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Formação em Teologia

Volume 11

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Ética cristã – piedade segundo Jonathan Edwards (parte 3)


Entender a vida cristã é entender a piedade. Infelizmente essa palavra foi
perdendo o significado com o passar do tempo. O uso comum que diz “Tenha
piedade de mim.” limita a piedade a um ato de caridade ou pedido de desculpas,
mas, quando a Bíblia usa a palavra piedade, abrange todos os aspectos da vida
cristã. Piedade diz respeito à devoção, a busca das coisas espirituais, a busca por
tudo que envolve o reino de Deus. Piedade é a própria definição da vida cristã, logo,
quando usamos a expressão piedade, não estamos falando em alguma caridade ou
ato de benfeitoria, estamos pensando justamente em vida cristã, em buscar a Deus,
ter intimidade e viver Seu propósito.
Em capítulos anteriores conversamos sobre os diferentes princípios éticos e
as formas pelas quais as matrizes de pensamento impulsionam as nossas decisões.
Na Bíblia, o livro de Provérbios é constituído de máximas, isto é, conceitos que
alimentam de sabedoria a nossa alma para tomarmos a decisão correta. Quando
nos referimos à piedade, contamos com um conjunto de significados e doutrinas
bíblicas que nos norteiam para sermos o que fomos planejados para ser.

Dica
Assista às aulas “Doutrinas da Salvação”, elas ajudarão a capturar a essência da
vida cristã e a entender que o Evangelho e a obra de Cristo é que norteiam nossas decisões.

Vamos basear nosso estudo n’As Firmes Resoluções”, obra de Jonathan


Edwards, notável pastor que influencia gerações até os dias de hoje. Pensaremos a
vida cristã a partir de alguns livros para aproximar a realidade, ajudando a unir o
conceito de vida cristã à prática. No exemplo desse pastor comum num lugar
comum, esse livro ajudará a analisar as decisões que ele tomou quando ainda muito
jovem e tinha o objetivo de que fossem como uma bússola para a alma.

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I Santidade

Santidade tem a ver com essência e afeta drasticamente o relacionamento


com a vida, os outros, comigo mesmo e com Deus. Santidade não é um ritual ou um
ato formal. Longe de ser um evento ritualístico, de horas gastas orando, de quantos
dons se dispõe e de quantos livros foram lidos, a santidade é percebida nos
relacionamentos. A vida cristã precisa estar dominada por Deus e a ética cristã
debaixo senhorio de Cristo.
George Whitefield e Jonathan Edwards são os dois personagens principais
do primeiro grande avivamento (1700) depois da reforma protestante (1500). O pai
de Jonathan Edwards estudou na universidade de Harvard e Edwards foi o terceiro
reitor da Universidade de Princeton, ficando lá por 5 meses e logo depois faleceu.
Esse avivamento impressiona pois não surge dentro de uma igreja, mas a partir do
ambiente universitário e afetou as igrejas, a nação e, de certa forma, o mundo todo.

II Marcas da Obra do Espírito Santo

Em 1741 Edwards escreveu sobre as marcas da autêntica obra do Espírito


Santo. Vamos comparar o que ele disse em 1741 com o que se pensa hoje:

1ª marca: aumentar a consideração por Jesus Cristo. Significa que quando o Espírito Santo
está trabalhando na vida de alguém, essa pessoa passa a se importar mais com Jesus
Cristo. Essa preocupação e cuidado em viver para Cristo aumentam dentro do coração e
não é simplesmente uma questão religiosa, denominacional ou coisa semelhante, Cristo se
torna importante numa medida muito maior em nós. Perguntando a muitos cristãos sobre
a importância e lugar de Cristo, a maioria responderá clichês como “Ele é tudo para mim”,
e obviamente essa resposta está certa, mas é preciso cuidado para não cair no abismo
entre discurso vazio e vida prática. Se Jesus Cristo é importante precisa-se demonstrar.
Isso é fundamental.

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2ª marca: levar as pessoas a deixarem suas corrupções rumo ao reino de Deus. A justiça
de Deus traz a percepção de que existe corrupção dentro de nós e que devemos estar
constantemente atentos a esse fato, buscando ser renovados pela graça do evangelho.

3ª marca: fome das coisas de Deus. Referimo-nos especificamente à Bíblia; fome de


conhecer a Palavra.

4ª marca: as verdades do Evangelho começam a ser fundamentadas. Deixam de ser uma


coisa distante, com status de conto ou lenda, e passam a ser real e nossa, ganhando um
lugar vívido em nossa mente e coração.

