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MIGUEL G. ARROYO i i i OUTROS SUJEITOS, OUTRAS PEDAGOGIAS Dados Internacionais de Catalogagio na Publieagio (CIP) (Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Arroyo, Miguel G. Outros Sujets, Outras Pedagogias » Miguel G. ‘Arroyo. ~ Petrépolis, RJ: Vozes, 20:2. Bibliografia ISBN 978-85-326-4448-0 1, Educagdio — Finalidades ¢ objotivos 2. Movimentos sociais 3. Pedagogia 4. Sociologia educacional I. Titulo. 12-10989 CDD-306.43 y EDITORA VOZES Petropolis Indices para ca:logo sistemétio: VSonintnniasthvarionsl AOR 3 QUE OUTROS SUJEITOS, QUE OUTRAS PEDAGOGIAS? A presenga de Outros Sujeitos nos remete a coletivos coneretos, histéri- 05, as classes sociais e os grupos subaltemizados, os oprimidos pelas diferen- tes formas de dominasgo econdmica, politica, cultural, Remete-nos também a suas criangas e adolescentes. Os coletivos segregados no padrio de trabalho; de acumulacdo, de ocupagao da terra, de poder/saber. Fazendo-se presentes no como pacientes, passivos e submissos, mas em agées, resisténcias, Iutas © organizagdes, ¢ se fazendo presentes como atores na cena escolar, social, politica, cultural e na produgdo de saberes. Reagindo a seu silenciamento Mostram-se presentes, existentes, reagindo a seu silenciamento e ocul- tamento. Reagindo as formas de ser pensados ¢ tratados, de ser subordinali- railos nas relagbes de poder, dominagio. Os grupos socials, Stnicos, raciais, ¢artegam para seus movimentos ¢ para as escolas vivéncias de como foram Pensados e alocados na ordem sccial, econémica, politica, cultural e peda- ‘Bogica. Vivéncias de resistencias, De aprendizados. Vincular Outros Sujeitos Som Ontras Pedagogias supde incagar quem sio esses Outros na especifici- | lade de nossa histéria e reconhecer com que pedagogias foram inferioriza- © decretados inexistentes, mas também com que pedagogias resistem e se m existentes ao longo dessa historia, Na diversidade de presengas os 3 Sujeitos sko eles ¢ elas tal como feitos e tal como se fazem. As Outras Hecebouias sio, de um lado, essas brutais pedagogias de subalternizagaio e, de Baio) Pedagogias de libertagiio de que sto sujeitos. ruas, no movimento adolescente/juvenil. S20 0s outros educandos que trazem ou- tras indagacdes pedagogicas a docéncia, Sao 0s outros docentes se orgenizando, ‘mobilizando ¢ inventando outro fazer educativo. Para se manifestar privilegiam ‘ages. Agbes coletivas na diversidace de campos ¢ fronteiras de huta pelo direito 8 vida, terra, a0 teto¢ tervit6rio, a identidade, orientaglo sexual, ao conhecimento, a meméria e cultura, a said, educagdo e dignidade, & justica, igualdade, és dife- rengas, Agbes coletivas pela emancinaciio, como pedagogies libertadoras radicais. 0 foco central so 0s conhecimentos € 08 processes, as pedagogias que contestam © que nessas ages coletivas emancipatorias os seus sujeitos pro- duzem. Contestam 0 pensameato 2m que foram produzidos? Trazem suas ex- perigncias ¢ interpretages? Repolitizam o campo do conhecimento? Em que ‘aspectos? Trazem o faco para Ourras Pedagogias em que se afirmam sujeitos sociais, politicos, culturais? Contestam o pensamento em que foram inferiorizados [As teorias e praticas educativas operam com formas de conhecer, mas pressupdem formas de pensar 0 canhecimento e de pensar os sujeitos sociais. Sobretudo, de pensar e tratar os Cutros nos padrées de poder, nas relagdes de trabalho, de produgo, de apropriagtolexpropriago da terra, da renda, dos direitos. O padro de saber, de pensar os outros e de pensar-se 0 NOs esti atre- Jado ao padrio de poder, de dominagao/subordinagao dos outros povos, racas, classes na especificidade da nossa historia a partir da empreitada catequética até a empreitada da educagao pislica popular. As eriangas, adolescentes po- pulares carregam as escolas formas de pensé-los atreladas a seu lugar, deles € de seus coletivos de origem, ao padrio de poder. As suas resisténcias como