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Anotações sobre as discussões teóricas elencadas no livro “Construtivismo de Piaget a

Emília Ferreiro” de Maria da Graça Azenha.

O livro “Construtivismo de Piaget a Emília Ferreiro” apresenta análises


referentes ao processo de aquisição da língua escrita, isto é, a alfabetização,
fundamentadas em conceitos básicos sobre os estágios de desenvolvimento intelectual.
Nesse sentido, Azenha busca na teoria da psicologia do desenvolvimento cognitivo
elaborada por Piaget elementos para a análise e explicação das transformações no
processo de aquisição da língua escrita. E, ainda, apresenta contribuições de diferentes
teorias para tratar dos fatores e mecanismos de mudança qualitativa no desenvolvimento
intelectual voltados para a alfabetização. Dessa maneira, a autora apresenta sua teoria
sobre o processo de construção intelectual para a aquisição da língua escrita.

O livro está estruturado em seis capítulos. Nos capítulos 2 e 3, a autora


apresenta uma análise referente às contribuições teóricas de Piaget. Nos capítulos 4 e 5,
a autora apresenta sua análise referente às contribuições teóricas elaboradas por Emília
Ferreiro. No capítulo 6, são apresentadas algumas implicações no campo pedagógico
referente a adoção dessas teorias.

A teoria de Piaget

A teoria de Piaget foi elaborada a partir das observações e experiências


realizadas por Piaget em uma escola primária no laboratório de Binet com a aplicação
de testes. Seu foco de análise eram os erros apresentados pelas crianças na solução dos
problemas propostos e a interpretação do percurso intelectual da criança em relação ao
seu desenvolvimento cognitivo. A partir da década de 1930, Piaget investigou a
construção das noções quantidade e número, tempo, espaço. As publicações de Piaget
referem-se à pesquisa da gênese de noções, de linguagem e de raciocínio, ao
desenvolvimento da percepção e à elaboração de modelos formais. A partir de 1970,
seus estudos estiveram voltados para a investigação dos mecanismos que explicam a
evolução do desenvolvimento cognitivo de um estado de equilíbrio para o estado
subsequente. Dessa maneira, o desenvolvimento cognitivo na teoria piagetiana ocorre
por meio de estágios como um contínuo processo de equilibração.
Para a autora, a teoria de Piaget e seus problemas podem ser relacionados à
teoria filosófica do conhecimento, pois se trata de investigações sobre o que é o
conhecimento, como se atinge um determinado estágio de conhecimento e como se
passa a um outro estágio qualitativamente superior. O que o distingue nesse campo é a
abordagem experimental destes problemas.

Nesse sentido, os métodos piagetianos dialogam com o empirismo, pois,


segundo a autora do livro, a interpretação ‘empirista’ do conhecimento atribui valor
extra ao papel da experiência sensível, particularmente da percepção, que de maneira
direta ou indireta direcionam conteúdos da vida material sobre o pensamento de um
indivíduo. Contudo, segundo a teoria de Piaget, o acesso ao conhecimento não decorre
apenas da percepção, não é uma simples associação, mas a “assimilação dos objetos aos
esquemas do indivíduo.

De outro lado, diferentes teorias partem da consideração de que existem


estruturas mentais pré-definidas, inatas. Os estudos de Piaget indicam para um processo
de desenvolvimento por estágios em que há novos aprendizados no decorrer do
processo. Dessa maneira, é apresentada a noção de construção em detrimento do
empirismo e do pré-formismo. Para Piaget, “tampouco, existem estruturas cognitivas a
priori ou inatas: só o funcionamento da inteligência é hereditário, e só gera estruturas
mediante uma organização de ações sucessivas (...) Daí resulta que uma epistemologia
em conformidade com os dados da psicogênese não poderia ser empírica e nem pré-
formista, mas não pode deixar de ser um construtivismo, com a elaboração contínua de
operações e de novas estruturas.”(apud AZENHA, in Piatelli-Palmarini, 1983, p 39).

Assim, para Piaget uma concepção construtivista incluiria a descrição e a


explicação de como se constroem as operações intelectuais ou um conjunto de
significados na sua interação com o mundo. A inteligência consistiria na capacidade de
adaptação de um indivíduo ao meio em que ocorre a construção de um equilíbrio
progressivo entre o mecanismo de assimilação de um conhecimento e o mecanismo de
acomodação desse conhecimento. Entendendo que repetição, generalização e
reconhecimento são as características funcionais de todos esquemas assimilativos. O
acesso ao conhecimento é engendrado e possibilitado pelos elementos já conhecidos
resultando em acomodação de conhecimentos para assimilação do novo. E ainda, é a
existência desse processo progressivo das ações cognitivas que caracteriza momentos de
estabilidade num contínuo processo de equilibração.
A psicogênese da língua escrita para Emília Ferreiro

Emília Ferreiro pesquisou os elementos constitutivos do processo de


psicogênese e aprendizado da língua escrita. As investigações dessa autora estão
voltadas para os mecanismos de apropriação e aprendizado da escrita inspirados nos
métodos de análise desenvolvidos pela teoria piagetiana.

Segundo Ferreiro, a linguagem atua como uma representação, ao invés de


ser apenas a transcrição gráfica dos sons falados. Nesse sentido, o aprendizado
sistemático das letras deve levar a competência linguística anterior da criança, visto que
existem relações internas entre fala e escrita, contudo, sendo a escrita um sistema de
representação da fala não há a estrita correspondência entre ambos. Compreender o que
as marcas sobre o papel representam e como se realiza essa representação é uma das
mais importantes tarefas a serem enfrentadas pela criança. A existência de
oportunidades de interação com a escrita em situações informais, próprias dos
ambientes letrados levaria ao conhecimento prévio à escola a ser considerado. Esse
ambiente propicia a chegada à escola em um nível de maior aproximação do universo
do conhecimento e da compreensão de leitura e escrita.