5ª marca: o amor pelas pessoas se torna cada vez mais profundo e visível. Assim, o amor
de Deus em nós leva a amar mais o próximo(s). Se o amor e o cuidado pelos outros
diminuem, mas afirmamos que o Espírito Santo está fazendo uma obra incrível em nós,
estamos longe da verdade.

Por volta do ano de 1900, parte da igreja começou a entender e ensinar os


dons como evidência do Espírito. Intimidade não tem a ver com códigos, rituais ou
habilidades, mas com o agir do Espírito Santo em nós, e por consequência,
enxergamos os pequeninos do Senhor - aqueles que estão nus, com fome e sede -
e os suprimos. Quando se começa a ver esses pequeninos, a intimidade com Deus
começa a ser real.
Lembrando nossa referência, As Firmes Resoluções, de Jonathan Edwards,
ele as escreve como se fossem uma marca, uma indicação. Edwards quer saber
para onde vai e entende que é necessário ter uma referência para avaliar a própria
vida. Ele busca um ponto de comparação para ver se estamos fazendo, ou apenas
falando, em nome de Deus. Estamos no Caminho ou tomando algum atalho?

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III Como foram escritas as Resoluções?


O desejo pelo foco nas coisas espirituais, que considerava serem as mais
importantes, o tornaram um dos maiores pensadores da sua época. Jonathan
Edwards buscava colocar todas as áreas da sua vida sob o senhorio de Jesus e
ansiava por santidade. Alertamos novamente para a real definição de santidade,
que se revela na forma que nos relacionamos com a vida.
As resoluções de Edwards são verdadeiras diretrizes para a autoavaliação,
partindo de uma forte base bíblica, de onde tirava as suas convicções, sentimentos
e pensamentos, Edwards compreendia a própria incapacidade e queria a
santificação, mas estava ciente de que não conseguiria gerá-la por suas próprias
mãos porque Deus é o agente da santificação. Vontade, decisão e esforço são
importantes, mas é Deus quem dá santidade.
Edwards entendia que tudo é obra da graça. Ele descobriu que as ações de
Deus estavam acima dos esforços dele. E até mesmo esse esforço é a graça que
produz em nós, e testemunha que tudo isso acontecia na dependência do Espírito.
O esforço não substitui a graça e sem ela qualquer esforço é irrelevante. No século
XXI é compreensível que o esforço influencie diretamente nas conquistas. Sabemos
que sem esforço não conseguimos chegar a lugar nenhum. Por outro lado,
precisamos compreender que a base do esforço é outra, graça. Se notarmos bem,
perceberemos que há pessoas que se esforçam e outras não; dentre as pessoas que
se esforçam, veremos que existem esforços que não dão em nada e os que
prosperam. Há trabalho que se transforma em vida, há trabalho que se multiplica.
Não somente referente ao sucesso profissional, mas na transformação da realidade
em algo bom e positivo.

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IV O esforço na realidade do Brasil

Ao contrário do que muitas pessoas pensam e apesar de tantos feriados, o


Brasil tem uma das maiores cargas horárias de trabalho no mundo. Apesar disso,
o esforço do brasileiro nem sempre frutifica e os resultados passam longe do lema
na bandeira, “Ordem e Progresso”. Nem todo esforço alcança êxito e Jonathan dizia
que existe uma peça que precisa se encaixar ao esforço, essa peça é a graça. Ele
insistia que não podia fazer qualquer coisa sem ajuda de Deus e não presumia ter
habilidade de cumprir sozinho seus votos. Ele buscava depender completamente
do Espírito Santo:

“Eu quero fazer, eu planejo fazer, eu intenciono fazer, mas, antes de intencionar,
saber que toda essa obra de santificação, conceituando de forma mais plena, é viver
do jeito que Deus quer. Santificar não tem a ver com movimento daquilo que
acontece exclusivamente dentro da igreja. Santificação tem a ver com movimento
de viver em todos os lugares de forma que glorifique o nome do Senhor.”

Segue uma breve citação do escrito de 1722:

“Quarta-feira, 2 de janeiro de 1722-23. Inerte. Descobri, por experiência própria,


que mesmo fazendo resoluções e elaborando tantas estratégias para cumpri-las,
como nunca aconteceu antes, tudo isso é nada e não tem propósito algum sem o
mover do Espírito de Deus. Se o Espírito de Deus deixasse de se manifestar em
mim, como ocorreu na semana passada, apesar de tudo o que faço, eu não
cresceria, mas definharia e desvaneceria miseravelmente.”

