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GEOTECNOLOGIAS APLICADAS AO PLANEJAMENTO E

GESTÃO AMBIENTAL: abordagens aplicadas à Zona Costeira do


Estado de São Paulo (Brasil)

CASTRO, Mariana de; MELLO, Kaline de; TOPPA, Rogério Hartung

Mariana de CASTRO
Graduanda, Bióloga, UFSCAR, Núcleo de Estudos em Ecologia da Paisagem e Conservação, João Leme dos
Santos, Sorocaba – Brasil, 55 15 32296003, mdc_mari88@hotmail.com

Kaline de MELLO
Mestranda, Bióloga, UFSCAR, Núcleo de Estudos em Ecologia da Paisagem e Conservação, João Leme dos
Santos, Sorocaba – Brasil, 55 15 32296003, kaline.mello@gmail.com

Rogério Hartung TOPPA


Professor Doutor, Biólogo, UFSCAR, Núcleo de Estudos em Ecologia da Paisagem e Conservação, João Leme dos
Santos, Sorocaba – Brasil, 55 15 32296003, toppa@ufscar.br

RESUMO

Em função da acentuada pressão antrópica no meio ambiente, é necessário monitorar as Zonas


Costeiras com relação aos aspectos jurídicos. Na região do Sistema Anchieta-Imigrantes
(localizado no Estado de São Paulo, Brasil) são frequentes as ocupações irregulares em Áreas
de Preservação Permanente e outros locais legalmente protegidos. Frente a esse cenário é
importante realizar um planejamento para evitar a expansão urbana desordenada e ilegal, que
pode provocar riscos ambientais além da perda de hábitat. O uso de geotecnologias, como SIG
(Sistemas de Informação Geográfica) e geoprocessamento permite facilitar a identificação de
áreas protegidas pela legislação brasileira. Essas tecnologias auxiliam na gestão subsidiando
decisões por meio da espacialização de informações sobre o território. O objetivo do presente
estudo é avaliar a dinâmica espacial de uso do solo de um trecho do Sistema Anchieta-
Imigrantes a fim de se obter subsídios para a análise de infrações em áreas legalmente
protegidas. Como metodologia, fotomosaicos de fotografias aéreas dos anos de 1963, 1972,
1987, 1994, 2001 e 2007 foram vetorizados originando planos de informação no MapInfo 9.5.
Além disso, por meio da elaboração de um mapa temático foram identificados conflitos em áreas
de proteção legal utilizando o Código Florestal Brasileiro. Um dos resultados observados foi o
aumento crescente na urbanização, com picos em 1972 e 1987, coincidentes com o crescimento
econômico da área. Ocorreu também a redução de Áreas de Preservação Permanente ao longo
dos referidos anos.

Palavras-chave: Baixada Santista, Sistema Anchieta-Imigrantes, SIG, Áreas de Preservação


Permanente, Dinâmica espacial.
1 - INTRODUÇÃO

Uma das regiões que apresenta riscos ambientais é a Zona Costeira, a primeira região
do Brasil a ser colonizada. Hoje essa área abriga remanescentes florestais de Mata Atlântica,
manguezais e matas de restinga, os quais apresentam alta biodiversidade e, portanto, são de
suma importância para a conservação de diversas espécies (AFONSO, 2006). Essas
características espaciais da paisagem se aplicam também a área de estudo (Figura 1), a Região
Metropolitana da Baixada Santista (RMBS), localizada no litoral sul do Estado de São Paulo
(Brasil) (MELLO, 2008). Essa região é de extrema importância não só econômica, considerando
os complexos industriais e portuários, presentes principalmente em Cubatão e Santos, mas
também biológica em função da presença de vegetação remanescente de Mata Atlântica, mata
de encosta, restinga e manguezais (MELLO, 2008). Porém, esses remanescentes foram se
tornando cada vez mais ameaçados, principalmente com o aumento populacional em virtude da
construção da Via Anchieta e a consolidação de Cubatão como pólo industrial (YOUNG &
FUSCO, 2006).

