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78-83 (Dez 2014 - Fev 2015) Brazilian Journal of Surgery and Clinical Research - BJSCR

Valeriana officinalis L., NO TRATAMENTO DA INSÔNIA E


ANSIEDADE
Valeriana officinalis L., IN THE TREATMENT OF ANXIETY AND INSOMNIA

RANULFO JOSÉ LINDOLFO VIDAL1*, CLEYTON EDUARDO MENDES DE TOLEDO2


1. Acadêmico do Curso de Graduação em Farmácia da Faculdade INGÁ; 2. Farmacêutico, Doutor pela Universidade Estadual de Maringá,
docente dos cursos de graduação em Farmácia e Medicina da Faculdade INGA.
* Rua Pitanga, 290, Centro, Ivaiporã, Paraná, Brasil. CEP: 86870-000. ranulfovidal@hotmail.com

Recebido em 24/09/2014. Aceito para publicação em 03/10/2014

RESUMO 1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho objetiva externar através de revisões de Problemas com ansiedade, insônia e outras mazelas
literatura analisar a efetividade de Valeriana officinalis L., no acometem muitas pessoas devido a diversos fatores,
tratamento de ansiedade e insônia como alternativa ao trata- desde predisposições genéticas, fatores ambientais, a
mento convencional com medicamentos controlados. A espécie
vida urbana cada vez mais estressante e conturbada dos
vegetal contém, principalmente, valepotriatos, sesquiterpenos e
lignanas. Seus mecanismos de ação incluem: atuar na forma- dias de hoje. Essa pode ser uma explicação ao uso in-
ção reticular por meio de um efeito estabilizante sobre os cen- tenso de medicamentos psicotrópicos, que são prescritos
tros vegetativos e emocionais, restaurando o equilíbrio autô- como tratamento para estes males1.
nomo-fisiológico; inibir a GABA transaminase no SNC; atuar Os sintomas dos distúrbios de ansiedade são amplos,
como agonista parcial de receptores de adenosina. A Valeriana onde os mais característicos são insônia, dificuldade em
é uma das plantas medicinais mais popularmente utilizados na
insônia, possui segurança relativamente alta, apresenta menos
iniciar o sono, fadiga, dores no peito, vômitos, espasmos
efeitos colaterais, não causa dependência e é bastante acessível e tremores, arrepios, mãos úmidas, dentre outros. Con-
à população. Entretanto, não há um consenso científico comum forme Castillo et al.2, ansiedade é um sentimento vago e
quanto aos exatos princípios ativos da Valeriana, assim, sua desagradável de medo, apreensão, caracterizado por
efetividade pode resultar da ação de um único composto e, de tensão ou desconforto derivado de antecipação de perigo,
forma mais provável, da interação entre compostos múltiplos de algo desconhecido ou estranho.
(fitocomplexos). Todavia, ela representa um futuro promissor
como alternativa no tratamento da insônia e ansiedade. A palavra ansiedade provém do grego, que significa
“estrangular, sufocar, oprimir3. Houaiss4, define a ansie-
PALAVRAS-CHAVE: Fitoterápico, valeriana, insônia, ansi- dade como um “estado afetivo penoso, caracterizado
edade. pela expectativa de algum perigo que se revele indeter-
minado e impreciso, e diante do qual o indivíduo se jul-
ABSTRACT ga indefeso”. Ou então, simplesmente como definem
Novaes et al.5 a ansiedade pode ser compreendida como
This paper aims to express, through literature reviews, analyzing uma resposta do ser humano ao desconhecido. Para Co-
the effectiveness of Valeriana officinalis L. in the treatment of
anxiety and insomnia as an alternative to conventional treatment êlho e Tourinho6, as elaborações revisadas sugerem, que
with prescription drugs. The plant species contains mainly valepo- a ansiedade, como problema clínico, pode guardar rela-
triates lignans and sesquiterpenes. Their mechanisms of action ção com repertórios de autocontrole. A ansiedade e o
include acting in the reticular formation through a stabilizing effect medo para Castillo et al.2, passam a ser reconhecidos
on the vegetative and emotional centers, self-restoring physiologi- como patológicos quando são exagerados, despropor-
cal balance; inhibit GABA transaminase in the CNS; act as a par-
cionais em relação ao estímulo, ou qualitativamente di-
tial agonist of adenosine receptors. Valeriana is a medicinal plant
popularly used in insomnia, has relatively high security, has fewer versos do que se observa como norma numa faixa etária
side effects, is not addictive and is very accessible to the popula- e interferem com a qualidade de vida, o conforto emo-
tion. However, there is no common scientific consensus on the cional ou o desempenho diário do indivíduo. Tais rea-
exact active principles of Valeriana, so its effectiveness can result ções exageradas ao estímulo ansiogênico se desenvol-
from the action of a single compound and, most likely on the inte- vem, mais comumente, em indivíduos com uma predis-
raction between multiple compounds (fitocomplexos). However, it
represents a promising future as an alternative in the treatment of
posição neurobiológica herdada Castillo et al.2
insomnia and anxiety. Enfermidades ou sintomas relacionados com insônia
e ansiedade, dentre muitos outros fatores desencadeantes,
KEYWORDS: Phytotherapic, valeriana, insomnia, anxiety.

