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INFLUÊNCIA DO PROCESSAMENTO TERMOMECÂNICO NA FORMAÇÃO DE

HIDRETOS EM LIGA DE ZIRCÔNIO PARA APLICAÇÃO NUCLEAR

Virgínia Morete Barbosa Bertolo

Projeto de Graduação apresentado ao Curso de

Engenharia de Materiais da Escola Politécnica,

Universidade Federal do Rio de Janeiro, como

parte dos requisitos necessários à obtenção do

título de Engenheira.

Orientadora: Rafaella Martins Ribeiro

Rio de Janeiro

Janeiro de 2016
Bertolo, Virgínia Morete Barbosa
Influência do Processamento Termomecânico na
Formação de Hidretos em Liga de Zircônio para Aplicação
Nuclear/ Virgínia Morete Barbosa Bertolo. Rio de Janeiro:
UFRJ/ Escola Politécnica, 2016.
IX, 58 p.: il; 29,7 cm.
Orientadora: Rafaella Martins Ribeiro
Projeto de graduação UFRJ/Escola Politécnica/ Curso de
Engenharia de Materiais, 2016.
Referências Bibliográficas: p. 53-58.
1. Zircônio. 2. Hidrogênio. 3. Reatores Nucleares. 4.
Formação de hidreto I. Ribeiro, Rafaella Martins. II.
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Escola Politécnica,
Curso de Engenharia de Materiais. III. Influência do
Processamento Termomecânico na Formação de Hidretos em
Liga de Zircônio para Aplicação Nuclear.

iii
Dedico aos meus pais Denise e Luiz
e ao meu irmão Victor.

iv
AGRADECIMENTOS

À Deus e aos meus protetores por terem me guiado em todos os momentos.


Aos meus pais, Denise e Luiz, e ao meu irmão, Victor, por todo amor, carinho,
motivação e amizade. Por não terem medido esforços ao longo de toda a minha vida
para que esse momento se tornasse realidade.
À minha amiga Paula Soares por sempre estar ao meu lado, por acreditar mais
em mim do que eu mesma, por me apoiar e por ter compreendido as minhas ausências.
À uma pessoa muito especial, Guilherme Londres, por andar lado a lado comigo.
Por me apoiar, tranquilizar e socorrer nos momentos difíceis. Por sempre me dar
motivos para sorrir.
À minha orientadora Rafaella pelos ensinamentos, pela motivação durante a
pesquisa, por sempre estar pronta para ajudar, pelo carinho e atenção desde a primeira
conversa e por não ter me deixado desesperar em nenhum momento.
Ao professor Dilson Silva dos Santos por ter me dado a oportunidade de entrar
para a PROPMEC e pelos ensinamentos.
Ao meu orientador acadêmico, professor Ericksson Rocha e Almendra, pelas
conversas e por estar sempre disponível.
Ao professor Leonardo Sales Araújo por ter aceitado fazer parte da banca.
Aos amigos da Metalmat por todos os momentos compartilhados e por terem
feito esse período da graduação uma etapa mais divertida.
A todos os professores do Departamento de Engenharia Metalúrgica e de
Materiais pelos conhecimentos transmitidos.
À todos da PROPMEC, em especial ao Leandro Martins pela paciência e suporte
com os ensaios finais do projeto, ao Rafael pela ajuda com a preparação de amostras, ao
Gabriel pela ajuda com os ensaios de hidrogenação eletroquímica e à Sônia por estar
disposta a ajudar em todos os momentos.
Ao CNPq pelo apoio financeiro durante os períodos de iniciação científica e de
intercâmbio acadêmico.

v
Resumo do Projeto de Graduação apresentado à Escola Politécnica/ UFRJ como parte
dos requisitos necessários para obtenção do grau de Engenheira de Materiais.

INFLUÊNCIA DOS TRATAMENTOS TÉRMICOS NA FORMAÇÃO DE


HIDRETOS EM LIGA DE ZIRCÔNIO PARA APLICAÇÃO NUCLEAR

Virgínia Morete Barbosa Bertolo


Janeiro/2016

Orientadora: Rafaella Martins Ribeiro


Curso: Engenharia de Materiais

As ligas de Zr são utilizadas no setor nuclear como material constituinte de


varetas combustíveis presentes nos reatores. A aplicação dessas ligas se deve à baixa
absorção de nêutrons, boa resistência à corrosão e boas propriedades mecânicas em
ambientes severos de alta temperatura e pressão. Entretanto, durante a operação dos
reatores, a vareta absorve H ocasionando a precipitação de hidretos e assim, o material
estará sujeito à fragilização por hidrogênio. De forma a reduzir o efeito deletério do H, o
controle microestrutural através do processamento das varetas é indispensável.
O objetivo deste trabalho é analisar a influência do processamento
termomecânico na absorção de hidrogênio e formação de hidretos na liga ZirBrasil-1.
Os resultados de microdureza Vickers indicaram a precipitação para tratamentos
a 800 °C. Após a hidrogenação, as análises de DRX e MO confirmaram a formação de
hidretos em todas as condições. O teste de cinética de absorção de H mostrou que a
condição laminada é a que leva menor tempo para iniciar a absorção e também a que
absorve a maior quantidade de H. Por outro lado, a condição tratada a 800°C/6 h é a que
mais demora a iniciar a absorção e a que absorve a menor quantidade de H. Através do
ensaio de tração foi observada a redução da ductilidade nas amostras hidrogenadas.
Dentre as condições analisadas neste trabalho, a amostra tratada a 800°C/6 h é a
que possui melhor desempenho para a aplicação nuclear devido às boas propriedades de
tração e também pelo maior tempo para início do processo de absorção, retardando a
formação de hidretos, e menor quantidade absorvida de hidrogênio.

Palavras-chave: Zircônio, Reator Nuclear, Hidrogênio, Formação de Hidreto

vi
Abstract of Undergraduate Project presented to POLI/UFRJ as a partial fulfillment of
the requirements for the degree of Materials Engineer.

THE INFLUENCE OF THERMOMECHANICAL TREATMENTS IN THE


FORMATION OF HYDRIDES IN ZIRCONIUM ALLOYS TO BE APPLIED IN THE
NUCLEAR SECTOR

Virgínia Morete Barbosa Bertolo


January/2016

Advisor: Rafaella Martins Ribeiro


Course: Materials Engineering

Zr alloys are widely used in the nuclear sector as part of the fuel elements due to
its low neutron absorption, good corrosion resistance and good mechanical properties
when submitted to harsh environments. However, in the nuclear reactor operational
condition, H is absorbed resulting in hydride precipitation and thus, the alloy suffer
hydrogen embrittlement. In order to reduce the H deleterious effects, microstructural
control through the fuel element processing is necessary.
The aim of this work is to analyse the influence of thermomechanical processing
conditions in the hydrogen absorption and hydride formation in ZirBrasil-1.
The results of Vickers microhardness test showed the precipitation for the 800°C
samples. X-Ray Diffraction and Optical Micrograph confirmed the hydride formation in
all conditions. The kinetics absorption of H showed that the rolled material takes less
time to start the absorption and also absorbs a higher concentration of H than the others.
On the other hand, the 800°C/6 h sample takes longer time to start the absorption and
absorbs less H than the other samples. The tensile test showed the ductility reduction for
all samples after hydrogenation.
Among all the thermomechanical processing conditions, the one that showed
improved performance to be used in the nuclear reactor is the 800°C/6 h due to the good
tensile properties, as well as an increased time to onset of absorption process, slowing
the hydride formation, and smaller amount of hydrogen absorbed.

Keywords: Zirconium, Nuclear Reactor, Hydrogen, Hydride Formation

vii
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 1
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ............................................................................... 2
2.1 Fissão Nuclear.................................................................................................... 2
2.2 Reatores PWR .................................................................................................... 3
2.2.1 Elemento Combustível ............................................................................... 4
2.3 O Zircônio .......................................................................................................... 7
2.3.1 Zircônio no Setor Nuclear .......................................................................... 7
2.3.2 Ligas de Zircônio ........................................................................................ 8
2.3.3 Histórico das Ligas de Zircônio Para Aplicação Nuclear........................... 9
2.3.4 Fabricação da Vareta Combustível ........................................................... 14
2.4 O Hidrogênio ................................................................................................... 16
2.4.1 Sistema Zr-H ............................................................................................ 16
2.4.2 Mecanismos de Absorção de Hidrogênio ................................................. 17
2.4.3 Precipitação de Hidretos ........................................................................... 19
2.4.4 Orientação dos Hidretos ........................................................................... 20
2.5 Falhas no Elemento Combustível .................................................................... 22
2.6 Efeito do Hidrogênio nas Propriedades Mecânicas ......................................... 24
3. MATERIAIS E MÉTODOS................................................................................. 25
3.1 Materiais .......................................................................................................... 25
3.2 Processamento Termomecânico....................................................................... 26
3.3 Tratamentos Térmicos ..................................................................................... 27
3.4 Hidrogenação Gasosa ...................................................................................... 27
3.4.1 Preparação da Amostra ............................................................................. 27
3.4.2 Realização do Ensaio ................................................................................ 28
3.5 Hidrogenação Eletroquímica ........................................................................... 28
3.5.1 Preparação da Amostra ............................................................................. 28
3.5.2 Realização do Ensaio ................................................................................ 29
3.6 Cinética de Absorção de Hidrogênio ............................................................... 29
3.6.1 Preparação da Amostra ............................................................................. 29
3.6.2 Princípio do Ensaio................................................................................... 29
3.6.3 Realização do Ensaio ................................................................................ 30

viii
3.7 Microdureza Vickers........................................................................................ 31
3.8 Difração de Raios-X ........................................................................................ 32
3.9 Análise Microestrutural ................................................................................... 33
3.9.1 Microscopia Ótica .................................................................................... 33
3.9.2 Microscopia Eletrônica de Varredura ....................................................... 34
3.10 Ensaio de Tração .............................................................................................. 34
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO .......................................................................... 35
4.1 Microdureza Vickers........................................................................................ 35
4.2 Difração de Raios-X ........................................................................................ 37
4.3 Microscopia Eletrônica de Varredura .............................................................. 41
4.4 Microscopia Ótica ............................................................................................ 43
4.5 Cinética de Absorção de Hidrogênio ............................................................... 45
4.6 Ensaio de Tração .............................................................................................. 47
5. CONCLUSÃO ....................................................................................................... 51
6. SUGESTÃO PARA TRABALHOS FUTUROS ................................................. 52
7. REFERÊNCIAS .................................................................................................... 53

ix
1. INTRODUÇÃO

A matriz energética brasileira foi por muito tempo baseada na hidroeletricidade.


