Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Hugo T. Y. Yoshizaki
Antonio R. N. Muscat
Departamento de Engenharia de Produção
Escola Politécnica
Universidade de São Paulo
Jorge L. de Biazzi
Departamento de Administração
Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade
Universidade de São Paulo
v.4, n.2, p. 174-186, ago. 1997
Resumo
1. Introdução
O
álcool etílico hidratado representa- usinas localizadas, em sua maioria, no
va, no início da década de 90, Sudeste e no Nordeste do País.
aproximadamente 40% do consumo A razão do crescimento da indústria do
(em volume) da frota automobilística álcool foi a crise do petróleo nos anos de
brasileira, substituindo parcialmente a 1973 e 1979, as quais causaram a necessi-
gasolina e gerando receitas superiores a um dade de reduzir as importações de petróleo.
bilhão de dólares por ano. Ele é uma fonte A viabilidade técnica de seu uso como com-
renovável de energia, processada a partir da bustível automobilístico permitiu ao governo
cana-de-açúcar em centenas de grandes implementar um programa de substituição
GESTÃO & PRODUÇÃO v.4, n.2, p. 174-186, ago. 1997 175
2. Descrição do Problema
E
m 1988, o consórcio COSAN álcool produzido pelas destilarias e usinas
(formado pelas Usinas Costa Pinto e deveria primeiro ser vendido e transferido
Santa Bárbara) solicitou um estudo para os terminais centralizados de distribui-
sobre o problema de distribuição de ção para, posteriormente, ser entregue aos
combustíveis (FUNDAÇÃO VANZOLINI, postos de gasolina juntamente com outros
1989). O consórcio COSAN, na época, produtos (gasolina e diesel). A figura 1
processava mais de 30 mil toneladas de cana apresenta este esquema de distribuição,
por dia durante a safra, tendo gerado separando os aspectos físicos e transacionais
receitas de mais de 130 milhões de dólares (vendas).
em 1993. O processo era o seguinte: todo o
DUTO/FERROVIA CAMINHÃO
CAMINHÃO-TANQUE
Tal esquema de distribuição era conse- capaz de entregar, regularmente, pelo menos
qüência de estratégias e políticas federais, a três opções de combustível num volume
saber: mínimo anual;
a) para tornar-se um distribuidor de b) um rígido controle federal nos assun-
combustíveis, uma companhia deveria ser tos energéticos, implicando uma grande
176 GESTÃO & PRODUÇÃO v.4, n.2, p. 174-186, ago. 1997
Figura 2 - Área atendida pela COSAN (por intermédio de uma única distribuidora)
Uma vez que as duas usinas do grupo clara, e, nesse sentido, um estudo de viabili-
estavam localizadas dentro da área geográfi- dade econômica foi solicitado pela COSAN.
ca servida pelos dois terminais, o álcool Este novo esquema implicaria a imple-
consumido próximo dos locais de produção mentação de dois pequenos terminais de
iria antes para os terminais e depois voltaria distribuição ao lado da tancagem das duas
para os postos de gasolina da região, confi- usinas, alimentando os caminhões que
gurando o chamado “turismo do álcool”. entregariam o álcool diretamente aos postos.
Distribuir o álcool separadamente da gaso- Isto economizaria parte das operações de
lina e do diesel era, portanto, uma alternativa transferência de álcool para suprir os
terminais principais (Paulínia e Barueri) a
178 GESTÃO & PRODUÇÃO v.4, n.2, p. 174-186, ago. 1997
partir das usinas. A transferência era feita combustíveis) para garantir o serviço, no
por dutos (somente entre Paulínia e Barueri) mínimo, semanal.
e por caminhões de compartimento único de Uma vez que a alternativa precisaria de
32m3. A distribuição final (transporte de desregulamentação e novos procedimentos
ponta) era, em geral, realizada por cami- operacionais com o distribuidor, os pontos
nhões de 14m3 com 3 ou 4 compartimentos, de vista dos três diferentes interessados
permitindo a entrega dos 3 combustíveis de foram necessários para avaliar o problema:
uma só vez. Dado que alguns pequenos governo (que aboliria as limitações legais),
revendedores consumiam apenas um ou dois distribuidor e COSAN + distribuidor (para
compartimentos de álcool por semana, seria dividir as economias decorrentes).