A implantação de vias de acesso na Baixada Santista, como a Rodovia dos Imigrantes,


atraiu trabalhadores menos qualificados e de baixa renda, que foram estabelecendo suas
residências em assentamentos irregulares (áreas com alta vulnerabilidade ambiental) ao longo
da planície e das encostas de uma escarpa denominada Serra do Mar. Esses assentamentos
passaram a ocupar uma área pertencente ao Parque Estadual da Serra do Mar (PESM) a partir
de seu decreto em 1977, e mesmo assim continuaram se expandindo (YOUNG & FUSCO,
2006). Por isso, é necessário desenvolver estratégias para evitar essa expansão e a ocupação
irregular em regiões que além de provocar uma maior perda de biodiversidade, alteração da
topografia e da permeabilidade do solo, pode causar riscos ambientais (AFONSO, 2006). Uma
das maneiras de se evitar esses riscos é respeitar as delimitações de Áreas de Preservação
Permanente (APP) previstas no Código Florestal Brasileiro (Lei Federal 4.771/65).

De acordo com a Lei nº 7.803/89, que altera a redação da Lei nº 4.771, de 15 de


setembro de 1965, a APP consiste em uma área não obrigatoriamente coberta por vegetação
nativa que possui funções ambientais como a preservação dos recursos hídricos, paisagens,
estabilidade geológica e pedológica, biodiversidade e fluxo gênico tanto de fauna quanto de flora.
Segundo o Art. 2º da referida Lei, são de preservação permanente as florestas e outras formas
de vegetação que se encontrem ao longo de corpos d’água como rios, lagoas, lagos,
reservatórios naturais ou artificiais, nascentes (inclusive consideradas intermitentes), topo de
morros, montes, montanhas e serras, encostas com declividade superior a 45º, restingas e
regiões com altitude superior a 1.800 m, independente da vegetação. Além disso, como está
previsto no Art. 3º dessa Lei, a APP contribui para o bem estar das populações humanas, de
maneira que contribuem para a atenuação de erosão das terras, fixação de dunas, formação de
faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias, auxílio da defesa do território nacional de
acordo com autoridades militares, proteção de sítios de beleza cênica, de valor científico ou
ainda histórico, abrigo para espécies ameaçadas de extinção e manutenção do ambiente para
suprir populações silvícolas (CONAMA, 2001).

Também está prevista na referida Lei a situação de áreas ou aglomerações urbanas e


regiões metropolitanas, sendo que os limites citados anteriormente deverão estar dispostos nos
planos diretores e leis de uso do solo. Além disso, pelo Art. 4º, a supressão de vegetação em
APP poderá ser autorizada em caso de utilidade pública ou interesse socioeconômico quando
não houver alternativa técnica ou locacional. Porém, o empreendimento deverá ser devidamente
detalhado e justificado, sendo que a autorização dessa supressão caberá ao órgão ambiental
estadual competente e se necessário do órgão federal ou municipal. Juntamente com a
autorização da referida supressão de vegetação serão emitidas as medidas mitigadoras e
compensatórias que deverão ser colocadas em prática pelo proponente. Essa Lei ainda prevê o
acesso de pessoas e animais às APP a fim de se obter água, desde que não ocorra supressão e
tampouco prejuízos para a regeneração e manutenção da vegetação (CONAMA, 2001).

Para se delimitar as APP de maneira mais eficiente faz-se o uso das geotecnologias, ou
seja, de um conjunto de tecnologias – ligadas às geociências – de informação geograficamente
referenciada. O geoprocessamento é um conjunto de tecnologias de manipulação, análise,
modelagem e visualização dos dados georreferenciados (com registro espacial de acordo com
um determinado sistema de coordenadas). A técnica de geoprocessamento pode ser agregada
ao uso de SIG (Sistemas de Informação Geográfica), cujas principais funções são coletar,
armazenar, recuperar, manipular, visualizar e analisar os dados georreferenciados. O SIG está
estruturado de tal maneira que integra dados, equipamentos e pessoas. Esse sistema fornece
subsídios para gestão, planejamento, manejo, caracterização de espaços, entre outros, podendo
ser aplicado ao zoneamento ambiental, monitoramento de áreas de risco e de proteção
ambiental, controle de ocupações e construções irregulares, entre outros (FITZ, 2008).