Entretanto, atualmente, o país passa por uma transição em busca de transformar sua
matriz energética predominantemente hidroelétrica para hidrotérmica por fatores como:
esgotamento econômico e ambiental e redução da capacidade de armazenagem de água
nos reservatórios em relação ao crescimento da carga do sistema. Portanto, para garantir
a operação segura do sistema energético, é necessária uma fonte alternativa de energia
de forma a complementar a matriz energética hidroelétrica brasileira. Dentre as
alternativas possíveis, a de maior segurança de fornecimento é a termoelétrica, que não
depende da natureza e o país possui grande reserva de combustíveis como, por exemplo,
o urânio [1].

Em virtude da necessidade de complementar a matriz energética brasileira atual,


pesquisas em tecnologia nuclear têm sido desenvolvidas no país com o objetivo de
nacionalizar a mesma, ou seja, produzir a tecnologia que hoje em dia é importada.
Dentro destas pesquisas está o estudo das ligas de zircônio utilizadas para a produção de
varetas de combustíveis utilizadas em reatores do tipo PWR (Pressurized Water
Reactor) utilizados nas usinas nucleares de Angra I, Angra II e, futuramente, Angra III
[2]. As ligas a base de zircônio possuem baixa absorção de nêutrons e detém boas
propriedades mecânicas e alta resistência à corrosão em ambientes de alta temperatura e
pressão [3].

A COPPE/UFRJ deu início ao processo de produção da primeira liga experimental


de zircônio do Brasil para o uso na área nuclear nomeada ZirBrasil-1, liga utilizada
neste estudo. Esta liga é composta principalmente por zircônio e nióbio com adição de
elemento de liga que visa melhorar o seu desempenho. Além da adição de elementos de
liga, o desempenho pode ser melhorado através do controle microestrutural a partir de
diferentes processos termomecânicos possibilitando alcançar a melhor combinação de
propriedades. No entanto, ultimamente, a seleção apropriada dos parâmetros desses
processos de forma a aperfeiçoar o desempenho da liga é um dos grandes desafios da
indústria.

Durante a operação dos reatores, esses materiais são expostos a diferentes


influências do meio que determinam sua vida útil como, por exemplo: a radiação e a

1
corrosão. Outro fator determinante é a absorção de hidrogênio, devido à decomposição
radiolítica da água, que ocorre nas condições de operação dos reatores PWR (320 °C e
160 atm). Esta absorção de hidrogênio pode levar à formação de hidretos, ao exceder o
limite de solubilidade da liga, reduzindo a ductilidade e a tenacidade à fratura. Além
disso, a orientação dos hidretos formados irá impactar diretamente nas propriedades
mecânicas da liga.

Este trabalho tem como objetivo analisar a influência do processamento


termomecânico na absorção de hidrogênio e formação de hidretos na liga ZirBrasil-1.
Para isto a liga foi fundida num forno elétrico a arco sob vácuo (VAR), submetida ao
processo de conformação composto por etapas de laminação a quente, com redução de
75%, e posterior laminação a frio, com redução de 58%. Em seguida, o material
resultante da laminação foi submetido a três diferentes tratamentos térmicos: 700 °C por
1 hora, 800 °C por 2 horas e 800 °C por 6 horas.

A evolução microestrutural da liga foi acompanhada através de valores de


microdureza Vickers e o processo de recristalização confirmado através da microscopia
eletrônica de varredura (MEV). O efeito do hidrogênio, sua interação com a
microestrutura e as condições de formação de hidretos foram determinados e
observados através dos ensaios de difração de raios-X, cinética de absorção de
hidrogênio e micrografias obtidas por microscopia ótica.

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.1 Fissão Nuclear

Fissão nuclear é o processo reacional em que através da absorção de nêutrons, um


núcleo de massa grande, como o urânio-235, se divide em dois fragmentos de massas
semelhantes. Em consequência a esta reação, em média, mais dois nêutrons são
emitidos. Desta forma, se os nêutrons emitidos durante a fissão de um núcleo
provocarem fissões sucessivas em outros núcleos têm-se uma reação em cadeia, como
ilustrado na Figura 1 [4].

2
Figura 1. Ilustração da reação de fissão nuclear. (Adaptado de [5]).

2.2 Reatores PWR

Os reatores de água pressurizada, conhecidos como reatores PWR (Pressurised


Water Reactor), são os mais utilizados em usinas em todo o mundo como observado
nos dados da Tabela 1 e estão em funcionamento em usinas nucleares como Angra I e
Angra II localizadas no Rio de Janeiro, Brasil.

Tabela 1. Reatores nucleares que se encontram em operação no mundo [6].


Reator Número de reatores
utilizados
PWR Reatores a água pressurizada 278
BWR Reatores a água fervente 80
PHWR Reatores refrigerados a água pesada pressurizada 49
(conhecida como CANDU)
GCR Reatores refrigerados a gás 15
LWGR Reatores refrigerados a água e moderados a grafite 15
FBR Reatores de geração rápida 2

O princípio de funcionamento esquematizado na Figura 2 deste reator se


baseia na utilização de água como líquido refrigerante em seu circuito primário e em
seguida, no circuito secundário, na utilização da água em forma de vapor. Em operação,
suas condições são de 320 °C e 160 atm [7]. Primeiramente, certa quantidade de calor é

3
gerada dentro do vaso de pressão como resultado da reação de fissão dos átomos de
urânio, aquecendo a água e, em seguida, a água pressurizada passa por este vaso
carregando o calor até o gerador de vapor, em circuito fechado, caracterizando o
A outra parte de água que passa por esse gerador é

turbina para geração de eletricidade. Depois de movimentar a turbina, o vapor é


condensado a partir do resfriamento pela água do mar e a água gerada é bombeada para
o gerador de vapor. Para que não haja vazamento de material radioativo, a água do
sistema primário não se mistura com a água do sistema secundário.

Figura 2. Esquema de funcionamento de um reator PWR. (Adaptado de [8]).

2.2.1 Elemento Combustível

No reator, a reação de fissão ocorre dentro de tubos de 10 milímetros de


diâmetro, uma faixa de 0,5 a 0,9 mm de espessura e um comprimento igual a 4 metros,
feitos de ligas de zircônio, que contêm pastilhas cilíndricas de urânio enriquecido (com
3,2% de urânio-235) chamadas varetas de combustíveis [9]. Estas varetas, em 235
unidades, são arranjadas de forma definida com 21 tubos guias, dois bocais (superior e

4
inferior) e grades espaçadoras, compondo um conjunto chamado elemento combustível,
como ilustrado na Figura 3. Na Figura 4 é possível observar os componentes de um
elemento combustível típico de Angra I.

Figura 3. Elemento combustível produzido pela INB para Angra II [10].

Figura 4. Elemento combustível e seus componentes. (Adaptado de [10]).

5
Os bocais inferior e superior são fabricados em aço inoxidável e tem a função de
orientar o fluxo de água para os canais de refrigeração entre as varetas de combustíveis.
Além disso, estes bocais servem como peças estruturais de forma a garantir a ligação do
elemento combustível com as estruturas do reator.

As grades espaçadoras são fabricadas ou em ligas de níquel ou em ligas de


zircônio e tem a função de manter as varetas combustíveis dentro do arranjo do
elemento combustível.

Os tubos guia recebem as barras de controle que são utilizados para controlar a
reação em cadeia [7]. No elemento combustível, barras de controle, são geralmente
feitas de cádmio devido à sua propriedade de boa absorção de nêutrons. Essas barras são
colocadas dentro dos tubos guias, fabricados em ligas de zircônio, intercaladamente
com as varetas combustíveis, de forma a controlar a reação em cadeia resultante da
fissão dos átomos de urânio, garantindo desta forma maior segurança durante a
operação. No caso em que as barras de controle se encontram totalmente para fora do
elemento combustível, o reator estará em sua capacidade máxima de operação. Por
outro lado, quando as barras se encontram totalmente dentro da estrutura do elemento
combustível não há reação de fissão em cadeia, o que indica que o reator está parado
(Figura 5) [11].

Figura 5. Barras de controle: (a) reator em condição de operação máxima (b) reator
parado. (Adaptado de [11]).

6
No Brasil, a fabricação do elemento combustível é realizada na Fábrica de
Combustível Nuclear (FCN) em Resende no Rio de Janeiro. Para garantir a segurança
necessária durante a operação, a fabricação do mesmo envolve rigoroso controle através
da utilização de medições a laser, raios-X, microscópios, entre outros.

2.3 O Zircônio

O zircônio é o 11° material em maior abundância na crosta terrestre, em


aproximadamente 0,028%, e suas reservas encontram-se em países como Austrália,
África do Sul, Brasil, Índia e Estados Unidos. No Brasil, as reservas estão estimadas em
4,5% das reservas mundiais [12].

O metal de transição zircônio está localizado no grupo 4(IVB) da tabela


periódica, representado pelo símbolo químico Zr, possui número atômico e massa
atômica equivalente a 40 e 91 u, respectivamente, e tem um alto ponto de fusão,
1855°C. Este material em temperatura ambiente se encontra em estado sólido, com

Caso a temperatura do zircônio atinja 865°C, o metal sofre uma transformação


alotrópica e tem sua estrutura alterada para cúbica de corpo centrado (CCC),

2.3.1 Zircônio no Setor Nuclear

A utilização do zircônio na indústria está em sua maioria (aproximadamente 90%)


relacionado ao setor nuclear devido às propriedades de resistência à corrosão e baixa
absorção de nêutrons. Porém, na crosta terrestre este se encontra associado ao háfnio,
que por sua vez é forte absorvedor de nêutrons, na forma de zirconita na proporção de
50:1, o que torna necessária a separação de ambos para que o zircônio possa ser usado
na indústria nuclear [14]. Portanto, o Processo Kroll é realizado com o objetivo de
separar os dois elementos e obter zircônio metálico em escala industrial. Neste processo
há a redução do ZrCl4 por magnésio e a destilação do Zr esponja. Primeiramente, o
ZrCl4 é colocado em atmosfera inerte contendo hélio e argônio, devido à alta reatividade
com oxigênio e nitrogênio, e é borbulhado em magnésio líquido dando origem à esponja
de zircônio metálico e cloreto de magnésio segundo a reação a seguir:

7
ZrCl4 2 (l) (1)

Em seguida, o objetivo é separar o magnésio e o cloreto de magnésio do Zr esponja


através da elevação da temperatura fazendo com que tanto o Mg e o MgCl2 se fundam.
Esta etapa é realizada em alto vácuo com o intuito novamente de impedir a reação do
zircônio com o ar [12].