necessário um plano de roteamento para O uso dos três pontos de vista foi justifi-
minimizar os custos de transporte (no cado pelos diferentes aspectos políticos de
esquema anterior, os postos requisitavam cada instância de negociação: para alterar as
caminhões cheios, com cada entrega leis, para convencer o distribuidor associado
normalmente composta pelos três diferentes das vantagens econômicas e para tornar
claras as razões para o próprio cliente.
3. Desenvolvimento da Solução
E
ste estudo apresenta a viabilidade distribuidor), ao invés do sistema centrali-
econômica da descentralização da zado (realizado apenas pelo distribuidor).
distribuição de álcool hidratado, As duas situações são apresentadas nas
permitindo o suprimento dos postos dire- figuras abaixo.
tamente a partir das usinas (COSAN +
Outras usinas
Base
Etanol Barueri
Costa Pinto 2.500 m3/mês
Etanol +
Gas.+ Diesel Postos de Gasolina
(24.000 m3/mês etanol)
Outras usinas
Usina Etanol
Sta. Barbara Base
Paulínia
Etanol
33 km
0 km Etanol +
Gas.+ Diesel
Etanol Refinaria ou
23 km 56 km Paulínia
Gas.+ Diesel Gas.+ Diesel
110 km
Base
Etanol
Barueri
144 km
Usina Etanol e/ou
Costa Pinto Gas.+ Diesel
Etanol
Postos de Varejo
Etanol
3) O retângulo com a palavra “SISTEMA” indica a entidade (ou entidades) que tem (têm) interesse na
economia do processo segundo cada ponto de vista.
4. O Modelo de Transbordo
D
istribuidores atuam como atacadis- de produção nas usinas, de balanço de fluxo
tas: eles concentram os combustí- nas bases e de atendimento de demanda nos
veis e depois os entregam aos postos; b) o objetivo era minimizar custos,
postos (varejistas). Sua estrutura de distri- uma vez que as receitas estavam determina-
buição permite economias de escala devido das em função da restrição de atendimento
às compensações entre as operações de dos postos (a capacidade total de produção
transferência (envolvendo meios de trans- era menor do que a demanda total) e dos
porte mais baratos, como dutos e ferrovias, e preços regulados; c) estas funções poderiam
transbordos) e as de entrega final (realizadas ser modeladas como lineares; d) já havia
com custos unitários de transporte maiores, métodos de solução eficientes para estes
via de regra rodoviários). A alternativa modelos de redes (baixo risco tecnológico) e
estudada implicava considerar as usinas de e) possibilidade de obter resultados rapida-
álcool como nós de transbordo, i.e., instalar mente.
bases em cada usina (conforme a figura 4). O tamanho do problema foi definido pelo
Tais bases precisariam de pequenos número de nós associados: 2 centros de
investimentos, pois os tanques das usinas produção (usinas), 4 nós de transbordo
seriam utilizados e apenas seriam adquiridos (bases de distribuição) e 88 cidades
mecanismos de transferência e tanques- consumidoras (agrupando-se 230 postos de
pulmão. Portanto, as áreas de influência gasolina). O modelo decidia fluxos de
seriam redefinidas a fim de minimizar os combustível para um mês de operação.
custos logísticos. O modelo de transbordo usado para o
O modelo de transbordo foi particular- problema do álcool hidratado está descrito a
mente apropriado porque: a) havia restrições seguir:
Índices:
i = usina de álcool / base de distribuição.
j = base de distribuição.
k = grupo de postos (municípios).
Dados:
cij = custo unitário total de transferência de álcool da usina/base i para base j
(US$/m3); inclui carregamento em i, transporte entre i e j e transbordo em j.
cjk = custo unitário de entrega de álcool da base j para o município (grupo) k
(US$/m3).
Pi = volume de produção nas usinas/bases i; há um produtor fictício para igualar
produção e demanda.
