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20º CONGRESSO NACIONAL DE TRANSPORTES MARÍTIMOS,

CONSTRUÇÃO NAVAL E OFFSHORE

PROPAGAÇÃO DE TRINCAS EM DEFEITOS DE SOLDAS


CIRCUNFERENCIAIS DE “RISERS” RÍGIDOS

Bianca de Carvalho Pinheiro e Ilson Paranhos Pasqualino


Programa de Engenharia Oceânica, COPPE/UFRJ

Introdução soldas durante a fabricação dos espécimes,


de forma a simular o defeito de falta de
A existência de possíveis defeitos de solda em penetração na raiz. O teste de dobramento
risers rígidos pode, dependendo do método de visa a simular os efeitos decorrentes da
lançamento adotado, provocar a sua falha por instalação pelo método carretel, sendo capaz
fadiga. Esse problema apresenta-se ainda de induzir deformações plásticas nos
mais crítico no caso de risers de aço em espécimes. O teste de fadiga submeteu os
catenária, ou steel catenary risers (SCRs), espécimes a um carregamento combinado de
instalados pelo método carretel. As tensões flexão cíclica e tração axial constante.
atingidas durante os processos de O trabalho numérico consistiu no
dobramento, desdobramento e retificação desenvolvimento de um modelo tridimensional
podem gerar deformações plásticas, de elementos finitos, adotando-se elementos
provocando o aumento de eventuais defeitos sólidos, rotações finitas, comportamento
de solda. Adicionalmente, SCRs são elasto-plástico do material e não linearidade
submetidos a grandes variações de tensão geométrica. As análises numéricas realizadas
durante a sua operação, o que reduz ainda procuraram reproduzir numericamente os
mais a vida à fadiga desse tipo de estrutura. experimentos físicos realizados. A simulação
Estimativas de vida à fadiga baseadas em numérica da propagação do defeito foi
curvas S-N podem ser empregadas nos baseada na teoria da Mecânica da Fratura
estágios preliminares do projeto. No entanto, o Linear Elástica. Os resultados das análises
desenvolvimento de um projeto seguro para a numéricas foram comparados com a
instalação de SCRs em águas profundas deve performance de vida à fadiga dos espécimes
ter como base um trabalho experimental dos testes experimentais.
compreendendo testes de fadiga em escala
real e processos de solda reais. De forma a se 1 – Testes Experimentais
obterem os possíveis efeitos prejudiciais do
processo de instalação pelo método carretel Os testes experimentais foram realizados no
na performance do riser à fadiga, deve-se âmbito de um projeto de pesquisa relativo à
simular o processo de dobramento antes dos fadiga de dutos rígidos instalados pelo método
testes de fadiga. carretel. Por serem sigilosos, os resultados
Neste trabalho, a performance de SCRs experimentais não podem ser apresentados.
instalados pelo método carretel, quanto ao O trabalho experimental compreendeu testes
fenômeno de fadiga, foi estudada através de de dobramento e de fadiga, em escala real, de
um trabalho numérico e experimental seis espécimes de dutos de aço API X-60,
realizado no Laboratório de Tecnologia com diâmetro externo nominal de 8,625 pol
Submarina (LTS) da COPPE/UFRJ. (219,08 mm) e com uma junta circunferencial
O trabalho experimental compreendeu testes soldada em sua seção central.
de dobramento e de fadiga, em escala real, de Para a realização dos testes experimentais,
espécimes de dutos de aço API X-60, com foram utilizados os aparatos de dobramento
diâmetro externo nominal de 8,625 pol, com (Figura 1) e de fadiga. Estes aparatos foram
uma solda circunferencial em sua seção construídos no âmbito de um projeto
central. Foram induzidos defeitos iniciais nas denominado “Plastically Strained SCR’s
-1-
Qualification Program for Installation Methods” Após os testes de dobramento, foram
[1], realizado entre a COPPE/UFRJ e diversas realizados os testes de fadiga. Nesses testes,
empresas da área de petróleo. os espécimes foram submetidos a um
Os espécimes foram fabricados de forma que carregamento de flexão cíclica sob tração
defeitos foram intencionalmente induzidos em axial constante, com o auxílio do aparato de
suas soldas circunferenciais durante o fadiga.
processo de soldagem dos dutos. Os defeitos O aparato do teste de fadiga, mostrado
induzidos simulam o defeito de falta de esquematicamente na Figura 2, inclui uma
penetração na raiz da solda, com diferentes estrutura de aço com um atuador hidráulico
dimensões para cada espécime, segundo um para tração e dois pórticos de aplicação de
critério de aceitação de soldas. Para que carga transversal equipados com atuadores
fossem obtidas as dimensões resultantes dos hidráulicos. O aparato é também equipado
defeitos induzidos, as soldas defeituosas dos com um propulsor para girar o espécime
espécimes foram avaliadas através de ensaios (composto de motor elétrico, correias e polias)
não-destrutivos antes dos mesmos serem e instrumentos diversos, como células de
submetidos aos testes de dobramento e de carga, LVDTs (sensores de deslocamento
fadiga. Os ensaios não-destrutivos utilizados linear), transdutores de pressão etc, e um
foram a radiografia e a técnica TOFD (time-of- sistema de controle e aquisição de dados.
flight diffraction). Através do aparato de fadiga o espécime é
Os testes de dobramento simulam as girado, fazendo com que atue sobre ele uma
condições do processo de instalação pelo solicitação combinada de flexão cíclica e
método carretel que, com o dobramento, tração constante.
desdobramento e retificação do duto, pode
induzir deformações plásticas no mesmo. Nos
testes de dobramento pode-se também
produzir uma amplificação do tamanho dos
defeitos de solda existentes.