2.3.2 Ligas de Zircônio

O desenvolvimento de ligas de zircônio foi motivado pela necessidade de


potencializar as propriedades do metal garantindo um melhor desempenho e segurança
para a fabricação de varetas combustíveis e outros constituintes dos reatores nucleares.
Diferentes elementos de liga, em intervalos determinados de composição, são
responsáveis pela mudança de microestrutura em função das fases do zircônio e os
diferentes níveis de solubilidade dos elementos de liga nas diferentes fases.
Como explicado anteriormente, o zircônio pode apresentar duas estruturas
cristalográficas: HC e CCC. Desta forma, há dois tipos de elementos de liga
responsáveis por influenciar as fases estáveis do zircônio: os elementos estabilizadores
da fase (HC) e os estabilizadores de fase (CCC). No primeiro caso, a temperatura de
transição da fase para a fase é aumentada fazendo com que o campo no diagrama
de fases seja ampliado. Os elementos -estabilizadores são: Al, Sn, N, O e Cd [14]. Por
outro lado, os elementos estabilizadores são responsáveis pela redução da temperatura
de transição da fase para a fase e consequentemente pela ampliação do campo no
diagrama de fases. Os elementos estabilizadores são: Nb, Fe, Cr, V e Mn [14].
Na Tabela 2 é possível analisar os elementos de liga e seus efeitos.

8
Tabela 2. Efeito dos Elementos de Liga [14].
Elementos de liga Efeitos
Resistência à corrosão
Sn - estabilizador
Propriedades mecânicas
Resistência à corrosão
Nb estabilizador
Propriedades mecânicas
Resistência à corrosão
Fe estabilizador
Propriedades mecânicas
Propriedades mecânicas ( em
O estabilizador
baixas concentrações)
Cr Propriedades mecânicas estabilizador

2.3.3 Histórico das Ligas de Zircônio Para Aplicação Nuclear

Existem algumas características nos materiais que são determinantes na escolha dos
materiais para aplicação nuclear como, por exemplo, a absorção de nêutrons. A tabela 3
mostra a seção de choque de absorção para alguns materiais.

Tabela 3. Seção de choque de absorção de nêutrons diferentes metais [14].


Seção de choque dos materiais em relação ao Be
Be Mg Zr Al Nb Mo Fe Cr Ni
1 7 20 24 122 278 281 322 512

O zircônio, sendo o terceiro metal com menor seção de absorção de choque, é o que
o torna um dos materiais estruturais mais adequado para aplicação em reatores
nucleares.
Zircaloy é o conjunto de ligas de alto teor de zircônio contendo Sn, Fe e Cr e foram
as primeiras a serem fabricadas [15]. Primeiramente, a Zircaloy-1 (Zr-2,5%Sn) foi
desenvolvida e recomendada para os reatores nucleares do submarino USS Nautilus
devido à boa resistência à corrosão [16]. Pesquisadores descobriram que a adição de
ferro, cromo e níquel melhorava a resistência à corrosão do zircônio e criou-se uma
nova liga. Para esta liga foi dado o nome de Zircaloy-2 (Zr-1,5Sn-0,15Fe-0,10Cr-
0,05Ni). Porém, os compostos intermetálicos formados pelo níquel (fase de Laves

9
Zr2Ni) foram identificados como potentes absorvedores de hidrogênio, o que invalida o
seu uso devido à formação indesejada de hidretos que pode levar a vareta combustível
ao colapso [17].
Variante da Zircaloy-2 com baixo teor de estanho, a Zircaloy-3 (Zr-0,25Sn-0,25Fe)
não chegou a ser produzida comercialmente devido às baixas propriedades mecânicas e
ineficiência em relação à resistência à corrosão durante o tratamento térmico no campo
bifásico ( + ). Em seguida, a Zircaloy-4 (Zr-1,5Sn-0,24Fe-0,10Cr) foi desenvolvida
com o objetivo de diminuir a absorção de hidrogênio e aumentar a resistência à corrosão
através da retirada de níquel e aumento da concentração de ferro quando comparada à
Zircaloy-2 [17].
As Figuras 6, 7 e 8 ilustram os diagramas de fases dos sistemas Zr-Sn, Zr-Fe e Zr-
Cr. No primeiro caso, analisando o diagrama de fases Zr-Sn é possível observar que ao
ter a concentração de estanho aumentada, a temperatura de transformação alotrópica -
também aumenta, confirmando o fato deste elemento de liga ser um -estabilizador. Por
outro lado, analisando os outros diagramas de fases, Zr-Fe e Zr-Cr, observa-se que ao
ter as concentrações, tanto de ferro quanto de cromo, aumentadas, a temperatura de
transição - diminui, o que confirma o fato de ambos serem -estabilizadores.
Os elementos de liga acima mencionados Fe e Cr ainda que não ultrapassem 2%
em peso de adição na liga, são responsáveis pela melhoria das propriedades mecânicas
do material, principalmente na resistência à corrosão. De acordo com os diagramas de
fase Zr-Cr e Zr-Fe, a solubilidade destes elementos no zircônio em temperatura
ambiente é muito baixa e dessa forma, formam compostos intermetálicos que se
precipitam na matriz Zr- , como por exemplo: Zr2Fe, Ze3Fe4Cr2 e ZrCr2 [18,19].

10
Figura 6. Diagrama de Fases Zr-Sn [20].

Figura 7. Diagrama de Fases Zr-Fe [20].

11
Figura 8. Diagrama de Fases Zr-Cr [20].

O interesse de aprimorar propriedades em busca de melhores desempenhos em


relação à radiação, oxidação e absorção de hidrogênio alavancou a elaboração das ligas
da nova geração contendo o nióbio como elemento de liga. Na tabela 3 é possível
observar que o Nb é o quinto metal com menor seção de choque de absorção de
nêutrons. Como exemplo, tem-se as ligas Zr-1Nb, Zr-2,5Nb e atualmente, tem-se uma
das ligas mais importantes para tubos de reatores nucleares na nova geração de ligas de
zircônio: Zr-Sn-Nb-Fe. Isto se justifica com base na baixa taxa de corrosão e aumento
da resistência mecânica que ela possui em comparação às demais [21].
O nióbio é utilizado como elemento de liga no setor nuclear uma vez que este
possui baixa absorção de nêutrons. Além disso, economicamente, o uso de nióbio é
favorável, pois o Brasil é o líder na produção do mesmo. O nióbio é um metal branco-
acizentado, brilhante e dúctil. Quando exposto ao ar por muito tempo sua cor se torna
azulada. O processo de oxidação começa a 200°C e por este motivo, é importante que o
trabalho a quente e os tratamentos térmicos sejam realizados em atmosfera protetora.
A Figura 9 apresenta o diagrama de fases Zr-Nb.

12
Figura 9. Diagrama de Fases Zr-Nb [22]

Ao analisar o diagrama de fases, observa-se que a solubilidade de Nb em Zr é


apenas 0,6% à temperatura de 600°C. Para a composição Zr-1Nb mencionada
anteriormente, o teor de nióbio excede o limite de solubilidade e desta forma é possível
observar um grande campo de Zr- com precipitados Nb- . NEOGY et al. [23]
publicaram resultados confirmando essa estrutura, ilustrada na micrografia obtida por
microscopia eletrônica de transmissão (MET) na Figura 10. A precipitação de partículas
de segunda fase é o principal mecanismo para melhoria das propriedades da liga. Os
precipitados ricos em nióbio dispersos na matriz de zircônio são a condição ideal para
fins nucleares, principalmente pela maior resistência à corrosão fornecida ao material.
A liga estudada neste trabalho tem composição igual Zr-0,8Nb-0,2X, onde X é
um elemento de transição. Este elemento de liga X foi utilizado com o objetivo de
aumentar a resistência mecânica, a resistência à corrosão e também de melhorar o
desempenho da liga em altas temperaturas. Através da análise do diagrama de fases Zr-
X, observa-se que a solubilidade do mesmo na matriz de Zr-
haverá formação de precipitados e estes serão do tipo ZrX2.

13
Figura 10. MET da liga Zr-1Nb mostrando a microestrutura composta de matriz
- . (Adaptado de [24]).

2.3.4 Fabricação da Vareta Combustível

Através da rota de fabricação da vareta combustível é possível controlar as


microestruturas produzidas e, consequentemente, controlar as propriedades mecânicas
resultantes. Portanto, cada liga, com suas diferentes composições, terá uma rota de
fabricação específica. Porém, de forma geral, os tubos são fabricados de forma similar à
rota mostrada na Figura 11.
Primeiramente, são formados briquetes através da compactação dos elementos
de liga e o zircônio esponja de forma a obter a composição desejada. Em seguida, estes
briquetes são soldados e fundidos em um forno a arco sob vácuo, podendo ser
submetidos à refusões
refusões com o objetivo de homogeneizar a composição química [25].
Após a etapa de fusão da liga é realizada a etapa de forjamento para redução das
dimensões do lingote e quebra da microestrutura bruta de fusão. O material forjado é
cortado em comprimentos menores
meno e é feito um furo central em cada um destes.
Em seguida, é realizado um tratamento térmico, em temperaturas maiores que

impedir a transformação de fase. Como resultado des --quenching,


quenching,
quenching
é gerado um produto de grãos pequenos e microestrutura desejável para otimizar as
propriedades mecânicas. Também é possível realizar um recozimento a 500°C para
adequar a microestrutura.

