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Departamento de Arquitetura
Trabalho prático I
“VIVÊNCIA”
Grupo 1 - TP2 Francisca Carvalho, Joana Ramos, Mara Nogueira, Maria Francisca Ferreira,
Mariana Ramos, Sabrina Vieira
ÍNDICE
CONCEITO ................................................................................................................... 1
CONCLUSÃO ....................................................................................................... 21 – 22
1
“DA ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO”, FERNANDO TÁVORA
“Aquilo a que chamamos espaço é constituído por matéria e não apenas as formas e
as linhas que nele existem e o ocupam, como os nossos olhos deixam supor.”2
1 TÁVORA, Fernando, Da Organização do Espaço, 9º edição, Editora FAUP. Porto, página 12.
2 PORTAS, Nuno – Prefácio à edição de 1982. In TÁVORA, Fernando – Da Organização do Espaço, página 24.
3 TÁVORA, Fernando, Da Organização do Espaço, 9º edição, Editora FAUP. Porto, página 20.
2
pensamos e usamos os espaços, já que nem sempre a forma como pensamos o espaço é
entendida da mesma forma pelos outros, originando usos variados.
Durante esta obra, Peter Zumthor refere muitas vezes a vivência como forma de
pensamento e processo projetual. Logo no início, descreve um espaço da sua infância e
atribui a esse espaço a sua conceção atual de uma cozinha.
Vai mais além e atribui a estas experiências não só as conceções que tem dos
espaços tradicionais que conhecemos numa habitação, algo que todos nós criamos
inconscientemente, mas joga com elas e puxa-as para a prática arquitetónica que desenvolve.
Existe assim uma intencionalidade de fazer arquitetura numa “cooperação contínua entre o
sentimento e o intelecto” 6. As vivências do autor deixam uma marca em coisas mais pontuais
como, por exemplo, na forma como projeta um certo espaço que precisa de conforto e
aconchego, porque as suas noções desses conceitos estão intimamente e necessariamente
4
TÁVORA, Fernando, Da Organização do Espaço, 9º edição, Editora FAUP, Porto, página 75.
5
ZUMTHOR, Peter, Pensar a arquitectura, Editorial Gustavo Gili, Barcelona, página 23.
6
ZUMTHOR, Peter, Pensar a arquitectura, Editorial Gustavo Gili, Barcelona, página 19.
3
ligadas à sua vivência e àquilo que o próprio concebe como conforto e aconchego. Mas numa
macroescala, a vivência do autor, e penso que de qualquer arquiteto, é o que realmente
permite que se projete com vista a tornar o mundo melhor e assim suprimir necessidades e
satisfazer desejos: “ Observo nitidamente o mundo construído e tento recolher nas minhas
obras o que me parece valioso, corrigir o que me incomoda e recriar o que nos faz falta”; “as
raízes do nosso entendimento arquitetónico encontram-se na nossa infância, na nossa
juventude; encontram-se na nossa biografia” 7
Aquilo que o autor vai concluindo ao longo desta obra, e que tem que ver com a
vivência, é que de forma muito essencial, as decisões projetuais são tomadas de acordo com
imagens que tem na memória ou, por outras palavras, vivências do autor. Aquilo que tenta
fazer é encontrar as razões para determinado espaço lhe ter passado certas emoções ou
sensações e levá-las para a sua arquitetura – “o que foi que provocou o sentimento de calor,
de segurança, de leveza ou amplidão que ficou na minha memória (…)”8. Descreve, ao longo
de dois capítulos, espaços e sensações que os mesmos lhe passaram – “este nicho, com a
altura da sala, tem um pequeno degrau que se eleva acima do resto do chão. “Não há dúvida,
é aqui que me quero sentar” 9– as razões que procura não serão mais que o motivo que o
leva a querer sentar-se ali. No fundo, de que forma é que a dimensão do espaço convida a
pessoa a querer abrigar-se ali? Ou de que materiais é composto que o tornam mais
acolhedor? Como é a luz naquele espaço? O segredo talvez seja perceber quais são as
características arquitetónicas deste espaço que nos convida a permanecer. A arquitetura é
feita por pessoas e para pessoas. O seu motivo e fim é sempre as pessoas e é com o pleno
conhecimento da nossa escala, juntamente com as nossas vivências do espaço, que se
consegue fazer boa arquitetura.
7
ZUMTHOR, Peter, Pensar a arquitectura, Editorial Gustavo Gili, Barcelona, página 53.
8
ZUMTHOR, Peter, Pensar a arquitectura, Editorial Gustavo Gili, Barcelona, página 75.
9
ZUMTHOR, Peter, Pensar a arquitectura, Editorial Gustavo Gili, Barcelona, página 38.