Ao espacializar as informações territoriais, o geoprocessamento permite com que seja


mais eficiente o manuseio desses dados e o estabelecimento de faixas de influência (buffers) em
torno das APP. Outra vantagem dessa tecnologia é a possibilidade de estabelecer essas faixas
de proteção evitando-se a realização de recorrentes visitas de campo e a demanda de grande
número de funcionários para a fiscalização, o que reduz os custos desse tipo de trabalho. Além
de se identificar áreas legalmente protegidas, também é importante analisar a dinâmica espacial
do local de estudo ao longo do tempo, contribuindo para previsão de tendências futuras de
crescimento principalmente com relação às áreas urbanas, contribuindo para o planejamento do
uso e ocupação da terra (CANEPARO, 2000). O objetivo desse estudo foi avaliar a dinâmica
espacial da ocupação humana de um trecho do Sistema Anchieta-Imigrantes a fim de se obter
subsídios para a análise de infrações em áreas legalmente protegidas.

2 - MATERIAIS E MÉTODOS

2.1 Área de Estudo

A área de estudo do presente trabalho abrange a RMBS, localizada na Zona Costeira do


estado de São Paulo, Brasil, sendo composta pelas cidades de Peruíbe, Itanháem, Mongaguá,
Praia Grande, São Vicente, Santos, Cubatão, Guarujá e Bertioga (Figura 1).

A RMBS apresenta uma área de 2.373 km2, representando menos de 1% do território


nacional, sendo, entretanto, a terceira região mais populosa do estado. Possui uma população
de 1.535.460 habitantes, sendo os municípios de Santos e Bertioga, respectivamente, os mais e
menos populosos (IBGE 2010).

A RMBS localiza-se no bioma da Mata Atlântica, considerado um dos 25 hotspots


mundiais de biodiversidade, abrigando diversas espécies endêmicas de aves, répteis e
mamíferos (MYERS et al., 2000). Atualmente, as estimativas de cobertura da Mata Atlântica
estão entre 11 a 16%, porém a grande preocupação é que mais de 80% dos fragmentos são
menores que 50 ha, sendo que a há uma considerável distância entre os fragmentos, e as áreas
protegidas mantém apenas 9% dos remanescentes florestais e 1% da floresta original (RIBEIRO
et al., 2009).

A RMBS apresenta diversas Unidades de Conservação e áreas protegidas, como a


Estação Ecológica da Juréia, o Parque Estadual Xixová-Japuí, o Parque Estadual da Serra do
Mar, entre outras, demonstrando a relevância da área na conservação da biodiversidade.

Com a finalidade de se realizar um maior detalhamento sobre o assunto foi delimitado


um polígono (Figura 1) de estudo associado ao Sistema Anchieta-Imigrantes. Além disso, a
região delimitada inclui trechos dos municípios de São Vicente, Cubatão, Praia Grande e Santos.

Figura 1 – Polígono de estudo, Região Metropolitana da Baixada Santista, estado de São Paulo,
Brasil.

2.2 Procedimento metodológico

Com base nos fotomosaicos georreferenciados de fotografias aéreas dos anos de 1963,
1972, 1987, 1994, 2001 e 2007 foi realizada a vetorização de elementos a fim de se elaborar os
planos de informação. Foram definidos dois planos de informação: o plano de áreas ocupadas,
que apresenta as classes de ocupação habitacional e industrial, e o plano viário com as classes
de rodovias do Sistema Anchieta-Imigrantes e as ferrovias. Os referidos planos foram elaborados
para os anos de 1963, 1972, 1984 e 2001 com o uso do software MapInfo 9.5, sistema de
coordenadas Latitude/Longitude e Datum SAD-69 (MELLO et al., 2009). Para o presente estudo
os mesmos planos foram desenvolvidos para o ano de 2007. Além disso, para o ano de 2007
também foram construídos planos de hidrografia (principais corpos d’água vetorizados com base
na fotointerpretação) e de APP associadas. Para a elaboração da carta temática de conflitos
(ocupações irregulares em áreas legalmente protegidas) realizou-se a tabulação cruzada dos
planos de informação de áreas ocupadas, hidrografia e APP. Todos os planos de informação e
as cartas temáticas foram geradas com o uso do software MapInfo 9.5.

