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MAGIA FAMILIAR:
O CONTROLE SOCIAL DO CORPO DA MULHER NO FILME A BRUXA
CURITIBA
2019
INTRODUÇÃO
Na presente análise abordaremos questões suscitadas a partir do filme A Bruxa (2015)
através da perspectiva feminista da escritora marxista italiana Silvia Federici, na obra Calibã
e a Bruxa, sobre a definição e controle do corpo físico e social da mulher no modelo ideal
para a acumulação primitiva do sistema capitalista, a esposa dona de casa obediente;
juntamente com seu correlato antagônico, seu simulacro perverso e temível, a bruxa. Essa
cisão conceitual se desenvolveu e se dissolveu durante os séculos XVI e XVII, tendo como
expoentes de violência a Caça às Bruxas e a Conquista da América, refletindo as contínuas
lutas sociais de seres dominados contra uma hegemonia histórica de pensamento (e ainda
resistindo) até os dias de hoje.
O TERRENO
A questão histórica mais importante que este livro aborda é como explicar a
execução de centenas de milhares de “bruxas” no começo da Era Moderna e
por que o surgimento do capitalismo coincide com essa guerra contra as
mulheres. (FEDERICI, 2017 p. 29)
A autora aborda como o desenvolvimento da servidão, surgida ”entre os séculos V e
VII em resposta ao desmoronamento do sistema escravista sobre o qual se havia edificado a
economia da Roma Imperial”, se deu por tentativas ulteriores do controle da vida (e do corpo)
do subjulgado camponês livre europeu:
Os senhores de terra se viram obrigados a conceder aos escravos o direito a
possuir uma parcela de terra e uma família própria, com a finalidade de
conter, assim, suas rebeliões e evitar sua fuga para o “mato”, onde
comunidades autogovernadas começavam a organizar-se às margens do
Império. (FEDERICI, 2017 p. 47)
Enquanto todos dormem, exceto a mãe que reza assiduamente, Caleb e seu pai
conversam sobre os problemas que a família está tendo em relação à sua subsistência - “A
nossa colheita não vai durar até o inverno” - escolhendo armar armadilhas na floresta para
caçar animais - “Temos de caçar a nossa comida, se não a podemos colher” - para conquistar
essa floresta selvagem (wilderness): “Ela não vai nos consumir”. Como futura cópia do pai,
Caleb recebe a tradicional educação patriarcal-divina, expressa no diálogo de sua marcha na
floresta:
(Pai) - Tu, então, nasceste pecador?
(Caleb) - Sim, fui concebido no pecado, e nascido da iniquidade.
(Pai) - E, qual é o teu pecado no nascimento?
(Caleb) - O pecado de Adão foi-me imputado e uma natureza corrupta
habita-me.
(Pai) - Bem lembrado, Caleb, muito bem. Podias dizer-me qual é a tua
natureza corrupta?
(Caleb) - A minha natureza corrupta é a falta de graça, entregue ao pecado,
somente ao pecado e assim será para sempre.