10
ZUMTHOR, Peter, Pensar a arquitectura, Editorial Gustavo Gili. Barcelona, página 21.
4
“LAFAYETTE PARK ROW-HOUSING”, MIES VAN DER ROHE
Anteriormente ocupado por um bairro operário (Black Bottom), o atual Lafayette Park,
um dos grandes projetos de renovação urbana, foi projetado com vista à criação de novas
residências, de forma a atrair a classe média alta para o centro de Detroit. Um projeto coletivo,
concluído em 1959, engloba o trabalho do arquiteto Mies van der Rohe, do paisagista Alfred
Caldwell e do planeador Ludwig Hilberseimer.
Nos seus 18 hectares, apresenta uma vasta diversidade de edifícios, desde torres de
apartamentos a residências modulares de um e dois andares, e uma abundante vegetação,
que gera um ambiente seguro e tranquilo, apesar de se encontrar nas proximidades do centro
da cidade. Um dos habitantes das torres, enfatiza a relação criada entre a natureza e o espaço
edificado: “diferentes momentos ao longo das mudanças das estações, com novas paletas
de cores refletindo nas fachadas de vidro e proporcionalmente empolgação visual” 11, ressalta
ainda que “é uma oportunidade única, como viver em um museu ativo dos edifícios de Mies”12.
11
Lafayette Park Row-Housing. Disponível em: https://en.wikiarquitectura.com/building/lafayette-
park/#, consultado a 25 de setembro de 2020.
12
Lafayette Park Row-Housing. Disponível em: https://sah-archipedia.org/buildings/MI-01-WN98,
consultado a 25 de setembro de 2020.
5
As habitações geminadas, em planta, surgem de forma regular e um pouco rígida,
contudo a vegetação envolvente atenua essa força, tornando-as quase invisíveis. A presença
de jardins comunitários e de áreas de lazer comuns, permite a criação de um ambiente
familiar.
13 Ricardo Legorreta-AA. VV., Legorreta & Legorreta, obras recientes: 1997-2003, 1a. Ed., México: Area
Editores, 2003, p.128 (dissertação)
6
Figuras 7 – Lafayette Park Row-Housing, Mies Van der Rohe
14
ZUMTHOR, Peter- Pensar a arquitetura, Editorial Gustavo Gili. Barcelona, página 22.
15
ZUMTHOR, Peter- Pensar a arquitectura, Editorial Gustavo Gili. Barcelona, página 19.
16
ZUMTHOR, Peter- Pensar a arquitectura, Editorial Gustavo Gili. Barcelona, página 23.
17
ZUMTHOR, Peter- Pensar a arquitectura, 1ºedição, Editorial Gustavo Gili, Barcelona, página 23.
7
liberdade criativa de cada habitante e a sua autoexpressão individual, adaptando-as às suas
necessidades e gosto.
Para Peter Zumthor os espaços devem ser capazes de comunicar com quem os ocupa,
deve ser estabelecida uma ligação entre o ocupante e o espaço, de forma a criar uma
atmosfera - “sobressai inevitavelmente e imediatamente o
conceito da atmosfera, um ambiente, uma disposição do
espaço construído que comunica com os observadores,
habitantes, visitantes e também, com a vizinhança, que os
contagia.”18
A arquitetura é realizada para ser vivenciada através de
espaços que “cuidem do homem, que o deixem viver bem e
o apoiem discretamente”19 , e com isto reflete sobre a
importância de projetar de forma a permitir a adaptabilidade
dos espaços, dado que, para Zumthor a qualidade
arquitetónica está associada à ligação emocional criada num Figura 12. Residência de estudantes na
espaço - “Qualidade arquitetónica só pode significar que sou Clausiusstrasse. Zurique, Suiça 1936
tocado por uma obra. (...). Entro num edifício, vejo um espaço e transmite-se uma atmosfera
Figura 13. Materialidade- Peter Zumthor, Figura 14. Tensão interior exterior- Peter Zumthor, adega
Termas de Vals, Graubunden, Suiça, 1996 Domino de Pingus (projeto). Peñafiel, Valladolid. Espanha,
