Você está na página 1de 33

Política Nacional sobre Drogas:

o que os gestores estaduais e municipais devem saber

Módulo 2
Epidemiologia do Uso de Drogas e as
Evidências sobre o que Funciona e o que
não Funciona em Políticas Públicas
Expediente
Presidente da República
Jair Messias Bolsonaro

Vice-Presidente da República
Antônio Hamilton Martins Mourão

Ministro da Cidadania
João Inácio Ribeiro Roma Neto

Secretário Especial de Desenvolvimento Social


Sérgio Augusto de Queiroz

Secretário Nacional de Cuidados e Prevenção às Drogas


Quirino Cordeiro Júnior

Diretora do Departamento de Prevenção, Cuidados


e Reinserção Social
Cláudia Gonçalves Leite

Conteúdo e texto original


Ronaldo Laranjeira
Sérgio Marsiglia Duailibi
Cláudio Jerônimo da Silva

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA

Reitor
Ubaldo Cesar Balthazar

Secretário de Educação a Distância


Luciano Patrício Souza de Castro

labSEAD
Coordenação
Luciano Patrício Souza de Castro

Supervisão Técnica de EaD


Giovana Schuelter

Financeiro
Fernando Wolf

Coordenação de Produção
Francielli Schuelter

Supervisão de AVEA
Andreia Mara Fiala

Audiovisual
Daniel Almeida Vital de Oliveira
Dilney Carvalho da Silva
Dominique Cabral

Design Gráfico
Sonia Trois
Aline Lima Ramalho
Maria Isabel Grullón Hernandez
BY NC ND

Design Instrucional
Gabriel de Melo Cardoso
Todo o conteúdo do curso Política Nacional sobre
Marcia Melo Bortolato
Drogas: o que os gestores estaduais e municipais devem
saber está licenciado sob a Licença Pública Creative
Linguagem e Memória Commons Atribuição-Não Comercial-Sem Derivações 4.0
Fábio Bianchini Mattos Internacional.

Programação Para visualizar uma cópia desta licença, acesse:


Renan Pinho Assi https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/deed.pt_BR
Sumário
Apresentação do Módulo....................................................................... 4

Objetivos de Aprendizagem do Módulo ............................................... 4

Aula 1: Epidemiologia do Uso de Álcool e de Tabaco ......................... 5

Álcool.................................................................................................................. 6

Tabaco..............................................................................................................15

Aula 2: Epidemiologia do Uso de outras Drogas no Brasil................. 20

Referências............................................................................................ 32
Apresentação do Módulo
Neste módulo, estudaremos a epidemiologia do
álcool e outras drogas no Brasil, com objetivo de
conhecermos quais são as drogas mais utilizadas
pelos brasileiros e o perfil das pessoas que
as utilizam, a fim de melhor direcionarmos os
programas de prevenção.

Objetivos de Aprendizagem
do Módulo
1. Entender e discutir a epidemiologia do uso
de drogas no Brasil comparando com alguns
outros países.

2. Conhecer e discutir a relação entre as


Políticas Epidemiológica.

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Políti
Aula 1 o que os

Epidemiologia do Uso de Álcool e de Tabaco

É importante conhecer a epidemiologia do consumo


de substâncias lícitas e ilícitas porque esse estudo
nos fornece um retrato de quais drogas a população
brasileira tem consumido e o perfil dessas pessoas,
para saber como devemos direcionar os programas
e ações das políticas sobre drogas no Brasil. Fonte: movia filmes/
Freepik.com (2021)

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
5 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
É importante, ainda, que os estudos sejam
metodologicamente compatíveis com a
mensuração de como se dá o consumo dessas
substâncias em todo o território nacional e que
sejam realizados com periodicidade adequada,
para que se possa conferir possíveis mudanças no
perfil de consumo e, assim, ajustar as políticas.

No Brasil, o consumo de opioides é baixo em


comparação com os Estados Unidos; por outro
lado, o consumo de crack é bastante significativo se
comparado com outros países e há um consumo
significativo do álcool em forma de binge (consumo
de seis ou mais doses em uma única ocasião).
Sendo assim, a legislação e os programas e ações
que visam ao tratamento e à prevenção devem
ser muito mais voltados para álcool do que para
opioides, por exemplo.

