Você está na página 1de 9

CAPÍTULO 1 - CRIAÇÃO E DIALÉTICA DO CONHECIMENTO

Poucas organizações têm demonstrado a capacidade de se adaptar às mudanças exigidas


pelo ambiente que as cerca e de lidar com situações de alta complexidade. F. Scott Fitzgerald
afirma a existência de uma inteligência diferenciada, no qual a capacidade de manter duas
ideias opostas em mente em pleno funcionamento ocorre com a premissa de que tudo na
vida é composto de opostos.

O paradoxo foi evitado por muito tempo nas empresas, pois promove grande sentimento de
desconforto na contraposição de ideias e situações. Charles Handy descreve este incômodo
como a sensação de que todo o senso de direção foi perdido, porém a aceitação da
existência de uma nova realidade completamente oposta ao conhecido e esperado pode
resultar no desenvolvimento da habilidade de análise crítica para a tomada de decisão.

As organizações que hoje não conseguem lidar com o paradoxo, buscando eliminá-los de
diversas situações, tendem a fracassar ao adotarem práticas de sucesso baseado em seu
próprio histórico. Empresas dialéticas definidas pelos autores, possuem o hábito de abraçar
ativamente os opostos, cultivando cada vez mais as contradições de forma positiva a fim de
se adaptar a mudança exigida pelo ambiente que as cerca.

1.1 Paradoxo e conhecimento

A sociedade industrial

Sociedade industrial: aumentar a eficiência na produção, ele prescreveu métodos e


procedimentos "científicos" para organizar e realizar o trabalho, o mais importante deles
sendo o estudo do tempo e do movimento. Na realidade, existem outros métodos para
aumentar a eficiência na produção – linhas de montagem, automação, robótica.

Sociedade do conhecimento: ​Como os seres humanos sofriam com a racionalidade limitada,


a organização tinha que lidar com a complexidade do mundo real decompondo a realidade
em partes de informação pequenas e simples o suficiente para que a pessoa as processasse.
O processamento eficaz da informação é possível apenas quando os problemas complicados
são simplificados e as estruturas organizacionais são especializadas.

Conhecimento explícito pode ser expresso em palavras, números ou sons, e compartilhado


na forma de dados, fórmulas científicas, recursos visuais, áudio, especificações de produtos
ou manuais. O conhecimento explícito pode ser rapidamente transmitido aos indivíduos,
formal e sistematicamente.
Conhecimento tácito, por outro lado, não é facilmente visível e explicável. Pelo contrário, é
altamente pessoal e difícil de formalizar, tornando-se de comunicação e compartilhamento
dificultoso. As intuições e os palpites subjetivos estão sob a rubrica do conhecimento tácito.
O conhecimento tácito está profundamente enraizado nas ações e na experiência corporal
do indivíduo, assim como nos ideais, valores ou emoções que ele incorpora.

1.2 Conhecimento e Dialética

Como no raciocínio dialético, a criação do conhecimento aceita o que aparenta ser oposto –
por exemplo, o conhecimento tácito e o conhecimento explícito – e tenta sintetizá-los
transformando-os e os unindo para transcender à realidade existente. A nova realidade é
criada através da síntese, que é o processo contínuo e dinâmico que reconcilia e transcende
aos opostos. Em outras palavras, o processo envolve a utilização de uma tese (A) e uma
antítese (B) para criar uma nova realidade (C). C é separado e independente de A e B, não
algo intermediário entre A e B. O que torna a criação do conhecimento complexa é o fato de
que a síntese tem que ocorrer em base contínua (como indicado pelo ziguezague e o padrão
espiralado da Figura 1.1) e através de uma multidão de opostos.

Identificamos os seguintes opostos que exigem uma síntese antes que o novo conhecimento
possa ser criado, organizacionalmente, de maneira espiralada:
● tácito/explícito;
● corpo/mente;
● indivíduo/organização;
● top-down/bottom-up;
● hierarquia/força de trabalho;
● Oriente/Ocidente.

No âmago da criação de conhecimento das empresas está sua habilidade de envolver os


opostos, cultivá-los e usá-los como um convite para encontrar um melhor caminho.

1.2.1 Síntese de Tático/Explícito

A criação do conhecimento inicia com a socialização e passa através de quatro modos de


conversão do conhecimento, formando uma espiral. O conhecimento é amplificado
passando pelos quatro modos de conversão, que podem ser descritos como a seguir:

1. Socialização: Compartilhar e criar conhecimento tácito através de experiência direta.


2. Externalização: Articular conhecimento tácito através do diálogo e da reflexão.
3. Combinação: Sistematizar e aplicar o conhecimento explícito e a informação.
4. Internalização: Aprender e adquirir novo conhecimento tácito na prática.
Este modelo descreve como os conhecimentos tácito e explícito são amplificados em termos
de qualidade e quantidade, assim como do indivíduo para o grupo e, então, para o nível
organizacional.