2003
20 ZUMTHOR, Peter- Atmosferas, 1ºedição, Editorial Gustavo Gili, Barcelona, página 11 a 13.
21 ZUMTHOR, Peter- Atmosferas, 1ºedição, Editorial Gustavo Gili, Barcelona, página 41.
22 ZUMTHOR, Peter- Atmosferas, 1ºedição, Editorial Gustavo Gili, Barcelona, págin a 23.
23 ZUMTHOR, Peter- Atmosferas, 1ºedição, Editorial Gustavo Gili, Barcelona, página 31.
10
Peter Zumthor projeta os seus edifícios de forma a serem apreciados, mas
principalmente de forma a que estes correspondam à utilização - “De forma que eu goste e
que vocês gostem, e sobretudo, que corresponda à utilização do edifício.”24 Agrada-lhe a
“tensão entre o interior e exterior”25, gosta de acentuar a diferença entre espaço público e
privado - “Considero um grande elogio quando em relação a um dos meus edifícios não se
consegue ler a sua forma (...) A explicação da forma deve surgir da sua utilização, e quando
isto é legível, considero o maior dos elogios.”26
Blur Building, projeto efémero, foi construído para a exposição Expo 2002, na Suíça,
pelos arquitetos Elizabeth Diller e Ricardo Scofidio. O principal objetivo destes era a criação
de um espaço onde os estímulos visuais fossem diminuídos, dado que no nosso dia a dia
somos excessivamente sobrecarregados com eles, e consequentemente ativar outros
sentidos.
Esta obra consiste num percurso por uma estrutura metálica (100m de largura e
60m de profundidade) a 25m de altura da água, controlada por um sistema regulador da
temperatura, humidade e o vento, que cria um efeito nevoeiro através da filtragem da água
do próprio lago.
Segundo os arquitetos do projeto
“entrar no Blur é como entrar num meio
sem forma, sem características, sem
profundidade, sem escala, sem volume,
sem superfície e sem dimensões”, dado
que a intensidade do nevoeiro não permite
visualização do espaço e o reconhecimento Figura 18. BLUR BUILDING
das pessoas que nele se movem.
12
O principal objetivo foi investigar a arquitetura como um espaço de relações sociais e
para isso foram fornecidas capas de chuva com um hardware embutido, o qual continha
algumas informações sobre os gostos ou desgostos das pessoas, e com sensores e
transmissores que incluíam informações das mesmas. No percurso do Blur, quando duas
pessoas se cruzavam, as informações dos perfis eram comparadas conforme a sua
compatibilidade, se os gostos divergissem as capas ficavam verdes, se fossem comuns estas
ficavam vermelhas.
33 ZUMTHOR, Peter- Atmosferas, 1ºedição, Editorial Gustavo Gili, Barcelona, página 43.
34 Zumthor, Peter, em relação às Termas de Vals disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/01-
15500/classicos-da-arquitetura-termas-de-vals-peter-zumthor.
13
Figuras 19. TERMAS DE VALS
O Teatro adaptável, projetado por Peter Zumthor e localizado junto ao castelo Riom
na Suíça, adquire características muito específicas e o seu modo de funcionamento permite
oferecer aos visitantes vivências distintas, dentro do mesmo espaço, variando consoante o
evento ali a decorrer.
14
O teatro é um espaço flexível uma vez que sua disposição pode ser alterada muito
facilmente, devido ao facto de este ser composto por diversas plataformas horizontais, móveis
a partir de um sistema que permite a deslocação vertical das mesmas.
Para além destas características, este teatro distingue-se do que conhecemos como
teatro contemporâneo uma vez que é descoberto, o que remete para os anfiteatros medievais
esta analogia é intensificada, pelo castelo preexistente.
15
CENTER FOR THE BLIND AND IMPAIRED, MAURICIO ROCHA
16
“Os edifícios são prismas retangulares, com estrutura em betão e cobertura plana.
Cada grupo explora diferentes relações espaciais e estruturais, tornando cada espaço
identificável para o utilizador, e variam em tamanho, intensidade da luz e peso dos materiais:
betão, tijolo, aço e vidro. O Centro pretende melhorar a perceção espacial ativando os 5
sentidos numa experiência em busca de informação. Um canal de água percorre o centro da
praça, de forma a que o som da água guie os utilizadores no seu caminho. Linhas horizontais
e verticais no betão à altura das mãos oferecem pistas táteis para identificar cada edifício.
Seis tipos de plantas perfumadas e flores nos jardins perimetrais atuam como sensores
constantes que ajudam a orientar as pessoas pelo complexo.” 35
35 Rocha, Maurício, Center for the Blind and Visually Impaired / Taller de Arquitectura-Mauricio Rocha, disponível
em: https://www.archdaily.com/158301/center-for-the-blind-and-visually-impaired-taller-de-arquitectura-mauricio-
rocha, consultado a 25 de setembro de 2020.