14
Figura 11. Rota de fabricação da vareta combustível.

Para a remoção dos defeitos superficiais é realizado uma usinagem na parede


externa, obtendo assim, o chamado TREX.
Após a etapa de forjamento, TREX é submetido à extrusão a quente em uma
faixa de temperatura entre 675°C
675°C e 800°C para obtenção de um tubo sem costura. O
fabricante determina as condições e taxas de redução utilizadas durante a extrusão.
O produto da etapa de extrusão é laminado pelo processo de passo peregrino.
Este processo consiste em passar o material por cilindros e uma matriz central para a
redução do diâmetro e da espessura da parede ao mesmo tempo formando a vareta
combustível. A redução obtida nesta etapa varia de 25 a 75%. O material produzido
combustível
nesta etapa experimenta uma deformação homogênea e, portanto possui uma
microestrutura uniforme [26].
[26
[2 6].

15
Após a laminação por passo peregrino pode ser realizado um recozimento a
vácuo, a temperatura de, aproximadamente, 700°C. O recozimento final controla a
microestrutura da vareta. A partir de 560°C, o trabalho
traba a frio resultante das etapas
anteriores é completamente removido e os grãos voltam a ser equiaxiais ((microestrutura
microestrutura
recristalizada) [2
[27
[27].
7].
Nas etapas de extrusão e de redução a frio, a recuperação e a recristalização
dinâmica são mecanismos de levam a mudanças na microestrutura [28
[28].
[28]
]. Logo, a
produção das varetas combustíveis exige um grande controle desses processamentos
termomecânicos de forma a obter as texturas cristalográficas
cristalográficas e as orientações
preferenciais de forma correta [29].
[29]].
[29

2.4 O Hidrogênio

Há várias
várias fontes de falhas em varetas combustíveis, entretanto, uma das mais
importantes é o hidrogênio. O hidrogênio é um elemento intersticial com grande
potencial fragilizador quando difundido em concentrações maiores que seu limite de
solubilidade devido à precipitação do hidrogênio
hid na forma de hidreto.

2.4.1 Sistema Zr-H

O sistema Zr-H encontra-se representado no diagrama de fases na Figura 12. A fase


Zr- consegue dissolver até 7%at. de hidrogênio em solução sólida para temperaturas
acima de 500°C, mas a solubilidade decresce rapidamente para menos que 1%at. de
hidrogênio com a redução da temperatura para 300°C. Portanto, a solubilidade de
hidrogênio no zircônio na temperatura de operação de um reator nuclear (320°C) é
extremamente baixa o que aumenta muito a probabilidade de haver precipitação de
hidretos. Entre 180°C e 550°C, caso a solubilidade seja excedida, coexistirá a matriz Zr-
, a fase de hidretos- e, possivelmente, a fase metaestável de hidretos- , de
estequiometria Zr-H1,66 e estrutura cúbica de face centrada (CFC). Para temperaturas
acima de 550°C haverá também a presença da fase Zr- . Em concentrações elevadas de
hidrogênio, a formação da fase ZrH2 dos hidretos- , de estrutura tetragonal de face
centrada (TFC) é originada [30].

16
Figura 12. Diagrama de Fases Zr-H. (Adaptado de [31]).

2.4.2 Mecanismos de Absorção de Hidrogênio

O zircônio possui uma forte afinidade com o hidrogênio, o que ocasiona uma rápida
absorção do mesmo [32]. Há algumas fontes de hidrogênio em reatores PWRs:

O hidrogênio pode ser liberado a partir das pastilhas combustíveis onde o


mesmo se encontra dissolvido;
A partir da decomposição do líquido refrigerante (água) por efeito da radiação
resulta no aumento de íons H+ disponíveis;
O hidrogênio liberado pela água devido ao processo de oxidação das varetas
combustíveis.

Uma das principais fontes de fornecimento de hidrogênio é a corrosão aquosa em


que o hidrogênio é liberado pelo líquido refrigerante (água) [33]. A corrosão das ligas
de zircônio em um ambiente aquoso está diretamente relacionada à oxidação do zircônio
pelo oxigênio presente na mesma, onde são produzidos zircônia e gás hidrogênio, como
representado na equação (2).

17
Zr + 2 H2O ZrO2 + 2 H2 (2)

Durante o processo corrosivo, a camada de óxido cresce e quando uma alta


tensão compressiva é aplicada, uma das fases do óxido de zircônio tetragonal é
estabilizada. Por outro lado, caso as tensões não sejam suficientemente elevadas para
estabilizar esta fase, uma transformação para a fase monoclínica ocorrerá acarretando
em um aumento de volume de aproximadamente 7%, gerando microtrincas e poros que
são considerados caminhos fáceis para difusão [34].
O processo de absorção de hidrogênio pode ser dividido em quatro etapas [35]:

1) Adsorção do gás hidrogênio na superfície da vareta;


2) Dissociação da molécula em átomos;
3) Penetração através da superfície (absorção);
4) Difusão na vareta;

As moléculas do gás hidrogênio (H2) adsorvem na superfície das varetas de


combustíveis e então se separam em átomos de hidrogênio (H). Em seguida, os átomos
ultrapassam a camada de óxido. Nesse momento em que os átomos de hidrogênio
tentam superar a camada de óxido, o consumo de átomos é relativamente baixo e
depende da temperatura e pressão do sistema e das propriedades da camada de óxido
formada na superfície da vareta [36].
A difusão de hidrogênio nas ligas de zircônio promove o endurecimento por solução
sólida intersticial. Por possuir um raio atômico muito pequeno, os átomos de hidrogênio
tendem a ocupar interstícios da rede cristalina dos metais. Nas condições de operação do
reator nuclear, a fase presente será a Zr- caso da fase Zr-
em que os átomos de hidrogênio estarão localizados: sítios intersticiais tetraédricos e
sítios intersticiais octaédricos, como é possível observar na Figura 13 [37].
Entretanto, como analisado na seção 2.4.1 e observado na Figura 12, o limite de
solubilidade do hidrogênio no zircônio é muito baixo, em torno de 1%at. na temperatura
de 320°C. Sendo assim, quando a concentração de hidrogênio absorvido ultrapassa o
limite de solubilidade, o hidreto de zircônio é precipitado.

18
Figura 13. Sítio (a) tetraédrico com um hidrogênio ocupando o mesmo (b) octaédrico
com um hidrogênio ocupando o mesmo. (Adaptado de [37]).

2.4.3 Precipitação de Hidretos

Uma vez que o zircônio possui baixa solubilidade ao hidrogênio, ao ter este limite
de solubilidade excedido, o hidrogênio precipita na forma de hidretos frágeis, como
exemplificado pela Figura 14.

Figura 14. Formação da camada de óxido e precipitação de hidretos. (Adaptado de


[38]).

19
Há quatro tipos de fases de hidretos que podem precipitar na matriz de zircônio
dependendo da quantidade de hidrogênio difundida e da taxa de resfriamento. São essas:
fase , fase , fase e fase . Porém, como pode ser observado no diagrama Zr-H
(Figura 12), as fases e não são representadas uma vez que estas são fases
metaestáveis. A fase possui estrutura cúbica de face centrada (CFC) e a fase possui
estrutura tetragonal.
Estudos [39] indicaram que o resfriamento lento propicia a formação de hidretos
e maiores pressões de hidrogênio propiciam a formação de hidretos .
ALLEN et al. [38] destacaram que a morfologia e a distribuição espacial dos
hidretos é crucial para entender os mecanismos de fratura de varetas combustíveis e
consequentemente, para melhorar a estabilidade das ligas a base de zircônio de forma a
prevenir o colapso das mesmas.

2.4.4 Orientação dos Hidretos

A orientação dos hidretos é um dos fatores que mais influenciam na vida útil das
varetas combustíveis. Esta orientação é um resultado da interação de dois elementos: a
textura do material e a reorientação dos hidretos pelo estado de tensões atuantes na
matriz de zircônio durante a formação dos mesmos [25].
As ligas de zircônio são policristalinas e, portanto, são compostos de um conjunto
de grãos onde cada um destes grãos é definido por uma orientação cristalográfica. A
distribuição das orientações cristalográficas destes grãos é chamada de textura. Em
geral, a textura é desenvolvida através de deformações plásticas durante os processos de
fabricação e tem grande influência na textura do produto final, influenciando
diretamente na orientação de hidretos. O processo pelo qual as varetas combustíveis são
produzidas laminação por passo peregrino provoca em sua maioria, a precipitação
de hidretos circunferenciais como mostrado na Figura 15(a) [40]. Entretanto, os hidretos
também podem se precipitar orientados radialmente como mostrados na Figura 15(b).

20
Figura 15. Orientação de hidretos (a) circunferenciais (b) radiais (Adaptado de [40])

A Figura 16 ilustra o plano basal (0002) da estrutura hexagonal do zircônio


orientado (a) paralelo ao plano da chapa, (b) paralelo à direção tangencial do tubo e (c)
perpendicular à direção tangencial do tubo.

Figura 16. Orientação do plano basal (0002) do zircônio hexagonal (a) paralelamente ao
plano da chapa, (b) paralelamente à direção tangencial do tubo e (c) perpendicularmente
à direção tangencial do tubo. (Adaptado de [41]).

Os hidretos tem a propensão a formar placas paralelas ao plano basal com


orientação (0002) [42]. Dessa forma, quando o plano basal está orientado paralelamente

21
à superfície dos tubos, os hidretos que se formam estarão orientados
circunferencialmente, impedindo a formação dos hidretos radiais.
Estudos realizados por MA et al. [43] comprovaram que as tensões externas às
varetas tendem a modificar o plano de hábito dos hidretos, de forma a se orientarem
perpendicularmente à tensão aplicada (formação de hidretos radiais).

2.5 Falhas no Elemento Combustível

As condições de operação no interior do núcleo de um reator são extremamente


severas, influenciando o desempenho físico dos diferentes componentes do elemento
combustível. Dentre essas condições estão presentes altos níveis de irradiação, elevados
carregamentos térmicos e mecânicos e ataque químico do líquido refrigerante [44].. A
degradação causada nesses elementos aumenta as possibilidades de falhas no elemento
combustível, onde as principais são: falha por radiação, falha por corrosão e falha por
absorção de hidrogênio.
Falhas por radiação são consequências da concentração de defeitos originados
através da colisão entre o material irradiado e nêutrons rápidos. Durante a colisão,
átomos são deslocados de suas posições da rede dando origem a dois tipos de defeitos:
lacunas e átomos auto-intersticiais. Entretanto, é importante destacar que se a energia de
impacto for alta, não apenas um átomo será deslocado de sua posição, mas também os
seus vizinhos, caracterizando os elementos em cascata. A intensidade com que estes
defeitos são formadoss depende da temperatura, da fluência de nêutrons e da composição
química da liga que compõe a vareta [44].. Estes defeitos pontuais agem como
obstáculos ao movimento de discordâncias e resulta no aumento da tensão de
escoamento e na redução da ductilidade do material que está sendo irradiado [45].
CHAWLA e MEYERS [45] confirmam esta afirmação, Figura 17, onde mostram o
efeito da irradiação por nêutrons nas propriedades mecânicas da Zircaloy.

