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Avaliação de Direito e Mineração

Questão nº 01
Em 28/12/2018, XYZ Ltda. apresentou tempestivamente Relatório Final de Pesquisa (RFP)
positivo para a substância filito, que foi aprovado pela ANM em 12/08/2019. Após a
aprovação do seu RFP, XYZ Ltda. protocolizou em 28/08/2019 contrato de cessão total
do direito minerário em favor da ABC Ltda., averbado pela ANM no dia 31/10/2019. A
ABC Ltda., para melhor planejar o seu empreendimento minerário e elaborar o seu Plano
de Aproveitamento Econômico (PAE), deseja realizar trabalhos complementares de
pesquisa na área do direito minerário e iniciar as operações de lavra com o intuito de
custear a pesquisa objetivada. Você foi procurado pela ABC Ltda. e deve responder
aos seguintes questionamentos:

(I) É possível a realização de trabalhos complementares de pesquisa para o melhor


detalhamento da jazida de filito?

Sim, de acordo com o novo regramento (§ 7º do Art. 9º do Decreto nº


9.406/2018) é possível a continuidade dos trabalhos de pesquisa, inclusive os
trabalhos de campo como sondagens, trincheiras, aberturas de poços, testes
geofísicos, mesmo após a entrega do relatório final de pesquisa e vencimento
do título de alvará de pesquisa.

Importante destacar que, antes da publicação do Decreto 9.406/2018,


que trouxe nova regulamentação para o setor, o pedido de autorização para
a realização da pesquisa complementar era submetido ao então DNPM que,
após análise das considerações postas pelo requerente, deferia ou não o alvará
especial com base em entendimentos técnicos e jurídicos adotados pela
Procuradoria Federal e, neste caso, permitia o ajustamento/atualização do
quadro de reservas presente no Relatório já entregue.

Apesar dos desentraves trazidos pela nova legislação permitindo a


continuidade da pesquisa mineral mesmo após a entrega do Relatório Final de
Pesquisa, tal permissão não concede ao titular o direito de realizar a extração
do bem mineral pesquisado, exceto se o titular possuir a Guia de Utilização em
vigor, conforme disposto no § 8º - Art. 9º do Decreto nº 9.406/2018.

Não obstante a permissão de trabalhos complementares com vistas ao


melhor detalhamento da jazida, cabe ressaltar que tal apuração dos recursos
provenientes da pesquisa complementar poderão ser utilizados para melhor
planejamento do empreendimento minerário em momento posterior à
aprovação do relatório final de pesquisa, quando da apresentação do Plano
de Aproveitamento econômico.
(II) considerando que a empresa tem interesse econômico também na exploração de
areia, é possível que a substância seja pesquisada e os dados dos recursos identificados
apresentados à ANM para a complementação do RFP?

De acordo com o § 7º do Art. 9º do Decreto nº 9.406/2018 é possível a


continuidade da pesquisa mineral na área outorgada, mesmo após a entrega
do relatório final de pesquisa.

No caso em tela, como o Relatório Final de pesquisa apresentado à ANM


contemplou apenas a substância mineral filito, encontrando nova substância
mineral (areia) durante a continuidade dos trabalhos de pesquisa, essa nova
substância (areia) deverá ser comunicada à ANM para fins de aditamento ao
título minerário (quando houver a outorga da Portaria de Lavra), conforme
disposto no Inciso IV e § 1º do art. 34 do Decreto 9.406/2018, pois, de acordo
com o § 9º do Art. 9º do citado Decreto, as informações obtidas durante a
continuidade da pesquisa (após a entrega do RFP) não poderão ser utilizadas
para retificação ou complementação das informações constantes no relatório
final de pesquisa entregue à ANM.