coletivos sio a essas formas de pensé-los ¢ alocé-los nesses padrdes de po- der/subordinagdo. Sto tentativas individuais e coletivas de se libertar dessas formas de pensé-los e de submeté-los. 14 historicas tenses nesse padrio de poder’saber que os movimentos sociais retomam ¢ radicalizam. Os conftontos no campo do conhecimento, dos valores e saberes, das cculturas € identidades, das cosmovisbes ¢ dos modos de pensar fazer par te da formacio de nossas sociedades. Perduram como um campo de tensdes politicas na diversidade de fronteiras, ages coletivas ¢ movimentos sociais. TensGes que se perpetuam como uma constante histérica, politica, porque padro de poder foi e continua associado @ um padrao de saber, de combi ‘mento, associado a um padrio de classificagao das culturas, dos saberes © racionalidades (QUIJANO, 2005). Assoviado ainda a um padrao cognitivo © pedagégico que tem operado como padres de classificagao social, étnica, racial, de género, de hierarquizagses ¢ bipolaridades cognitivas dos coletivos humanos: coletivos primitivos, irracionais, ineultos, selvagens, ignorantes, se gregados do poder versus coletivos racionais, cultos, civilizados, detentores do poder/saber. Com que pedagogias de dominagao tém sido con-formados? ‘Com que Outras Pedagogias se auloformam? © tema sugere ndo ficarmos ai e avangarmos. Se o pensamento em que foram produzidos como inferiores faz parte do padrio de poderisaber e do padre politico de dominagto/subordinagao, também em nossa historia fo- ram se constituindo movimentos sociais, acdes coletivas que vém fazendo do conhecimento, da cultura, da meméria e identidades um campo de afir- ‘magdo, formagao ¢ emancipacdo. Se o padréo de poder/saber conformou um pensamento sociopedagdgico pam inferiorizar os coletivos populares, esses em suas agBes/reagdes/afirmagtes inventaram outras formas de pensar-se € de formar-se, outto pensamento sociopedagégico. Outras Pedagogias. Uma tensa histéria com trapos peculiares,ique exigiu ser reconhecida constituinte da historia da educagdo ¢ da histé-ia das teorias pedagégicas. Essas tenses so repostas, repolitizadas na atualidade pela diversidade de coletivos socias, étnicos, raciais, de género e orientagdo sexual dos campos e periferias em suas agdes ¢ movimentos que incorporam pedagogias e saberes acumulados por outras ages ¢ movimentos de educae20, emancipacdo, Mas ‘vao além, Os campos de suas lutes 0s obrigam a inventar processos e pedago- sis com outras radicalidades ¢ virtualidades formadoras e emancipedoras. Ha uma histéria de tenses entre pedagogias. no padrio de poder/saber, domina- fo, libertagto, Essas formas de pensar os Outros estdo incrustadas no pensa- mento educacional. Como criangas, adolescentes, jovens ou adultos populares serio pensados como inferiores ao chegarem 3s escolas e universidades, a0 ser Teprovados porque com problemas de aprendizagem ou de tondutas, valores. ‘Nos encontros,oficinas, dias de estudo os militantes poem de manifesto essas tensBes. Mostram que carregam vivencias de opressBo, segregaga0, de tratos infe- Florizantes. Mostram também como desconstroem as formas como forem pensados © 05 processos/pedagogias com que foram tratados como inexistentes, inferiores, ‘sub-humanos. Explicitam ¢ reagem a esses processos/pedagogias de subalterniza- ‘io. Nessas reagGes afirmam Outras Pedagogias de emancipacdo. Como reagem &s formas como foram pensados, con-farmados ¢ classificados como inferiores? Nao se reconhecem nas formas de pensé-los e de segrega-tos Essas persistentes formas de pensé-los como inferiores para submeté-los 20 padrao de poder, de trabalho, de expropriagao da terra, do espaco, do ‘conhevimento, da cultura trazem para 0 pensamento social, politico, pedags- ¢gico a necessidade de dar maior centralidade as formas historicas de pensé-los seja nas salas de aula, seja nas politicas sociais, educativas. Com que coneep- g0es slo pensados? Como primitives, violentos, incultos. Que identidades, formas de nomeé-los persistem nas concepgbes de educagdo, nas diditicas, ou como reprovados, defasados no sistema escolar ou como reprimidos nas suas lutas por direito a terra teto, territorios? Secundarizar, ocultar essas formas de pensé-los faz parte dos estreitos vinculos entre o padriio de poder/saber que se perpetua. Se reconhecem nossas formas de pensi-los ou resistem? 