22
Figura 17. Curva tensão-deformação para Zircaloy irradiada e não irradiada. (Adaptado
de [45]).

Além dos impactos diretos nas propriedades mecânicas do material, a criação


desses defeitos pontuais afeta diretamente a solubilidade de hidrogênio na liga.
CHRISTENSEN et al. [46] mostraram que uma única lacuna é capaz de prender até
nove átomos de hidrogênio enquanto os átomos auto-intersticiais prendem em menor
quantidade. Portanto, a grande probabilidade dos átomos de hidrogênio se aglomerarem
nos defeitos, principalmente nas lacunas, leva a um aumento da solubilidade do H na
liga.
Outra causa das falhas ocorridas em varetas combustíveis é a corrosão, pois é
durante o processo de corrosão que o hidrogênio passa pela camada de óxido e é
absorvido pelo zircônio. Como visto anteriormente, uma vez que o lim
limite de
solubilidade de hidrogênio pelo zircônio é excedido, o hidrogênio precipita na forma de
hidretos. O efeito da precipitação dos hidretos é uma grande preocupação para a
integridade estrutural das varetas combustíveis [30]. Ao precipitarem, um campo de
tensões é gerado devido à diferença entre o parâmetro de rede do hidreto e o da matriz
de zircônio, ocasionando a formação de trincas para alívio de tensões [47].
Consequentemente, propriedades mecânicas como ductilidade e tenacidade são
prejudicadas tornando
tor possível a fratura [30]. Em geral, são observados dois

23
mecanismos de fratura causados pelo hidrogênio: fragilização por hidretos radiais
(radial hydride embrittlement) e o trincamento retardado por hidretos (delayed hydride
cracking) [48].
A fragilização por hidretos radiais se deve ao fato dos mesmos serem pontos
nucleadores de trinca. Dessa forma, as trincas partem dos hidretos, e quando orientados
radialmente, se propagam na direção de espessura do tubo, levando-o à ruptura [41].
Consequentemente, os hidretos circunferenciais são menos deletérios às propriedades
mecânicas das varetas.
A fragilização por trincamento retardado por hidretos é um crescimento sub-
crítico de trinca dependente do tempo e comum ao zircônio e outras ligas nas quais há
formação de hidretos. Este processo se dá através da seguinte maneira: o hidrogênio em
solução se difunde para a zona plástica da ponta da trinca, precipitando-se. Quando os
precipitados atingem uma condição crítica relacionada ao tamanho e ao fator de
intensidade de tensões aplicado, KI, estes se rompem por clivagem e a trinca se propaga
em uma distância aproximadamente do comprimento do hidreto. Ao atingir a interface
com um material mais dúctil (livre de hidretos), a propagação da trinca é interrompida.
Novamente, átomos de hidrogênio irão se difundir para a região da ponta da trinca,
novos hidretos irão precipitar e então o processo recomeça, até o momento em que a
trinca atingir seu tamanho crítico e a trinca propagar instavelmente até a ruptura da
estrutura [7].

2.6 Efeito do Hidrogênio nas Propriedades Mecânicas

Como discutido na seção anterior, a presença de hidretos influencia diretamente as


propriedades mecânicas das varetas combustíveis. Na Figura 18 é possível observar a
forma com que propriedades como: limite de escoamento, limite de resistência à tração,
a redução de área e o alongamento do material são afetadas com a concentração do
hidrogênio para a Zircaloy-4 [49
[49].

24
Figura 18. O efeito do hidrogênio sobre as propriedades mecânicas. (Adaptado de [49]).

Em relação ao limite de resistência à tração observa-se um aumento até uma


concentração de 400 ppm de hidrogênio seguido de um decréscimo para concentrações
superiores. LIN et al. [50] atribuem este crescimento da resistência à tração ao
mecanismo de endurecimento por dispersão de precipitados (hidretos). Já a curva de
limite de escoamento apresenta um crescimento por toda faixa de concentração de
hidrogênio. Este efeito pode ser justificado pelo aumento da densidade e mobilidade de
discordâncias com a concentração de hidrogênio, possibilitando que o material atinja
limites de escoamento superiores ao do material sem hidrogênio [51].
Por outro lado, tanto a redução de área quanto o alongamento total do material são
reduzidos bruscamente com o aumento da concentração de hidrogênio. Isso se deve à
característica do hidreto ser frágil e, portanto, não admitir deformações plásticas.
Consequentemente, cada hidreto presente na vareta torna-se
torna um ponto frágil,
diminuindo assim a ductilidade.

3. MATERIAIS E MÉTODOS

3.1 Materiais

Para o desenvolvimento desta pesquisa foi realizada a fusão de liga a base de


zircônio, ZirBrasil-1, de composição Zr-0,8Nb-0,2X, onde X é um elemento de

25
transição, no forno de fusão a arco sob vácuo VAR (Vacuum Arc Remelting), modelo
L200 da empresa ALD Vacuum Technologies GmbH, presente no DEMAT
(Laboratório de Degradação de Materiais), resultando na produção de um lingote de
10kg com 150 mm de diâmetro. As características operacionais usadas para a fusão da
liga foram as seguintes: corrente de 2 kA, voltagem de 30 V, a taxa de fusão numa faixa
de 0,3 1,0 kg/mh e pressão de vácuo em uma faixa de 0,05 - 0,10 mbar. Apenas parte
do lingote, uma amostra de 2,6 cm x 5,3 cm (altura x comprimento) Figura 19 -, foi
utilizada para as etapas seguintes do estudo.
A matéria prima utilizada para fabricação da liga, o zircônio esponja, foi doado pela
INB (Indústrias Nucleares do Brasil) e os elementos de liga utilizados possuem alta
pureza.

Figura 19. Parte do lingote produzido usada no processo de conformação.

3.2 Processamento Termomecânico

Devido à disponibilidade de equipamentos adequados, optou-se pela fabricação de


chapas, ao invés de tubos.

O processo de conformação foi realizado no laminador FENN 150


HARTFORD, CONN, HORSBURGH e SCOTT, presente no Laboratório de
Processamento Termomecânico (TERMIC), em duas etapas: laminação a 850°C, onde
se obteve um grau de redução total de 75% e posterior laminação a frio com grau de
redução de 58% através de passes de pequena deformação. Nesta etapa foram obtidas

26
chapas com 1,05 mm de espessura e aproximadamente 22 cm de comprimento Figura
20.

Figura 20. Chapa obtida após os processos de laminação a quente e a frio.

3.3 Tratamentos Térmicos

Após a etapa de laminação a frio, foram realizados tratamentos térmicos em um


forno tubular Carbolite, presente no DEMAT (Laboratório de Degradação de Materiais)
nas seguintes condições: 700°C por 1 hora, 800°C por 2 horas e 800°C 6 horas. As
amostras foram encapsuladas em tubos de quartzo a vácuo para reduzir a formação de
óxido. Em todas as condições as amostras foram resfriadas ao ar com o objetivo de
obter microestruturas recuperadas e recristalizadas, similares às microestruturas
utilizadas nas ligas comerciais.

3.4 Hidrogenação Gasosa

O ensaio de hidrogenação das amostras em autoclave tem por objetivo avaliar a


formação e morfologia dos hidretos em função das diferentes condições laminada a
frio e tratadas termomecanicamente em que as amostras se encontram.

3.4.1 Preparação da Amostra

A preparação das amostras consistiu em cortá-las em um tamanho adequado para


que coubessem na autoclave, as faces foram lixadas para a retirada da camada de óxido

27
superficial até a lixa SiC 600 e em seguida foi utilizado álcool etílico e um secador
térmico de forma a limpar e secar a superfície das amostras.

3.4.2 Realização do Ensaio

A hidrogenação foi realizada em autoclave nas amostras laminadas a frio e tratadas


termicamente 700°C por 1 h, 800°C por 2 h e 800°C por 6 h. As etapas do processo de
hidrogenação foram as seguintes:

Teste de vazamento de gás;


Purga com gás Ar seguida de vácuo por 5 minutos, onde estas duas etapas foram
repetidas 3 vezes consecutivamente;
Introdução de H2 na pressão de 10 bar (similar à de operação dos reatores).

Em seguida, a autoclave foi colocada no forno tubular Carbolite, presente no


DEMAT (Laboratório de Degradação de Materiais), a 320°C por 48 h e após o término
da hidrogenação as amostras foram resfriadas dentro do forno. Para retirada das
amostras, primeiramente foi realizado vácuo à temperatura ambiente com o objetivo de
retirar o hidrogênio contido no reservatório.
Os hidretos formados foram analisados por microscopia ótica.

3.5 Hidrogenação Eletroquímica

A hidrogenação eletroquímica tem por objetivo introduzir uma grande concentração


de hidrogênio nos corpos de prova de tração, para todas as condições analisadas, de
forma a analisar o efeito fragilizador do hidrogênio nas propriedades mecânicas da liga.

3.5.1 Preparação da Amostra

As amostras utilizadas para a realização da hidrogenação eletroquímica foram os


corpos de prova de tração descritos na norma ASTM E8M. A preparação das amostras
foi realizada em ambos os lados e consistiu em lixá-las com as lixas SiC: 100, 220, 320,
400 e 1200 e polir com o pano OP-CHEM 200 mm da Struers com uma solução de 10%
oxálico (20 mL de alumina + 80 mL H2O + 10 g ácido oxálico) e pano OP-FELT 200
mm da Struers com solução OPS (Sílica Coloidal de 0,04 µm).

28
3.5.2 Realização do Ensaio

Os corpos de prova foram postos em contato com filamentos de platina (para


estabelecer contato elétrico com o contraeletrodo quando ligados em circuito) e a região
da cabeça do corpo de prova foi isolada com Teflon de forma a deixar apenas a região
útil exposta à hidrogenação. Em seguida os corpos de prova foram colocados em um
becker com solução eletrolítica de hidróxido de sódio (NaOH) a 0,1M e ligadas em
circuito com um contraeletrodo de platina. A densidade de corrente utilizada foi igual a
5 mA/cm² e o tempo de ensaio igual a 40 horas.