Figura 2 – Esquema do aparato do teste de


fadiga.

O espécime é montado no aparato de fadiga


de forma análoga a uma viga simplesmente
apoiada nas extremidades. Cargas
transversais são aplicadas em dois pontos
igualmente espaçados dos apoios, com o uso
dos pórticos atuados hidraulicamente. Essas
cargas produzem um momento fletor
(a) constante na região do espécime entre os
pórticos, onde se localiza a junta soldada,
criando assim um estado de flexão pura na
região da solda. Com a rotação do espécime,
as cargas transversais aplicadas fazem com
que todas as fibras do metal oscilem entre os
estados de compressão e tração, isto é, o duto
é submetido a um carregamento cíclico de
flexão que o conduz à fadiga. O espécime é
submetido a uma tensão de tração constante,
simultaneamente à solicitação cíclica de
flexão, de forma a se aplicar uma tensão
média axial (σm) constante. A carga de tração
é aplicada com o auxílio de um atuador
hidráulico posicionado em uma extremidade
(b)
do espécime, enquanto que a outra é
Figura 1 – Aparato utilizado no teste de
restringida axialmente.
dobramento. Momento em que o espécime é
(a) dobrado e (b) retificado.

-2-
1.1 - Parâmetros geométricos e de material apresenta, para cada espécime, os valores
dos espécimes médios obtidos para o diâmetro externo,
Os seis espécimes foram fabricados a partir espessura, ovalização e excentricidade antes
de três dutos de aço grau API 5L X60, dos testes de dobramento. Na Tabela 3 são
identificados por T1, T2 e T3. Foram listados os valores médios obtidos para o
fabricados dois espécimes (denominados A e diâmetro e a ovalização após os testes. Os
B) a partir de cada duto. Cada espécime foi valores de diâmetro sofreram pequenas
fabricado com uma solda circunferencial alterações devido às solicitações mecânicas
central usando-se as técnicas de soldagem durante os testes de dobramento. Nota-se que
SMAW (shield metal arc welding) no ovalizações foram amplificadas de forma
enchimento e GTAW (gas tungsten arc significativa após os testes.
welding) na raiz. Os parâmetros geométricos
nominais dos espécimes, dados pelo diâmetro Tabela 2 – Parâmetros geométricos dos
externo (D), espessura (t) e comprimento (L), espécimes antes dos testes de dobramento.
são apresentados na Tabela 1. Espécime D (mm) t (mm) D/t ∆o (%) Ξo (%)
T1A 219,63 15,45 14,22 0,168 3,578
Tabela 1 – Parâmetros geométricos nominais
dos espécimes. T1B 220,07 14,94 14,73 0,166 4,082
D t L T2A 219,22 15,40 14,24 0,206 4,583
(m)
(mm) (pol) (mm) (pol) T2B 219,25 15,24 14,39 0,184 4,575
219,08 8,625 15,06 0,593 5,2 T3A 219,94 15,59 14.11 0,243 4,386