0s estudos pés-coloniais tém destacado que o poder sobre 0s outros povos ¢ grupos sociais se conformou sobre um saber sobre esses Outros. Pensados como objetos naturais, em estado de natureza, primitives, selvagens, 0 poder! saber poderia submeté-los ou ignoré-los como inexistentes, inferiores, pré-humanos. O pensamento que se’ conformou sobre os povos colonizados € que 0s conformou como inferiores passou a ser usado como um dos ins- trumentos de legitimago da relagio politica de dominagao/subordinagao, Constituiu-se e persiste como justficativa da inferiorizagao da diversidade de coletivos populares. Particularmente o pensamentc colonizador e socioeducativo se alimentam dessa forma de pensé-los a partir da empreitada colonizedora assumida mais tarde nas repiiblicas e democracias como empreitada educativa, civilizatoria pelos sistemas de educagao e de instrucdo piblica, Pensamento legitimado pelas teorias pedagdgicas e a educagao escolar como o percurso do polo nega- tivo da incultura para a cultura; da ignoriincia para o saber; de irracionalidade para a racionalidade, Conformar na crianga educada 0 adulto civilizado. ssa forma no Nés civilizado pensar 9s Outros como objetos naturais € as dico- tomias inferiorizadoras entre primitives e civilizados persiste nas formas de pensar as criangas e adolescentes ¢ seus coletivos sociais, étnicos, raciais, de ‘género, das periferias e dos campos. Persiste como 0 pensamento que os con- figura ¢ os aloca no seu lugar na erdem social, econdmica, politica e cultural Até na ordem pedagogica \Vejamos algumas formas de pensé-los e conformé-los as quais reagem como coletivos, Em suas agSes reagem as formas parciais, superficisis de sua classificago que ocultam os processos mais radicais de sua inferioriza- ‘gdo © segregactio, como coletivos humanos. As categorias mais frequentes com que séo vistos, sobretudo no pensamento sociopedagdgico, tém sido: marginalizados, exeluidos, desiguais, inconsclentes. Formas de pensé-los ¢ classificé-los que ocultam formas histéricas mais abissais e sacrificiais de segregé-los. Nao se reconhecem marginais Conceitui-los como marginalizados, marginais, supde entender que na sociedade uns coletivos esto situados em margens opostas, mas possfveis de serem aproximados por meio de pontes ou pinguelas. Que a margem, 0 territé- rio de e6 pode ser ocupado, conquistado pelos coletivos da outra margem, pot meio de politicas de passagem, do esforgo, do éxito nesse percurso. Nessas con- cceituagdes cabern esperanga, politicas de aproximaciio e de passagem. Nessa ‘visio se legitima o pensamento educativo e a diversidade de pedagogias sal- vadoras dos marginalizados. A visfio dos setores populares como coletivos & margem tem sido cara & pedagogia e as politicas socioeducativas. A empreitada civilizatéria, a escola até as pedagogias salvadoras carregam essa identidade: oferecer percursos, passagens para sair da ignorfinciz, da incultura, da tradieto pré-politica, da pobreza pata a civilizagdo, a cultura, a consciéncia politica, 0 progresso, a ascensto social... Uma imagem incrustada em nossa cultura politica, pedagé- gia, civilizatéria dos marginais. Entretanto, nessa cultura politico-pedagdgica as passagens de margem serio condicionadas. S6 passam aqueles que se esforcam por sair do polo negativo, ue fizerem um percurso exitoso. O ideal do mérito esté tio arraigado que tor- mina operando diante dos fracassos como mecanismo de confirmacto da sua condigtio de marginais porque preguigosos, sem valores de esforeo, de éxito para saitem da ouira mangem, Ou