3.6 Cinética de Absorção de Hidrogênio

O ensaio de cinética de absorção de hidrogênio tem por objetivo determinar a


quantidade máxima de hidrogênio, em % peso, que uma liga pode absorver e o tempo
para início da absorção em temperatura e pressão desejada. No caso deste estudo a
temperatura e a pressão escolhidas foram similares as de operação dos reatores
nucleares: 320 °C e 10 bar.

3.6.1 Preparação da Amostra

A preparação das amostras consistiu em cortá-las, as faces foram lixadas para a


retirada da camada de óxido superficial até a lixa SiC 200 e em seguida foi utilizado
álcool etílico e um secador térmico de forma a limpar e secar a superfície das amostras.

3.6.2 Princípio do Ensaio

Para a análise da cinética de absorção de hidrogênio na liga, o equipamento utilizado


possui um reservatório de gás e um porta-amostra, de volumes conhecidos, onde há uma
válvula de isolamento entre esses elementos. De forma que a pressão do reservatório de
gás e do porta-amostra sejam medidas são utilizados transdutores de pressão e um um
termopar é acoplado ao porta-amostra para medição de temperatura durante o ensaio.
No caso de testes realizados fora da temperatura ambiente, um forno e um controlador

29
de temperatura são acoplados ao equipamento. Na Figura 21 é possível observar um
esquema do funcionamento do equipamento.

Figura 21. Esquema do funcionamento do equipamento do ensaio de cinética de


absorção [23].

Através da relação de temperatura, pressão e volume é possível medir a


quantidade de hidrogênio absorvida pela liga através do ensaio. Dessa forma, é
necessário que os volumes do sistema sejam cuidadosamente pré-calibrados e o
reservatório e o porta-amostra mantidos a temperatura constante. Ao fixar o volume e a
temperatura, a pressão do reservatório de gás e do porta-amostra pode ser medida
através dos transdutores de pressão para fornecer dados de pressão e concentração
isotérmicas. O volume do conjunto porta-amostra e amostra deve ser calibrado de forma
a obter uma medida precisa do volume de gás livre no sistema.
Para realização do ensaio, o reservatório de gás é preenchido de H2 a uma
pressão desejada e então a válvula de isolamento é aberta. O transdutor de pressão
contido no equipamento mede a variação de pressão ocorrida. Uma vez que se conhece
a pressão inicial de gás e os volumes do sistema, é possível determinar a quantidade de
gás absorvida.

3.6.3 Realização do Ensaio

O ensaio de cinética de absorção de hidrogênio foi realizado no equipamento PCT


Pro 2000 Hy Energy, presente no Laboratório de Propriedades Mecânicas (PROPMEC),

30
como mostrado na Figura 22. Este equipamento é controlado pelo software HyData
v2.2.119 desenvolvido pelo próprio fabricante.
As etapas para do ensaio de cinética de absorção de hidrogênio foram:

Teste de vazamento de gás com Ar;


Purga com gás Ar durante 40 minutos;
Calibração do volume do reservatório à temperatura ambiente;
Aquecimento da amostra até a temperatura de ensaio (320°C). Esta etapa foi
realizada sob vácuo;
Introdução de H2 na pressão de ensaio (10 bar);

Em seguida é dado início a cinética de absorção e após o término do ensaio, a


amostra é resfriada dentro do forno. Para retirada das amostras, primeiramente foi
realizado vácuo à temperatura ambiente com o objetivo de retirar o hidrogênio contido
no reservatório.

Figura 22. PCT Pro 2000 Hy Energy.

3.7 Microdureza Vickers

As medidas de microdureza Vickers (HV) foram realizadas nas amostras laminada a


frio e tratadas a 700°C por 1 h, 800°C por 2 h e 800°C por 6 h, antes e após a
hidrogenação, no equipamento microdurômetro Zwick/Roell, modelo Indentec ZHµ-
Mkll-M, instalado no Laboratório PROPMEC, como mostrado na Figura 23. Os

31
parâmetros utilizados para a realização das medidas foram: carga de 200 g e tempo de
15 s. As diagonais foram medidas diretamente no equipamento e a média foi utilizada
para o cálculo do valor da dureza.

Figura 23. Microdurômetro Zwick/Roell modelo Indentec ZHµ-Mkll-M.

3.8 Difração de Raios-X

O teste de difração de raios-X (DRX) permitiu identificar as fases existentes em


cada condição laminada e tratadas termicamente bem como a formação de hidretos
nas amostras hidrogenadas. O difratômetro utilizado para a realização do teste de DRX
é da marca Shimadzu, modelo XRD-6000, instalado no Laboratório Multiusuário de
Caracterização de Materiais, com monocromador de grafite e radiação de cobre Cu-K
onde o comprimento de onda é ). As identificações das fases
foram feitas com a utilização do programa Powdercell e da base de dados do livro
[52]. As condições para os testes de DRX foram:
varredura contínua, em um intervalo de 20 a 90°, passo de 0,02° e velocidade de 2°/min.

32
Figura 24. Difratômetro Shimadzu modelo XRD-6000.

3.9 Análise Microestrutural

A análise microestrutural da liga se deu através de microscopia ótica e microscopia


eletrônica de varredura.

3.9.1 Microscopia Ótica

A microscopia ótica teve como objetivo a observação da orientação e da distribuição


dos hidretos formados durante o processo de hidrogenação. Entretanto, para que os
hidretos fossem observados, as amostras foram embutidas transversalmente em
baquelite comum. A preparação das amostras após o embutimento consistiu em lixar
com as lixas SiC: 100, 220, 320, 400 e 1200 e polir com o pano OP-CHEM 200 mm da
Struers com uma solução de 10% oxálico (20 mL de alumina + 80 mL H2O + 10 g ácido
oxálico) e pano OP-FELT 200 mm da Struers com solução OPS (Sílica Coloidal de
0,04µm).
O microscópio utilizado para observação dos hidretos e obtenção das imagens foi o
Olympus BX60M (Câmera Sony CCD-IRIS), instalado no Laboratório de Microscopia
Ótica.

33
3.9.2 Microscopia Eletrônica de Varredura

A microscopia eletrônica de varredura (MEV) teve como objetivo a caracterização


microestrutural da liga para a condição tratada termicamente a 800°C por 6 horas. A
preparação da amostra consistiu em lixá-la com as lixas SiC: 100, 220, 320, 400 e 1200
e posterior poli-la eletroliticamente no equipamento Struers Tenupol-5, com tensão de
28V, por 1 min e 30 s em eletrólito de composição 9% de ácido perclórico e 91% de
ácido acético glacial.
O microscópio utilizado para a caracterização microestrutural foi o JEOL JSM
6460-LV, no modo shadow com sinal de elétrons retroespalhados a 15 kV, e para a
identificação das fases foi utilizado o EDS NORAN System Six 200, instalado no
Laboratório Multiusuário de Microscopia Eletrônica e Microanálise.

3.10 Ensaio de Tração

O ensaio de tração uniaxial foi realizado em corpos de prova com dimensões de


acordo com a norma ASTM E8M e está ilustrado na Figura 25 (a espessura do corpo de
prova é igual a espessura do material). Os corpos de prova foram ensaiados a
temperatura ambiente nas condições encruada e tratada termicamente a 700°C por 1 h,
800°C por 2 h, 800°C por 6 h, antes e após hidrogenação.
A taxa de deformação utilizada foi de 7,6 x 10-5 s-1. O equipamento utilizado foi o
EMIC DL 10000 que se encontra no Laboratório de Propriedades Mecânicas.

Figura 25. Dimensões do corpo de prova de acordo com a norma ASTM E8M

34
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1 Microdureza Vickers

O efeito das diferentes condições de tratamentos termomecânicos sugeridas neste


trabalho, bem como o efeito do hidrogênio, foi estudado através de medidas de
microdureza Vickers (HV). Em cada condição foram realizadas cinco medidas de
microdureza. Os valores médios de microdureza e respectivos desvios padrão estão
indicados na Tabela 4.

Tabela 4. Microdureza Vickers para as amostras antes e após a hidrogenação.

Condições de processamento HV
Laminada a frio 269 ± 5
Laminada a frio H2 267 ± 3
TT 700 °C/1 h 186 ± 4
TT 700 °C/1 h H2 206 ± 5
TT 800 °C/2 h 203 ± 10
TT 800 °C/2 h H2 221 ± 14
TT 800 °C/6 h 247 ± 8
TT 800 °C/6h H2 257 ± 13

A Figura 26 mostra os resultados do ensaio de microdureza Vickers com seus


valores médios e respectivos desvios padrão. Os pontos em cinza representam os
resultados das amostras antes da hidrogenação e os pontos em azul representam os
resultados das amostras após a hidrogenação.

35
300

250

200

150
HV

100

50

0
Laminada Laminada TT 700 TT 700 TT 800 TT 800 TT 800 TT 800 °C/
a frio a frio H2 °C/1 h °C/1 h H2 °C/2 h °C/2 h H2 °C/6 h 6h H2
Amostras

Figura 26. Resultados dos Ensaios de Microdureza Vickers

Analisando primeiramente as amostras sem hidrogênio, a condição encruada


apresentou microdureza de 269 HV. Ao medir-se a microdureza após o tratamento
térmico de 700 °C por 1 hora foi observado que houve uma redução da dureza para 186
HV, indicando a ocorrência do processo de recristalização, como observado por JUNG
et al. [53] para tratamentos de 600°C por 1 hora para as ligas HANA-4 e HANA-6.
JUANG et al. [53] também observaram a presença de partículas de segunda fase nos
tratamentos realizados nesta temperatura. No entanto, os tratamentos térmicos a 800°C
por 2 horas e 800°C por 6 horas apresentaram microdurezas de, respectivamente, 203
HV e 247 HV, apontando um aumento gradativo da dureza, sugerindo a ocorrência de
precipitação fina, consequência do processo de envelhecimento. GUEDES [17] também
observou um comportamento similar em seu estudo quanto ao decréscimo e posterior
aumento de dureza para a mesma liga do presente trabalho. As amostras laminadas ao
serem submetidas a um tratamento térmico de 600°C por 1 hora tiveram suas medidas
de durezas reduzidas ao serem comparadas às medidas da amostra laminada, enquanto
que outras amostras submetidas ao tratamento térmico de 750°C por 1 hora indicaram
valores maiores que os de 600° por 1 hora. Entretanto, esses resultados apenas foram
observados para algumas condições de processamento que por sua vez são diferentes
das deste trabalho. NEOGY et al. [54] também observaram uma redução seguida de um
aumento na dureza em tratamentos térmicos 580°C por 4 horas e 630°C por 1 hora para
a liga Zr-1Nb-1Sn-0,1Fe e justificaram este ocorrido à precipitação.