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Uma coisa é tomar uma resolução, outra é manter essa resolução. Outra
coisa completamente diferente é tomar uma resolução, mantê-la e ver essa
resolução frutificando de maneira adequada, glorificando a Deus. São elementos
distintos: tomar resolução, manter resolução e ver que essa resolução está
frutificando de maneira que glorifique a Deus. Observe o próximo trecho:

“Quarta-feira, 9 de Janeiro. Noite. Enganoso é o meu coração; tomo uma


firme resolução, mas tão cedo ela enfraquece. 15 de janeiro, Terça-feira. Ai de mim!
Como declino rápido ou quão fraco, quão instável, quão incapaz de fazer qualquer
coisa sozinho.”

Esse trecho revela uma situação muito comum, quando tomamos a decisão
e sabemos que era a melhor opção. Passa um tempo e percebemos que manter
aquela resolução parece impossível. A sua decisão, conscientemente, é o melhor
que podia ser feito, mas o dilema que surge é de que forma sustentar as decisões.
Atente para a primeira parte da citação, em 9 de janeiro. Edwards já estava triste,
sabia que não estava tão forte. Em 15 de Janeiro ainda continuava triste porque o
tempo está passando e ele percebe que não consegue dar conta daquilo que tem
de fazer, em outras palavras, “Decidi e agora?”. Muitos têm dificuldade de decidir,
mas existe outra dificuldade, manter a decisão. A graça precisa encontrar tanto o
esforço quanto as resoluções. Vamos pensar na tecnologia como exemplo: Um
pensamento comum era de que quando a tecnologia chegasse, a humanidade
avançaria. Hoje presenciamos o avanço tecnológico e percebemos que só a
tecnologia não é suficiente para resolver os problemas do mundo. Precisamos de
tecnologia, mas também de ética e caráter para que as pessoas usem a tecnologia
na solução de problemas pois só a tecnologia não vai resolver os problemas (pelo
contrário).

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Em nossos esforços precisamos enxergar que há algo anterior e superior,


mais poderoso que a realidade humana, a graça. Edwards encontrou o mesmo
problema que nós, tomamos uma decisão, mas depois vem a apatia, uma fraqueza
tamanha que faz com que pareçamos pessoas completamente diferentes das que
tomaram aquela atitude no momento anterior.
A partir daqui, usaremos os termos santidade, ética e vida cristã como
sinônimos. Vamos relacionar esses nomes para que isso comece a fazer mais
sentido. Dentro dessa estrutura de santidade, é primordial a rendição completa a
Deus e a anulação do senso de propriedade. O centro do problema jaz na nossa
rebeldia. Se Deus é o ser perfeito do universo, se nós estivermos rendidos a Ele,
seremos levados aos melhores lugares possíveis, mas sem rendição pior será.
Edwards entendia algo essencial: “Não sou meu em nenhum aspecto; a minha
língua, minha fala, meu corpo, eu não sou meu.”

V A Prioridade de todas as Resoluções?

Ética cristã tem a ver com realizar todas as coisas para glorificar a Deus.
Temos que abrir a mente, dar glória a Deus não tem relação com o ato do culto
dentro da igreja, a glória a Deus é um movimento muito mais completo e complexo.
Pastor de uma igreja, Edwards recebeu convites para pastorear as igrejas mais
influentes da época, mas ele entendeu que se fosse para uma dessas igrejas não
daria glória a Deus e acabou ensinando numa tribo indígena, entendendo que
naquele momento, a ação dele que mais glorificaria o nome do Senhor era cuidar
dos índios. É necessário perceber quais são as nossas motivações e o porquê de
continuarmos.

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A Ética Cristã não é um objeto de trabalho, opinião ou concepções, é viver


para a glória do Pai. O ponto central da ética cristã é o que nos move. Podemos ter
razões secundárias e egoístas ou podemos ser movidos em tudo para glória de
Deus. Pense em cada ação de sua vida para a glória de Deus: trabalhar, comer e
beber, viver e se relacionar. A ética cristã é marcada por um princípio: tudo que
fizer, faça para a glória de Deus:

“Farei tudo que considerar ser o mais importante, para a glória de Deus,
resolvi fazer da Glória de Deus o sumo bônus, meu supremo bem. Tudo que eu
decidir fazer, eu decido fazer porque em última instância, sei que isso irá glorificar
o nome do Senhor.”

Bibliografia sugerida:

EDWARDS, Jonathan. As Firmes Resoluções.

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