sem consciéncia de estarem nesse margem, ‘Outra condicdo é que a passagem seré individual. Os individuos, nfo os coletivos, sero capazes de fazer percursos se se afastarem dos seus coletivos sécio/étnico/raciais, dos campos ¢ das periferias incapazes de percursos de assagem como coletivos porque thes é inerente serem indolentes, inferio- es em valores, moralidade, competéncias, inclusive incdnsciéncia. Conse- ‘quentemente as politicas de ir tirando individuos de seus coletivos marginais, nunca aeabarao, As imagens dos coletivos como marginais terminam sendo funcionais a realimentar politicas e pedagogias e o priprio pensamento socio- educativo que se autolegitimam em oferecer pontes, percursos de passagem. ‘Um circulo fechado que se vem lastranclo na histéria das politicas ¢ das peda- ‘gosias ¢ teorias sociceducativas. Sem a existéncia de marginais perdem sua raziio de ser. Como quebrar esse c'rculo fechado? As teotias pedagégicas oficiais giram nesse cireulo fechado, mas nao fal- tam tentativas de educadores, de formuladores de politicas de quebrar esse Citeulo. Os préprios “marginais” em seus movimentos quebram esse circulo fechado a0 ndo reconhecer-se marginais. Os coletivos sociais, étnicos, raciais, dos campos e periferias assim clas~ sifteados reagem a essa visio de marginais, nilo se identificam com esse tt mo e trazem ages indagadoras desestabilizadoras para o pensamento socio educativo, suas politicas e pedagogias, que se justificam ¢ realimentam dessa classificagdo, Pazem-se copresentes na ordem social, ocupam as margens de cé, o$ territ6rios, terras, espagos, instituigées sem ter passado pelas pontes, pinguelas, sem fer-se submetido a percursos exitosos. Surpreendem as formas de pensé-tos. Como é possivel que sem passar por nossos pereursos eiviliza térios, conscientizadores, fagam-se presentes em agdes coletivas se esto su- midos na inconseiéncia, na ignoransia, no senso convum, na falsa consciéncia? Com essas ages coletivas desconstroem conhecimentos, formas de pen- silos ¢ de “educé-los”, Terminam mostrando a fraqueza de um pensamen- to socioeducativo conformado em classificagdes dicotdmicas dos coletivos humanos. Os préprios coletives situados & margem ¢ aos quais se prome- tem politicas e pedagogias de passagem nos advertem de que as formas de pensé-los e de segregé-los foram e continuars muito mais brutais e radicais. Que as politicas e pedagogias ter2o de partir dessas radicalidades historicas. ‘Terdo de repenser-se nos cursos de formago, no recontar 2 historia do pen- samento educacional, das didéticas, dos curriculos até da identidade docente, Qual a fangio da escola? Qual 0 nosso oficio? Trazer o povo, os marginais para a margem de ca? ‘Nao se reconhecem como exeluidos ‘Outra categoria com que o pensamento social ¢ educativo os tem pensado fe tratado ¢ exeluidos, Diante do aumento do nimero de marginais, no desem- prego, na sobrevivéneia, no trabalho informal e diante da massificagao da po~ breza e da miséria em nossas sociedades, a categoria marginal perdeu sentido. [As promessas de tird-los da marginalidade via percursos escolares exitosos ficaram promessas vazias. As esperangas que essas pedagogias carregavam de possibilidades de reverter a marginalidade por meio de agdes ¢ politicas socio~ ‘educativas distributivas foi perdendo forga. As distancias entre os coletivos da imargem de od e aqueles da margem de la se tomaram mais profundas, apesar do aumento de sua escolatizagio e de sua presenca nas instituigdes pablicas (ARROYO, 2010). ‘A categoria explorados no trabalho perdeu impacto, ¢ a categoria de- sempregados porque desnecessérios, excluidos, entra na moda. A opresszo! ‘exploragio foi substituida pela exclusio. Processo semelhante no campo da cidadania prometida, a partir da escolarizagdo ¢ da educagao critica, diante do “gumento da subcidadania, da cidadimia condreionada a educaeao, a categoria de excluidos do trabalho, da cidadenia, da participagio politica passou a ocu- par o centro das andlises sobre 05 Outros subalternizados. A exclusio como 0 principio para entender sua produclo e as politicas inclusivas como remédio. ‘As pedagogias de inclusto, participagdo sto inventadas do lado dos inclufdos para prometer incluir os exeluidos. 