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Anne Grace Gomes
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Mestranda. Universidade Estadual de Londrina. E-mail: anne.ss@hotmail.com.
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1. INTRODUÇÃO
pobreza - ganham cada vez mais visibilidade no cenário brasileiro, e tem focalizado suas
ações crescentemente no público feminino, com o objetivo de superação da condição de
pobreza e dependência financeira de mulheres, muitas vezes chefes de família. Os
pressupostos para se alcançar o que se chama de conquista de autonomia financeira e
empoderamento, são materializados através da promoção de cursos de costureiras,
rendeiras, doceiras, entre outras atividades, que, claramente remetem-se às funções
historicamente concebidas como tarefa feminina, e que por sua vez, também foram as
principais causas para invisibilidade da mulher na sociedade.
O presente artigo, portanto, tem como objetivo principal a análise da fragilidade
da proposta da geração de renda para mulheres ao abordar a questão de gênero, partindo-
se da hipótese que estas ações não são agentes de promoção, visto que reforça uma
“condição feminina” que por anos tem sido o veículo de exclusão, em todas as esferas,
principalmente o mundo do trabalho.
Kon (2001) entende que este padrão de absorção da mão de obra feminina pelo
capitalismo industrial teve maior ênfase nos países menos desenvolvidos com situações
econômicas tidas como desfavoráveis. Esta realidade justificou o fato de que, a presença
das mulheres no mercado de trabalho, devia-se a necessidade de elevar a renda para a
sobrevivência da família, ou seja, “de um maior número de pessoas da família trabalhando,
quando a oferta dessa mão de obra muitas vezes cria suas oportunidades de trabalho (KON,
2001, p.286).
Na conjuntura brasileira, para Nogueira (2006) é difícil realizar estudos que
dimensionem a distribuição do trabalho feminino nos ramos de atividades econômicas no
início da abertura produtiva no país. É a partir de 18723, que se levantam os primeiros dados
acerca da mão de obra feminina no mercado de trabalho, ficando exposto que 45,5% da
classe trabalhadora era formada por mulheres, e deste número, 1/3 estava alocada no
emprego assalariado doméstico (SAFFIOTI, 1976, p.238 Apud NOGUEIRA, 2006, p.53).
Esta presença feminina no mercado de trabalho se mantém ainda em 1900, no
entanto, mesmo com a crescente presença da mulher na indústria – em virtude da escassez
de mão de obra masculina – os postos de ocupação que mais absorvem a mão de obra das
mulheres, são os referentes a esfera doméstica, o que indica a profissionalização da
atividade ocupada por elas historicamente.
[...] No entanto ocorreu uma alteração nos espaços onde as mulheres desenvolviam
seu trabalho: da totalidade das mulheres economicamente ativas, 52,6 % se
encontravam em serviços domésticos, 24,6% se dedicavam a agricultura, 14,2% às
artes e ofícios e somente 4,2% às indústrias manufatureiras, sendo que o restante
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O trabalho doméstico, embora fundamental dentro da estrutura do modo de produção capitalista, não era
considerado trabalho.
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Data do primeiro censo brasileiro.
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social. O modelo de família reconhecido como pai, mãe e filhos, passou por profundas
mudanças, e embora ainda seja modelo, não se aplica mais a todas famílias da atualidade.
[...] Este modelo ideal de família que orientou e em alguns casos ainda orienta as
políticas sociais seria o de uma família formada por um casal heterossexual,
legalmente casado, com dois filhos (um de cada sexo) e todos vivendo em casa
própria, onde o marido seria o principal provedor e a mulher a dona de casa, ou que
trabalha em tempo parcial [...] (GOLDANI, 2002, p.33).
[...] A pobreza está rapidamente se tornando num problema feminino. Ela associa
este processo de empobrecimento das mulheres ao aumento na proporção de
famílias pobres chefiadas por mulher. Para ela, essas famílias são aquelas onde há
apenas um adulto do sexo feminino e nenhum adulto do sexo masculino [...]
(PEARCE, 1978, p.28 Apud NOVELLINO, 2004, p.03).
[...] Surpreende constatar que a renda das mulheres pobres corresponde apenas 5%
da renda de todas as mulheres (pobres e não pobres), demonstrando que as
desigualdades de gênero que colocam mulheres pobres e não pobres em
desvantagem frente ao sexo oposto, por deterem tão somente ¼ de todas as
rendas, somam-se no caso das mulheres pobres, profundas desigualdades
decorrentes do quadro extremamente perverso da concentração de renda no país
[..] (LAVINAS, 1993 Apud NOVELLINO, 2004, p.6).
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
sim, considerado como de real importância à economia, a medida que vende sua força de
trabalho, produz e gera mais valia.
A desvalorização do trabalho feminino implicou no cerceamento das
possibilidades de que a mesma, através do seu trabalho, conquistasse seu sustento. Este
panorama acrescido das mudanças pelas quais a família atravessou (onde o homem não
está necessariamente presente) trouxe a mulher um complexo de desafios, tendo sido o
principal deles, a necessidade de inclusão no mercado produtivo. Para então desempenhar
o papel “provedor” frente a solicitude da família, mulheres se marginalizaram no mundo do
trabalho, na proporção que foram assumindo trabalhos precarizados, instáveis, com salários
menores que os dos homens e ainda com jornada dupla (afinal, que cuidaria dos serviço
domésticos, se é papel da mulher?). Estes fatos foram fundamentais para o aprofundamento
da pobreza entre as mulheres, e por conseqüência, a sua incapacidade de manter um
determinado nível de subsistência para seus dependentes.
Logo, tornando-se pauta da agenda pública, este segmento de mulheres pobres
constitui-se alvo de um conjunto de políticas que visam o enfrentamento a pobreza, e na
forma de grupos de geração de renda, encontram a instrumentalidade necessária para a
superação da pobreza e autonomia financeira. Todavia, a política pública de que se trata
aqui, nada mais é do que política para mulher pobre, esvaziada do conteúdo de gênero, que
é a discussão de prima relevância para se compreender as causas do fenômeno.
Ao passo que são desenvolvidos cursos de doceiras, costureiras, cabeleireiras,
entre outras funções que lembram a vida doméstica, a pergunta a ser feita é: como objetivar
autonomia financeira com atividades, que historicamente, marginalizaram a mulher na
sociedade? De modo geral, os grupos de geração de renda atuais, que se destinam às
mulheres pobres, acabam por caminhar na contramão da história, uma vez que reforçam
uma identidade doméstica à mulher, que sabidamente, a subalternizou e subalterniza na
sociedade de classes, contribuindo para a manutenção das relações desiguais de gênero.
Pensar em uma política pública na perspectiva de gênero requer a mobilização de esforços
para a ruptura de paradigmas e (re) construção de alternativas que, de fato, promovam a
autonomia financeira dessas mulheres e dêem visibilidade a mulher no mundo do trabalho.
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Referências Bibliográficas
CARLOTO, C.M. Políticas Públicas, Gênero e Família. In: Serviço Social em Revista, Vol.
5 – Número 1. Londrina: UEL, Jul/Dez 2002.
FARAH, M.F.S. Gênero e Políticas Públicas. In: Estudos Feministas, Florianópolis, 12 (1):
360, Janeiro-Abril/2004.
GOLDANI, A.M. Família, Gênero e Políticas: famílias brasileiras nos anos 90 e seus
desafios como fator de proteção. In: Revista Brasileira de Estudos de População, V.19, n.
1, Jan/Jun, 2002.
WHITAKER, D. Mulher & Homem: O mito da desigualdade. São Paulo: Editora Moderna,
1988.