36
Após a hidrogenação, as amostras tratadas termomecanicamente a 700°C por 1
hora, 800°C por 2 horas e 800°C por 6 horas apresentaram os respectivos resultados de
microdureza: 206 HV, 221 HV e 257 HV, mostrando um aumento da dureza causado
pela formação de hidretos, confirmado pelas análises de DRX (Figuras 27 a 30).
Porém, no caso da amostra laminada, o valor se manteve. Sugere-se que isto se deve ao
fato da hidrogenação ter sido a quente e consequentemente haver a aniquilação de parte
dos defeitos a partir do processo de recuperação, contrapondo o efeito do hidrogênio no
aumento da dureza.

4.2 Difração de Raios-X

Os difratogramas da liga ZirBrasil-1, para as condições laminada e tratadas


termicamente estão apresentados nas Figuras 27 a 30.
Os difratogramas antes da hidrogenação indicam a presença de uma matriz Zr- ,
hexagonal compacta, para todas as condições analisadas. A fase Zr- é característica de
ligas a base de zircônio como mencionado na literatura por MARTINS [14] para as ligas
Zr-0.8Nb-0.2Mo e Zr-1Nb-0.2Mo e por LELIEVRE [9] para liga Zr-1Nb. Após a
hidrogenação, observa-se a formação de hidretos nesta matriz. Entretanto, para cada
condição há a presença de diferentes hidretos: na amostra apenas laminada, foi possível
identificar picos de ZrH2 tetragonal e ZrH2 cúbico enquanto que para os tratamentos
térmicos de 700 °C por 1 hora, 800 °C por 2 horas e 800 °C por 6 horas,
respectivamente, houve a formação de ZrH, ZrH e ZrH2 tetragonal e ZrH. RIBEIRO
[25] em seu estudo em ligas Zr-Nb-Al, Zr-Nb-Cu e Zr-Nb-Mn também observou a
formação de hidretos do tipo ZrH e ZrH2.
Os precipitados finos formados nos tratamentos térmicos de 800°C por 2 h e de
800°C por 6 h, como apontado nos resultados do ensaio de microdureza, não puderam
ser identificados através da técnica de DRX devido à baixa fração volumétrica.

37
Laminada H
(c) Zr
ZrH Cúbico
2
ZrH2 Tetragonal

(b) Laminada

(a) Zr- Padrão

20 30 40 50 60 70 80 90
2

Figura 27. Difratograma (b) da amostra laminada antes da


hidrogenação e (c) da amostra laminada após a hidrogenação.

38
(c) TT 700°C/1 h H
Zr
ZrH

(b) TT 700°C/1 h

(a) Zr- Padrão

20 30 40 50 60 70 80 90
2

Figura 28. Difratogramas


hidrogenação e (c) da amostra 700°C/1 h após a hidrogenação.

39
TT 800°C/2 h H
(c) Zr
ZrH
ZrH2 Tetragonal

(b) TT 800°C/2 h

(a) Zr- Padrão

20 30 40 50 60 70 80 90
2

Figura 29. Difratogramas


hidrogenação e (c) da amostra 800°C/2 h após a hidrogenação.

40
(c) TT 800°C/6 h H
Zr
ZrH

(b) TT 800°C/6 h

(a) Zr- Padrão

20 30 40 50 60 70 80 90
2

Figura 30.
hidrogenação e (c) da amostra 800°C/6 h após a hidrogenação.

4.3 Microscopia Eletrônica de Varredura

Através da técnica de MEV foi possível observar a microestrutura da liga


ZirBrasil-1 para a condição tratada termicamente a 800°C por 6 horas e analisar as
composições químicas de três regiões específicas da microestrutura através da técnica
de EDS, como mostrado pela figura 31.

41
Analisando a microscopia para a condição 800°C por 6 horas (Figura 31),
observa-se na microestrutura a presença de grãos equiaxiais, com tamanho da ordem de
10 m, confirmando a hipótese levantada pelos resultados de microdureza de que este
tratamento térmico garantia a recristalização completa da amostra. Os espectros de EDS
mostram que a microestrutura é homogênea, visto que a composição nas três regiões é
somente de zircônio. Isto se deve ao fato de que os elementos de adição estão em
solução sólida ou formando precipitados muito finos, o que não permite que os mesmos
sejam resolvidos por esta técnica. NEOGY et al.[23] estimaram o tamanho de grão da
fase Zr- - -1Nb como recebida. O
-se na faixa de 3-5 µm e o tamanho do precipitado
encontrava-se no intervalo de 40-60 nm. Na região 1 (Figura 31(b)), observa-se a
presença de um pico discreto de oxigênio que provavelmente foi proveniente dos metais
usados na fusão ou do processamento da liga.

(b)

(c)

(a)

(d)
Figura 31. Observação por MEV da condição 800°C por 6 h, mostrando (a) estrutura
recristalizada; (b) EDS da região 1; (c) EDS da região 2 ; (d) EDS da região 3

42
4.4 Microscopia Ótica

Para que fosse possível a confirmação da presença de hidretos indicada pelos


resultados de microdureza e difração de raios-X e análise de suas morfologias,
observou-se então a seção transversal das amostras hidrogenadas. As micrografias estão
apresentadas nas Figuras 32 a 35.

Figura 32. Hidretos formados na condição laminada a frio.

As imagens de microscopia ótica indicam a formação de hidretos alinhados, de


pequeno volume e não conectados para as amostras laminada e tratadas a 700°C por 1
hora e 800°C por 2 horas. Porém, para a de 800°C por 6 h há a presença de hidretos não
alinhados e conectados. Em todas as condições, os hidretos estão dispostos
espaçadamente ao longo da espessura.
SILVA [7], MARTINS [14] e GABRIEL [41] também analisaram a morfologia
e distribuição de hidretos em seus estudos em ligas a base de zircônio. SILVA [7]
observou um comportamento parecido com a deste estudo onde a liga Zr-1Nb-1Sn-
0.1Fe quando hidrogenada por 48 horas apresentou a formação de hidretos curtos,
circunferenciais e uniformemente distribuídos na espessura do tubo. Por outro lado,
MARTINS [14], na mesma condição de hidrogenação, observou presença de hidretos
longos para as ligas Zr-0.8Nb-0.2Mo e Zr-1Nb-0.2Mo. Em relação às ligas comerciais,
ao comparar a liga deste estudo com a liga comercial Zr-1Nb estudada por GABRIEL

43
[41], observa-se a ausência ou quantidade reduzida de hidretos ramificados, o que reduz
a possibilidade de propagação de trinca a partir dos hidretos e, consequentemente, o
colapso prematuro do tubo de zircônio durante a sua operação no reator nuclear.

Figura 33. Hidretos formados na condição de tratamento térmico a 700°C por 1 hora.

Figura 34. Hidretos formados na condição de tratamento térmico a 800°C por 2 horas.

44
Figura 35. Hidretos formados na condição de tratamento térmico a 800°C por 6 horas.

4.5 Cinética de Absorção de Hidrogênio

O teste de cinética de absorção foi realizado para as amostras laminada e tratadas


termicamente por 700°C por 1 hora, 800°C por 2 horas e 800°C por 6 horas. Os
resultados estão apresentados no gráfico da Figura 36 e na tabela 5.

A amostra laminada a frio iniciou a absorção de hidrogênio em, aproximadamente,


12 horas de ensaio e atingiu seu limite de absorção em 1,80 %p. A amostra tratada a
700°C por 1 hora demorou 16 horas para iniciar a absorção de hidrogênio e atingiu o
limite de absorção de 0,60 %p. A amostra tratada a 800°C por 2 horas começou a
absorver hidrogênio após, aproximadamente, 15 horas de ensaio e atingiu seu limite de
absorção em 1,07 %p. Em contrapartida, a liga tratada 800°C por 6 horas iniciou a
absorção após 26 horas de exposição na autoclave com hidrogênio e atingiu apenas 0,50
%p.

45
2

1,80 %p Laminada

1,07%p TT 800°C/2 h
1

TT 700°C/1 h 0,60 %p

0,50 %p
TT 800°C/6 h

0
0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50
Tempo (h)

Figura 36. Curvas de cinética de absorção de hidrogênio para as amostras laminada e


tratadas termicamente.

Tabela 3. Resultados da cinética de absorção

Amostras Tempo para início da absorção (h) H (%p)


Laminada a frio 12 1,80
TT 700°C/1 h 16 0,60
TT 800°C/2 h 15 1,07
TT 800°C/6 h 26 0,50

A interação do hidrogênio com a microestrutura depende fortemente da natureza dos


defeitos existentes nas condições analisadas. A amostra laminada é composta por grãos
alongados e possui alta densidade de discordâncias, consequência da deformação
plástica durante o processo de conformação. Uma vez que a energia de ligação do
hidrogênio com as discordâncias é forte, as discordâncias agem como sítios
aprisionadores de hidrogênio, aumentando a solubilidade do mesmo na liga, o que
justifica a maior absorção pela amostra laminada [51]. Para as amostras tratadas a
700°C e 800°C, os resultados de microdureza e a literatura [53] indicaram uma
microestrutura recristalizada com a presença de precipitados, sendo que a diferença

46
entre elas é que a amostra tratada por 6 horas apresenta grãos e precipitados maiores do
que a amostra tratada a 700°C por 1 hora e a amostra tratada a 800°C por 2 horas. Em
ambos os casos a quantidade de hidrogênio absorvida foi bem menor quando comparada
à amostra laminada. Isto se deve ao fato de os precipitados servirem como barreira para
a difusão do hidrogênio. Além disso, no caso da amostra tratada a 800°C por 6 horas, os
precipitados são maiores o que faz com que a matriz seja menos efetiva na absorção de
hidrogênio e assim a amostra leve um tempo maior para iniciar a absorção de
hidrogênio do que para as demais amostras. RIBEIRO et al. [55] observaram o mesmo
comportamento para ligas Zr-Nb-Al, Zr-Nb-Cu e Zr-Nb-Mn para as condições
laminadas e tratadas termomecanicamente.