0 termo exclustio, excluidos, escola, politicas € pedagogias inclusivas passou a ser incorporado como ure categoria com maior poder explicativo da produglo dos coletivos diferentes em desiguais. Um termo mais forte do ‘que marginais e que pretende dar conta de que a separagiio entre os coletivos sociais é mais radical. Nao é apenas de margens, mas separados por muralhas, rmuros. As mangens e as fronteiras s&0 aproximéveis, os muros, murallas sto impeditivos de tentar passar. Construidos pelos coletivos que esto dentro, para impedir qualquer tentativa de passagem dos de fora, So os de dentro que se defendem e defendem seus tertitérios, cercando-os de murathas e cercas.~ ‘tio eles que se digaam abrir as fronteitas, oferecer ou nfo vistos, passaportes, ou exterminar aqueles ousados quese atrevem a ultrapasser 0s muros para sair de seu lugar. O termo excluidos, tio na moda, reffete @ autoconsciéncia que tém aqueles que os excluem, Nesse maior distanciamento entre os coletivos, nessa exclusdo até de pos- sibilidades de passagem o pensamento socioeducativo e suas politicas ainda tema ousadia de oferecer a escola ¢ uma pluralidade de projetos como inclusi- vos. Escola inclusiva, politicas, prejetos inelusivos vém sendo as propostas de moda, Até no MEC, a Secretaria ca Diversidade (Secad) virou Secretaria da Inclusio, Temos um pensamento socioeducativo construido nessa dicotomia exclusfo‘inclusdo. Uma caracteristica & ser um pensamento conformado de dentro do muro para os coletivos pensados fora. E significativo que 0s proprios coletivos pensados cofno excluidos no usem esse adjetivo para nomear-s¢ ¢ identificar-se. Nao se aceitam pensados nem como marginais, nem como excluidos. Nem defendem os projetos ¢ pe- Aagogias de inclusio, escola, curriculs inclusivos; nem Iutam para que sejam mais eficientes, com mais recursos, que os incluam logo a todos. Sabem-se produzidos e inferiorizados em processos sociais, politicos, culturais ¢ até pe- agégicos bem mais radicais. Consequentemente suas agdcs sdo mais radicais. Em suas agGes coletivas nfo se propdem superar a exclustio nem acclerar sua incluséo na ordem social, politca, cidada, hegeménica. Nem inctuidos no Projeto de sociedade, de cidade ou de campo, de relagbes sociais de producto € de trabalho. Nem pedem pedagog'as, projetos de suportabilidade da exclusfo, 8 Suas ages contestam o sistema sceial e no pedem para se integrar, ser nele incluidos, nem para ser capacitados para merecer a incluso, Apresentam-se conscientes e capazes de conformar outro projeto de campo, de cidade, de relagoes de poder, de sociedade, que n&o os conforme no lugar em que sto pensados e alocados. Entram nos embates sobre reforma agritia e urbana, so- bre 0 diteito ao trabalho, & terra, vida, moradie, escola, universidade. Entram de cheio, sem esperar as pedagogias inclusivas. © pensamento e os rituais de passagem sii contestados. Essa postura dos coletivos em ages € movimentos nao se reconhecendo como marginais, nem excluidos e zontestando as politicas e pedagogias de in- clusio trazem para 0 pensamento socioeducativo ¢ politico desestabilizagdes que o obrigam a repensar-se e a repensar sua visto sobre esses coletivos, con- sequentemente sobre as formas de autopensar-se, Nesse sentido, suas posturas indagadoras das formas como tém sido pensados podem ser vistas como ten- cionadoras do campo do conhecimento e das politicas ¢ pedagogies. Mostram como 0 pensamento socioeducativo € as teorias pedagogicas so condiciona- das pelas formas de pensi-los e de tentar conformé-los. Aliés, as formas de ppensé-los sdo construfdas & medica dos limites das formas de traté-fos ou nos limites