• Mas a quem devemos dirigir os esforços


de prevenção?
• A todos os brasileiros?
• A um público específico, homens,
mulheres, jovens?

Álcool

Apresentamos a seguir alguns dados


importantes sobre o consumo de algumas
substâncias no nosso país que exemplificam como
os estudos epidemiológicos ajudam na resposta
dessas questões.

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
6 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Prevalência de consumo de bebidas alcoólicas na vida, nos últimos
12 meses, nos últimos 30 dias e em binge – Brasil, 2015

80
70
66,4
60
50
Prevalência (%)

40 43,1

30
30,1
20
16,5
10
0
Vida 12 meses 30 dias binge

Fonte: Adaptado
de Bastos et al.
(2017).
O “III Levantamento Nacional sobre o Uso de
Drogas pela População Brasileira” (III LNUD),
realizado pela FIOCRUZ em 2015, aponta que
66,4% das pessoas consumiram álcool na vida e
que 16,5% fizeram uso em binge. A constatação
de que cerca de 66% dos brasileiros consumiram
álcool na vida pode contrastar com a percepção
do senso comum de que todos os brasileiros
bebem. Daí a importância dos dados para orientar
políticas com base nas evidências.

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
7 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Fonte:
Conhecer o perfil dos que fazem uso de álcool View Apart/
Shutterstock.com
é muito importante também para orientar as
políticas. Por exemplo, os dados mostram que
o consumo de bebidas alcoólicas na vida, nos
últimos 12 meses e nos 30 dias anteriores,
concentrou-se claramente nas faixas etárias
intermediárias, especialmente entre os adultos
mais jovens (25-34 anos), com valores igualmente
mais elevados, embora não tão pronunciados nas
faixas mais próximas (18-14 anos e 35-44 anos),
conforme apresentaremos na tabela a seguir.

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
8 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Número de consumidores de 18 a 65 anos e prevalência de consumo
de bebidas alcoólicas na vida, nos últimos 12 meses, nos últimos 30
dias e em binge, segundo o nível de escolaridade – Brasil, 2015

Na vida e nos últimos 12 meses

Vida 12 meses
Nível de IC 95% IC 95%
Pessoas Pessoas
Escolaridade % %
(1.000) LI LS (1.000) LI LS

Total 94.664 71,3 69,5 73,1 61.433 46,3 44,8 47,7

Sem instrução
e fundamental 30.046 69,5 67 72 16.427 38 36 40
completo

Fundamental
completo e médio 18.801 70,1 67,6 72,5 12.331 46 43,7 48,3
incompleto

Médio completo
e superior 34.043 71,9 69,6 74,2 23.497 49,6 47,5 51,7
incompleto

Superior
completo ou 11.774 76,5 73,4 79,5 9.178 59,6 56,4 62,8
mais

Últimos 30 dias e em binge


30
30dias
dias binge
Nível de
Pessoas IC 95% Pessoas IC 95%
Escolaridade % %
(1.000) LI LS (1.000) LI LS

Total 44.252 33,3 32 34,7 24.289 18,3 17,2 19,4

Sem instrução
e fundamental 11.764 27,2 25,3 29,1 6.873 15,9 14,2 17,6
completo

Fundamental
completo e médio 8.832 32,9 30,7 35,2 5.089 19 17,1 20,8
incompleto

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
9 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
30 dias binge
Nível de IC 95% IC 95%
Pessoas Pessoas
Escolaridade % %
(1.000) LI LS (1.000) LI LS
Médio completo
e superior 16.891 35,7 33,7 37,7 9.181 19,4 18 20,8
incompleto

Superior
completo 6.764 43,9 40,5 47,3 3.145 20,4 17,3 23,6
oumais

Nota: As prevalências (%) são relativas ao total da população da


pesquisa e IC95% é o intervalo de confiança de 95% Fonte:
(LI - Limite Inferior e LS - Limite Superior). Bastos et al. (2017).