T3B 220,03 14,99 14,68 0,151 5,165


Antes dos testes de fadiga, as dimensões dos
espécimes e os parâmetros iniciais de
imperfeição geométrica foram medidos e Tabela 3 – Parâmetros geométricos dos
registrados. O diâmetro externo (D) foi medido espécimes após os testes de dobramento.
com um paquímetro em vinte posições em Espécime D (mm) D/t ∆o (%)
torno da circunferência de nove seções T1A 219,28 14,19 0,369
transversais nas proximidades da solda. Um
T1B 219,58 14,70 0,560
transdutor de ultra-som foi usado para medir a
espessura (t) para as mesmas posições onde T2A 219,20 14,23 0,633
os diâmetros foram medidos, totalizando
T2B 218,97 14,37 0,512
quarenta medições de espessura para cada
seção transversal. A partir dos valores de T3A 219,80 14.10 0,579
diâmetro e espessura medidos, foram T3B 219,55 14,65 0,623
calculadas, para cada uma das nove seções
de medições, a ovalização (∆0) e a
excentricidade da parede do duto (Ξ0), Como os deslocamentos dos espécimes no
definidas por: aparato de dobramento são diferentes, tem-se
que os valores de diâmetro e ovalização
medidos após os testes são diferentes para
Dmax − Dmin
∆0 = (1) espécimes fabricados a partir de um mesmo
Dmax + Dmin duto. Além disso, observa-se na Tabela 2, que
e mesmo antes dos testes, existe uma diferença
t max − t min em relação aos parâmetros geométricos de
Ξ0 = (2) espécimes fabricados a partir de um mesmo
t max + t min
duto. Isso se deve ao processo de fabricação,
que não confere ao duto uniformidade de
onde Dmáx e Dmín são, respectivamente, os dimensões no sentido longitudinal.
diâmetros máximo e mínimo e tmáx e tmín são, As dimensões (comprimento e altura) dos
respectivamente, as espessuras máxima e defeitos induzidos, obtidas através de ensaios
mínima encontrados na seção. não-destrutivos, não podem ser apresentadas
As medições de diâmetro externo e ovalização por serem de caráter sigiloso.
foram feitas antes e depois dos testes de
dobramento, de forma que fosse avaliada a 1.2 - Procedimentos experimentais
sua influência sobre esses parâmetros. Após Após o espécime ter sido posicionado no
os testes de dobramento, os valores de aparato de fadiga, e antes do teste, quatro
espessura permanecem constantes, assim extensômetros (strain gages) foram
como os valores de excentricidade. A Tabela 2 posicionados nas regiões da solda e do metal

-3-
base para a realização do teste de 1.3 - Resultados
carregamento, de forma que fossem obtidas O intervalo de tensões adotado nos testes de
medidas de deformação longitudinal. As fadiga foi escolhido baseando-se em curvas S-
cargas adotadas para a obtenção da N disponíveis na literatura que sugerem que,
amplitude de tensão e tensão média para essa faixa de tensões, o número de
desejadas foram então aplicadas ao ciclos de vida à fadiga (N) recai,
espécime, que foi subseqüentemente aproximadamente, entre 105 a 107 ciclos.
rotacionado como no teste de fadiga real, mas Todos os espécimes apresentaram trincas
para um limitado número de ciclos. As passantes antes de 107 ciclos.
deformações foram registradas e as
informações posteriormente processadas para 2 – Análises Numéricas
a obtenção das tensões reais atuantes no
espécime. Caso necessário, então, as cargas As análises numéricas visam a simular apenas
inicialmente aplicadas eram corrigidas para os testes de fadiga, pois as deformações
que os parâmetros de teste de carga plásticas resultantes dos testes de
desejados fossem atingidos. dobramento foram introduzidas no modelo
Os testes de fadiga foram realizados até a numérico através da consideração de
detecção de uma trinca passante. As trincas deformações iniciais.
passantes foram detectadas de forma O modelo numérico foi desenvolvido com o
consistente com o auxílio de uma bexiga de auxílio do método dos elementos finitos,
borracha vedada colocada em torno da região incorporando grandes rotações e deformações
da solda circunferencial e inflada com ar a finitas.
uma pressão de aproximadamente 15 psi O programa comercial ABAQUS [2] foi
(100 kPa), Figura 3. empregado na geração da malha base do
modelo e nas análises de elementos finitos,
enquanto que o programa comercial
ZENCRACK [3] foi usado para gerar a trinca
inicial sobre a malha base e atualizar a malha
ao longo do processo de propagação da
trinca. A propagação da trinca, baseada na
Mecânica da Fratura Linear Elástica (MFLE),
se dá através da espessura do modelo.
Tendo em vista a geometria e a posição do
defeito, condições de simetria foram adotadas
visando a se reduzir o modelo numérico para
1/4 de sua geometria, mostrada
esquematicamente na Figura 4, onde a região
Figura 3 – Bexiga de borracha e sensor óptico da solda é destacada. Os planos 1-2 e 2-3
usado para a detecção de trincas passantes. foram adotados como sendo planos de
simetria.
Como a perda repentina de pressão pode O comprimento do modelo numérico foi
indicar a presença de uma trinca passante no adotado como sendo 2D, onde D é o diâmetro
espécime, a superfície externa da membrana externo da sua seção transversal. No entanto,
foi constantemente monitorada por um sensor admitindo-se a simetria em relação ao plano
óptico ligado ao sistema de aquisição de 2-3, foi modelada apenas metade desse
dados e de controle. No momento do comprimento, ou seja, D. Esse comprimento
esvaziamento da bexiga, o feixe de laser reduzido foi considerado suficiente para que
emitido pelo sensor óptico posicionado em um as tensões resultantes do carregamento no
lado da bexiga atinge o sensor no lado oposto bordo não afetassem a região da trinca. Isso
da mesma, indicando o seu esvaziamento e foi verificado em uma análise numérica
interrompendo automaticamente o teste. preliminar de flexão pura com o modelo sem
Geralmente, trincas passantes detectadas defeito.
dessa forma não eram aparentes por simples A trinca inicial simula o defeito de falta de
inspeção visual. A posterior inspeção com penetração induzido nos espécimes dos testes
líquido penetrante era usualmente suficiente experimentais. O defeito de falta de
para identificar as regiões de falha. penetração na raiz da solda é um defeito
plano, orientado na direção circunferencial, e
pode ser definido através de um comprimento
(c) e uma altura (h) (Figura 4). Considerando a
simetria em relação ao plano 1-2 em x3 = 0,

