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SOUZA, Jessé. A ralé brasileira: quem é e como vive. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2009 (483p.)
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da sociedade e dos governos. Como o origem e esse destino comuns representa
abandono social e político não é compreender problemas sociais e seus
percebido – por razões que o livro desafios de outro modo, possibilitando o
explica – o sentimento de impotência é nosso debate público sair da
tornado “culpa” individual – permitindo adolescência.
quebrar a fonte de toda resistência
Nesse sentido, o livro também critica o
política – e substituído por “auto- caráter unificador e escamoteador de
legitimações” que impedem toda crítica
conflitos de um mito nacional que logrou
social e toda autocrítica individual, o que inclusive ser o fundamento da ciência
possibilita reconstruir toda a trama da
social dominante do Brasil moderno e de
reprodução continuada do abandono
sua influência sobre os nossos principais
como o vemos hoje. Chegar a esse
partidos políticos como o PSDB e o PT.
universo recôndito, que explica como o
Assim, tanto as teorias liberais quanto as
dominado internaliza cotidianamente a
abordagens politicamente corretas são
dominação e o torna vítima passiva de
criticadas por compartilharem de uma
seus efeitos, foi o ponto principal do
mesma visão anacrônica e conservadora
trabalho. Como aqui a pesquisa
do Brasil contemporâneo cujo leitmotiv é
meramente quantitativa – muito útil para
o desconhecimento do mundo de classes
descobrir sem problemas o candidato em como a “ralé”. Assim, perceber a “ralé”
que se quer votar ou o sabonete que se
como “ralé”, ou seja, como conjunto de
quer usar – ajuda muito pouco, o livro
famílias e de indivíduos assolados pela
faz uso inovador do método qualitativo
desestruturação familiar, pela
desenvolvido por especialistas em
naturalização do abuso sexual em todos
pesquisas internacionais.
os níveis, pela não incorporação
O esforço de acompanhar a trajetória sistemática dos pressupostos do trabalho
social dos principais tipos sociais da produtivo moderno altamente
“ralé” como empregada doméstica, especializado, pelo uso instrumental de
catadores de lixo, traficantes de drogas, todos contra todos, pode ter um efeito
prostitutas, trabalhadores braçais crítico, de conhecimento daquilo que
desqualificados, mostra, sem anestesia, todos evitamos saber, extraordinário.
que todos esses tipos perfazem uma Portanto, a leitura de um trabalho com
origem e um destino comum apesar da este compõe instrumento indispensável
eventual multiplicidade de destinos para iniciar a elevação do debate público
individuais. Como a percepção dessa no país ao tratar sem rodeios de nosso
classe social na mídia, no governo e na maior problema – a chocante
academia brasileira é fragmentária – fala- desigualdade social que criou entre nós
se de violência pública, insegurança, duas classes de pessoas, as que são
assistencialismo, analfabetismo consideradas como tal e as que não são –
funcional, má formação de mão de obra e pôr fim às ilusões que caracterizam a
etc., como se não houvesse um vínculo formulação de muitas de nossas políticas
interno ligando todas essas questões a um públicas.
núcleo social comum – mostrar essa
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CARLOS SÁVIO TEIXEIRA é Doutor em Ciência Política pela USP e professor pesquisador do
Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da UFF
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