4.6 Ensaio de Tração

O ensaio de tração foi realizado para todas as condições analisadas, antes (Figura 37
e tabela 6) e após a hidrogenação (Figura 38 e tabela 7).

1000
900
Laminada
800
TT 800 C/6 h
700
Tensão (MPa)

TT 800 C/2 h
600
TT 700 C/1 h
500
400
300
200
100
0
0 5 10 15 20 25
Deformação (%)

Figura 37. Gráfico tensão vs. deformação para as amostras não hidrogenadas.

47
Tabela 4. Resultados do ensaio de tração para as amostras não hidrogenadas

Limite de Limite de
Alongamento
Amostras Escoamento Resistência à
Total (%)
(MPa) tração (MPa)
Laminada 860 860 8
TT
388 523 23
700°C/1 h
TT
400 638 18
800°C/2 h
TT
487 680 16
800°C/6 h

Os resultados do ensaio de tração estão intimamente relacionados com a


microestrutura de cada condição. Primeiramente, para a condição laminada observa-se
uma alta resistência à tração e baixa ductilidade em relação às demais amostras. Isto se
deve ao processo de encruamento, ou seja, à grande interação entre discordâncias
geradas durante o processo de conformação. Dessa forma, ao interagirem entre si, as
discordâncias diminuem seu movimento e consequentemente endurecem o material e
reduzem a capacidade de deformação do mesmo.

No caso das amostras tratadas a 800°C, o que as difere é o tempo em que as


mesmas foram submetidas ao tratamento térmico. Através dos resultados de
microdureza e de microscopia eletrônica de varredura sugere-se que a amostra tratada
por 6 horas apresentou grãos e precipitados maiores, bem como maior fração
volumétrica de precipitados, do que a amostra tratada por 2 horas. Em geral
microestruturas compostas por grãos e precipitados pequenos tendem a apresentar
propriedades melhores de limite de escoamento e limite de resistência à tração.
Entretanto, neste estudo, foi observado que a amostra com grãos e precipitados maiores
é a que possui os maiores valores. De acordo com KESTENBACH e GALLEGO [56] o
mecanismo de endurecimento por precipitação depende mais da fração volumétrica do
que do tamanho das partículas. Portanto, isto justifica os resultados para o limite de
escoamento e limite de resistência à tração da amostra de 800°C por 6 h quando
comparados à de 800°C por 2 h. Com relação à ductilidade, uma vez que a amostra de
800°C/6 h apresenta maior fração volumétrica de precipitados, esta é a que apresenta
menor ductilidade. Seguindo o mesmo raciocínio, para a amostra tratada a 700°C/1 h, os
resultados de microdureza e a literatura [53] sugerem uma microestrutura também

48
recristalizada e precipitada, porém com menor fração volumétrica e menor tamanho do
que as amostras a 800°C. Esta microestrutura justifica os resultados do ensaio de tração
de menor limite de escoamento e maior alongamento do que as demais amostras.

SILVA [7] em seu estudo realizou ensaios de tração para as ligas comerciais Zr-
1Nb e Zr-1Nb-1Sn-0,1Fe e obteve resultados inferiores com relação ao limite de
escoamento e ao limite de resistência à tração quando comparadas à ZirBrasil-1.
Entretanto, em relação à ductilidade, as ligas comerciais apresentaram valores de
ductilidade de 46%, ou seja, igual ou superior ao dobro da ductilidade encontrada para
todas as condições de tratamento termomecânico da liga deste estudo.

900
Laminada
800
700
600 TT 800 C/2 h
Tensão (MPa)

TT 800 C/6 h
500
400 TT 700 C/1 h

300
200
100
0
0 2 4 6 8 10 12 14 16
Deformação (%)

Figura 38. Gráfico tensão vs. deformação para as amostras hidrogenadas

49
Tabela 5. Resultados do ensaio de tração para as amostras hidrogenadas

Limite de Limite de
Alongamento
Amostras Escoamento Resistência à
Total (%)
(MPa) Tração (MPa)

Laminada 822 822 5

TT
373 524 14
700°C/1 h

TT
290 627 12
800°C/2 h

TT
382 592 10
800°C/6 h

Após a hidrogenação dos corpos de prova observou-se que, em geral, os


resultados estão de acordo com a literatura para as medidas de limite de resistência à
tração e ductilidade [49]. Para todas as condições foi observado o efeito deletério do
hidrogênio na ductilidade da liga. SILVA [7] também observou a redução da ductilidade
com a absorção de hidrogênio para as ligas Zr-1Nb e Zr-1Nb-1Sn-0,1Fe, entretanto a
redução da ductilidade para as ligas comerciais foi significativamente maior do que
quando comparada à queda sofrida pela liga ZirBrasil-1. Apesar desta maior redução, as
ligas comerciais continuaram apresentando melhor ductilidade, cerca de 25%.
BLACKMUR [49] observou a redução do limite de resistência à tração para
concentrações maiores que 980 ppm de hidrogênio. Em todas as condições houve
redução nos valores de limite de resistência à tração exceto para a tratada a 700°C/1 h
em que o valor se manteve. Entretanto, ao contrário do aumento do limite de
escoamento observado por BLACKMUR [49] para a Zircaloy-4, a ZirBrasil-1
apresentou uma redução nos seus valores de limite de escoamento. Isto pode ter sido
ocasionado pelo efeito HEDE (Hydrogen Enhanced Decohesion) causado pelo
hidrogênio onde os átomos de H reduzem a energia de coesão entre os átomos, fazendo
com que a fratura ocorra mais facilmente [57].

50
5. CONCLUSÃO

As principais conclusões da influência dos tratamentos termomecânicos na


formação de hidretos em liga a base de zircônio para aplicação nuclear foram:

1. Foi observada através dos resultados de microdureza a recristalização e,


sugerido através da análise da literatura, a precipitação para o tratamento a
700°C por 1 hora e a recristalização e precipitação nas amostras tratadas a
800°C por 2 e 6 horas. A recristalização da condição de 800°C por 6 horas
pode ser confirmada através da técnica de MEV. Entretanto, as demais por
possuírem grãos muito pequenos, não puderam ser analisadas. A precipitação
também não pode ser confirmada através de MEV e nem DRX em função do
pequeno tamanho dos precipitados.
2. A morfologia e distribuição de hidretos para a liga ZirBrasil-1 nas condições
de processamento, com exceção do tratamento a 800°C por 6 h, apresentam
hidretos alinhados, de pequeno volume e ausência de hidretos ramificados,
podendo levar a um aumento no tempo de vida útil dos componentes que são
fabricados atualmente com ligas de Zr-1Nb.

3. Os resultados da cinética de absorção de hidrogênio mostram que entre as


condições analisadas, a condição laminada é a que apresenta menor tempo
para iniciar a absorção e também é a que mais absorve hidrogênio e, por
outro lado, a condição com tratamento termomecânico a 800°C por 6 horas é
a que demora mais tempo para iniciar a absorção e também é a que menos
absorve hidrogênio.
4. Os ensaios de tração mostraram que a absorção de hidrogênio pela liga tem
efeito deletério principalmente na ductilidade da liga para todas as condições
analisadas.
5. O tratamento termomecânico que mostrou o melhor desempenho para a
aplicação em reatores nucleares foi o de 800°C por 6 horas uma vez que
apresentou um bom conjunto de propriedades mecânicas e foi a condição que
menos absorveu hidrogênio e a que levou mais tempo para iniciar esta
absorção.

51
6. SUGESTÃO PARA TRABALHOS FUTUROS

Como sugestão para trabalhos futuros, considera-se:

Analisar a liga nas condições tratadas por MET de forma a identificar,


avaliar tamanho, morfologia e distribuição dos precipitados para melhor
caracterizar a liga;
Realizar a análise de textura cristalográfica em função do processamento
termomecânico de forma a investigar a precipitação de hidretos;
Realizar outros tratamentos termomecânicos de forma a obter uma
microestrutura mais próxima à das ligas comerciais;
Realização de ensaios de dessorção para as amostras hidrogenadas.

52
7. REFERÊNCIAS

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Chemistry Congress, pp. 3-34, n. 42, São Paulo, Set. 2014.

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Maio 2011.

[3] VICENTE ALVAREZ, M. A., S ANTISTEBAN, R. J., VIZCAINO, P., et al.,


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[4] UFSM. Fissão Nuclear. Disponivel em:


<http://coral.ufsm.br/gef/Nuclear/nuclear12.pdf>. Acesso em: Nov 2015.

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<http://www.infoescola.com/fisica/fissao-nuclear/>. Acesso em: Nov 2015.

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Disponivel em: <http://www.euronuclear.org/info/encyclopedia/n/npp-reactor-
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http://conhecimentonuclear.blogspot.com.br/2011/07/funcionamento-de-um-reator-
pwr.html >. Acesso em: Nov 2015.

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Ciência, Tecnologia e Inovação. Disponivel em:
<http://www.cnen.gov.br/images/cnen/documentos/educativo/programa-de-informacao-
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Energia Nuclear e Ciências das Radiações, Minas Gerais, 2012.

53
[11] Usina Nuclear. Disponivel em:
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Acesso em: Nov 2015.

[12] LAMOTTE, A.; DE MOURA, L. N.; NISHIKAWA, T. S. P. Processo Kroll


Obtenção de Titânio e Zircônio Metálico. São Paulo, SP, Brasil, 2011.

[13] ZIMMERMMANN, Â. J. D. O., Encruamento, Recristalização e Textura


Cristalográfica de Zircônio Puro e da Liga Zircaloy-4. Dissertação de D.Sc.,
Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil, 2014.

[14] MARTINS, C. D., Síntese e caracterização de ligas a base de Zr-Nb para uso em
reatores nucleares. Dissertação de M.Sc., COPPE/UFRJ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil,
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Para a Consolidação de Cavacos Prensados de Zircaloy e Estudo do Sistema Dinâmico
do Arco Elétrico. Dissertação de D.Sc., São Paulo, SP, Brasil, 2005.

[17] GUEDES, B. C., Correlação entre Processamento Termomecânico e Textura


Cristalográficas da Liga ZirBrasil-1. Dissertação de M.Sc., Instituto Militar de
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