Você está na página 1de 5

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

Faculdade de Ciências Sociais


Departamento de História

Resenha:
“A propaganda política no Varguismo e no Peronismo”: aspectos
teórico-metodológicos e uma análise sobre história política
Maria Helena Rolim Capelato

Carolina Gonçalves Mazzio Pereira


RA00224054
MBA/6

América IV - Yvone Dias Avelino


No texto em questão, a autora Maria Capelato, professora titular do
departamento de História da USP, pretende realizar uma análise comparativa da
propaganda política varguista e peronista, inserindo sua pesquisa no campo da
história política renovada e do estudo dos imaginários sociais e coletivos, além de
considerar as questões postas pelas revisões historiográficas – as quais irá apontar
ao longo de sua tese. Para isso, ela compara diferentes referências teóricas,
examinando o percurso metodológico que compôs os conhecimentos sobre o
populismo e o autoritarismo nas décadas anteriores à conclusão de seu trabalho.
O ponto central da tese é referente ao caráter autoritário da propaganda
veiculada pelos meios de comunicação, educação e produção cultural, cujo objetivo
era canalizar a participação das massas na direção imposta pelos regimes de
Getúlio Vargas (especialmente durante o Estado Novo) e Juan Domingo Perón. “Na
tentativa de impedir a expressão de conflitos sociais e das manifestações políticas
com sentido de oposição, negou-se o princípio da pluralidade da vida social,
característica das experiências democráticas, substituindo-o pela proposta de
construção de uma sociedade unida e harmônica.” (CAPELATO, 1997) O interesse
pelo assunto surge em fins da década de 1980, a partir das campanhas eleitorais de
Carlos Menem (Argentina) e de Fernando Henrique Collor (Brasil), que, em
contextos históricos diversos, recuperaram imagens, mitos e símbolos das políticas
peronistas e varguistas, embora já superadas. Além disso, no Brasil, houve o golpe
militar de 1964, o que motivou a busca pelas raízes mais profundas do autoritarismo
brasileiro. Assim, a necessidade de entender os regimes populistas em evidência
explica-se pelas questões contemporâneas à autora.
Maria Capelato defende que “os modelos e tipologias construídos para
explicar o populismo na América Latina não levaram devidamente em conta as
particularidades nacionais nem as especificidades conjunturais” de cada região e,
para explicar e revisar tais análises posteriores à década de 1980, ela cita, em
primeiro lugar, a teoria da modernização, do sociólogo argentino Gino Germani, no
qual o populismo seria um momento de transição da sociedade tradicional para o
capitalismo moderno – desenvolvido e democrático, sendo uma etapa da evolução
das sociedades latino-americanas. Essa teoria indica uma dissociação das partes
em relação ao todo, desintegrando o sistema capitalista. Em seguida e por outro
ângulo de abordagem, mostra-se um conceito que entende o capitalismo como
totalidade não dissociada, “considerando o moderno e o tradicional como partes
constitutivas de um mesmo todo onde elas se integram de forma contraditória, e o
período pode ser compreendido como um momento específico da conjuntura
histórica mundial (o período entre guerras) em que novas formas de controle social
foram engendradas com vistas à preservação da ordem ameaçada por conflitos
sociais.” (CAPELATO, 1997) Por fim, a autora apresenta a tese do Partido
Comunista, que, também em perspectiva evolucionista e etapista, interpreta o
populismo como fase de transição necessária para chegar ao socialismo.
Apontando a questão das generalizações dessas grandes sínteses, Capelato,
assim como os intelectuais de sua época, buscou favorecer uma historiografia que
privilegiasse as particularidades de cada regime e os recortes mais específicos. O
estudo da história política do qual a autora faz parte reconhece outras formas
políticas que não somente as instituições estatais, tirando o foco das teorias do
Estado. Além disso, a análise da propaganda faz parte da temática da história das
representações políticas, em particular na construção dos imaginários coletivos.