-4-
apenas metade do comprimento do defeito foi dos resultados, avaliação do crescimento da
representada e posicionada no plano 2-3. trinca e atualização da malha pelo
ZENCRACK, até que este processo seja
interrompido devido à excessiva distorção dos
elementos ou à aproximação da frente da
trinca em relação à superfície externa do
modelo.

2.2 - Propriedades físicas do modelo


numérico
Os espécimes utilizados nos testes
experimentais foram fabricados em aço API 5L
X-60. As propriedades elasto-plásticas do
material dos espécimes foram determinadas
através de testes de tração uniaxial, em
corpos de prova retirados dos dutos originais
empregados na fabricação dos espécimes,
para as regiões do metal base e da solda.
Na Tabela 4 são apresentadas as
propriedades mecânicas médias obtidas
através dos testes de tração uniaxial, onde E é
Figura 4 - Representação esquemática de um
quarto do modelo numérico. o módulo de elasticidade, σp é a tensão de
proporcionalidade e σu é a tensão limite.
2.1 – Procedimentos do ZENCRACK O comportamento elasto-plástico do modelo
Para a geração de malhas em três dimensões numérico foi modelado segundo o critério de
contendo uma ou mais frentes de trinca o escoamento de Von Mises associado à lei de
ZENCRACK adota uma metodologia que fluxo potencial com encruamento isotrópico.
utiliza “crack-blocks”. O termo “crack-block” A propagação de trincas por fadiga foi
refere-se a uma coleção de elementos sólidos simulada numericamente adotando-se a lei de
de 20 nós na forma de um cubo unitário. Um Paris:
arranjo de crack-blocks pode conter frentes de
trinca, cujo plano é posicionado sobre as faces da
= C( ∆K I ) m (3)
dos cubos. A abertura de parte dessa face é dN
permitida sob carregamento, consistindo na
face aberta da trinca. No caso dos crack- onde a é o comprimento da trinca, N é o
blocks do tipo “large”, todas as suas faces são número de ciclos, C e m são constantes do
muito refinadas e os mesmos devem ser material e ∆KI é a amplitude do fator de
conectados ao resto da malha através de intensidade de tensão.
acoplamentos de graus de liberdade. Define-se a razão de tensões por:
O procedimento de geração da malha
contendo a trinca inicial, a partir de uma malha
base sem trincas, é obtido através da σ mín
R= (4)
substituição de um ou mais elementos sólidos σ máx
(de 20 nós) desta malha por crack-blocks que
podem ser conectados entre si para formar as
As curvas da/dN versus ∆K adotadas foram
frentes de trinca. Para que os “large crack-
obtidas para a técnica de soldagem GTAW no
blocks” possam ser utilizados, os elementos
enchimento e na raiz [4]. Para a obtenção
da malha base a serem substituídos devem
dessas curvas foram utilizados corpos de
ser ligados ao restante da malha através de
prova fabricados em aço API X-65. Foram
acoplamentos de graus de liberdade.
obtidas curvas para duas razões de tensões
Para avaliar o crescimento da trinca, o
(R) diferentes, R = 0,1 e R = 0,5, e ainda para
ZENCRACK assume que a sua direção em
cada R foram consideradas duas condições:
qualquer ponto da frente da trinca é dada pela
uma sem deformação longitudinal inicial e
direção da máxima taxa de liberação de
outra com uma deformação longitudinal inicial
energia elástica (Gmáx). A distribuição de Gmáx
de 3%, que simula a deformação sofrida por
ao longo da frente da trinca é obtida a partir
um riser rígido durante o processo de
das análises de elementos finitos realizadas
lançamento pelo método carretel. A Tabela 5
pelo programa ABAQUS.
apresenta os valores de C e m obtidos para as
São realizadas então sucessivas análises pelo
ABAQUS, acompanhadas do processamento

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curvas consideradas, admitindo-se da/dN em um arranjo de três crack-blocks que contém a
mm/ciclo e ∆K em MPa⋅m1/2. trinca inicial.