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podem ter seu aparecimento favorecido pelo modo de Um dos vegetais mais empregados no Brasil para
vida atual, e a grande pressão que esta exerce nas pesso- tratamento da ansiedade (tabela 1) é a Valeriana offici-
as. Na sociedade atualmente, devido ao estilo de vida da nalis L., conhecida popularmente como Valeriana. Suas
população, a correria, o trânsito, a, cobrança de resultado raízes compreendem órgãos subterrâneos como o rizoma,
no trabalho, as múltiplas tarefas, a concorrência faz com as raízes e os estolhos9, e são empregadas para produção
que toda a população esteja exposta a esse distúrbio. de medicamentos fitoterápicos.
É o distúrbio do sono que mais acomete a população Seus constituintes químicos são: o óleo essencial,
e tem sido associado com a diminuição no desempenho que abrange monoterpenos, sesquiterpenos, ácidos car-
do trabalho, o aumento na incidência de acidentes de, boxílicos, valpotriatos, aminoácidos, alcaloides, flavo-
carro, e maior propensão às doenças1. noides, dentre outros9. Com base na informação dispo-
Segundo Secchi e Virtuoso1 a insônia é um distúrbio nível dos estudos científicos, o efeito farmacodinâmico
do sono que consiste na incapacidade de iniciar ou man- da valeriana ajuda a promover e restaurar o sono natural
ter o sono, ou ter uma duração e qualidade adequada após pelo menos 2-4 semanas de uso.
para restaurar a energia e o estado de vigília normal. Assim, o objetivo deste trabalho foi compilar dados
Isso faz com que o indivíduo acometido diminua seu sobre a efetividade da Valeriana no tratamento da insônia
rendimento, e fique mais propício a enfermidades. e ansiedade.
Cerca de 30% da população mundial sofre de insônia,
sendo mais frequente em pacientes idosos com ou sem
patologia crônica, mas apenas 10% recebem tratamento 2. MATERIAL E MÉTODOS
adequado1. Para realização deste trabalho, foi empregado o mé-
Bastien et al7, demonstraram que a família, trabalho todo de Revisão Literária, onde foram realizadas pes-
ou escola e eventos de saúde são os mais comuns fatores quisas sobre a efetividade da Valeriana officinalis
desencadeantes de insônia. Devido à rotina diária e a- L.,como alternativa no tratamento de insônia e ansiedade,
presentação de rendimentos, elevando o índice de es- compreendendo uma revisão literária de dezenas de ar-
tresse. tigos científicos, presentes no Google a Acadêmico,
O tratamento para a ansiedade inclui a psicoterapia, Google Sciello ; bem como pesquisas em livros que a-
realização de atividades físicas, e tratamento medica- brangem fitoterápicos , toxicologia, botânica, envol-
mentoso, classicamente representados pelos ansiolíticos vendo diversos temas desde a composição química, a
e antidepressivos1. efetividade até a racionalidade no uso de fitoterápicos.
Entre os medicamentos utilizados para o tratamento Foram realizadas também pesquisas no bulário oficial da
da ansiedade e insônia, encontram-se os benzodiazepí- ANVISA, onde foram coletadas informações impor-
nicos, que são os mais prescritos para este fim, como por tantes sobre fármacos psicotrópicos, com objetivo de
exemplo, alprazolam, diazepam, clonazepam, fluraze- compilar dados sobre a efetividade da Valeriana offici-
pam, lorazepam, dentre outros. Porém, de uma maneira nalis L.,no tratamento de insônia e ansiedade.
geral, seu uso prolongado produz efeitos adversos como
dependência, sedação diurna (ressaca), má qualidade do 3. DESENVOLVIMENTO
sono, o que induz a busca por tratamentos alternativos
seguros entre eles os produtos fitoterápicos8. Valeriana officinalis L.
Alguns antidepressivos também são recomendados A Valeriana é uma planta perene nativa da Europa e
para certas formas de ansiedade e/ou insônia. Dentre da Ásia, e naturalizada na América do Norte. O gênero
alguns exemplos, estão a sertralina, paroxetina, fluoxe- Valeriana, pertencente à família Valerianaceae, ordem
tina, venlafaxina, buspirona, dentre outros, que também Dipsacales, inclui mais de 250 espécies12. A espécie de
causam uma série de efeitos colaterais, que será mostra- Valeriana mais comumente utilizada na terapêutica é a
do mais adiante. Valeriana officinalis, apesar de V. edulis (Valeriana me-
O medicamento fitoterápico é obtido exclusivamente xicana) e V. wallichii (Valeriana indiana) também serem
de espécies vegetais, não pertencendo a essa classe, por- utilizadas13.
tanto, aqueles que possuem em sua composição substân- A composição química da Valeriana varia de acordo
cias ativas isoladas, mesmo sendo originários de plantas, com a subespécie, variedade, idade da planta, condições
produzidos sinteticamente ou associados com extratos de crescimento, idade e tipo do extrato14. A raiz de Vale-
vegetais1. riana contém muitos componentes, entre eles estão os
No Brasil, todos os fitoterápicos são regulamentados monoterpenos bicíclicos (valpotriatos – valtrato e dihi-
como medicamentos convencionais e, por conseguinte drovaltrato), óleos voláteis (valeranona, valerenal e áci-
são submetidos aos mesmos testes de qualidade, segu- dos valerênicos), sesquiterpenos, lignanas e alcalóides.
rança, eficácia e toxicidade solicitados pela ANVISA Também estão presentes aminoácidos livres, como o
para todos os medicamentos1. ácido gama-aminobutírico (GABA), tirosina, arginina e