das politicas. Politicas de incluso é o maximo @ que o Estado pretende chegar a uma incluso subalterna, Nai se reconhecem como desiguais Outta categoria para identificé-los também é contestada: os desiguais. ‘Aqueles coletivos que engrossam as desigualdades de nossas soctedades t30 desiguais, Os coletivos pobres, ns linha da miséria, revelariam ndo tanto que ‘0 pensamento os separou em margens, muralhas, fronteiras, mas se reconhece que 0s tomou desiguais, porém apenas desiguais em condigies de vida, de emprego, moradia, sade, escolarizagao, letramento, nivel de renda, Desiguais inseridos dentro da sociedade, da ordem desigual. J4 inseridos em uma hie- rarquia social. : Essa conceituagio dos Outros subalternizados desperta a sensibilidade do pensamento socioeducativo, das politicas compensatérias para suprir as ca- réncias e desigualdades das condigdes de vida a partir da infincia. A escola se afirma nessa visto como nivdladora, como capacitadora para a igualdade nas condigées do viver a partir da infaincia. Qualidade da educag%o piblica para garantir a igualdade social, Toda crianga na escola, bons desempenhos ‘no dominio de competéncias de leitura e de célculo, alfabetizagtio na idade certa, nivelardo as condiges de vida ¢ 0s Outros, desiguais serdo iguais a Nés. Assim sio justificadas as politicas distributivas, compensatérias. Um pense- mento que se pensa progressista, igualitaro. (© pensamento progressista igualitarista se alimenta do pensar/alocar os subalternizados apenas como desiguais. As formas de pensar os desiguais, as desigualdades correspondem as formas de pensar o Bstado, suas politicas como corretoras das desigualdades. Destacam-se as desigualdades possiveis de serem corrigidas por meio de politicas/programas ou cujos resultados sto passiveis de ser avaliados, quantificados, gestionados nos limites do Estado. Visdes reducionistas das desigualdades ¢ dos Outros pensados/feitos de: ‘guais, tendo Nés como pardmetto de igualdade. Redugdes frequentes. Ver as desigualdades como caréncias ¢ os desiguais como carentes, de condigdes de vida, de emprego, de moradia, de saiide © renda, levard a politicas supletivas de caréneias. Ver as desigualdades como problema moral, de falta de valores, de habitos de trabalho, de sustentabili dade ou como falta de educago levaré a politicas moralizadoras para superar as desigualdades. As formas de persar‘os outros sujeitos sociais coincidentes: desiguais pelas caréncias, pela falta, logo as politicas do Estado se legitimando, suprindo caréncias para a igualdade. As formas mais radicais de peasar, explicar e intervir nas desigualdades estio se diluindo ¢ simplificando ao reduzir as desigualdades a caréncias, a exclustio. Uma forma de substituir politicas de igualdade por polticas/pro- gramas de inclustio ou de supléncia de caréncias. H4 uma intencionalidade politica nesses processos de descaracterizar as desigualdades, de reduzi-las @ dimensbes mais leves, passiveis de corregdes leves, por exemplo: toda crianga na escola, alfabetizada na idade certa! E as desigualdades serio superadas, (Os Outros em suas ages coletivas ndio se reconhecem nessas formas de pen- sé-los como desiguais apenas em condiedes de vida ou em valores. Quando de- fendem a igualdade levam suas lutas mais a fndo, igualdade np ser, no viver, no ser reeonhecidos como humanos, i desiguais porque inferiores, suib-humanos. Nessas desigualdades mais radicais Zoram produzidos porque diversos, em raga, thie, género, orientago sexual, campo, periferia. Desigualdades mais radicais do que nas condigées de vida e nas caréncias morais. Os coletivos levam os em- bates, contestam essas formas supericiais de pensé-los em que se legitimam as formas histéricas de classificé-los ¢ as politicas e as pedagogias de traté-los e educé-los. Apontam outras formas de pensé-los mais radicais. Se sua diver- sidade social, étnica, de géncro esté na base de sua desigualdade nas condi- ‘es socigis de vida, como membros desses coletivos reagem a politicas € Pedagogias compensatdrias, distributivas, moralizantes e apontam politicas © pedagogias das diferencas, afirmativas. 