimenta no sentido de


aplicar as decisões que foram tomadas pelo legislado ou pelo constituinte, ou seja,
por aqueles que exercem o poder em nome do povo, entretanto essa afirmação não
pode ser levada ao ponto de ter-se uma ideia de mecanicidade na atividade exercida
pelo Judiciário. Como crítica a essa compreensão, existe a necessidade de verificar a
justificativa de cunho normativo pelo viés do clamor social, que deu origem a norma
que justifica a ação do judiciário.

Após décadas de regime militar, a Carta Constitucional promulgada no florescer


democrático do país, abrigou em si uma série de direitos que foram alcançados pelos
mais diversos setores sociais, levando-a a ser conhecida até os dias de hoje como um
diploma legal extremamente ambicioso.

O conteúdo de nossa recente constituição foi recheado de uma ampla gama de


direitos, sendo que eles absorveram um vasto significado moral e valorativo,
resultante, em grande medida, de um seio social fértil para compreensões de caráter
pluralistas.
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Entretanto, o que era fruto de um clamor popular, agora, mais de 30 anos
depois de sua promulgação, se revela como questões de cunho decisório que
parecem estar distantes da deliberação popular, exercida essencialmente pelos
processos políticos e que no momento presente se demonstram quase que
constantemente questionados em processos judiciais, por meio do modelo de controle
de constitucionalidade que foi consagrado na constituição. Nesse contexto, afirma
Jorge Octávio Lavocat Galvão:

Relativamente ao Brasil, no começo de sua experiência democrática, uma


Corte Constitucional com amplos poderes fazia-se necessária para fortalecer
o compromisso com os direitos fundamentais e aniquilar os espectros da
ditadura. Vinte anos depois, entretanto, a população depara-se com a
possibilidade de ter restringida sua participação na tomada de decisões
político-sociais. (GALVÃO, 2011, p. 391)

Desse modo, tendo em vista o possível abismo formado entre a população e o


processo de tomada de decisões, além do constante robustecimento de nossa carta
constitucional, encontra-se o ponto de tensão entre o movimento denominado
Ativismo Judicial e a democracia.

De maneira mais afinada, percebe-se o atenuar da tensão quando a Corte


Constitucional toma o papel de interpretar, dar significado no sentido de mudança de
entendimento, robustecimento, esvaziamento, extensão ou retração de termos ou
postulados abertos em que os fundamentos sociais estão assentados.

Expostas as questões de cunho normativo, segue-se agora a uma reflexão


filosófica que se demostra mais rebuscada, entretanto, palatável ao entendimento.

4.2. JUSTIFICATIVA DE CUNHO FILOSÓFICO

Em primeiro plano, para compreender-se a justificativa filosófica nas questões


relativas ao Ativismo Judicial e a Judicialização é preciso entender, de primeiro
19
momento, a ideia e a definição de um Estado Constitucional Democrático de Direito.
Dessa maneira, é possível definir o seu sentido:

Estado Constitucional Democrático de Direito. Tal estrutura de Estado tem


conformação constitucional, com a previsão na Carta de um rol de direitos
fundamentais e de limitações ao próprio legislador, em nome de uma esfera
inviolável de direitos do cidadão. O conjunto de princípios constitucionais
conformadores do regime democrático (soberania e vontade populares,
sufrágio universal, participação democrática dos cidadãos etc.) (DEFINI,
2013 p. 157)

A partir da compreensão geral sobre o Estado Constitucional Democrático de


Direito, entende-se os grandes papéis da Constituição. O primeiro papel da
constituição é o estabelecimento das regras e limites democráticos, assegurando
sobre a alternância no poder, o governo de maioria e a ampla participação política.
Entretanto, é necessário ficar claro que o princípio democrático não está resumido
única e exclusivamente a preponderância cega do princípio majoritário, mas ao
sopesamento, no sentido de valorização e proteção dos direitos e liberdades
fundamentais.

O segundo papel fundamental faz referência à valorização e proteção dos


princípios fundamentais, ainda que para isso, sejam necessários o enfrentamento e a
imposição de medidas contra uma maioria detentora de grande parte dos votos. Dessa
forma, a Suprema Corte revela-se como a intérprete final da Constituição, sendo sua
responsabilidade a delimitação dos termos democráticos, velando pelos direitos
fundamentais em todas as suas proporções.