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glutamina15. Os valpotriatos estão presentes somente na Podem eventualmente existir em pequenas quantida-
planta fresca. des se a secagem for realizada em uma temperatura infe-
Tabela 1. Plantas medicinais, mais conhecidas e utilizadas no trata- rior a 40˚C, uma vez que são altamente instáveis e d e-
mento de ansiedade e insônia. compõem-se facilmente pelo calor, umidade ou varia-
NOME NOME
ções de PH, originando outros compostos1. Além disso,
REFERÊNCIA são insolúveis em água, existindo apenas em preparações
POPULAR CIENTÍFICO
Schulz V, Hansel R, Tyler VE. Fitoterapia não aquosas. A decomposição dos valpotriatos produz
Valeriana offici- racional: um guia de fitoterapia para as
Valeriana
nalis ciências da saúde. 4ª ed. São Paulo: Ma- pequenas quantidades do ácido isovalérico, que é res-
nole; 200210 ponsável pelo odor característico desagradável da plan-
Brasil. Ministério da Saúde. A fitoterapia
no SUS e o programa de pesquisas de
ta1.
Maracujá Passiflora edulis
plantas medicinais da central de medica- Tabela 2. Medicamentos benzodiazepínicos mais utilizados para ansi-
mentos. Brasília; 200611.
edade e/ou insônia e seus respectivos efeitos colaterais16.
Capim santo Brasil. Ministério da Saúde. A fitoterapia
Capim limão Cimbopogon no SUS e o programa de pesquisas de Princípio
Efeitos adversos mais comumente observados
Capim de citratus plantas medicinais da central de medica- Ativo
cheiro mentos. Brasília; 200611. Tontura, vertigem, sedação, sonolência, nervosismo,
Brasil. Ministério da Saúde. A fitoterapia ansiedade, cefaléia, depressão, taquicardia, confu-
Funcho, erva Fueniculum no SUS e o programa de pesquisas de Alprazolam
são, falta de coordenação, insônia, náuseas, diarréia,
doce vulgare plantas medicinais da central de medica- comprometimento de memória, etc.
mentos. Brasília; 200611.
Sonolência, cansaço, relaxamento muscular, confu-
Schulz V, Hansel R, Tyler VE. Fitoterapia
Melissa racional: um guia de fitoterapia para as Diazepam são mental, depressão, cefaléia, depressão circulató-
Erva cidreira ria, efeitos paradoxais, dentre outros.
officinalis ciências da saúde. 4ª ed. São Paulo: Ma-
nole; 200210. Sonolência, vertigem, cefaléia, fraqueza muscular,
Schulz V, Hansel R, Tyler VE. Fitoterapia ataxia, fraqueza muscular, distúrbios gastrintestinais,
Piper racional: um guia de fitoterapia para as Flurazepam
Kava kava alterações da libido, confusão mental, efeitos para-
metbysticum ciências da saúde. 4ª ed. São Paulo: Ma- doxais, etc.
nole; 200210.
Sedação, fadiga, sonolência, depressão, fraqueza
Lorazepam muscular, tontura, confusão, pressão arterial baixa,
etc.
Sonolência, náuseas, vômito, depressão, fraqueza
Clonazepam geral, cefaléia, lentidão de reações, confusão mental,
etc.