Esses dados são relevantes para se desenhar um


programa de prevenção, por exemplo, uma vez
que ajudam a definir quem é o público-alvo (sua
faixa etária, condição econômica) e como atingir
esse público. Essas questões de suma importância
podem ser respondidas com a ajuda dos dados
apresentados na pesquisa epidemiológica.

Se quisermos aprofundar o estudo sobre o perfil dos


bebedores em binge, os dados do “II Levantamento
Nacional de Álcool e Drogas” (II LENAD) mostram
que a maioria dos bebedores em binge são homens
e que houve aumento de 29% em seis anos (2002-
2012), ao passo que, entre as mulheres, esse
aumento foi de 35%. Com esses dados, podemos
dizer que, embora a maioria dos bebedores em
binge esteja entre os homens, o aumento maior se
deu entre as mulheres. Veja no gráfico a seguir.

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
10 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Beber em binge no último ano entre bebedores adultos (2006/2012)

% 2006

2012
70
,4%
60 % 29 66

31,1 59
50 %
51
36 49
40 45

36
30
20
10
0
Total Homens Mulheres

Fonte:
II LENAD (2014).
Se essa tendência se confirmar nos próximos
levantamentos, as mulheres podem alcançar
índices próximos aos dos homens no futuro.
Esses dados são extremamente relevantes para
mostrar a tendência ou para qual direção caminha
o perfil dos usuários, uma vez que apontam
para onde devemos caminhar com relação aos
programas de prevenção e tratamento.

Um dado epidemiológico de relevância é a


constatação de que 20% dos que mais bebem
consomem 56% do total de bebidas ingeridas,
ou seja, há concentração de consumo entre
os bebedores mais contumazes, conforme
apresentado no gráfico a seguir.

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
11 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Concentração do consumo de álcool

20% dos que mais bebem 56%

10% dos que mais bebem 45%

5% dos que mais bebem 24%


%
0 10 20 30 40 50 60

Fonte:
Até aqui vimos alguns exemplos dos dados II LENAD (2014).
sobre consumo de bebida alcoólica, mas é
importante saber quantos destes bebedores são
dependentes. Os dados apresentados no a seguir
apontam que 16% da população de bebedores
bebem moderadamente e que, entre os 50% não
abstêmios no momento da pesquisa, 17% são
abusadores e dependentes.

Padrão de uso na população e abuso e dependência de álcool


entre bebedores

16%

beber nocivo

50% beber moderado


abstêmio
32%

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
12 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Dependência de alcóol na população = 6,8%
10,5% entre homens e 3,6% entre mulheres

50%

17%

Bebedores Abusadores e/ou Dependentes


(67,3 milhões de pessoas) (11,7 milhões de pessoas)

Fonte:
II LENAD (2014).
Os gestores públicos podem ainda se interessar em
conhecer mais detalhadamente o hábito de beber e
dirigir: quantos brasileiros têm esse hábito e qual o
perfil desse padrão de bebedor? Eles podem estar
interessados em se orientar para a proposição de
leis mais rígidas sobre conduzir veículo sob efeito
de bebida ou criar uma campanha de prevenção
seletiva, direcionada a um grupo específico de
pessoas que compartilham os mesmos fatores de
riscos; no caso aqui, beber e dirigir.

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
13 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Fonte: rawf8/
Os dados do II LENAD apontam que 21% Shutterstock.com
apresentavam essa condição em 2012, uma
diminuição de 21% em relação ao ano de 2006.
Novamente podemos observar que os homens são
maioria, mas a maior queda no período estudado
também está entre os homens. Esse dado já
ajuda os gestores públicos e os legisladores na
proposição de programas e ações em políticas
públicas. Confira no gráfico a seguir.

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
14 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Conduzir um veículo após consumo de álcool (2006/2012)
%
2006
35 19
% 2012
33,7
30
21%
25 27,5 27,3

20 21,6

15
17%
10
8,6
5 7,1

0
Total Homens Mulheres

Fonte:
Não é nossa intenção dissecar todos os dados II LENAD (2014).
epidemiológicos disponíveis, mas que você
compreenda a importância desses dados e conheça
os mais relevantes. Por isso, na sequência vamos
apresentar tais dados, com foco na relevância
de cada um para as decisões de gestores na
elaboração e implementação de programas e ações
em política públicas voltados à prevenção do uso
de álcool e outras drogas.