O papel da Constituição e do Poder Judiciário, como seu guardião e intérprete,


em nada pode diminuir ou mesmo cercear o papel da função legislativa, do governo
majoritário e da essencialidade da política.

De acordo com a observância da constituição e das leis cabe ao parlamento.


por sua função típica, e a sanção do Presidente da República, fazer a opção mais
ajustada aos princípios de uma sociedade que se caracteriza pelo pluralismo. Dessa
forma, o poder judiciário deve se mostrar inerte e absolutamente diferente quanto as
20
deliberações e as opções administrativas realizadas por quem é competente para tal,
sendo exceção a isso, o que é essencial para a preservação do Estado Constitucional
Democrático de Direito e aos direitos fundamentais.

Em suma, os grandes agentes do cotidiano político devem ser os detentores


de cargo eletivo, ou seja, todos aqueles que possuem votos para tal. Logo, Juízes e
tribunais não podem e nem deve presumir a imposição de suas vontades e
preferências, sendo suas ações legitimadas apenas quando demonstram capacidade
de fundamentar seus posicionamentos de forma racional com base na Constituição.

5. OUTRAS CONSIDERAÇÕES SOBRE OS LIMITES DEMOCRÁTICOS

É certo que, no cenário atual, de acordo com os níveis de complexidade que se


observa nas demandas levadas ao judiciário, deve-se fazer outros apontamentos
sobre a linha tênue em que caminha a totalidade dos princípios que compõem a
estrutura democrática.

Dessa feita, será abordado neste bloco, questões relativas à capacidade do


judiciário em matérias específicas e seus limites, e sobre os efeitos decisórios
estruturalmente encadeados.

5.1. CAPACIDADE DO JUDICIÁRIO EM MATÉRIAS ESPECÍFICAS E SEUS


LIMITES

No título I da Carta Constitucional de 1988, tem-se a compreensão geral dos


princípios fundamentais da república. No que diz respeito aos poderes da União, no
art. 2º, compreende-se:

Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o


Legislativo, o Executivo e o Judiciário (BRASIL, 1988, Art. 2º)
21
Em linhas gerais, em relação à forma como os Estados democráticos se
constroem, aponta Luiz Roberto Barroso:

As maiores partes dos Estados democráticos do mundo se organizam em um


modelo de separação de Poderes. As funções estatais de legislar (criar o
direito positivo), administrar (concretizar o Direito e prestar serviços públicos)
e julgar (aplicar o Direito nas hipóteses de conflito) são atribuídas a órgãos
distintos, especializados e independentes. (BARROSO, 2009, p. 19)

Sem nenhum embaraço à independência dos poderes, o Legislativo, o


Executivo e o Judiciário comumente operam um sistema de interfiscalização de suas
atividades institucionais. Dessa forma, atuam como uma barreira para o surgimento
de uma hegemonia de poder, fazendo uma instância preponderar sobre as outras e,
por conseguinte, sendo capazes de causar desequilibro e, dessa forma, ameaçando
a salubridade do sistema democrático vigente. De um modo geral, os três poderes
têm a capacidade e a responsabilidade de interpretar a Constituição no sentido de
promover, potencializar e afinar os princípios gerais que são a intencionalidade de seu
conteúdo, ou seja, promover os fins nela previstos.

É importante ressaltar que na estrutura institucional, nos casos em que há


divergência na interpretação das normas constitucionais ou legais, a interpretação
preponderante é a do poder judiciário, isso não quer dizer que todas as matérias
devem passar pelo crivo institucional dos tribunais.

Analisar o judiciário, nas limitações de sua capacidade institucional, nos revela


questões que envolvem a determinação de qual poder tem a capacidade técnica ou
científica para dizer o melhor direito. Comumente observa-se o poder judiciário proferir
decisões de grande repercussão em áreas de conhecimento muito específicas e que,
por sua vez, podem não ter na figura do Magistrado, o ente mais competente, no
sentido jurídico da expressão. Isso, deve-se à falta de um arcabouço de conhecimento
refinado na área exigida para o julgamento da questão, sendo de bom tom que as
medidas sejam apreciadas pelo Legislativo e Executivo.
22
Em determinados casos, com a apresentação de estudos técnicos e científicos
adequados que deem lastro decisório, é necessária uma análise criteriosa sobre a
competência jurisdicional do Judiciário para proferir decisão específica.