17
Figuras 25. CENTER FOR THE BLIND AND IMPAIRED
18
“OS OLHOS DA PELE”, JUHANI PALLASMAA
Ao longo da obra, vamos percebendo que não é a visão, sentido privilegiado e muitas
vezes apontado como ponto central da arquitetura, que nos permite a relação mais próxima
com o mundo e com as nossas emoções, até pelo contrário. Esta propriedade separadora da
visão está bem espelhada num excerto do texto: “Durante experiências emocionais muito
intensas, tendemos a barrar o sentido distanciador da visão; fechamos os olhos enquanto
dormimos, ouvimos música ou acariciamos nossos amados.”36. Consideramos esta frase
especialmente bonita quando pensamos na nossa experiência pessoal, porque o que
permanece realmente e intensifica a vida é o cheiro característico da nossa casa, o sabor dos
cozinhados da avó, o primeiro entrelaçar de dedos no primeiro namoro, ouvir a nossa música
favorita num concerto… Veremos, o problema não reside na visão, mas sim no seu
isolamento e não interação com os restantes sentidos, o que resulta no desaproveitamento
da potencial experiência do mundo - “Essa separação e redução fragmentam a complexidade,
a abrangência e a plasticidade inatas do sistema sensorial, reforçando um a sensação de
isolamento e alienação.”37
Podemos relacionar com esta ideologia o Center for the Blind and Impaired, de
Maurício Rocha, já que é o exemplo real da arquitetura sem visão. Conseguimos provar que
é possível uma obra resultar e ter um efeito profundo nos seus utilizadores sem a necessidade
dos olhos, já que desenvolveram uma sensibilidade muito maior ao tato, por exemplo. Vale a
pena referir que Pallasmaa entende todos os sentidos como extensões do tato, já que é a
pele que reveste o corpo e formou todos os órgãos sensitivos: “A visão revela o que o tato já
sabe. Poderíamos considerar o tato como o sentido inconsciente da visão. Os nossos olhos
acariciam superfícies, curvas e bordas distantes; é a sensação tátil inconsciente que
determina se uma experiência é prazerosa ou desagradável. Aquilo que está distante ou perto
é experimentado com a mesma intensidade, ambas se fundem numa experiência coerente.”38
21
não o conseguiria fazer, mas a vivência das pessoas no espaço fica gravada e dá-lhe
vida tantas vezes quantas for vivenciado! É seguro afirmar que os espaços vivem
desta mutabilidade, mas nada disto seria possível sem o processo de tornar as nossas
sensações numa ciência exata que permite que se conheça o comportamento e os
sentidos da vida humana de tal forma, que o espaço projetado torne a vida de quem
o vai vivenciar mais fácil e agradável! É também esta consciência que nos permite
projetar com tanta sensibilidade quanto necessária - sabemos que o nosso
conhecimento poderá produzir espaços que mudam vidas, mas também sabemos que
a nossa passagem é temporária e que é preciso projetar também esse espaço livre
de apropriação.
22
BLIBLIOGRAFIA/ WEBGRAFIA
https://www.archdaily.com.br/br/01-15500/classicos-da-arquitetura-termas-de-vals-peter-
zumthor.
https://en.wikiarquitectura.com/building/lafayette-park/#, consultado a 25 de setembro de
2020.
https://sah-archipedia.org/buildings/MI-01-WN98, consultado a 25 de setembro de 2020.
https://www.archdaily.com/158301/center-for-the-blind-and-visually-impaired-taller-de-
arquitectura-mauricio-rocha, consultado a 25 de setembro de 2020
ÍNDICE DE IMAGENS
Figuras 1 e 2. ”Tokyo kindergarten by Tezuka Architects lets children run free on the roof”.
Disponível em: https://www.dezeen.com/2017/10/02/fuji-kindergarten-tokyo-tezuka-
architects-oval-roof-deck-playground/, consultado a 25 de setembro de 2020.
Figura 13. Materialidade - Peter Zumthor, Termas de Vals, Graubunden, Suiça, 1996;
Disponível em: ZUMTHOR, Peter- Atmosferas, 1ºedição, Editorial Gustavo Gili, Barcelona
Figura 14. Tensão interior exterior - Peter Zumthor, adega Domino de Pingus (projeto).
Peñafiel, Valladolid. Espanha, 2003; Disponível em: ZUMTHOR, Peter- Atmosferas, 1ºedição,
Editorial Gustavo Gili, Barcelona
Figura 15. ZUMTHOR, Peter- Atmosferas, 1ºedição, Editorial Gustavo Gili, Barcelona
Figuras 24. CENTER FOR THE BLIND AND IMPAIRED; Disponível em:
https://www.archdaily.com/158301/center-for-the-blind-and-visually-impaired-taller-de-
arquitectura-mauricio-rocha, consultado a 25 de setembro de 2020.
Figuras 25. CENTER FOR THE BLIND AND IMPAIRED; Disponível em:
https://www.archdaily.com/158301/center-for-the-blind-and-visually-impaired-taller-de-
arquitectura-mauricio-rocha, consultado a 25 de setembro de 2020
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