Vamos agora conhecer alguns dados relevantes


sobre o tabaco.

Tabaco

Em 2012, a prevalência de fumantes entre os


brasileiros adultos diminuiu 3,9 pontos percentuais
em relação a 2006, ano em que 20,8% do total de
brasileiros declararam-se fumantes.

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
15 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Fonte: I WALL/
Shutterstock.com
A prevalência de fumantes é maior entre os homens,
tanto em 2006 (27,1%) como em 2012 (21,4%),
enquanto entre mulheres 15,1% declaravam-se
fumantes em 2006 e 12,8% em 2012. Apesar da
queda observada no número de fumantes, tanto
entre homens quanto entre mulheres, nota-se que a
redução no número de fumantes foi mais expressiva
entre os homens. Houve diminuição de 5,7 pontos
percentuais na prevalência de fumantes homens
e de 2,3 pontos percentuais na prevalência de
fumantes mulheres, entre os anos de 2006 e 2012,
conforme o gráfico a seguir.

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
16 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Prevalência do consumo de tabaco entre adultos por gênero

%
2006
30
22 2012
%
25 27,0
19
%
20 20,8 21,0 13%
15 16,9
15,0
13,0
10

0
Total Homens Mulheres

Fonte:
A prevalência do tabaco é um bom exemplo do II LENAD (2014).
impacto das políticas na epidemiologia. A mudança
no perfil epidemiológico se deve a mudanças nas
políticas nas últimas décadas, como proibição de
propaganda, por exemplo, entre tantas outras.

Ao se analisar a idade de experimentação do


cigarro e início de consumo regular, nota-se que
não foram observadas variações relevantes entre
os dois anos analisados (2006 e 2012), tampouco
diferenças significativas por gênero. Em relação
aos dados da população adulta brasileira, observa-
se que a média de idade de experimentação do
cigarro é em torno de 16 anos idade (com desvio
padrão de 5,3), e a idade média de consumo regular
é 17 anos.

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
17 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Muito provavelmente o aumento da média de idade de experimentação
também se deve às políticas mais restritivas de propaganda e proibição de
venda para menores, outro exemplo de como as políticas impactam
a epidemiologia.

Apesar da importante redução da proporção de


fumantes observada e da estabilidade da média
de início de consumo do cigarro, foi observado um
dado importante ao se analisar os dois anos de
realização do estudo: um pequeno aumento no
número médio declarado de cigarros fumados por
dia. Os brasileiros em 2006 fumavam em média
13,1 cigarros por dia; já em 2012 o número de
cigarros fumados pela população adulta passou a
ser em média 14 cigarros. Observa-se que tanto os
homens como as mulheres passaram a fumar mais
em 2012: enquanto em 2006 os homens fumavam
em média 13,6 cigarros e as mulheres 12,3, em
2012 esse número aumentou para 14,5 cigarros
fumados pelos homens e 13,1 pelas mulheres em
média. Confira no quadro a seguir.

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
18 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Média de idade entre os fumantes
adolescentes

Ano de estudo Média Desvio padrão

Masculino 11,6 9,6

2006 Feminino 9,5 7,7

Total 10,8 9

Masculino 14,7 8,7

2012 Feminino 12,6 7,1 Fonte:


Total 14,2 8,4 II LENAD (2014).

Até agora, vimos os dados apresentados pelas


pesquisas do II Levantamento Nacional de Álcool
e Drogas, realizado pela UNIFESP no ano de 2012,
e do III Levantamento Nacional do Uso de Drogas
pela População Brasileira, realizado pela FIOCRUZ
no ano de 2015, os quais atendem a padrões
metodológicos, desenhando um retrato de como
se dá o consumo em nível nacional. Buscamos
destacar a importância desses dados na gestão
e implementação de programas e ações em
política públicas voltados para a prevenção do
uso de álcool e outras drogas. No próximo tópico,
manteremos a mesma perspectiva, mas agora com
foco no uso de substâncias ilícitas.