Grande parte dos medicamentos ansiolíticos, hipnó-


Valtrato Aceval- ticos (Tabela 2) e antidepressivos (Tabela 3) podem cau-
trato sar dependência química. Conforme Schulz et al. (2002),
o tratamento farmacológico atual de nervosismo e insô-
nia é confiado principalmente às benzodiazepinas e tem
um certo número de riscos sérios, como ressaca de se-
dação, respostas prejudicadas, insônia de retrocessos,
depressão respiratória e dependência da droga.
Cerca Tabela 3. Medicamentos antidepressivos largamente prescritos
Dihidrovaltrato
por médicos para tratar ansiedade e a insônia16.
Princípio ativo Efeitos adversos mais comumente observados
Diarreia, náusea, cefaleia, insônia, palpitações,
Fluoxetina
diminuição do apetite, calafrios
Náusea, disfunção sexual, insônia, sudorese,
Paroxetina
diarreia, visão turva, vertigem, sonolência
Boca seca, sudorese, tremor, diarreia, náusea,
Sertralina
sonolência, tontura, cefaleia, insônia
Valere-
Cefaleia, astenia, sudorese, náuseas, constipação,
Isovaltrato nol
Venlafaxina hipertensão, vômitos, sonolência, nervosismo,
ansiedade, tremor
Tontura, cefaleia, nervosismo, delírio, náusea,
Buspirona
excitação, sudorese

Os benzodiazepínicos estão entra as drogas mais


prescritas e utilizadas em todo o mundo. Eles funcionam
Valerenal como, anticonvulsivantes, relaxantes musculares, ansio-
Figura 1. Estrutura química dos principais constituintes da Valeriana líticos e hipnóticos. São bem absorvidos pelo trato gas-
com interesse farmacológico9. trintestinal e possuem boa lipossolubilidade para atra-

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vessarem a barreira hematoencefálica17. ou hidroalcoólicos10.


