UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO

INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS

DEPARTAMENTO DE LETRAS
LET820 – ANÁLISE DO DISCURSO – PROF. MELLIANDRO MENDES GALINARI
DISCENTE: SHEILA ROSE TOMAZ PIRES CANDIDO

A publicidade Dove Firming sob a perspectiva da Análise do Discurso

Os textos publicitários são excelentes materiais para serem analisados sob a

perspectiva teórica da Análise do Discurso. Para Orlandi, essa área tem como
finalidade entender como um objeto simbólico produz sentidos, como ele está
investido de significância para e por sujeitos.

Esta análise tem como objetivo refletir sobre possíveis sentidos atribuídos à
publicidade Dove Firming, identificando as posições dos sujeitos e a sua formação
discursiva e ideológica.

Os interlocutores são os componentes envolvidos na construção de sentidos. Dessa

forma, segundo Orlandi (2001, p.31) o texto não deve ser entendido como uma
unidade fechada em si mesma, e que para que faça sentido é preciso que o
interdiscurso seja acionado pelos sujeitos leitores, ao passo que o locutor, por meio
de dizeres, afeta o modo como o sujeito interpreta determinada situação discursiva,
sendo que esse sujeito também está inserido em uma realidade e em um contexto.

No papel de locutor do discurso temos a Dove que em 2005 lançou no Brasil a

campanha Real Beleza, divulgada em mídias eletrônicas e revistas impressas. O
foco desta análise será uma das imagens dessa campanha em anexo. Por meio de
uma linguagem não verbal, vemos sete mulheres de pele branca, usando roupas
íntimas brancas, cor essa que remete ao componente da fórmula dos produtos da
Dove que é o leite. Essas mulheres demonstram bem-estar, alegria e leveza. No site
da Dove, encontramos a intenção dessa publicidade que é “mostrar que as
mulheres, ainda que não estejam no padrão “ideal” podem ser belas e felizes”. Essa
tal concepção afeta a autoestima do público-alvo e torna-se uma estratégia de
marketing.

Orlandi (2001, p. 38) afirma que “todo dizer é ideologicamente marcado e é na

língua que a ideologia se materializa. Nas palavras dos sujeitos. [...] o discurso é o
lugar do trabalho da língua e da ideologia”. Portanto, sabemos que no século XXI a
ideologia que prevalece na sociedade moderna é que as mulheres devem ser
inteligentes, profissionais bem-sucedidas, mães e esposas, e além de tudo devem
ter um cuidado estético se enquadrando nos padrões de beleza – serem magras,
usarem roupas da moda e de marca, maquiagem, cabelos e unhas impecáveis.
Nessa campanha ocorre uma tentativa de desmistificar os estereótipos presentes na
sociedade, acionadas pela memória discursiva dos sujeitos, visto que todo discurso
faz sentido a partir de outros, já-dito, sedimentados no meio social. Apesar dessa
publicidade mudar o seu público alvo colocando mulheres comuns sem estereótipos
do mundo da moda, a fim de fazer com que as consumidoras sintam-se
representadas e se reconheçam no “outro”, percebemos que a mulher branca ainda
é presente e não ocorre a representatividade de mulheres negras.

O slogan da campanha é curto, sendo composto por um substantivo antecedido do

adjetivo, ordem que não é convencional segundo a gramática. Porém, se ao invés
de Real Beleza, a campanha fosse Beleza Real, seguindo a convenção da Língua
Portuguesa, essa opção poderia trazer ambiguidade de sentidos não desejada. A
palavra “real” é polissêmica e pode significar, segundo o minidicionário Houaiss
(2009), verdadeiro, aquilo que existe ou ainda, que está ligado ao rei, à realeza.
Portanto, a “beleza real” poderia ser confundida ou relacionada à beleza da corte,
das rainhas.

Referente as condições de produção, a publicidade está voltada explicitamente para

público feminino, mulheres adultas, da classe média, vaidosas, que se cuidam e se
preocupam com a sua estética corporal.
Além dos aspectos ilustrativos da imagem também temos o enunciado “Ao contrário
das outras modelos desta revista, nós estamos aqui para mostrar curvas reais.
Sistema firmador Dove testado em curvas de verdade”. Ao analisar a primeira parte
desse enunciado “Ao contrário das outras modelos desta revista”, vemos uma
tentativa de descontruir uma ideologia de que as demais publicidades trazem
mulheres dentro dos padrões da moda enquanto que a Dove apresenta mulheres
com “curvas de verdade”, “imperfeitas”. Ao analisar esse enunciado temos também o
uso do ethos ao tentar trazer uma credibilidade e uma identificação com o público.
De acordo com a retórica de Aristóteles, o ethos é particularmente importante para
criar interesse no público e por isso, o tom e o estilo da mensagem serão
fundamentais para isso. Além disso, é a forma como o orador convence o público de
que está qualificado para falar sobre o assunto. Essa forma de convencimento
vemos nesse enunciado e também na imagem ao tentar trazer mulheres fora dos
padrões impostos pela sociedade, dizendo que essas são as “curvas de verdade”.
O logus é outra estratégia discursiva que percebemos quando inferimos que o
produto funciona e que mulheres que não são modelos usam e aprovam.

Após essa análise, verifica-se a publicidade Dove Firming, por meio da Campanha
Real Beleza, tentou inovar na forma de anunciar seus produtos, à medida que trouxe
mulheres anônimas para serem modelos dos produtos, buscando resgatar a
autoestima feminina.

Vale ressaltar que compreender discursos é lançar mão de todos os possíveis

elementos, sejam esses linguísticos ou não, que geram significações textuais,
esgotando, dessa forma, todas as possibilidades que ali estejam presentes, uma vez
que é sabido que nada está presente destituído de sentido ou colocado de maneira
ingênua.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Carolina Constantine Rocha de. A mulher na publicidade brasileira.

2006. Monografia (Bacharelado em Comunicação Social) Centro Universitário da
Cidade Escola de Comunicação e Artes Publicidade e Propaganda, Rio de Janeiro.
Disponível em:< http://pt.scribd.com/doc/71711100/3/CAPITULO-III-A-MULHER-
NACAMPANHA-PELA-REAL-BELEZA-%E2%80%93-DOVE > Acesso em: 03
Dez.2019

CAMPANHA Dove Real Beleza. Disponível em: <http:// www.campanhapelarealbele

za.com.br>. Acesso em: 03 Dez. 2019.

ORLANDI, Eni Puccinelli. Sujeito, História e Linguagem. In: Análise de Discurso:

princípios e procedimentos. Campinas, SP: Pontes, 2001, p.25 - 55.
ANEXO