Tabela 4 – Propriedades mecânicas médias


para o aço API 5L X-60 obtidas através dos
testes de tração uniaxial.
Região E (MPa) σp (MPa) σu (MPa)
5
Metal base 2,1 x 10 486,42 643,01
5
Solda 2,1 x 10 583,97 771,93

Tabela 5 – Valores de C e m para as curvas


da/dN versus ∆K adotadas.
Deformação
R C m
inicial
0 4,06 x 10-9 2,81
0,1 -8
3% 3,48 x 10 2,24
0 8,81 x 10-9 2,83
0,5 -8
3% 3,29 x 10 2,29
Figura 5 – Uma das malhas base de
elementos finitos geradas.
2.3 – Malha de Elementos Finitos
A malha de elementos finitos foi gerada com
O tipo de crack-block utilizado foi o large
elementos sólidos tridimensionais quadráticos
crack-block, que permite que a propagação da
de 20 nós, denominados C3D20 segundo a
trinca possa ser realizada através da
nomenclatura do ABAQUS, com três graus de
espessura sem que seja necessário o
liberdade por nó, correspondentes às
desenvolvimento de uma nova malha ao longo
translações nas direções 1, 2 e 3.
desse processo.
Uma das malhas base, sobre as quais foram
A malha composta pelos crack-blocks, que
geradas as trincas iniciais, é mostrada na
contém a trinca inicial, possui a sua parte
Figura 5, na qual as regiões do metal base e
interna delimitada pela frente da trinca,
da solda são apresentadas em branco e
correspondendo à sua face “aberta”. Admite-
vermelho, respectivamente.
se, assim, que a trinca inicial representa o
A malha é mais refinada na região da solda do
defeito induzido nos testes experimentais.
que na região do metal base, pois esta última
A Figura 6 mostra um exemplo de como a
tem como única função transmitir a carga
trinca inicial é gerada sobre a malha base com
aplicada no bordo à região da solda. Foi
a introdução dos crack-blocks. Na Figura 6 (a)
realizada uma transição suave entre essas
são mostrados os três elementos a serem
duas regiões, de forma que a malha da região
substituídos por crack-blocks, enquanto na
do metal base tenha o seu refinamento
Figura 6 (b) é mostrada a trinca inicial gerada,
reduzido à medida que se afasta da região da
onde os elementos da face “aberta” são
trinca.
apresentados em azul. A Figura 7 mostra a
As malhas foram elaboradas de forma que há
malha do modelo após a introdução da trinca
duas regiões distintas discretizadas em
inicial.
elementos finitos, uma relativa à região em
que a trinca inicial é introduzida (dentro da
região da solda) e outra correspondente ao
resto da geometria do modelo. As malhas
dessas duas regiões são geradas de forma
independente, sendo os nós não coincidentes
nas fronteiras entre as suas superfícies
conectados através do acoplamento de graus
de liberdade.
Em destaque na Figura 5 é mostrada a malha,
contendo três elementos, da região na qual a
trinca inicial é introduzida. O ZENCRACK Figura 6 – (a) Elementos da malha base a
realiza a substituição desses elementos por serem substituídos. (b) Malha da trinca inicial
gerada.

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As malhas mais refinadas (3 e 4)
apresentaram um consumo de tempo
computacional excessivo, além de não terem
demonstrado vantagens para este caso
específico. Comparando-se as malhas 1 e 2, a
última mostra-se mais apropriada, pois os
large crack-blocks geraram radialmente 5
elementos na parte “aberta” da face da trinca
e 5 elementos na parte “fechada”, em
detrimento de 4 e 6, respectivamente, para a
malha 1. Assim, quando a trinca se propaga
através da espessura do duto, a malha 2
apresenta menores distorções dos elementos.
Dessa forma, foram adotados os large crack-
blocks st28x1 e sq112ax4, correspondentes à
malha 2.