Os benzodiazepínicos são drogas de ação direta do A raiz seca da valeriana contém em média 0,5 a 2%
SNC. Conforme Coelho et al. 18, o principal mecanismo de óleo volátil. Aproximadamente 20 estudos originais
de ação dessas substâncias se caracteriza pela ligação em sobre a farmacologia experimental de preparações de
receptores localizados no complexo GABA. A depen- raiz e substâncias produzidas a partir dela. Análises des-
dência de alguns benzodiazepínicos, podem desenvolver ses estudos podem ser encontrados em Santos et al.21
em dias ou semanas. Num estudo recente lorazepam Estudos experimentais com ácido valerênico mostrou
ofereceu maior resistência à retirada relativamente gra- que este diminuiu a taxa de degradação do ácido ga-
dual (15 dias), em doses terapêuticas, equivalente a 10 ma-aminobutírico (GABA). Estudos mais recentes10
mg de diazepam, com maior pontuação de sintomas19. mostraram um aumento na concentração de GABA nas
De acordo com Carlini20, os benzodiazepínicos atu- fendas simpáticas após a administração de valeriana.
am no sistema de neurotransmissão gabaérgico, estimu- Esses autores usaram um extrato de valeriana em vez de
lando a ação do GABA produzindo um efeito depressor. ácido valerênico isolado. O GABA considerado um
A ação dessas substâncias em sítios de ligação localiza- neurotransmissor importante, que tem um papel chave
dos no complexo GABA, promovem a abertura do canal no estresse e na ansiedade. O início tardio de ação dis-
de cloreto com consequente influxo do ânion para dentro tingue claramente a valeriana dos hipnóticos sintéticos10.
do neurônio e produzindo consequente hiperpolarização A valeriana caracteriza-se por ter um dos maiores
da célula. mecanismos de sinergismo no reino vegetal22, ou seja,
O uso crônico de benzodiazepínicos leva ao efeito alguns ativos que agem de forma coordenada em prol da
rebote e possui risco de dependência, principalmente em ação farmacológica (tabela 4).
mulheres com mais de 45 anos e em idoso. A retirada do Tabela 4. Mecanismo sinérgico de ativos encontrados em Valeriana
medicamento deve ser gradual, pois os sintomas perce- Princípio ativo Ação fisiológica
bidos podem ser vários, como aumento da insônia, au- Atuam na formação reticular por
mento da frequência cardíaca, tremor diarreia e outros. O Valepotriatos: meio de um efeito estabilizante
uso em idosos deve ainda mais racionalizado, uma vez Diidrovaltrato (80%), valtra- sobre os centros vegetativos e
que há relatos no aumento do índice de mortalidade com to (15%) e acevaltrato (5%)23 emocionais, restaurando o equilí-
brio autônomo-fisiológico24.
o uso crônico além de que diferentes benzodiazepínicos Sesquiterpenos: Inibem a enzima que metaboliza
em doses terapêuticas mostram que o uso prolongado Ácidos valerênicos e seus o GABA (GABA transaminase),
(maior do que 6 meses) leva a perda de eficácia (tolerân- derivados: valerenal, ácido aumentando os níveis deste me-
cia) no tratamento da insônia19. Pacientes que fazem uso acetoxivalerênico e ácido diador no sistema nervoso cen-
hidroxivalerênico. tral25
crônico dessas drogas, geralmente desenvolvem primei- Lignanas:
ramente tolerância do tipo funcional, envolvendo altera- Agonista parcial dos receptores
Berche-
de adenosina, sub-tipo A126
ções na neurotransmissão Gabaérgica e também altera- mol-4’-O-β-D-glicosídeo
ções na sensibilidade e número de receptores benzodia-
zepínicos. O uso crônico também pode levar à depen- Apesar dos séculos de experiência com preparação
dência que se manifesta pelos sintomas de abstinência, de raiz de valeriana, não há evidência de que a droga
como ansiedade (maior do que na condição cause dependência. Como a raiz de valeriana age gradu-
pré-existente), vômitos, convulsões, diarreia, insônia, almente e não é útil pra o tratamento agudo de insônia, o
etc17. Dessa problemática, surge como alternativa far- aconselhamento adequado e terapêuticas físicas são ne-
macoterapêutica medicamentos ansiolíticos fitoterápicos, cessárias durante as semanas iniciais para garantir o
possibilitando uma estratégia viável e segura de trata- cumprimento do tratamento, especialmente em pacientes
mento. Entretanto, o uso de plantas medicinais e fitote- acostumados a usar benzodiazepínicos ou outras drogas
rápicos deve ser realizado com os devidos cuidados, sintéticas10.
entre eles, considerar um correto diagnóstico, analisar Para Nunes e Sousa27, existem dados insuficientes
doses corretas e possíveis interações medicamentosas e para recomendar a utilização da valeriana para o trata-
alimentares. Assim, vem à tona o pré-conceito errôneo mento das perturbações de ansiedade, pois a evidência
que as pessoas têm de que tudo que é natural tem pouca da eficácia está limitada pelos resultados contraditórios
eficácia e nenhum efeito colateral1. dos estudos analisados e pelos seus problemas metodo-
A espécie vegetal valeriana usada na Alemanha (Va- lógicos, apesar de mostrar algum efeito na insônia ligeira
leriana officinalis) é uma dentre aproximadamente 250 a moderada. Alexandre et al.28 colocam que amostras de
espécies que ocorre em todo mundo. Nativa da Europa e valeriana apresentam resultados promissores como uma
das zonas temperadas da Ásia. Somente a raiz da valeri- alternativa terapêutica nos distúrbios do sono, porém,
ana europeia é usada como uma droga oficial. A planta também acreditam que a metodologia dos ensaios não é
cortada e seca é usada em preparações de chás. Os pro- a mais eficaz para comprovar sua ação, alegando que
dutos farmacêuticos são produzidos de extratos aquosos devido aos problemas metodológicos dos ensaios indi-