Para a presente análise foram selecionadas somente as APP que se enquadram


segundo o Art. 2º da Lei nº 7.803/89, em que ao longo dos rios ou de outros corpos d’água
considerando o seu nível mais alto deve haver uma faixa marginal de vegetação preservada com
largura mínima de 30 m para cursos d’água com largura inferior a 10 m; 50 m para cursos d’água
com largura de 10 a 50 m; 100 m para cursos d’água com largura entre 50 e 200 m; 200 m para
cursos d’água com largura de 200 a 600 m; e 500 m para cursos d’água com largura superior a
600 m (CONAMA, 2001).

2.3 Tratamento dos dados

A área dos polígonos representativos de cada plano de informação foi determinado com
o uso do SIG-MapInfo 9.5. Com isso, o processamento dos dados espaciais consistiu na
quantificação das áreas das classes de ocupação industrial e habitacional e a contabilização da
área urbanizada (habitacional somada à industrial) com relação ao polígono de estudo para cada
ano (MELLO et al., 2009).

A referida variação foi calculada com base na equação de diferença:

Diferença (m2) = Área data final – Área data inicial

Com base na Equação (1) calculou-se a variação de maneira que:


Diferença
Variação (%) = x 100
( data inicial
Área
A porcentagem de urbanização por ano considerando a área total do polígono de estudo
(correspondente a 178.800.000 m2) foi calculada de acordo com a equação:
Área industrial + Área habitacional
Urbanização (%) = ______________ x 100
Área polígono
As regiões de conflito (presença de áreas ocupadas nos limites das APP) também foram
quantificadas. Para se calcular a perda de APP considera-se a relação:

APP redução (m2) = Conflito indústrias + Conflito habitação

sendo que:

Conflito indústrias = área industrial dentro dos limites de APP;

Conflito habitação = área habitacional dentro dos limites de APP.

Além disso, essa perda foi contabilizada em porcentagem com relação à área total de
APP presente no polígono de estudo, sendo que:
APP redução
APP redução (%) = x 100
APP total
Também foi calculada a taxa de APP perdida em função somente da habitação:
Conflito habitação
APP habitação (%) = __________ x 100
APP total
Abaixo segue o cálculo que foi aplicado para determinar a perda de áreas em função da
industrialização:
Conflito indústria
APP indústria (%) = __________ x 100
APP total

3 - RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 Dinâmica espacial

Com base na vetorização e tabulação cruzada dos planos de informação foram


construídos mapas temáticos referentes aos anos de 1963, 1972, 1987, 1994 (Figura 2), 2001
(Figura 3) e 2007 (Figura 4).

A B

C D

Figura 2 – Mapeamento dos planos de informação correlacionados ao uso e ocupação da terra


para os anos de 1963 (A), 1972 (B), 1987 (C) e 1994 (D), Baixada Santista, estado de São
Paulo, Brasil (Fonte: MELLO, 2008).
Figura 3 – Mapeamento dos planos de informação correlacionados ao uso e ocupação da terra
para o ano de 2001, Baixada Santista, estado de São Paulo, Brasil (Fonte: MELLO, 2008).

Figura 4 – Mapeamento dos planos de informação correlacionados ao uso e ocupação da terra


para o ano de 2007, Baixada Santista, estado de São Paulo, Brasil.
Foi possível observar um aumento na distribuição de manchas de área habitacional e
industrial ao longo do tempo. Pode-se verificar um alto crescimento na área industrial no período
de 1963-72, provavelmente em função da construção de rodovias, com início na década de 40
com a Rodovia Anchieta (Figuras 5 e 6). Esse fator, juntamente com o aumento populacional na
década de 60, pode ter contribuído para o maior aumento encontrado na urbanização no período
de 1972-87 (Figuras 5, 6 e 7), bem como para a favelização na década de 80, uma vez que não
houve planejamento durante essa expansão. Além disso, em função do aumento da demanda
por bens de consumo a Rodovia dos Imigrantes foi inaugurada em 1976, intensificando o turismo
na região.

Figura 5 – Área em milhões de metros quadrados para a série temporal analisada, considerando
total de área urbanizada e as classes de ocupação industrial e habitacional, Baixada Santista,
estado de São Paulo, Brasil.