Tabela 6 – Performance das malhas


analisadas.
No de
Large
Malh elemento T(1)
Figura 7 – Malha após a introdução da trinca crack- N
a s total da (min)
inicial. blocks
malha
st28x1c /
Para a escolha do tipo de large crack-block a 1 669 169 129672
sq112x4c
ser adotado, foi realizado um estudo de st28x1 /
sensibilidade da vida à fadiga, em número de 2 sq112ax 669 169 128290
ciclos, em relação ao refinamento da malha 4
com diferentes tipos de large crack-blocks.
st248x4 /
Foram consideradas quatro malhas distintas, 3 1493 347 127564
sq496x8
mostradas na Figura 8.
st496x8 /
4 1989 464 126245
sq496x8
(1)
Tempo computacional das análises.

2.4 – Condições de contorno e


carregamento
Para simular as condições de simetria, os
deslocamentos normais aos planos 1-2 e 2-3
são restringidos, respectivamente, em x3 = 0 e
x1 = 0. No entanto, com a introdução da trinca
inicial, os deslocamentos dos nós da face
“aberta” da trinca posicionada no plano 2-3
são admitidos como livres, simulando o defeito
de falta de penetração.
O carregamento foi aplicado sobre um nó de
referência (x1 = D; x2 = x3 = 0) e transmitido ao
bordo correspondente ao plano 2-3 em x1 = D
através da vinculação dos deslocamentos dos
Figura 8 – Malhas utilizadas no estudo de nós desse bordo em relação aos movimentos
sensibilidade de malha. do nó de referência. Essa restrição de
deslocamentos é chamada de “kinematic
Considerando o mesmo tamanho de trinca coupling”. Os movimentos de translação e
inicial, as quatro malhas foram utilizadas para rotação do nó de referência são restringidos.
determinar o número de ciclos de carga (N) A Figura 9 mostra as condições de contorno
necessário para obter-se uma trinca passante após a introdução da trinca inicial, podendo
na parede do duto. A Tabela 6 apresenta os ser visualizados os nós livres da face “aberta”
resultados das análises do estudo de da trinca. A Figura 10 apresenta um detalhe
sensibilidade de malha. das condições de contorno na região da trinca
Verifica-se que todas as malhas forneceram após a sua introdução.
quase os mesmos resultados de vida à fadiga.

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de tração e de momento positivos (+T e +M) e
aplicação de tração positiva e de momento
negativo (+T e -M). O passo de carga
correspondente à aplicação de tração e
momento positivos (+T e +M) é indicado
esquematicamente na Figura 11.

+M

+T

Figura 9 – Condições de contorno após a


introdução da trinca inicial.

Figura 11 – Passo de carga correspondente a


+T e +M.

2.5 - Resultados das análises numéricas e


correlação numérico-experimental
Diversas análises de elementos finitos são
necessárias para propagar a trinca através da
Figura 10 - Detalhe das condições de contorno espessura do duto. Quando a frente da trinca
na região da trinca. se aproxima da superfície externa do modelo
o processo é interrompido devido à excessiva
O carregamento considerado nas análises distorção dos elementos. Dependendo do
numéricas consiste em uma combinação de modelo analisado, foram necessárias de 26 a
momento fletor cíclico (M) sob tração axial 37 análises de elementos finitos para que a
constante (T). A tração axial foi aplicada na propagação da trinca atingisse o limite
direção 1 e o momento fletor em torno da superior determinado. A Figura 12 mostra
direção 3. A determinação de M e T foi feita todas as frentes da trinca desenvolvidas em
com base nos resultados adquiridos nos uma análise completa do modelo T1B.
testes experimentais. O valor do momento Os resultados numéricos, em número de
fletor aplicado é calculado a partir da variação ciclos de vida à fadiga, são apresentados nas
de tensão (∆σ) obtida nos testes Tabelas 7 e 8, respectivamente, para R = 0,1
experimentais, utilizando-se a teoria de vigas e R = 0,5, onde Nnum corresponde ao número
elásticas, através da qual pode-se calcular o de ciclos obtidos.
momento fletor como uma função da tensão Os resultados das análises numéricas foram
normal (σ): comparados com os resultados experimentais,
em número de ciclos de vida à fadiga (Nexp).
π Dm2 t σ Entretanto, por serem sigilosos, os resultados
M= (5)
4 experimentais não podem ser apresentados.
A correlação entre os resultados numéricos e
onde Dm e t são, respectivamente, o diâmetro experimentais foi feita calculando-se a razão
da superfície média e a espessura do modelo (RN) entre Nnum e Nexp. Para a situação em que
e σ=∆σ/2. R = 0,1, RN varia entre 0,99 e 7,78, quando a
A história de carregamento para cada ciclo de deformação inicial é nula, e entre 0,61 e 4,97,
carga é composta de dois passos: aplicação quando a deformação inicial é igual a 3%.
Para a situação em que R = 0,5, RN varia entre