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
19 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Políti
Aula 2 o que os

Epidemiologia do Uso de outras


Drogas no Brasil

Segundo os dados do II LENAD, a substância


ilícita com maior prevalência de uso na população
brasileira é a maconha. Do total da população
adulta, 6,8% declararam já ter usado a substância
alguma vez na vida; ou seja, 7,8 milhões de
brasileiros adultos já usaram maconha pelo
menos uma vez na vida. Entre os adolescentes,
esse número é de 597 mil indivíduos (4,3%)
dentre quase 14 milhões de adolescentes
brasileiros. Analisando o uso nos últimos 12
meses, 2,5% dos brasileiros adultos e 3,4% dos
adolescentes declaram ter usado maconha,
representando mais de 3 milhões de adultos e
478 mil adolescentes em todo o país.

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
20 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Fonte:
C_KAWI/
Ainda segundo o II LENAD, a prevalência do uso
Shutterstock.com
da cocaína uma vez na vida pela população adulta,
é de 3,8%, representando cerca de 5 milhões de
brasileiros com 18 anos ou mais. A prevalência do
uso de cocaína nos últimos 12 meses na população
adulta observada é de 1,7%, representando mais de
2 milhões de brasileiros. No caso dos adolescentes,
2,3% declararam ter utilizado cocaína pelo menos
uma vez na vida e 1,6% destes declarou ter
utilizado nos últimos 12 meses, representando
cerca de 225 mil adolescentes em todo o país.

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
21 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Fonte:
Studio4dich/
O II LENAD levantou ainda que 9,6% da população
Shutterstock.com
com 18 anos ou mais já utilizaram tranquilizantes
pelo menos uma vez na vida. Observa-se que, entre
as substâncias estudadas, o tranquilizante é a mais
consumida entre a população adulta nos últimos
12 meses, representando aproximadamente 8
milhões de usuários no último ano em todo o país.
As prevalências de uso de tranquilizantes entre
adolescentes são consideravelmente menores do
que as observadas entre adultos, mas ainda assim
são expressivas: 2,5% dos adolescentes declararam
já terem utilizado tranquilizantes na vida e 1,4%
utilizou nos últimos 12 meses (população de
aproximadamente 198 mil adolescentes).

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
22 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Fonte:
Estimulantes aparecem como a substância com Couperfield/
Shutterstock.com
a quarta maior prevalência entre adolescentes,
ficando apenas atrás da maconha, da cocaína
e de solventes (como cola de sapateiro, por
exemplo). A prevalência do uso de estimulantes é
de 1,3% alguma vez na vida e 0,9% nos últimos 12
meses. Entre adultos, a prevalência dessa mesma
substância é de 2,7% alguma vez na vida e de 1,1%
nos últimos 12 meses, representando quase 1,5
milhão de brasileiros com 18 anos ou mais.

O II LENAD revela que a prevalência do uso de


crack nos últimos 12 meses na população adulta
brasileira é de 0,7%, representando mais de 800 mil
brasileiros. Vale destacar que, por ser um estudo
probabilístico domiciliar, a população em situação
de rua não está contemplada na amostra. Assim, a

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
23 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
prevalência reflete apenas a população que
não vive em situação de rua. Já a prevalência
de crack alguma vez na vida foi de 1,3%,
representando mais de 1,7 milhão de brasileiros.
Vale relembrar que as projeções apresentadas
levaram em consideração os pesos relativos dos
indivíduos na amostra. Entre adolescentes (jovens
de 14 a 17 anos), as prevalências de uso de crack
na vida e nos últimos 12 meses observadas foram
0,8% e 0,1% respectivamente.

Proporção de indivíduos que utilizaram determinada


substância alguma vez na vida (2012)
Substância Adolescentes Adultos
(consumo no
último ano) % N % N
Cocaína 2,3 316.040 3,8 5.131.954
Estimulantes 1,3 182.302 2,7 3.694.737
Ritalina 0,6 87.050 0,4 568.249
Crack 0,8 108.867 1,3 1.766.438
Oxi 0,5 66.454 0,3 420.099
Tranquilizantes 2,5 342.209 9,6 12.842.014
Solventes 2 275.460 2,2 949.804
Ecstasy 0,5 70.985 0,7 1.105.167
Morfina 0,1 14.258 0,8 208.958
Heroína 0,2 25.854 0,2 695.600
Esteroides 0,8 112.212 0,6 862.833
Alucinógenos 1,4 191.646 0,9 1.208.616
Anestésicos 0,4 52.091 0,5 695.600
Cristal 0,3 40.091 0,3 364.322
Maconha 4,3 597.510 6,8 7.831.476
Total população 13.947.197 134.370.019

Fonte:
II LENAD (2014).