A partir da investigação das ideias sobre critérios que distinguem textos para
ler e textos que não permitem a leitura, Ferreiro observou e analisou os critérios de
legibilidade apresentados como conhecimento prévio à chegada à escola. Suas
observações resultaram no estabelecimento de análise a partir da consideração da
quantidade mínima de letras para que haja leitura, para que seja um texto, e da
variedade mínima de letras, no que se mostrou que a criança é capaz de apresentar uma
leitura simbólica a partir desses elementos.

O método utilizado nessa investigação é o da escrita espontânea por parte


da criança e da indagação sobre essa escrita por parte das pesquisadoras até que se atinja
a estabilidade sobre a compreensão sobre essa escrita. Nesse sentido, as pesquisas
indicaram que para as crianças uma palavra exige uma quantidade mínima de letras e
uma variedade mínima de letras. Outros dados colhidos eram referentes ao
conhecimento e diferenciação de elementos gráficos como desenhos. É importante
identificar se existiriam para essa criança a diferenciação entre letras e números e a
partir de então, construir os conhecimentos de um determinado conjunto de letras e/ou
de números. Chegando até o último nível de aquisição quando as letras do alfabeto são
nomeadas e é possível indicar o valor sonoro de uma determinada letra para além do seu
nome. E ainda, observando-se as diferenças entre letras e sinais gráficos de pontuação
como sinais para a identificação dos elementos constitutivos de um texto. Chegando ao
último estágio apresentado no livro em que se trata da questão da orientação espacial da
leitura, o que as pesquisas de Ferreiro demostraram fazer parte desse escopo de
conhecimentos anteriores à chegada ao ambiente escolar e passível de aprendizado
enquanto convenção. Esses seriam os conhecimentos prévios investigados por
Ferreiro para o desenvolvimento do processo de construção da aprendizagem do sistema
simbólico da escrita, estágio que há a percepção de que as letras e as palavras se
diferenciam produzindo a convenção dos significados.

Considerando a evolução da aprendizagem em níveis de alfabetização,


Emília Ferreiro identifica e classifica esse processo de aquisição em: hipótese ou nível
pré-silábico e hipótese ou nível silábico.

No primeiro destes, a criança passaria por um estágio em que escrita pode


ocorrer de maneira indiferenciada em que os grafismos podem ser constituídos de traços
descontínuos, para o estágio diferenciado, em que há tentativas sistemáticas par o
registro das letras definidas, na tentativa de elaborar um conjunto de letras diferenciado
de outro.

Na etapa seguinte, isto é, o nível silábico a criança inicia a tentativa de


estabelecer relações entre o contexto sonoro da linguagem e o contexto gráfico do
registro. Passando pelo nível silábico-alfabético, quando há a tentativa de estabelecer
partindo da etapa de aquisição do conhecimento anterior, isto é, da etapa alfabética, a
análise da escrita em termos de fonemas. E, por fim, o nível alfabético, estágio em que a
criança é capaz de realizar uma análise sonora dos fonemas das palavras que vai
escrever. Nesse sentido, há análise dos erros apresentados são indicadores da forma
pela qual as crianças chegaram a descobrir as funções da escrita e a sua organização
enquanto sistema de representação gráfica.

Considerações referentes às implicações pedagógicas da aplicação do método


Dessa maneira, a autora apresenta aspectos teóricos das investigações
desenvolvidas por Piaget e por Emília Ferreiro, destacando que para Ferreiro, há uma
identidade entre os mecanismos de aprendizado estudados por ambos, contudo, para
diferentes áreas do conhecimento. Nesse sentido, o aprendizado ocorre com a
constatação do papel ativo do sujeito com o objeto de realidade a ser apreendido. E
aponta que, é necessário considerar que existe um espaço de elaboração do sujeito do
sujeito, mediando ensino-aprendizagem, e nem sempre há correspondência dos
percursos de ensino-aprendizagem.

Nesse sentido, a Azenha indica que a observação e a interpretação das


condutas adotadas pelas crianças durante o processo de aquisição da linguagem escrita
são elementos fundamentais para a elaboração de práticas de ensino-aprendizagem por
parte do professor. As interações com a linguagem escrita que precede a alfabetização
formal criam procedimentos letrados anteriores à alfabetização que devem ser
consideradas para a análise e definição dos métodos de alfabetização. As ideias
elaboradas por Ferreiro, a partir das investigações sobre o processo de aquisição da
escrita apontam elementos importantes para o estabelecimento do diagnóstico dos
diferentes níveis de escrita e estágios de desenvolvimento nesse aspecto do
conhecimento que podem e devem ser considerados quando se pensa a função social
desempenhada pela escola. A passagem de um estágio para o estágio subsequente desse
aprendizado, isto é, as mudanças no conjunto de significados são graduais e ancoradas
em conhecimentos anteriores. Nesse sentido, o conhecimento teórico consistente por
parte dos educadores constitui elemento fundamental para definir diferentes formas de
alfabetizar.

Referência bibliográfica

AZENHA, Maria da Graça. Construtivismo de Paiget a Emília Ferreiro. São Paulo:


Editora Ática, 2003.

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