-8-
0,43 e 3,38, quando a deformação inicial é experimentais compreende duas fases:
nula, e entre 0,55 e 4,46, quando a iniciação (nucleação) e propagação da trinca.
deformação inicial é igual a 3%. Admite-se em geral que a duração à fadiga de
uma junta soldada é constituída unicamente
pela fase de propagação, não sendo
importante incluir o período de iniciação da
trinca. Dessa forma, a simulação numérica
baseada na Mecânica da Fratura,
considerando apenas a fase de propagação
de trinca, através da adoção da lei de Paris, é
considerada satisfatória. Na Figura 13 são
mostrados alguns estágios intermediários de
propagação da trinca referentes a uma análise
numérica em que se adotou a curva da/dN
versus ∆K levantada para R = 0,5 sem a
consideração de deformação inicial.
Figura 12 – Frentes da trinca desenvolvidas No caso dos testes experimentais, tem-se que
em uma análise completa do modelo T1B. as fraturas por fadiga dependem não só da
qualidade do material utilizado, mas também
Tabela 7 – Resultados numéricos (R = 0,1). da fabricação e técnica de soldagem adotada,
Espécime R=0,1 estando estes fatores relacionados com as
/ fases de iniciação e propagação de trinca por
Modelo Deformação Deformação
inicial = 0 inicial = 3% fadiga. Assim, esses fatores podem ter
contribuído para as diferenças observadas
T1A 628.795 388.509
entre os resultados experimentais e numéricos
T1B 2.342.739 1.079.385 de vida à fadiga.
Deve-se ressaltar que o fato de as curvas
T2A 554.804 353.994
da/dN versus ∆K adotadas terem sido
T2B 1.620.699 827.250 levantadas com o uso de corpos de prova
fabricados em aço API X-65 e adotando-se a
T3A 1.429.863 737.224
técnica de soldagem GTAW, tanto no
T3B 170.711 169.678 enchimento como na raiz, também pode ter
influenciado nos resultados numéricos de
Tabela 8 – Resultados numéricos (R = 0,5). forma a distanciá-los dos experimentais.
A forma de detecção de trincas passantes nos
Espécim R=0,5 testes experimentais é outro aspecto que pode
e/
Modelo Deformação Deformação ter causado a discrepância entre os resultados
inicial = 0 inicial = 3% numéricos e experimentais. Para que as
T1A 273.478 349.277 trincas passantes fossem detectadas nos
testes experimentais, elas deveriam assumir
T1B 1.031.047 980.548 um tamanho na superfície externa do
T2A 241.064 318.166 espécime suficiente para que as moléculas de
ar pudessem migrar da bexiga inflada para
T2B 713.415 747.467 dentro do duto. No momento em que a bexiga
T3A 625.796 674.701 sofresse esvaziamento, o teste era
interrompido e o número de ciclos registrado.
T3B 73.591 119.001 Em contrapartida, a análise de elementos
finitos era interrompida quando o primeiro nó
A diferença observada entre os resultados da frente da trinca se aproximasse de uma
numéricos e experimentais pode ser explicada distância limite em relação à superfície
considerando-se as diferenças entre a base externa do duto ou por excessiva distorção da
das simulações numéricas realizadas e os malha, não sendo, em ambos os casos,
procedimentos dos testes de fadiga. A identificada a formação de uma trinca
simulação numérica consistiu em uma análise passante. Assim, em alguns casos, o número
com base na Mecânica da Fratura que de ciclos de vida à fadiga obtido nos testes
reproduz a propagação por fadiga de uma experimentais pode ter sido superestimado,
trinca pré-existente segundo uma lei de enquanto que a performance à fadiga obtida
propagação determinada. Entretanto, o nas análises numéricas pode ter sido
fenômeno de fadiga ocorrido nos testes subestimada. Isso pode ter provocado baixas
razões entre Nnum e Nexp em algumas análises.

-9-
considerado como sendo uma trinca inicial
plana, mas de fato corresponde a um espaço
vazio na raiz do cordão de solda e isso pode
ter gerado, em alguns casos, um número
superestimado de ciclos de vida à fadiga
obtido numericamente.
Observa-se que as análises numéricas em
que se adotou a curva da/dN versus ∆K
levantada para R = 0,5 sem a consideração de
deformação inicial obtiveram resultados que
apresentaram uma melhor correlação
numérico-experimental. Os resultados
apresentados a seguir serão relativos a essas
análises.
A Figura 14 mostra um gráfico, em
coordenadas logarítmicas, de faixa de tensão
aplicada (∆σ) versus número de ciclos de vida
à fadiga (N) para os resultados numéricos.
Neste gráfico, também são apresentadas
curvas S-N de projeto para juntas soldadas
circunferenciais de dutos, dadas pela BSi [5]
(E e F2) e pela API [6] (curva X’). As curvas E
e F2 são definidas para desvio padrão igual 2.
O gráfico na Figura 14 apresenta pontos de
fadiga abaixo da curva E, e até mesmo um
ponto abaixo da curva X’. Tal comportamento
também foi observado em alguns testes
experimentais. Isso não significa que as
curvas de projeto sejam inadequadas para
este tipo de junta soldada. Isso de deve ao
fato de que os defeitos induzidos possuem
dimensões superiores às estabelecidas no
critério de aceitação de defeitos. Durante a
fabricação dos espécimes não foi possível, em
todos os casos, gerar defeitos com as
dimensões desejadas, isto é, dentro do critério
de aceitação pré-estabelecido.
500
400