Dk = demanda do grupo k.
Variáveis de decisão:
GESTÃO & PRODUÇÃO v.4, n.2, p. 174-186, ago. 1997 183
Modelo:
minimizar f(x) = ∑∑c x + ∑∑c x
i j
ij ij
j k
jk jk
,
sujeito a:
∑x = P ,
j
ij i
i (1)
∑x − ∑x
i
ij
k
jk
= 0, j (2)
∑x = D ,
j
jk k
k (3)
O
método utilizado para a resolução bases e de definição de áreas de influência
do problema de localização das das mesmas está esquematizado na figura 6.
DADOS DE ENTRADA
- distâncias entre municípios
- volumes (entrega mensal)
- custos (transbordo e transporte)
ALTERNATIVAS
- localização das bases
- produtos entregues MODELO DE TRANSBORDO
a partir das bases
- composição da frota
SAÍDA DO MODELO
- tamanho das bases
- áreas de influência
- custos da alternativa
- estrutura da frota
são não
iguais aos
Substituir
de entrada
?
sim
Acréscimo de custos de
distribuição devido ao roteamento
SAÍDA
- tamanho das bases não altera
sim
- áreas de influência custos de
Substituir
- custo da alternativa distribuição
- composição e ?
estrutura da frota
(localização das bases, produtos entregues dado de entrada, poderia haver alteração dos
pelas mesmas e composição da frota. Por custos de distribuição nos mesmos (pois
composição da frota deve-se entender os estes foram assumidos como sendo propor-
tipos de caminhões que fazem parte da cionais à distância média ponderada —
mesma, com relação ao número de compar- pelos volumes distribuídos — dos municí-
timentos e respectivos volumes). pios pertencentes ao city-market de cada
A saída do modelo define os tamanhos base). Nos casos em que isto ocorreu, os
das bases, suas áreas de influência, os custos dados de entrada foram modificados e o
da alternativa e a estrutura da frota (por modelo de transbordo novamente executado,
estrutura da frota deve-se entender a relação até que a saída coincidisse com a entrada.
entre a frota própria da distribuidora e a Posteriormente, foi calculado o acrésci-
frota contratada pela mesma, que fazem a mo de custo de distribuição devido ao rotea-
distribuição). Os problemas definidos em mento, conforme a fórmula anteriormente
função do modelo de transbordo foram apresentada. Caso os custos de distribuição
resolvidos com a utilização de um software tivessem alterações significativas, os dados
de programação linear (BLP88), executado de entrada do modelo de transbordo seriam
em um microcomputador XT, consumindo, alterados, e o modelo novamente executado.
aproximadamente, 15 minutos para cada Como as alterações foram muito pequenas,
problema. este segundo loop não foi utilizado.
Como o city-market de cada base (cida- Este procedimento foi realizado para cada
des atendidas pela frota própria da distribui- alternativa de localização das bases e para ca-
dora) poderia ser diferente do adotado como da ponto de vista de avaliação dos resultados.
6. Resultados e Conclusões
T
odos os resultados apresentaram a economias de custos estimadas estão na
vantagem dos novos terminais de tabela abaixo.
distribuição próximos às usinas. As
Referências Bibliográficas:
FUNDAÇÃO VANZOLINI.: Aplicação de Pesquisa LARSON, R & ODONI, A.: Urban Operations
Operacional na Distribuição de Álcool em São Research. Englewood Cliffs, NJ. Prentice Hall,
Paulo: Relatório Final. São Paulo, Fundação Inc, 1981.
Vanzolini, 1989. NOVAES, A. G. N.: Sistemas Logísticos. São
Paulo, SP. Editora Edgar Blücher, 1989.
Abstract
This study affirms the economic advantage of decentralized distribution of ethanol fuel,
directly from the producing mills, as compared to the federally mandated practice of
centralized, multi-product (ethanol plus fossil fuels) distribution. The investiment analysis
employed logistics costs evaluated with a transshipment (LP) model. The quantitative results
from the study influenced the client organization to begin lobbying efforts to change
associated federal regulations, which was approved by CNP in July 1993.