Figura 6 – Porcentagem de variação para a série temporal analisada, considerando o total de


área urbanizada e as classes de ocupação industrial e habitacional, Baixada Santista, estado de
São Paulo, Brasil.
Figura 7 – Porcentagem de urbanização para a série temporal analisada, Baixada Santista,
estado de São Paulo, Brasil.

Nesse mesmo período, o aumento de áreas industriais pode ser explicado pelo maior
trânsito portuário e pelo desenvolvimento de Cubatão como pólo industrial. Com a expansão
urbana sem planejamento, o crescimento econômico da região foi responsável pelo aumento do
custo de vida. Na falta de conjuntos habitacionais destinados à população de baixa renda,
surgiram loteamentos irregulares em áreas de preservação e até de risco, como manguezais,
vales e encostas. Consequentemente foram provocados não só impactos ambientais, como
também ameaças à saúde das populações humanas que se estabeleceram nesses locais
(MELLO, 2008).

Os valores absolutos em área ao longo dos anos (Figura 5) indicam uma tendência de
crescimento na área total urbanizada desde a década de 80 até 2007, além de uma estagnação
na expansão industrial. No período de 1987-94 houve aumento na urbanização semelhante ao
período de 1963-72. Entretanto, diferentemente das décadas de 60 e 70, a expansão da mancha
urbana foi superior à expansão industrial e esse padrão foi mantido até 2007. De acordo com
Mello (2008), essa mudança pode ter relação com a estabilização da economia e também com a
limitação de espaço físico para áreas industriais a partir da década de 80. Deve-se considerar
também a limitação das áreas habitacionais em função da estreita faixa de planície, presença de
áreas inundáveis e de manguezais.

A redução do crescimento de áreas habitacionais no período de 1994-01, também pode


ter sido provocada pela intensificação da verticalização de moradias em todos os municípios da
Baixada Santista. Além disso, pode ter ocorrido uma menor urbanização em função da
publicação do Código Florestal Brasileiro em 1965, que limitou a expansão por meio de
penalizações aos infratores. A diminuição das manchas industriais pode estar ligada à
incorporação do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatório de Impacto sobre o Meio
Ambiente (RIMA) a partir de 1986, com a Resolução CONAMA nº 01/86. A necessidade de uma
licença ambiental para um empreendimento de grande porte dificultou o desenvolvimento do
setor industrial, pois uma série de medidas, inclusive mitigadoras para impactos ambientais
irreversíveis, deve ser atendida (FUNGARO et al. 2009).

No período de 2001-07 notou-se novamente uma estabilização na ocupação de áreas


industriais, provavelmente, em função dos mesmos motivos apresentados para as décadas de
80 e 90. O aumento na taxa de urbanização pode ser explicado pelo crescimento do setor de
construção civil, o qual atraiu funcionários com pouca ou nenhuma qualificação profissional que
passam a se instalar na região (MELLO, 2008). Um exemplo é a construção da Nova Rodovia
dos Imigrantes, inaugurada em 2004. Segundo Fungaro et al. (2009), a Nova Imigrantes é
menos impactante, pois sua construção teve de se adequar às exigências do EIA-RIMA. Foi
observada redução do impacto ambiental na vegetação, pois a previsão era de 600.000 m 2 pelo
EIA e na realidade houve uma perda de 51.446 m2. Isso foi possível principalmente com a
construção de mais túneis e viadutos, o que dificultou a observação da rodovia no mapeamento
de uso e ocupação da terra de 2007.

3.2 Análise de infrações em áreas legais

A Figura 8 apresenta o mapeamento da legislação correlacionada à distribuição das


APP, determinadas com base na distribuição dos principais corpos d’água vetorizados por meio
da fotointerpretação dos registros fotográficos do ano de 2007, para a área de estudo. O
mapeamento revelou que a região de estudo deveria contemplar 53.430.000 m2 referentes às
APP associadas à hidrografia mapeada, o que seria o cenário ideal correlacionado às diretrizes
pré-estabelecidas pela legislação ambiental brasileira. A situação atual das APP mapeadas
apresenta 45.330.000 m2, o que representa aproximadamente 85% do cenário ideal (Figura 10).