300

200
∆σ (N/mm2)

100
90
80
Figura 13 – Estágios intermediários de 70
60

propagação da trinca. 50
40
X'
30 F2 para d=2
No caso do teste de fadiga do espécime T1A, E para d=2
20 Resultados numéricos para R=0,5
após a trinca ter se propagado através da (sem deformação inicial)

espessura, a sua propagação se deu no


sentido circunferencial, o que fez com que se 10
1E+004 1E+005 1E+006 1E+007
Número de Ciclos
obtivesse um elevado número de ciclos de
Figura 14 - Gráfico de variação de tensão
vida à fadiga como resultado experimental.
versus número de ciclos de vida à fadiga para
Isso acarretou em baixas razões entre Nnum e
os resultados numéricos.
Nexp em todas as análises relativas ao
espécime T1A.
3 – Conclusão
Um fator que pode ter contribuído para as
diferenças entre os resultados refere-se à
Neste trabalho, a performance à fadiga de
forma como o defeito inicial (falta de
SCRs instalados pelo método carretel foi
penetração na raiz) é modelado. O mesmo foi
estudada através de um trabalho numérico e

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experimental. O trabalho numérico [3] ZENCRACK, 2002, “ZENCRACK User
compreendeu o desenvolvimento de um Manual for Zencrack 7.0”, Zentech
modelo de elementos finitos visando a simular International Ltd.
a propagação de trincas por fadiga em [4] de Marco Filho, F., Propagação de Trincas
defeitos de solda de SCRs. de Fadiga em Juntas Soldadas de Aço API 5L
Foram observadas algumas discrepâncias Grau X-65 para Utilização em Risers Rígidos.
entre os resultados numéricos e experimentais Tese de D.Sc., COPPE/UFRJ, Rio de Janeiro,
que podem ser justificadas a partir da RJ, Brasil, 2002.
consideração das diferenças entre a base das [5] British Standard, “Guide on methods for
simulações numéricas realizadas e os assessing the acceptability of flaws in metallic
procedimentos dos testes de fadiga. structures”, BS 7910:1999.
A simulação numérica da propagação de [6] The American Petroleum Institute (2001),
trincas por fadiga consiste em um trabalho API Recommended Practice 2A-WSD (latest
bastante complexo, que envolve diversos edition).
parâmetros e fatores que nem sempre podem
ser levados em conta. Isso torna difícil a
obtenção de uma boa correlação numérico-
experimental. No entanto, o procedimento
numérico desenvolvido mostrou-se bastante
eficiente, apesar dos fatores de discrepância
mencionados.
O trabalho numérico conseguiu definir uma
distribuição dos pontos no gráfico de faixa de
tensão aplicada (∆σ) versus número de ciclos
de vida à fadiga (N) bem “próxima” à obtida
experimentalmente. Neste sentido, está se
colocando que a tendência dos resultados de
fadiga, em relação às curvas de projeto, foi
obtida com sucesso.
É verdade que para as diversas curvas da/dN
consideradas, alguns resultados apresentaram
uma alta discrepância, mas estes ocorreram
para apenas um dos seis espécimes
analisados.
O trabalho realizado demonstrou que a
metodologia de análise desenvolvida é válida.
Entretanto, para que a simulação seja
realizada com sucesso, é necessária a
determinação precisa das propriedades de
fadiga do material para o nível de
carregamento considerado (R).

4 - Agradecimentos

Os autores agradecem ao Programa de


Recursos Humanos da ANP pelo apoio
financeiro dispensado para a realização deste
trabalho.

5 – Referências Bibliográficas

[1] Netto, T.A. et.al., 2000, “Fabrication of


Fatigue Test and Bending Simulator
Apparatus”, Coppetec Report PENO-1421 –
Part I (Plastically Strained SCR´s: Qualification
Program for Installation Methods).
[2] ABAQUS, 2002, “User´s and Theory
Manuals”, Release 6.3, Hibbitt, Karlsson,
Sorensen, Inc.

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