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07/10/2021 SICC (R) 2021 | Sistema de Informação do Contabilista Certificado

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PT26514 - IRC / Gastos fiscais
Quarta, 01 de Setembro, 2021

IRC - Gastos Fiscais

Actualizado em: Quinta, 23 de Setembro, 2021

Numa determinada sociedade por quotas o sócio-gerente paga durante o ano algumas despesas em nome da sociedade
(restaurantes, artigos de limpeza, telefone, artigos de papelaria, combustíveis, etc.) com dinheiro pessoal. A empresa tem saldo
bancário disponível para poder pagar estas despesas ao sócio, mas como ele não necessita deste dinheiro ainda não o levantou.
Quando se lançar estas despesas na contabilidade deve se levá-las a crédito da conta 26 ou 27? Estão estes movimentos sujeitos à
entrega da declaração mensal de imposto de selo e sujeitos a imposto de selo? Se sim, faz-se mensalmente ou anualmente? Podem
estes valores ficar em conta-corrente por prazo indeterminado e o sócio só os receber quando entender?

Noutra sociedade em que o sócio apresenta faturas em nome da sociedade, pagas pela sociedade, com despesas que não são para a
empresa, mas sim para uso pessoal, em que conta devem ser lançados estes valores? Pode ser na conta 268? Sendo uma empresa
que tem um saldo considerável na conta 56 (lucros) não será melhor fazer distribuição de lucros (pagando o respetivo imposto)? Para
saldar esta conta onde vão cair estas despesas pessoais?

Parecer Técnico
Na situação exposta as questões colocadas referem-se ao enquadramento fiscal, em sede de IRC, das despesas pagas em nome de
terceiros.

No caso em apreço são colocadas duas situações:

Questão 1: O sócio paga determinadas despesas relativas a faturas emitidas em nome da sociedade. Em concreto é questionado qual
o registo contabilístico e se esta operação está sujeita a Imposto do Selo.

Questão 2: A sociedade paga despesas pessoais do sócio. Os documentos são emitidos em nome da sociedade. Em concreto é
questionada a contabilização destas operações.

Questão 1

Em termos de Imposto do Selo, estando causa pagamentos de despesas do sócio em nome e por conta da sociedade, importa
começar por efetuar a delimitação entre o reembolso de despesas e os mútuos.

O reembolso de despesas tem a ver com o facto de um terceiro incorrer - ele próprio - numa despesa, titulada em nome da sociedade,
vindo esta a reembolsar o terceiro; o terceiro apresenta à sociedade o documento comprovativo da despesa; a despesa é realizada
pelo terceiro, mas o documento é emitido em nome da sociedade.

No mútuo (empréstimo), o que está em causa é uma das partes emprestar à outra dinheiro, para que esta restitua outro tanto do
mesmo género e qualidade. No mútuo, quem realiza a despesa é o mutuário (no caso, a sociedade) e não o mutuante (no caso, o
sócio), ao passo que no pagamento por conta quem realiza a despesa é o terceiro por conta da sociedade.

Em cada caso, haverá que avaliar se estamos perante reembolsos de despesas ou mútuos. De notar que, a inexistência de contrato
escrito é irrelevante para a qualificação da operação.

No caso em concreto, não se tratando de mútuo, mas meros pagamentos adiantados de despesas da empresa, estas operações não
estão sujeitas a imposto do selo. Todavia, de referir que o procedimento efetuado não é apropriado, devendo o sócio efetuar um
empréstimo à sociedade, quando esta esteja com dificuldades de tesouraria, e sendo a sociedade a efetuar os pagamentos aos seus
credores a partir das suas contas bancárias.

No caso em concreto é referido que o sócio paga as despesas em nome da sociedade e não existe um prazo definido para o
reembolso, sem expectável que seja prolongado no tempo. Assim sendo, há o risco destas operações poderem vir a ser consideradas
operações de financiamento e por conseguinte estar sujeitas a Imposto do Selo.

