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Hidráulica - Notas de Aula 2

Prof. Arlan Scortegagna Almeida


15 de junho de 2019

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1 Questão 1
Em uma tubulação horizontal de diâmetro igual a 150 mm, de ferro fundido
em uso com cimento centrifugado ( = 0, 16mm), foi instalada em uma seção
A, uma mangueira plástica (piezômetro) e o nı́vel d’água na mangueira al-
cançou a altura de 4,20 m. Sabendo que a velocidade média do escoamento é
1,44 m/s, (a) qual é a vazão (em L/s) e (b) o nı́vel d’água esperado em outro
piezômetro instalado em uma seção B localizada 120 metros a jusante de A?

Vamos começar calculando a vazão:

Q = V A = V.π.D2 /4 = 1, 44π.0, 1502 /4 = 0, 025m3 /s = 25, 45L/s (1)

Aplicamos a Equação de Bernoulli (conservação de energia) entre as


seções A e B:
V2 V2
za + Pa /γ + a = zb + Pb /γ + b + hf (2)
2g 2g
Podemos anular as alturas geométricas (za e zb ) pois elas são iguais (não
há desnı́vel na tubulação - tubulação horizontal). Além disso, as velocidades
são iguais uma vez que o diâmetro é o mesmo. Veja que para chegar nessa
conclusão, podemos considerar a equação da continuidade (conservação de
massa):

Qa = Qb ; Va .π.Da2 /4 = Vb .π.Db2 /4; Da = Db logo Va = Vb (3)


As cargas de pressão (P/γ) equivalem às alturas nos piezômetros: ha e
hb . Portanto, temos ha :
ha = 4, 20 m (4)
Para determinar hb , substituimos os termos em (2):

Pa Pb
= + hf (5)
2g 2g

ha = hb + hf (6)
hb = ha − hf (7)
Para calcular hf , utilizaremos a equação de Darcy-Weisbach. Mas antes,
precisamos encontrar o fator de atrito (f ). A equação de Colebrooke-White
é a opção mais direta:
!
1  2, 51
√ = −2.log + √ (8)
f 3, 71D Rey f

1
Como discutimos em sala, o problema dessa equação é que o f está
implı́cito. Vamos reescrever a função na forma f = g(f ), de modo que o
lado direito da expressão, ”g(f )”, é nossa função iteradora:
1
f=" !#2 (9)
 2,51

− 2.log 3,71D
+
Rey f

Agora, a rugosidade relativa e o número de Reynolds são:


 0, 16 mm
= = 0, 00107 ou 1, 07.10−3 (10)
D 150mm
V.D 1, 44.0, 150
Rey = = = 216000 ou 2, 16.105 (11)
ν 10−6
O método usado para resolver a equação 6 para f é baseado em iteração
de ponto fixo. A técnica é bastante simples: devemos dar um chute inicial
para o fator de atrito (f0 ) e substituir esse valor no lado direito da equação
6, que é a nossa função iteradora - g(f ) da equação de Colebrook-White.
Calculando o valor numérico, vamos obter como resultado o lado esquerdo da
equação que equivale a f1 = g(f0 ). Esse valor é então inserido no lado direito
da equação 6 e assim vamos obter f2 = g(f1 ). À medida que esse processo se
repete, ou seja, que fazemos g(fn ) = fn+1 , deve haver convergência, de modo
que os valores do fator de atrito se tornam praticamente constantes, dentro
da precisão desejada. Os valores do fator de atrito nos nossos problemas de
Hidráulica devem estar entre 0,1 e 0,008. Então, para o chute inicial de 0,1
teremos na primeira iteração:

f0 = 0, 1 (12)
1
f1 = " !#2 (13)
 2,51

− 2.log 3,71.D
+
Rey f0

1
f1 = " !#2 = 0, 020536 (14)
1,07.10−3 2,51√
− 2.log 3,71
+ 2,16.105 0,1

Agora, inserinto f1 novamente no lado direito da equação 6 obtemos:


1
f2 = " !#2 = 0, 021207 (15)
1,07.10−3 2,51
− 2.log 3,71
+ √
2,16.105 0,020536

2
Repetindo o procedimento...

f3 = g(f2 ) = 0, 021188 (16)


f4 = g(f3 ) = 0, 021189 (17)
f5 = g(f4 ) = 0, 021189 (18)

Considero três algarismos suficientes. Dessa forma, poderı́amos ter parado


na segunda iteração em que f = 0, 0212.

Podemos citar duas técnicas alternativas para calcular o fator de atrito:


(i) através da equação de Swamee-Jain (1976), em que f encontra-se explı́cito
na fórmula; e (ii) através do Diagrama de Moody, que nada mais é do que um
método gráfico em que a equação de Swame-Jain (geralmente atualizada) é
apresentada em curvas. Sobre o uso do Diagrama de Moody encaminharei a
forma de utilização em anexo (Anexo 1). Sobre a equação de Swamee-Jain,
atentemos ao seguinte fato: existem restrições e sua validade está condi-
cionada a intervalos especı́ficos de rugosidade relativa (/D) e número de
Reynolds (Rey). Aplicando Swamee-Jain ao nosso exemplo, temos:
0, 25
f=" (19)
 2
#

 5,74
log 3,7D
+ Rey 0,9

0, 25
f=" = 0, 0214 (20)
 2
#

1,07.10−3 5,74
log 3,7
+ (2,16.105 )0,9

Observe que o valor obtido pela equação de Swamee-Jain (f = 0, 0214) é


muito próximo ao valor de f calculado pela equação de Colebrook-White
com o método iterativo (f = 0, 0212).