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
24 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Proporção de indivíduos que utilizaram determinada
substância nos últimos 12 meses (2012)
Substância Adolescentes Adultos
(consumo no
último ano) % N % N
Cocaína 1,6 225.655 1,7 2.287.720
Estimulantes 0,9 124.620 1,1 1.482.951
Ritalina 0,2 33.927 0,3 379.478
Crack 0,1 18.235 0,7 898.285
Oxi 0,1 7.119 0,3 454.830
Tranquilizantes 1,4 198.278 6 8.067.462
Solventes 1,2 171.911 0,5 614.861
Ecstasy 0,1 20.412 0,2 317.374
Morfina 0,1 14.258 0,6 750.547
Heroína 0,1 7.119 0,2 256.641
Esteroides 0,6 87.613 0,3 352.093
Alucinógenos 0,8 111.263 0,5 714.574
Anestésicos 0,4 53.460 0,3 414.168
Cristal 0,2 21.811 0,3 455.295
Maconha 3,4 478.103 2,5 3.374.242
Total população 13.947.197 134.370.019

Conhecer a proporção de brasileiros que faz uso de Fonte:


II LENAD (2014).
alguma droga é importante, mas não responde a
todas as perguntas necessárias para direcionar as
políticas de saúde, principalmente as de prevenção,
tais como: quais os fatores de riscos estão
associados ao abuso e à dependência de drogas?

Veja a seguir os grupos de fatores de risco que são


abordados no II LENAD.

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
25 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Saúde física da população

Saúde mental

Rede de suporte social

Eventos recentes e violência

Chama atenção o fato de que a ansiedade, neste


estudo, aparece como sintoma vivido por 17%
dos adolescentes alguma vez na vida e por 12,7%
como tendo vivido nos últimos 12 meses. Entre
adultos, a proporção daqueles que declararam
ter sofrido de ansiedade também apresenta
frequência significativa: 18,5% declararam ter
sofrido de ansiedade nos últimos 12 meses e
23,9% relataram ter sofrido alguma vez na vida.
Ainda entre adultos, a proporção de indivíduos
que declarou ter sofrido de enxaqueca e de
depressão alguma vez na vida também é bastante
significativa: 21,6% e 15,1% respectivamente.

Sobre a qualidade de vida, destacamos aqui


algumas frequências encontradas no estudo.

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
26 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Quando indagados sobre
oportunidades de lazer,
14,1% dos adolescentes
disseram não ter “nada”
ou “muito pouco”. Entre
adultos, essa proporção
é de 25,7%; ou seja, 1⁄4
dos adultos brasileiros
consideram ter pouca ou
nenhuma oportunidade
de lazer.

Fonte: fizkes/
Shutterstock.com

13,7% dos adultos


responderam “bastante
ou extremamente”
quando perguntados
sobre o quanto precisam
de tratamento médico
para levar sua vida diária.
Entre adolescentes,
a proporção é de 7,2%.

Fonte:
Alexander_Safonov/
Shutterstock.com

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
27 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
As políticas de prevenção ao uso de drogas devem considerar fatores de riscos
em vários domínios da vida, como social (qualidade de vida) e de saúde global,
incluindo a saúde mental.

Não é nosso objetivo aqui detalhar todos


os achados epidemiológicos de estudos
recentes, mas é importante destacar que
os estudos epidemiológicos servem não
somente ao propósito de retratar o perfil da
população geral. É possível fazer estudos de
populações específicas, como o perfil de uso de
substância por estudantes do ensino primário
e do secundário. Para mostrar um exemplo,
apresentamos, a seguir, um levantamento de
populações específicas: o Levantamento de
Cenas de Uso em Capitais (LECUCA).