Face ao exposto, considerando que desconhecemos o entendimento da Autoridade Tributária e Aduaneira sobre esta matéria,
sugerimos que seja apresentado um pedido de informação vinculativa, nos termos do artigo 68.º da Lei Geral Tributária.

Em termos contabilísticos, no Sistema de Normalização Contabilística (SNC), as operações de financiamentos obtidos estão
concentradas numa mesma conta (25 - Financiamentos obtidos), independentemente do tipo de entidades envolvidas.

A conta 25 - "Financiamentos obtidos" do SNC destina-se a registar os financiamentos obtidos, sejam de instituições de crédito
(bancos, sociedades de leasing e outros similares), dos participantes de capital (sócios) ou de outras empresas do grupo.

Esta conta é apresentada no Balanço, na parte do Passivo, mais concretamente na rubrica "Financiamentos obtidos", sendo que as
quantias podem ser apresentadas de modo distinto, em função do prazo de maturidade desses financiamentos, ou seja, de estar
previsto que venham a ser liquidadas num período até doze meses após a data do balanço (passivo corrente) ou a mais de doze
meses (passivo não corrente).

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A conta 253 - "Participantes de capital" destina-se ao registo dos financiamentos obtidos, nomeadamente suprimentos e outros
mútuos, que tenham origem em entidades participantes de capital, pessoas singulares ou outras sociedades.

A conta 254 - "Subsidiárias, associadas e empreendimentos conjuntos" irá destinar-se ao registo dos financiamentos obtidos,
nomeadamente suprimentos e outros mútuos, que tenham origem em entidades participadas pela entidade em causa.

A conta 258 - "Outros financiadores" destina-se ao registo dos financiamentos obtidos de outras entidades que não tenham
enquadramento nas contas anteriores.

Há que ter em atenção que nestas contas apenas devem ser registados os financiamentos obtidos, nomeadamente de sócios, que se
configurem como passivos financeiros, conforme o conceito estabelecido na NCRF 27 - "Instrumentos Financeiros".

O passivo financeiro tem como principal característica a obrigação de entregar dinheiro ou outro ativo financeiro a uma outra entidade,
que tenha sido originada por um contrato, onde normalmente estão estabelecidos condições e custos de reembolso (maturidades e
juros).

Qualquer entrada de dinheiro efetuada pelos sócios, que não tenham estas características de passivo financeiro, devem ser registados
diretamente em capitais próprios, como é o exemplo das entradas de capital social, prestações suplementares ou acessórias.

A conta 26 - "Acionistas/Sócios" do SNC destina-se a registar as operações relativas às relações da sociedade com os titulares de
capital (pessoas singulares ou outras sociedades), agindo enquanto tal.

Na situação em concreto, considerando que estamos perante pagamento de despesas do sócio em nome da sociedade, a operação
não se enquadra em nenhuma das contas anteriores. Assim, os pagamentos das despesas efetuadas pelo sócio em nome da
empresa devem ser contabilizados na conta 278 - "Outros Devedores e Credores".

Questão 2

No pedido de parecer é solicitado a contabilização de determinadas faturas, relativas as despesas pessoais do sócio (pressupomos
que seja sócio-gerente), emitidas em nome da uma sociedade. Em concreto são apresentados os seguintes cenários:

Em termos contabilísticos, importar começar por referir que a contabilidade deve basear-se nas operações realizadas no período, com
o objetivo de se preparar e apresentar demonstrações financeiras que contenham a posição financeira e o desempenho económico
verificado nesse período, independentemente de outros formalismos legais.

Para melhor entendimento do conceito de posição financeira e desempenho, a seguir transcrevemos os §§ 49, 68 e 69 da Estrutura
Conceptual (EC):

"49 -Os elementos diretamente relacionados com a mensuração da posição financeira são os ativos, os passivos e o capital próprio.
São definidos como segue:

a) Ativo é um recurso controlado pela entidade como resultado de acontecimentos passados e do qual se espera que fluam para a
entidade benefícios económicos futuros;

b) Passivo é uma obrigação presente da entidade proveniente de acontecimentos passados, da liquidação da qual se espera que
resulte um exfluxo de recursos da entidade incorporando benefícios económicos; e

c) Capital próprio é o interesse residual nos ativos da entidade depois de deduzir todos os seus passivos.