45 Mostram-se conscientes, politizados Poderiamos pensar que os coletivos em suas agdes e movimentos se contraptem ’s formas de pensé-os a partir do pensamento sécio/educativo! politico, inclusive progressista? As categorias familiares a esse pensamento para nomear 05 coletivos populares tém sido inconscientes, pré-politicos, tradicionais, pré-modernos, As divisdes ¢ polarizagbes nao seriam de ter- ritérios, margens, muros nem desigualdades nas condigdes de vida, nem na diversidade étnica, racial, de género ou territério, nem sequer de humanos e ssub-humanos, mas apenas e fundamentalmente de conscientes/inconscientes, politizados/despolitizados. Porque inconscientes ¢ despolitizados ou sumidos na consciéncia falsa, em crengas, tradigées, misticismos, na consciéneia do dominador, opressor, passaram ¢ ser marginais, excluidos, desiguais, segre- gados, oprimidos e ainda inconscientes dessa condigo. Consequentemente passivos, subcidadaos, massa de manobra dos conchavos politicos. Certas pedagogias libertadoras, conscientizadoras, politizadoras, criticas partem dessa visto do povo parasse afirmar com a fungo de tiré-los desse es- tado de inconsciéncia e de falsa consciéncia, de des-politizagio para levé-los& consciéncia critica, politica, participativa, cidadd. B significativo que os movi- mentos sociais mais radicais nao se reconhecem nessas categorias nem nessas “pedagogies”, trazendo indagagtes desestabilizadoras sobre essas formas pro- pressistas, citias, de pensé-los e trati-los. Elas sao vistas como pedagogies também do lado de c4, do Nés, conscientes, politizados pare eles, nem sempre impostas, prontas, mas até construidas com sua participagdo. A propria inclu- sty puuticipante dos coletivos pepulares é explnrada como conscientizadora & capacitadora para e patticipagdo politica, cidada. 0s coletivos em suas agées se chocam com essas “pedagogias”, deslocam «0 foco da participago para a lua, o conflito, a ocupagdo, a proposta de outra politica agriria, urbana, educetiva, de outra escola, outra universidade, outro projeto de campo ¢ de sociedads, outras relagdes politicas. A radicalidade de suas agéies mostra a superficialidade de categorias cuituadas do lado de c4, da sociopedagogia até progressista: conscientizagao, politizagao, cidadania cri ca, participagto... Por ai os colefivos em suas agbes ¢ movimentos pressionam pot uma repolitizasao e radicalizagao do pensamento socioeducativo progres- sista, Suas pedagogias sfo pressionadas superar os timites de origem em {que se enredam: ter como matriz.o pensar polarizado dos coletivos humanos. Pensar o povo sumido na falsa consciéncia. Hé uma intencionalidade nessa diversidade de formas de pens4-los: legiti- ‘mar as formas de trati-los ¢ autolegitimar as agéncias, instituigdes sociais, po~ liticas e culturais, suas ages, programas ¢ politicas. Autolegitimar as relagbes TS Fstado e grupos subalternizados Nas resisténcias desses grupos a essas formas de pensi-los ede traé-los reagem e contestam as formas de pensar-se 0 Estado, suas insttuigbes, politicas e programas. Tenses carregadas de apren- iizados, que levam a afitmar-se presentes, existentes, conscientes ¢resistentes faessas formas Yo superficiais de persi-los. ‘Besas formas de pensar os grupos populares que se fazem presentes nas cescolas, nos campos, nas cidades, em ages coletivas € movimentos tém le~ sitimado as orientaybes de politics, as teorias pedagogicas, as diditias, os Gurriculos ¢ 2 docgneia, Na medida em que esses outros destinatirios dessas poltcas © diéticas nao se reconhecem nesses formas de pensé-os, as po- Iitieas, as teorias pedagogicas, as cirettizes, os curriculos ¢ a ago docente deixam um Vazio de legitimidade. Para onde avancar? a1

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