Figura 8 – Cenário ideal referente à distribuição das Áreas de Preservação Permanente


associadas aos principais corpos d’água vetorizados com base na fotointerpretação de registros
aerofotogramétricos do ano de 2007, Baixada Santista, estado de São Paulo, Brasil.
Figura 9 – Carta de conflitos legais com base na distribuição das áreas de Preservação
Permanente (APP), para a distribuição da hidrografia mapeada pela fotointerpretação de
registros aerofotogramétricos do ano de 2007, Baixada Santista, estado de São Paulo, Brasil.

As áreas habitacionais foram responsáveis por uma redução de aproximadamente 13%


e os conflitos correlacionados às áreas industriais compreendem aproximadamente 2% (Figura
10). A expansão industrial se apresenta pouco presente na redução de APP provavelmente em
função da criação do Código Florestal que determinou as áreas de APP e uma série de
penalidades aos infratores aliada ao maior controle por parte do Governo Federal de
empreendimentos por meio da imposição de estudos ambientais para o licenciamento de
empreendimentos.

Figura 10 – Infrações em APP em função de áreas habitacionais e industriais, Baixada Santista,


estado de São Paulo, Brasil.
Segundo o Art. 22 da Lei nº 7.803/89, a fiscalização das normas do Código Florestal
cabe aos municípios nas áreas urbanas, sendo que o Governo Federal tem a função de apoiar
esse processo. O objetivo dessa fiscalização é detectar infrações penais e passíveis de punição
de um período de três meses a um ano de prisão simples, ou multa de até 100 vezes o salário
mínimo mensal, podendo também ser aplicadas ambas as penas referidas. Como consta no Art.
26, as infrações em APP consistem em cortar árvores sem permissão do órgão ambiental ou
outra autoridade competente, destruir ou danificar a vegetação, ainda que em regeneração, bem
como impedir ou dificultar essa regeneração natural. De acordo com o Art. 29, poderão ser
penalizados os autores diretos, arrendatários, parceiros, posseiros, gerentes, administradores,
diretores, promitentes compradores ou proprietários das áreas com cobertura florestal, inclusive
autoridades que possam se omitir ou facilitar o ato por meio de consentimento legal (CONAMA,
2001).

Na tentativa de se fiscalizar a região da Baixada Santista, com base no Código, foi


criado o Programa Regional de Identificação e Monitoramento de Áreas de Habitação
Desconforme (PRIMAHD) pela Agência Metropolitana da Baixada Santista (AGEM). Esse projeto
realiza a identificação, qualificação e quantificação de habitações em desconformidade, sendo
necessário para planejamento futuros, pois ocorre a integração dos nove municípios que fazem
parte da Baixada Santista. Além disso, desde 1970 existe o Plano Metropolitano de
Desenvolvimento Integrado (PMDI) da RMBS, sendo que sua última revisão resultou no plano de
2002. Dentre seus objetivos, o PMDI é responsável por revelar cenários de desenvolvimento e
demandas a curto, médio e longo prazo, auxiliando na organização e atuação de agentes
públicos e particulares, e também na urbanização e ordenamento espacial, visando à
preservação de áreas previstas pela legislação (AGEM, s. d.).

Os instrumentos jurídicos, projetos e planos diretores contribuíram para que a redução


das APP ultrapassasse 15% de sua área total referente ao contexto apresentado nesse trabalho.
Porém, esses instrumentos apresentam predominantemente um caráter intimidador, não
auxiliando nos processos identificação do infrator. Isso se deve à dificuldade de fiscalização das
áreas legalmente protegidas por parte do poder público. Hoje no Brasil, existem poucos
funcionários atuando nesse processo, por isso a publicação de um plano de gestão por si só não
é responsável pela devida ordenação territorial. Os planos devem estar associados a um
contínuo monitoramento. Além disso, notou-se a falta de estabelecimento de políticas públicas
de auxílio aos moradores de baixa renda que eram atraídos para a região em função da
presença de indústrias, vias de transporte e o crescimento econômico da região. Segundo Young
(2008), durante esse processo de desenvolvimento, a oferta de empregos era maior do que a
disponibilidade de moradia para as populações menos qualificadas. Consequentemente foram
formados conjuntos populacionais desestruturados, distantes e menos valorizados. Essas
regiões geralmente são áreas de proteção legal, pois são de difícil acesso em termos de
declividade e presença de vegetação e, portanto, demoram mais para apresentar serviços como
energia elétrica e saneamento básico, diferentemente dos grandes centros urbanos localizados
na planície.