68 - O resultado é frequentemente usado como uma medida de desempenho ou como a base para outras mensurações, tais como o
retorno do investimento ou os resultados por ação. Os elementos diretamente relacionados com a mensuração do resultado são
rendimentos e gastos. O reconhecimento e mensuração dos rendimentos e gastos, e consequentemente do resultado, depende em
parte dos conceitos de capital e de manutenção do capital usados pela entidade na preparação das suas demonstrações financeiras.
Estes conceitos são tratados nos parágrafos 100 a 108.

69 - Os elementos de rendimentos e de gastos são definidos como se segue:

a) Rendimentos são aumentos nos benefícios económicos durante o período contabilístico na forma de influxos ou aumentos de
ativos ou diminuições de passivos que resultem em aumentos no capital próprio, que não sejam os relacionados com as contribuições
dos participantes no capital próprio; e

b) Gastos são diminuições nos benefícios económicos durante o período contabilístico na forma de exfluxos ou deperecimentos de
ativos ou na incorrência de passivos que resultem em diminuições do capital próprio, que não sejam as relacionadas com
distribuições aos participantes no capital próprio."

É também necessário atender que as demonstrações financeiras devem ser preparadas e apresentadas atendendo ao pressuposto do
regime do acréscimo (§ 22 da EC). Isto é, devem ser reconhecidos gastos e rendimentos no período a que digam respeito
independentemente do momento da emissão ou receção das faturas, ou dos pagamentos e recebimentos.

De acordo com o § 92 da EC "os gastos são reconhecidos na demonstração dos resultados quando tenha surgido uma diminuição dos
benefícios económicos futuros relacionados com uma diminuição num ativo ou com um aumento de um passivo e que possam ser
mensurados com fiabilidade. isto significa, com efeito, que o reconhecimento de gastos ocorre simultaneamente com o
reconhecimento de um aumento de passivos ou de uma diminuição de ativos (por exemplo, o acréscimo de direitos dos empregados
ou a depreciação de equipamento)".

Por último, o § 93 refere que "os gastos são reconhecidos na demonstração dos resultados com base numa associação direta entre
os gastos incorridos e a obtenção de rendimentos específicos. Este processo, geralmente referido como o balanceamento de gastos

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com réditos..."

Resumidamente, podemos dizer que em termos contabilísticos devemos reconhecer gastos com base numa associação direta com
os réditos obtidos e quando tenha surgido uma diminuição de ativo ou aumento de um passivo.

Em termos de IRC, para a determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo
sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC, conforme previsto no n.º 1 do artigo 23.º do Código desse
imposto.

O artigo 23.º do CIRC dá primazia ao facto do gasto ser efetivamente incorrido no exercício da atividade do sujeito passivo. Neste
artigo, são também definidos requisitos mínimos quanto ao tipo de documento suporte da operação, sendo inclusivamente limitada a
dedutibilidade fiscal do encargo nos casos em que este deve ser suportado por fatura

Existe ainda a obrigação de todos os sujeitos passivos de IRC, bem como os sujeitos passivos de IRS que disponham ou devam dispor
de contabilidade organizada, estarem obrigados a possuir, pelo menos, uma conta bancária através da qual devem ser,
exclusivamente, movimentados os pagamentos e recebimentos respeitantes à atividade empresarial desenvolvida, conforme o n.º 1
do artigo 63.º-C da Lei Geral Tributária (LGT). Logo, não é admissível que despesas de caráter pessoal dos sócios sejam pagas através
das contas da sociedade.

Considerando o anteriormente exposto, o Contabilista Certificado deverá proceder ao registo contabilístico, de todas as operações,
tendo por base as normas contabilísticas, tendo na sua posse os adequados documentos justificativos, datados e suscetíveis de
serem apresentados sempre que necessário, de acordo com a alínea a) do n.º 2 do artigo 123.º do Código do IRC (CIRC).