Agora podemos substituir os dados na equação Universal de Darcy-Weisbach:

L V2 120 1, 442
hf = f = 0, 0212 = 1, 79 m (21)
D 2g 0, 150 2.9, 81

Substtuindo hf em (7):

hb = 4, 20 − 1, 79 = 2, 41 m (22)

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2 Questão 2
A instalação hidráulica do esquema em anexo (Anexo 2) tem diâmetro de 50
mm em ferro fundido com leve oxidação. Para esse material, a rugosidade
absoluta é 0,30 mm. Os coeficientes de perdas de carga localizadas (hl ) são:
- saı́da do reservatório K1 = 1,0;
- cotovelo de 90o K2 = 0,9;
- curvas de 45o K3 e K4 = 0,2;
- registro K5 = 5,0;
- entrada do reservatório K5 = 1,0.
Determine, usando a equação de Darcy-Weisbach, a vazão transportada:

Em sala, aplicamos a equação de Bernoulli e verificamos que a perda


de carga total equivale às diferenças de cota entre as superfı́cies livres dos
reservatórios da esquerda e da direita. Chegamos à essa conclusão aplicando
Bernoulli entre os pontos 1 e 2, nos reservatórios, e assumindo que as veloci-
dades e as pressão aı́ são nulas. Portanto, as perdas totais são:

hf = z1 − z2 = 50, 0 − 45, 0 = 5, 0 m (23)

Essas perdas equivalem ao somatório das perdas localizadas e continuas.


Para as perdas localizadas (hl ), temos a seguinte expressão genérica:
X V2 V2 V2
hl = K = (1 + 0, 9 + 2.0, 2 + 5 + 1, 0) = 8, 3 (24)
2g 2g 2g
Para as perdas de carga contı́nuas (hc ), usamos a equação Universal de
Darcy-Weisbach:

L V2 (2, 0 + 13, 0 + 5, 0 + 25, 0) V 2 V2


hc = f =f = 900f (25)
D 2g 0, 050 2g 2g
Obs: na aula tı́nhamos considerando L=43,0 metros. Mas segundo o prob-
lema original, nos faltou considerar os 2,0 metros da descida da tubulação
desde o reservatório da esquerda. Portanto, corrigir o comprimento L para
45,0 metros! Além disso, tinha lhes informado outra rugosidade absoluta.
Peço que desconsiderem essa informação e utilizem  = 0, 30 mm...

Desenvolvendo a equação 23, portanto, as perdas totais são:

V2
hf = hl + hc ; 5, 0 = (8, 3 + 900f ) (26)
2g

4
Isolando a velocidade em (25) teremos:
s
10g
V = (27)
8, 3 + 900f

Para resolver essa questão, novamente devemos recorrer ao método iter-


ativo. Note, no entanto, que como não temos a velocidade, o método deve
ser aplicado em duas etapas, para cada iteração:
1 - estimar um valor inicial para a velocidade V ;
2 - a partir desse valor, calcular o número de Reynolds e o fator de atrito f
correspondente;
3 - recalcular a velocidade V com a equação 26, que nesse caso é nossa função
de iteração.

Para simplificar e evitar o uso de um método iterativo dentro do outro, o


que iria ocorrer se utilizássemos iterações para calcular o fator de atrito f e
depois para calcular a velocidade V , podemos utilizar a equação de Swamee-
Jain. Vimos no exercı́cio anterior que o uso dessa equação conduz à diferenças
insignificantes...

1a iteração:

1 - a velocidade nos problemas de Hidráulica geralmente está entre 0,5 e


5,0 m/s. Portanto, como chute inicial podemos usar V0 = 2, 0 m/s;

2 - calculamos o fator de atrito para V0 através da equação de Swamee-


Jain (Equação 19):

V0 .D 2, 0.0, 050
Rey0 = = = 105 (28)
ν 10−6
 0, 30[mm]
= = 0, 006 (29)
D 50[mm]
0, 25
f0 = " = 0, 03320 (30)
 2
#

0,006 5,74
log 3,7
+ (105 )0,9

3 - recalculamos a velocidade de acordo com a Equação 26:


s s
10g 10.9, 81
V1 = = = 1, 602 m/s (31)
8, 3 + 900f0 8, 3 + 900.0, 03320

5
2a iteração:

1 - repetimos o processo partindo de V1 , que foi definida na iteração an-


terior... V1 = 1, 602 m/s;