Por fim, é importante ressaltar que as APP identificadas no presente estudo


correspondem somente às margens dos cursos d’água identificados pela fotointerpretação. Esse
dado pode explicar a baixa redução de APP encontrada para o ano de 2007. Por se tratar de
uma região dotada de fisionomias vegetais como manguezais e restingas, além de áreas com
diferentes declividades (presença de planície litorânea e a escarpa Serra do Mar), a área de
estudo apresenta maior quantidade de APP como previsto pelo Código Florestal, e
provavelmente houve uma maior perda das áreas em questão, que devem ser analisadas em
estudos mais aprofundados para o planejamento e gerenciamento regional.

4 – CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho possibilitou a correlação dos dados apresentados referentes ao


aumento do crescimento das áreas urbanizadas em diferentes taxas ao longo das décadas
estudadas. Além disso, observou-se um padrão de ocupação da terra, sendo que até a década
de 70 a mancha industrial cresceu mais do que as áreas habitacionais, enquanto a partir da
década de 80 o crescimento da mancha habitacional foi maior. A principal hipótese para essa
observação consiste na imposição de licença ambiental para grandes empreendimentos e
publicação de outras leis ambientais, além da estabilização da economia e limitações do espaço
físico.

Com isso, foi possível analisar a redução de APP em 2007, em relação à área ideal de
APP. A inversão de cenário indicada na dinâmica espacial está relacionada à maior influência de
áreas habitacionais para a diminuição da vegetação em questão, em função da ocupação
desestruturada e sem fiscalização da população de baixa renda, que se estabeleceu
principalmente em áreas legalmente protegidas.

Segundo Araújo (2002), a legislação que regulamenta as APP está em desconformidade


com o zoneamento urbano. O Código Florestal possibilita dupla interpretação no que diz respeito
ao estabelecimento dos limites dessas áreas protegidas, sendo que o termo “limite”, que consta
em lei, pode ser compreendido como delimitação máxima – e não mínima como previsto no
Código – nas áreas urbanas. Até sua última atualização com medidas provisórias de 2001, esse
mesmo Código trata da possibilidade de supressão de florestas de preservação permanente no
Art. 3º, desde que aprovado pelo Governo Federal. Esse trecho da lei dá margem a
interpretações equivocadas, como a possibilidade de supressão de mangues ou outras
fitofisionomias. Portanto, ainda que a preservação dessas áreas estivesse prevista por lei,
interpretações equivocadas possibilitaram a invasão e redução das APP, como observado no
presente estudo de caso.

Sendo assim, pode-se perceber que o planejamento das zonas costeiras, na Baixada
Santista, ao contribuir para o ordenamento do território, delimitando as áreas passíveis de
expansão e locais destinados à conservação, deve estar aliado a políticas públicas para
adequação de populações em condições de irregularidade e a instrumentos de fiscalização.
Estudos como esse, com aplicação de geotecnologias, fornecem subsídios para a gestão de
áreas como a Zona Costeira, além de auxiliar no monitoramento das infrações, possibilitando a
conservação de regiões fundamentais para a saúde do ecossistema e das populações humanas.

BIBLIOGRAFIA

AFONSO, C. M. (2006). A paisagem da Baixada Santista: Urbanização, transformação e


conservação. São Paulo (Brasil), Edusp/FAPESP, 309 pp.

AGEM – Agência Metropolitana da Baixada Santista. Disponível em:


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ARAÚJO, S. M. V. Z. (2002). “As Áreas de Preservação Permanente e a questão urbana”.
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CANEPARO, S. C. (2000). “Análise da dinâmica espacial da ocupação antrópica em


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FUNGARO, D. A.; MARGARIDO, L.; MARTINS, L. (2009). “Gestão Ambiental no Projeto da


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