Cada modo do processo SECI envolve uma combinação diferente das entidades de criação
do conhecimento, como mostrado abaixo:

1. Socialização: indivíduo para indivíduo.


2. Externalização: indivíduo para grupo.
3. Combinação: grupo para organização.
4. Internalização: organização para indivíduo.

1.2.2 Síntese de Corpo/Mente

“Penso, logo existo”. Ele presumia que o eu pensante é independente do corpo ou da


matéria. Assim, de acordo com o dualismo cartesiano, o conhecimento verdadeiro pode ser
obtido apenas pela mente, não pelo corpo. Contrastando, a criação do conhecimento
enfatiza muito a importância da experiência corporal. Por exemplo, a criança aprende a
comer, andar e falar através da tentativa e do erro; ela aprende com o corpo, não apenas
com a mente. O aprendizado, no entanto, representa somente um dos modos da estrutura
de criação do conhecimento. O aprender-fazendo é equivalente à internalização, que é a
conversão do conhecimento explícito em conhecimento tácito, como mencionado acima. Os
três modos restantes de conversão do conhecimento dão igual importância à aquisição de
conhecimentos a partir da experiência pura ou direta. O indivíduo obtém insights subjetivos,
intuições e palpites a partir da experiência corporal.

1.2.3 Síntese do Indivíduo/Organização

O conhecimento é criado apenas pelos indivíduos. Em outras palavras, uma organização não
pode criar conhecimento por si mesma, sem os indivíduos. É muito importante, portanto,
que a organização apóie e estimule as atividades criadoras de conhecimento dos indivíduos
ou que proporcione os contextos apropriados para elas. A criação do conhecimento
organizacional deve ser entendida como um processo que “organizacionalmente” amplifica
o conhecimento criado pelos indivíduos e o cristaliza no nível do grupo através do diálogo,
discussão, compartilhar de experiência, fazer sentido ou comunidade de prática.
Deve ficar claro a partir do que foi mencionado acima que um indivíduo e uma organização
não estão realmente nas extremidades opostas de um dualismo. O indivíduo é o “criador”
do conhecimento e a organização é o "amplificador" do conhecimento. Entretanto, o
contexto real no qual grande parte da conversão ocorre é no nível do grupo ou da equipe. O
grupo funciona como o “sintetizador” do conhecimento.
1.2.4 Síntese de Inferior/Superior

A presunção implícita por trás do modelo top-down é a de que apenas os administradores


do topo são capazes de criar conhecimento. Além disso, o conhecimento criado pelo topo
administrativo existe para ser processado e implementado. Em contraste, o modelo
bottom-up pressupõe que o conhecimento seja criado por empregados empreendedores da
linha de frente, com muito poucas ordens e instruções provenientes do topo da
administração. Nenhum dos modelos é adequado como processo para a administração da
criação do conhecimento. Citando apenas um fato, o modelo top-down é adequado
principalmente para lidar com conhecimento explícito, mas não com conhecimento tácito,
enquanto o inverso é verdadeiro para o modelo bottom-up.

Devido a essa limitação, os dois modelos realizam apenas conversões parciais do


conhecimento. O modelo top-down está concentrado na combinação e na internalização e o
modelo bottom-up concentra-se na socialização e na externalização. Outra limitação dos
dois modelos é a negligência dos administradores medianos. Na administração top-down, os
administradores medianos processam muitas informações, mas raramente envolvem-se na
criação do conhecimento. Na administração bottom-up, o criador do conhecimento é o
indivíduo empreendedor na linha de frente da organização, com os administradores
medianos desempenhando um papel mínimo.