2 - calculamos o fator de atrito para V0 através da equação de Swamee-


Jain (Equação 19):
Rey1 = 8, 01.104 (32)
0, 25
f1 = " #2 = 0, 03344 (33)
 
0,006 5,74
log 3,7
+ (8,014 )0,9

3 - recalculamos a velocidade de acordo com a Equação 26:


s s
10g 10.9, 81
V1 = = = 1, 598 m/s (34)
8, 3 + 900f0 8, 3 + 900.0, 03344
3a iteração:

1 - vejam que a velocidade já foi praticamente a mesma na segunda it-


eração, aproximadamente 1,6 m/s. Para verificar que o fator de atrito se
mantém constante, dentro da precisão desejada, executamos uma nova it-
eração com V2 = 1, 598 m/s...
2 - fator de atrito:
Rey2 = 7, 99.104 (35)
0, 25
f2 = " #2 = 0, 03344 (36)
 
0,006 5,74
log 3,7
+ (7,994 )0,9

3 - recalculamos a velocidade de acordo com a Equação 26:


s s
10g 10.9, 81
V2 = = = 1, 598 m/s (37)
8, 3 + 900f0 8, 3 + 900.0, 03320

Portanto, a velocidade final é 1,6 m/s, aproximadamente, e a vazão:


π.0, 0502
Q = V.A = 1, 6. = 3, 14.10−3 m3 /s = 3, 14 L/s (38)
4

Essa é a resposta do problema. Agora, lembrem-se que em sala lhes in-


formei que é importante haver consistência nos resultados. Não faz sentido

6
obter uma perda de carga contı́nua de 10 mH2O e uma perda localizada de
0,000005 mH2O, por exemplo. Para verificar a consistência, retornamos às
equações 23 e 24 e constatamos que as perdas localizadas e contı́nuas são,
respectivamente:

V2 1, 62
hl = 8, 3 = 8, 3 = 1, 08 m (39)
2.g 2.9, 81
V2 1, 62
hc = 900f = 900.0, 03344 = 3, 92 m (40)
2.g 2.9, 81

Consequentemente, das perdas totais que equivalem a 5,0 mH2O, 78 por


cento são perdas contı́nuas e 22 por cento são perdas localizadas o que é
coerente com os problemas comuns em Hidráulica (há quem diga que as
perdas localizadas são em torno de 10 por cento das contı́nuas!).

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ANEXO 1

Aqui usaremos o Diagrama de Moody para determinar o fator de atrito da


Questão 1.
O primeiro passo é calcular a rugosidade relativa e o número de Reynolds, o que
foi feito na resolução da questão:
- ε/D = 1,07.10-3
- Rey = 2,16.105
A figura abaixo apresenta o Diagrama de Moody.

Notem que os valores de Rey e do fator de atrito (f), que na figura é denominado
‘coeficiente de perda de carga distribuída’, estão em escala logarítmica.
Primeiramente, deve-se selecionar uma das curvas cuja rugosidade relativa, no
eixo da direita, mais se aproxima da rugosidade do nosso problema. Nesse caso,
selecionamos a curva 0,001:
Agora vamos ver onde está o Reynolds (Re). Primeiro verificamos no eixo das
abscissas a linha que tem a potência (105) e traçamos uma linha vertical o mais
próximo visível do nosso Reynolds calculado, que vamos aproximar como 2.105:

Agora traçamos uma linha horizontal até o eixo das ordenadas (direita) onde a
linha vertical cruza com a curva da rugosidade
relativa:

O fator de atrito correspondente ao eixo das ordenadas, que corresponde ao


método do Diagrama de Moody, é aproximadamente f = 0,021. Pelo método da
iteração calculamos f = 0,0212 e pelo método da equação de Swamee-Jain calculamos
f = 0,0214.
Notem que se considerarmos somente dois algarismos significativos, os três
métodos que estudamos representam o mesmo valor, ou seja, f = 0,02. Na maioria das
aplicações de Hidráulica, a incerteza em outras variáveis como a pressão e a própria
velocidade é mais importante do que a incerteza na precisão do fator de atrito.
Portanto, concluímos que os resultados dos três métodos são equivalentes e cabe
a você escolher o método que lhe é mais adequado para o cálculo do fator de atrito.
Por exemplo, se você tiver disponível o Diagrama de Moody, esse método parece ser
o mais direto e fácil. Mas se você não tiver ele disponível, ou precisar calcular
diversas vezes, talvez seja melhor implementar um programa computacional com a
equação de Swamee-Jain. Agora, se o seu problema por algum motivo está fora dos
intervalos de restrição, em termos de Reynolds e de rugosidade relativa, da equação
de Swamee-Jain, o método iterativo para solucionar a equação de Colebrook-White
pode ser a melhor alternativa.
Levem em conta ainda que, a depender da fonte, o Diagrama de Moody é apenas
uma apresentação visual de resultados calculados com a equação de Swamee-Jain
(geralmente atualizada) de modo a prevenir o uso de calculadoras mais avançadas.
ANEXO 2

Esquema ilustrativo da instalação hidráulica referida na Questão 2:

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