Quanto a isso, são citados diferentes autores que apontam as imagens como
dispositivos de manipulação e dominação, possuindo grande peso nas práticas dos
regimes autoritários, por mobilizarem ressentimentos, frustrações, medos e
esperanças.
Em reflexão sobre a relação do populismo com o totalitarismo, e
considerando também as mudanças historiográficas contemporâneas à escritora,
argumenta-se que os regimes autoritários brasileiros e argentinos não se
enquadram na definição do totalitarismo, visto que este implica na união absoluta
entre massas nacionais e o Estado, o que de fato não aconteceu. Ainda assim,
pode-se identificar traços totalitários nos discursos e práticas desses governos, pois
se utilizavam da repressão e supressão das liberdades, além da manipulação das
massas através dos símbolos.
No entanto, em sua pesquisa, a professora conclui que a referência ao
totalitarismo não ajuda a melhor compreender a natureza do varguismo e do
peronismo, já que considera um conceito extremamente generalizante. Ela
compartilha da opinião de Marc Bloch sobre a importância do método comparativo
em história: deve-se comparar para levantar novas questões e problemas que levem
a novos enfoques e interpretações e diante da proximidade tanto espacial quanto
temporal, além do sincronismo entre os países, comparar pode levar a uma origem
comum, nem que seja parcialmente. Para a autora, o estudo comparativo da
propaganda política entre os dois governos também se encaixa nessa perspectiva
apresentada pelo historiador. Segundo ela, a partir da ampliação das pesquisas
empíricas sobre o período, ela se propôs a apontar os traços de uma experiência
universal e as especificidades que as situações históricas particulares apresentam.
Um ponto interessante apresentado no texto é a questão da conquista e
colonização ibérica e, portanto, católica, que habituou os povos brasileiro e
argentino ao culto a imagens e símbolos, tornando-os terreno cultural fértil para as
propagandas e práticas nazi-fascistas. “O estudo comparado da propaganda política
varguista e peronista ganha importância ainda maior ao se levar em conta que
ambas se inspiraram nas experiências nazifascitas, tanto no que se refere à forma
de organização da propaganda como nas mensagens e apelos realizados com o
intuito de sensibilizar o receptor para práticas políticas de sustentação do poder.”
(CAPELATO, 1997)
Deve-se considerar, sobretudo, que durante as décadas de 1930-40 houve
avanço considerável dos meios de comunicação de massa, que, passando a dispor
de equipamentos técnicos e científicos mais complexos, possibilitou a fabricação e
manipulação dos imaginários coletivos, regulando a vida social.
No período entre-guerras, vivenciou-se uma crise do liberalismo, momento
em que a propaganda política constitui elemento principal da política de massas:
para evitar a eclosão de revoluções, surge o Estado forte comandado por um líder
carismático, capaz de conduzir as massas, atraídas, em grande parte, pela
propaganda. No Brasil, foi com o Estado Novo que ocorreu a consolidação da
política de massas (além disso, o governo foi instituído a partir de um golpe, por isso
iria precisar buscar legitimação política e o faria a partir da propaganda); na
Argentina, tal consolidação ocorreu na década seguinte e, embora tenha se
organizado no interior do sistema liberal, a natureza e propósito de conquista das
massas aproximavam a propaganda argentina da brasileira.
O texto da professora Maria Capelato é bem escrito e possui linguagem clara
e de fácil entendimento, embora seja um pouco repetitivo, o que é comum ao se
tratar de uma tese. Além do mais, o texto explica as mudanças na historiografia,
apresentando inovações tanto temáticas quanto em relação às fontes. Enquanto
historiadora, isso me desperta grande interesse, além de considerar o tema em si
muito relevante, especialmente diante da conjuntura atual.
BIBLIOGRAFIA

CAPELATO, Maria Helena Rolim. Imagens e Espetáculo do Poder no Varguismo e


no Peronismo, In: Multidões em Cena. Propaganda política no varguismo e no
peronismo. 2ª Ed. São Paulo: UNESP, 2009.

Você também pode gostar