1.2.5 Síntese da Hierarquia/Força-tarefa

A hierarquia e a força-tarefa são duas estruturas organizacionais opostas presentes há muito


tempo. A hierarquia, que é uma estrutura altamente formalizada, especializada e
centralizada, funciona bem na condução eficiente do trabalho de rotina em grande escala. A
força-tarefa, por outro lado, é flexível, adaptável, dinâmica e participativa, e é
particularmente eficaz na realização da tarefa bem definida, que necessita ser completada
em um determinado período de tempo. A partir da perspectiva de criação do conhecimento,
a hierarquia é uma estrutura eficiente para adquirir, acumular e explorar novos
conhecimentos através da combinação e da internalização. A hierarquia, entretanto,
prejudica a iniciativa individual devido a sua forte propensão para o controle, podendo ser
disfuncional nos períodos de incerteza e de mudanças rápidas. Não é adequada para
adquirir, acumular e explorar o conhecimento tácito. A força-tarefa, por outro lado, é uma
estrutura eficiente para criar novo conhecimento através da socialização e da externalização.
Devido a sua natureza temporária, entretanto, a hierarquia não é tão eficaz na exploração e
na transferência do conhecimento, ampla e continuamente, por toda a organização.
Também não é particularmente adequado para explorar o conhecimento explícito.

1.2.6 Síntese de Oriente/Ocidente


As empresas japonesas e ocidentais parecem estar adotando duas abordagens opostas na
criação do conhecimento organizacional. Já aludimos ao fato de que a forma dominante de
conhecimento no Ocidente é o conhecimento explícito, que pode ser rapidamente
transmitido, formal e sistematicamente aos indivíduos. As práticas administrativas ocidentais
enfatizam o conhecimento explícito, criado através de habilidades analíticas e de formas
concretas de apresentação oral e visual, como documentos, manuais e bases de dados
computacionais. Os japoneses, no entanto, encaram o conhecimento explícito apenas como
a ponta do iceberg. Consideram o conhecimento como principalmente tácito – isto é, algo
que não é facilmente visível e exprimível, que é altamente pessoal e difícil de formalizar,
obtido através do uso de metáforas ou pinturas, algo profundamente enraizado na ação e na
experiência do indivíduo.

O futuro pertence às empresas que podem sintetizar o melhor do Oriente (A) e do Ocidente
(B) e construir um modelo universal (C) de criação do conhecimento organizacional.
Afirmamos que tal síntese já está ocorrendo, tanto no Oriente quanto no Ocidente. Na
próxima seção, observaremos duas empresas – IBM e Canon – que obtiveram sucesso na
incorporação da abordagem do “melhor dos dois mundos” à criação do conhecimento.

CAPÍTULO 3 - TEORIA DA CRIAÇÃO DO CONHECIMENTO ORGANIZACIONAL

3.1 Conhecimento e informação

Como estamos preocupados com a criação do conhecimento organizacional, em oposição à


criação do conhecimento individual, nossa teoria também terá sua própria “ontologia”
distinta, que concerne aos níveis das entidades criadoras do conhecimento (indivíduo,
grupo, organizacional e interorganizacional). Neste capítulo apresentaremos nossa teoria da
criação do conhecimento, tendo em mente as duas dimensões – epistemológica e ontológica
– da criação do conhecimento. A Figura 3.1 apresenta as dimensões epistemológica e
ontológica em que ocorre a “espiral” de criação do conhecimento. A espiral emerge quando
a interação entre o conhecimento tácito e o explícito é elevada dinamicamente de um nível
ontológico mais baixo para níveis elevados.
3.2 Duas dimensões da criação do conhecimento
O conhecimento é uma função de uma determinada instância, perspectiva ou intenção. Em
segundo lugar, o conhecimento, ao contrário da informação, é sobre ação. É sempre
conhecimento “para algum fi m”. E, em terceiro lugar, o conhecimento, como a informação,
é sobre significado. É específico ao contexto e relacional.
A informação e o conhecimento são específicos ao contexto e relacionais por dependerem
da situação, sendo criados dinamicamente na interação social entre as pessoas. Berger e
Luckmann (1966) argumentam que as pessoas que interagem, em um determinado contexto
histórico e social, compartilham informações a partir das quais constroem o conhecimento
social como uma realidade que, por sua vez, influencia seu discernimento, comportamento
e atitude. Similarmente, a visão corporativa, apresentada como uma estratégia obscura pelo
líder, é construída organizacionalmente em conhecimento pela interação dos membros da
corporação com o ambiente, o que por sua vez afeta seu comportamento de negócios.