Deste modo, os encargos suportados com a aquisição de bens e serviços para consumo pessoal de um sócio muito dificilmente
poderá ser considerado como indispensável numa ótica empresarial, pois o uso destes bens, não se esgota com o exercício das
funções.

A aquisição de bens e serviços pelo sócio, poderá também ser considerado como rendimento do trabalho dependente, ou seja, ficam
sujeitos a tributação, por força do n.º 2 do artigo 1.º do CIRS os rendimentos mencionados, quer em dinheiro quer em espécie,
determinando-se o valor destes de acordo com as regras estabelecidas no artigo 24.º do CIRS.

Essa remuneração acessória não será considerada para a determinação de retenção na fonte da Categoria A, pois está excecionada
no n.º 1 do artigo 99.º do CIRS, não há retenção na fonte sobre os rendimentos em espécie de acordo com a alínea a) do n.º 1 do
artigo 99.º do CIRS.

De acordo com o n.º 2 do artigo 99.º-C do CIRS, "considera-se remuneração mensal o montante pago a título de remuneração fixa,
acrescido de quaisquer outras importâncias que tenham a natureza de rendimentos de trabalho dependente, tal como são definidos
no artigo 2.º, sem prejuízo do disposto no número seguinte".

Sendo considerado rendimento do trabalho dependente, deverá constar na declaração mensal de remunerações (DMR).

Sendo o sócio um dos gerentes da empresa ou trabalhador da mesma o pagamento de despesas pessoais, é considerado como um
rendimento em espécie, pelo que deverá ser contabilizado na conta 63X "gastos com pessoal", sendo fiscalmente aceite na medida
em que é tributado na esfera do trabalhador.

De todo o modo, deve ser evitado que despesas de caráter pessoal de sócios (ou sócios-gerentes) e trabalhadores sejam faturadas e
pagas pela empresa, a menos que sejam consideradas como integrantes da remuneração dos trabalhadores e gerente.

Face ao exposto, no caso em apreço, estamos perante despesas pessoais que poderão ser enquadradas como rendimento de trabalho
dependente, devendo ser declarado como rendimento em espécie na DMR nos códigos A63 a A67 (dependendo do tipo de despesas)
ou código A (nos casos em que não couber nos códigos A63 a A67).

Sendo considerado rendimento de trabalho dependente, as faturas poderão ser contabilizadas na conta 63x - Gastos com o pessoal,
sendo este gasto aceite fiscalmente.

No caso de as despesas não serem consideradas rendimento do trabalho dependente, as faturas devem ser contabilizadas na conta
688X - "Gastos não aceites" e acrescer no Quadro 07, campo 752 da Modelo 22.

Nesta hipótese, chamamos a atenção que se pode presumir que se trata de saídas de verbas que reverteram a favor dos sócios
devendo ser aplicado o tratamento que normalmente é dado aos adiantamentos por conta de lucros (são considerados como
rendimentos de capitais - categoria E do IRS), dando lugar à correspondente retenção na fonte à taxa de 28% [artigo 71.º, n.º 1, alínea
a) do CIRS].

No caso de o sócio devolver os valores à sociedade, esta deve emitir uma fatura ao sócio com o débito de todas as despesas
suportadas.

Em resumo, não se verificando as condições para aplicação da alínea c) do n.º 6 do artigo 16.º do CIVA, o débito de encargos deve
processar-se da seguinte forma:

- Se for efetuado sem qualquer discriminação, a liquidação deve fazer-se à taxa normal;

- Se o débito se fizer de forma discriminada, segundo a natureza de cada um dos componentes da despesa, a respetiva tributação far-
se-á à taxa prevista para cada um deles no artigo 18.º do CIVA;

- No caso de se tratar de despesas isentas ao abrigo de uma qualquer disposição do Código do IVA ou de operações não sujeitas a
imposto porquanto não se podem subsumir nas regras de incidência daquele código, o respetivo débito beneficiará igualmente
daquela isenção ou daquela não sujeição.

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