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viduais e os resultados conflitantes, as evidências de padronizadas para avaliação de efeitos farmacológicos.


eficácia disponíveis são consideradas fracas para justifi-
car o uso da valeriana no tratamento dos distúrbios do REFERÊNCIAS
sono, indicando a necessidade da realização de novos
ensaios clínicos28. Poyares et al. (2005) afirmam que os [01] Secchi P, Virtuoso S. O efeito da valeriana no tratamento
efeitos colaterais da valeriana são dificilmente perceptí- da insônia. Visão Acadêmica 2012; 13(1).
veis e não apresentam cardiotoxidade, porém ela apre- [02] Castillo ARGL, Recondo R, Asbahr FR, Manfro GG.
Transtornos de ansiedade. Rev Bras Psiquiatr 2000;
senta potenciais interações com fármacos que também 22(Suppl 2):20-23.
atuam no sistema nervoso central, pois podem ocorrer [03] Graeff FG, Guimarães FS. Fundamentos da psicofarma-
efeitos aditivos, sinérgicos e/ou antagônicos e, assim, cologia. São Paulo: Atheneu; 1999; 246.
causar potencialização ou redução dos efeitos sedativos [04] Houaiss A. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. São
destes fármacos28. Paulo: Objetiva; 2001.
A história do uso popular desta planta representa uma [05] Novaes MAFP, Romano BW, Lage, SG. Internação em
forma de comprovação da baixa toxicidade, da seguran- UTI: variáveis que interferem na resposta emocional.
ça e da eficácia desta droga vegetal, o que não dispensa a Arq Bras Cardiol 1996; 67(2):99-102.
comprovação cientifica destas características. [06] Coêlho NL, Tourinho, EZO. Conceito de ansiedade na
análise do comportamento. Psychology: Reflection and
Os resultados comportamentais mostraram um efeito criticism 2008; 21(2):171-8.
ansiolítico e hipnótico da Valeriana officinalis. Faustino [07] Bastien CH, Vallières A, Morin, CM. Precipitating fac-
et al.29, comparou o extrato de Valeriana oficinalis tors of insomnia. Behavioral Sleep Medicine 2004;
(81mg de valepotriatos como ingredientes ativos) com o 2(1):50-62.
placebo e com o diazepam (6,5mg) em pacientes com [08] Fernández-San-Martín MI, Masa-Font R, Palacios-Soler,
transtorno de ansiedade generalizada (TAG). Os trata- L, Sancho-Gómez, P, Calbó-Caldentey C, Flores-Mateo
mentos foram administrados por quatro semanas. Se- G. Effectivenes of Valerian on insomnia: a meta-analysis
gundo Faustino et al.29, o extrato foi padronizado, sendo of randomized placebo-controlled trials. Sleep Medicine
utilizados os compostos diidrovaltrato, valtrato e aceval- 2010 June; 11(6):505-11.
[09] Gonçalves, S; Martins, AP. Valeriana Officinalis.
trato como marcadores fitoquímicos, na proporção mí- 2005[acesso 16 ago. 2014] Rev. Lusófona de Ciências e