3.3 Conversão do conhecimento: interação entre conhecimento tácito e explícito


A história da epistemologia ocidental pode ser vista como uma controvérsia contínua sobre
o tipo de conhecimento que é mais verdadeiro. Enquanto os ocidentais tendem a enfatizar o
conhecimento explícito, os japoneses tendem a salientar o conhecimento tácito. Na nossa
visão, no entanto, o conhecimento tácito e o conhecimento explícito não são totalmente
separados, mas entidades mutuamente complementares. Eles interagem e se intercalam nas
atividades criativas dos seres humanos. Nosso modelo dinâmico de criação do
conhecimento está ancorado no pressuposto crítico de que o conhecimento humano é
criado e expandido através da interação social entre o conhecimento tácito e o
conhecimento explícito. Chamamos essa interação de “conversão do conhecimento”. Deve
ser observado que essa conversão é um processo “social” entre indivíduos e não con-
finado em um único indivíduo. De acordo com a visão racionalista, a cognição humana é um
processo dedutivo dos indivíduos, porém o indivíduo nunca está isolado da interação social
quando percebe as coisas. Assim, através do processo de “conversão social”, o
conhecimento tácito e o explícito expandem-se em termos de qualidade e quantidade

3.4 Quatro formas de conversão do conhecimento


Eles são como a seguir: (1) de conhecimento tácito para conhecimento tácito, que
chamamos de socialização; (2) de conhecimento tácito para conhecimento explícito, ou
externalização; (3) de conhecimento explícito para conhecimento explícito, ou combinação;
e (4) de conhecimento explícito para conhecimento tácito, ou internalização. Três dos quatro
tipos de conversão do conhecimento – socialização, combinação e internalização – foram
discutidos a partir de várias perspectivas na teoria organizacional.

3.5 Espiral do conhecimento


3.6 Condições para a criação do conhecimento organizacional
3.6.1 Intenção
A intenção organizacional proporciona os critérios mais importantes para o julgamento da
veracidade de uma determinada porção de conhecimento. Se não fosse a intenção, seria
impossível julgar o valor da informação ou do conhecimento percebido ou criado. No nível
organizacional, a intenção é frequentemente expressa pelos padrões ou visões
organizacionais, que podem ser usados para avaliar e justificar o conhecimento criado. Ela é
necessariamente carregada de valor.

3.6.2 Autonomia
Similar a um sistema autopoiético, os indivíduos e os grupos autônomos, nas organizações
de criação de conhecimento, estabelecem seus limites de tarefas por conta própria, em
busca do objetivo final da organização. Nas organizações administrativas, uma poderosa
ferramenta para criar as circunstâncias nas quais os indivíduos possam agir autonomamente
é proporcionada pela equipe de auto-organização. Essa equipe deveria ser multifuncional,
envolvendo membros de uma seção transversal ampla das diferentes atividades
organizacionais. As equipes de projeto com diversidade multifuncional são usadas
frequentemente pelas empresas japonesas em cada fase da inovação.

3.6.3 Flutuação
A flutuação e o caos criativo são a terceira condição organizacional para a promoção da
espiral de conhecimento. Eles estimulam a interação entre a organização e o ambiente
externo. A flutuação é diferente da desordem completa e caracteriza-se pela “ordem sem
recursão”. É uma ordem cujo padrão é difícil de prever inicialmente (Gleick, 1987). Se as
organizações adotam uma atitude aberta dirigida aos sinais ambientais, podem explorar a
ambigüidade, a redundância ou o ruído desses sinais para melhorar seu próprio sistema de
conhecimento.

3.6.4 Redundância
A redundância é a quarta condição que permite que a espiral de conhecimento ocorra
organizacionalmente. Para os administradores ocidentais, que estão preocupados com a
idéia de processamento eficiente da informação ou com a redução de incertezas (Galbraith,
1973), o termo “redundância” pode soar pernicioso devido a suas conotações com
duplicação desnecessária, desperdício ou sobrecarga de informação. O que queremos dizer
aqui com redundância é a existência de informação que vai além das exigências operacionais
imediatas dos membros da organização. Nas organizações de negócios, a redundância
refere-se à sobreposição intencional de informação sobre as atividades de negócios, às
responsabilidades administrativas e à empresa como um todo.
3.6.5 Variedade
A quinta condição que ajuda no avanço da espiral de conhecimento é o requisito variedade.
De acordo com Ashby (1956), a diversidade interna de uma organização precisa combinar
com a complexidade do ambiente a fim de lidar com os desafios apresentados pelo mesmo.
Os membros de uma organização podem enfrentar muitas contingências se possuírem o
requisito variedade, que pode ser realçado pela combinação de informações de maneira
diferente, flexível e rápida, além de oferecer também igual acesso à informação em toda a
organização. Com o objetivo de maximizar a variedade, todos na organização precisam ter
assegurado o acesso mais rápido à mais ampla variedade de informações necessária,
percorrendo o menor número de passos (Numagami, Ohta e Nonaka, 1989).

Você também pode gostar