5.2. OS EFEITOS DECISÓRIOS ESTRUTURALMENTE ENCADEADOS

Em determinados casos há a exposição do judiciário a efeitos estruturalmente


encadeados, que são indesejados e imprevisíveis, sendo necessária uma posição
mais contida e cautelosa.

Para que esse estudo seja compreendido com mais clareza, apresenta-se
como exemplo os constantes casos em matérias de saúde pública, onde vê-se
decisões “almáticas” sobre temas relacionados com a concessão de medicamentos e
terapias, que são causas de uma desordem no curso normal da administração pública.
No que diz respeito à alocação de recursos, o professor Luís Roberto Barroso afirma:

Tais excessos e inconsistências não são apenas problemáticos em si. Eles


põem em risco a própria continuidade das políticas de saúde pública,
desorganizando a atividade administrativa e impedindo a alocação racional
dos escassos recursos públicos. (BARROSO, 2009, p.35)

A partir dos exemplos, extrai-se a lição de que a interferência do judiciário


sempre é possível, mas nem sempre é conveniente. Assim, fica claro que é
fundamental uma criteriosa avaliação de sua própria capacidade institucional em seus
limites, para o pleno equilíbrio institucional e a efetivação da segurança jurídica.
23
6. CONSIDERAÇÕS FINAIS

O ativismo judicial e a judicialização são elementos presentes no cotidiano


institucional brasileiro. Ressalta-se, mais uma vez, o grau de proximidade entre
ambos, entretanto, revelam-se distintos tanto em sua definição quanto em sua prática.

A judicialização é o movimento resultante das opções constitucionais, feitas por


um país, que vivia o ardor do novo fogo democrático e incendiava as instituições em
1988. Esse fato, resultou em uma Constituição analítica, com um sistema de controle
de constitucionalidade abrangente, que enseja debates de amplitudes políticas e de
cunho moral, oferecidos ao Supremo Tribunal Federal e ao Poder Judiciário no
formato de ações judiciais.

É fato que a opção constitucional em relação à amplitude de propositura de


ações, deu início a uma corrida sem precedentes no sentido de buscar a tutela do
Estado, contribuindo para uma expansão da jurisdição constitucional que passou ter
influência direta sobre as relações sociais e sobre a política.

Por sua vez, o ativismo judicial é a máxima expressão de um protagonismo do


Poder Judiciário em posição interpretativa e proativa, pois em relação ao alcance da
norma constitucional, ele ultrapassa sua função típica e navega por águas de
competência do legislador ordinário. Nesse sentido, mostra-se como uma forma de
“criar atalho”, para desembargar a inércia de um processo político de cunho majoritário
e incapaz de chegar a um denominador comum em sua função.

É fato que, apesar de seus benefícios em âmbito de mobilidade e ajuste de


demandas sociais, tanto a judicialização como o ativismo judicial perpassam por riscos
quanto a estrutura democrática. Dessa maneira, é necessário realizar apontamentos
sobre a falta de capacidade institucional do judiciário em sua atividade técnica e sobre
os imprevisíveis e indesejados efeitos decisórios estruturalmente encadeados.

Partindo do pressuposto que os membros do Poder Judiciário não são


popularmente eleitos, verifica-se uma diminuição da possibilidade de avanços para
além dos limites democráticos, quando Magistrados e Tribunais exercem, de maneira
contida, a aplicação da lei ao caso concreto.
24
Ressalta-se, entretanto, que em caso de fluidez ou abstração de conceitos
basilares para a boa condução da justiça, o Poder Judiciário passa a operar como
intérprete, dotado do poder criativo de dar sentido e conduzir conceitos a uma quase
normatização, a fim de dizer o bom direito aos casos que lhe são propostos.

Ao fim, reafirmo a figura do Poder Judiciário, especificamente do Supremo


Tribunal Federal, como o guarda maior da Constituição, asseverando seu
cumprimento e tendo como seu estandarte os valores e a moral democrática, assim
como os direitos fundamentais. Enfatizo aqui a necessidade de compreender o papel
do judiciário como um interventor eventual, ou seja, atuando contra os eminentes
riscos de acidentes democráticos e suas sombras.
25
REFERÊNCIAS

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excessiva: direito à saúde, fornecimento gratuito de medicamentos e parâmetros para
a atuação judicial, 2009. Disponível em: https://bd.tjmg.jus.br/jspui/handle/tjmg/516.
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