nima de 80, 15 e 5%, respectivamente. Não foi observa- Tecnologias da Saúde, 2005; (3)2:209-22. Disponível em:
da diferença significativa entre os três grupos, sendo que http://recil.grupolusofona.pt/bitstream/handle/10437/451/
ao final do tratamento todos os grupos apresentaram cbf3_06.pdf?sequence=1.
redução significativa da ansiedade em relação ao basal31, [10] Schulz V, Hansel R, Tyler VE. Fitoterapia racional: um
observou-se que a mesma tem sim uma ação depressora guia de fitoterapia para as ciências da saúde. 4ª ed. São
do SNC. Para que esta possa se apresentar como uma Paulo: Manole; 2002.
alternativa consagrada de tratamento como ansiolítico e [11] Joly AB. Botânica: introdução à taxonomia vegetal. São
hipnótico, precisa de outras metodologias de ensaio a Paulo: Nacional; 2005.
[12] Brasil. Ministério da Saúde. A fitoterapia no SUS e o
fim de melhor elucidar seu mecanismo de ação e sua programa de pesquisas de plantas medicinais da central
eficácia30. de medicamentos. Brasília; 2006.
[13] National Institutes of Health: office of dietary supple-
4. CONCLUSÃO ments. Dietary supplement fact sheet: Valerian. Bethes-
da; 2008.
Apesar do clássico uso popular, os efeitos da Vale- [14] World Health Organization. Monographs on Selected
riana ainda não estão bem definidos. É necessário, estu- Medicinal Plants. Geneva; 1999.
do mais elaborado sobre o assunto. A metodologia utili- [15] Hadley S, Petry JJ. Valerian. American Family Physician
2003; 67(8):1755-58.
zada nos ensaios não era muito potente e o tamanho das
[16] Agencia Nacional de Vigilância Sanitária - Anvisa. Me-
amostras em alguns estudos segundo os autores, era pe- dicamentos. [acesso 9 set. 2014] Disponível em:
queno, com poucos participantes. Entretanto, seu uso é http://portal.anvisa.gov.br/wps/content/Anvisa+Portal/An
bem aceito quando associado com mudança no estilo de visa/ Inicio/Medicamentos.
vida e se usado regularmente. Alexandre et al.26 colocam [17] Oga S. Fundamentos de toxicologia. São Paulo: Atheneu;
que amostras de valeriana apresentam resultados pro- 2003.
missores como uma alternativa terapêutica nos distúrbios [18] Coelho FMS, Elias RM, Poyares D, Pradella-Halliman M,
do sono, mas discute a necessidade da realização de no- Bittencourt LRA, Tufik S. Benzodiazepínicos: uso clíni-
vos ensaios clínicos. co e perspectivas. RBM Rev Bras Med. 2006; 63(5).
[19] Poyares D, Pinto Junior LR, Tavares S, Barros-Vieira S.
Esse trabalho foi realizado no intuito de valorizar o
Hipnoindutores e insônia. Rev Bras Psiquiatr 2005;
uso racional e controlado de medicamentos à base de 27(Supl 1):2-7.
produtos naturais que atuam no SNC e também para
mostrar a importância do uso de metodologias científicas

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