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
28 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Fonte:
Agência Brasil
Fotografias /
O LECUCA, estudo que traça o perfil dos Wikimedia.org
frequentadores da maior cena aberta de consumo de
crack do país, a Cracolândia paulista, na região da Luz,
centro de São Paulo, encontrou dados importantes
sobre os usuários de crack que frequentam esse local
em 2016, 2017 e 2019.

O perfil sociodemográfico dos frequentadores da


Cracolândia mostra que a população é, em sua maioria,
composta por homens (68,7%), solteiros (77,6%), com
idade média de 35,2 anos; as mulheres participantes
da pesquisa representaram 23,7% da amostra, com
idade média de 34,6 anos. Observa-se que 7,5% dos
frequentadores são transgêneros e com idade média
de 30 anos. As proporções de mulheres e transgêneros
parece flutuar no decorrer dos anos, apresentando um
aumento das mulheres e diminuição da população
transgênero entre 2017 e 2019. Grande parte dos
frequentadores (87%) declarou não possuir nenhuma
atividade remunerada. Destes, quase 80% estão nessa

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
29 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
condição há pelo menos um ano e mais da metade há
cinco anos ou mais. Mais da metade dos entrevistados
(56,8%) referiram não possuir nenhuma fonte de
renda, seja advinda de trabalho ou de programas de
transferência de renda. Destaca-se o aumento da
proporção de respondentes sem exercer nenhuma
atividade por um longo período de tempo. Em 2016, 51,
5% estavam sem atividade há pelo menos 1 ano e 17,8%
há 5 anos ou mais, enquanto em 2019 observou-se que
79,4% se encontravam sem nenhuma atividade há pelo
menos um ano e, destes, 52% há 5 anos ou mais.

Para o propósito deste curso, é importante


que você conheça alguns dados fundamentais
e, sobretudo, a importância dos estudos
epidemiológicos para embasamento das políticas
públicas de prevenção e tratamento.

Apenas com conhecimento de dados levantados por


meio de um estudo epidemiológico bem desenhado
com metodologia adequada, podemos ter um retrato
de como está o consumo de drogas, qual é o perfil
da população que usa, abusa ou possivelmente
seja dependente de drogas. O levantamento
domiciliar com amostra aleatória e probabilística
é um método adequado de se obter esses dados.
O II Levantamento Nacional de Álcool e Drogas e
III Levantamento Nacional sobre o Uso de Drogas
pela População Brasileira são estudos grandes
realizados com metodologia adequada e que podem
subsidiar as políticas públicas. Estas sempre deveriam

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
30 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
se embasar em evidências e métodos científicos
validados para proposição de diretrizes e ações tanto
de tratamento como de prevenção. O Levantamento
das Cenas de Uso em Capitais é outro exemplo para
estudar uma população específica: os usuários de
crack em situação de rua.

Esses e outros dados podem sem dúvida embasar


políticas de assistência a essa população em alta
vulnerabilidade.

Na Prática
Quais dados sobre fatores de risco associados ao
consumo de substâncias você gostaria de saber sobre a
população brasileira que poderiam ser respondidos pelos
estudos epidemiológicos?

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
31 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas
Referências
BASTOS, F. I. P. M. et al. (org.). III levantamento
Nacional sobre o Uso de Drogas pela População
Brasileira. Rio de Janeiro: ICICT/Fiocruz, 2017.

MADRUGA, C. S. (coord.) et al. Levantamento


de Cenas de Uso em Capitais – São Paulo
(LECUCA). 2020. Disponível em: https://
revistadependenciaquimica.com.br/wp-content/
uploads/2020/12/Relatorio-LECUCA-SP-Final.pdf.
Acesso em: 22 fev. 2020.

II Levantamento Nacional de Álcool e Drogas


(LENAD). Ronaldo Laranjeira (Supervisão) et al. São
Paulo: Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia
para Políticas Públicas de Álcool e Outras Drogas
(INPAD), UNIFESP, 2014.

CURSO POLÍTICA NACIONAL SOBRE DROGAS


Módulo 2 – A Epidemiologia do Uso de Drogas e as Evidências sobre o
32 que Funciona e que não Funciona em Políticas Públicas

Você também pode gostar