No entanto, anterior a nova regra trazida pelo Decreto


supramencionado, o então DNPM, com base em entendimentos da
Procuradoria Federal, outorgava à pedido do titular e em casos esporádicos, o
alvará especial de pesquisa com vistas à melhor definição das reservas
contempladas no relatório final de pesquisa, possibilitando ao minerador o
ajustamento do quadro de reservas com os dados obtidos durante o novo prazo
concedido, haja vista o interesse, também, da administração pública em
melhor aproveitamento econômico de possíveis recursos minerais ali presente.

De todo modo cabe salientar que, apesar de existir o entendimento


jurídico sobre a possibilidade de, à critério da ANM, outorgar autorização
especial para pesquisas complementares, caso o pedido estiver tecnicamente
justificado e possibilitar o titular utilizar dos dados obtidos para
complementar/retificar as reservas já apresentadas no RFP - (Parecer PROGE
085/2007 – FMM), por outro lado encontrar-se em vigor o § 9º do Art. 9º do
Decreto nº 9.406/2018 que permite a continuidade da pesquisa após entrega
do RFP, mesmo sem a necessidade de pedido formal pelo titular, porém, veda
o uso das informações adquiridas a partir da pesquisa complementar para
efeitos de retificação ou complementação dos dados constantes no relatório
final de pesquisa já entregue à ANM.

(III) há a possibilidade de a empresa já iniciar as operações de lavra de filito antes da


outorga da Concessão de Lavra? Se sim, qual procedimento deve ser seguido?

Sim. Considerando o regramento aplicado ao regime de autorização e


concessão, poderá o titular realizar a lavra de filito antes da outorga do título de
portaria de lavra se obtida a autorização prévia concedida em caráter
excepcional pela ANM através da Guia de Utilização, conforme disposto no art.
24 do Decreto 9.406/2018 e Art. 102 da Portaria nº 155/2016, considerando os §1º
e §2º do art. 102 da referida Portaria.

Para que seja autorizada a Guia de Utilização em favor do titular, deverá


o interessado protocolizar o pedido junto à ANM instruindo o requerimento com
os elementos de informação e prova elencados no art. 104 da Portaria nº
155/2016 e, após análise realizada pelo ente regulador e se considerada
satisfatória a justificativa técnica e econômica frente aos dados relativos ao
depósito potencialmente existente, o técnico responsável pela análise do
pedido de Guia de Utilização adotará as providências elencadas nos Incisos I -
III do art. 106 da Portaria nº155/2016.

Importante destacar que se tratando de primeiro pedido de Guia e


tendo em vista que o relatório final de pesquisa ainda se encontra pendente de
aprovação (caso em tela), antes de proferir parecer favorável a aprovação da
Guia, o técnico da ANM realizará vistoria na área para certificar os dados
apresentados pelo interessado, e por economia processual, vistoriar também os
dados constantes no Relatório Final de Pesquisa.

Por conseguinte, se o requerimento de Guia de Utilização atender ao


disposto no art. 104 da Portaria 155/2016, estiver com a taxa anual por hectare
devidamente quitada e instruído com a Licença ambiental ou documento
equivalente, após análise e parecer favorável pelo técnico vistoriador, o
requerimento deverá seguir para a aprovação da autoridade competente,
conforme disposto no Inciso III – Art. 106 da Portaria 155/2016.

Questão nº 02

Em 12/06/2020, foi publicado no Diário Oficial da União a Portaria de Lavra nº XX/2020,


autorizando XYZ S.A. a lavrar minério de ferro em área de 752 hectares no Município de
Itaúna/MG. Para a disposição dos rejeitos decorrentes do processo de beneficiamento,
a empresa recorrerá à construção de uma barragem de mineração, que ficará
alocada fora da poligonal do direito minerário e em propriedade de terceiros, em área
na qual consta um requerimento de pesquisa da ABC S.A. protocolizado em 14/01/2020.
Na condição de consultor da XYZ S.A., responda aos seguintes questionamentos:

(a) Devido à resistência dos superficiários em permitir o ingresso da empresa na área,


é possível a constituição de servidão mineral? Se sim, quais são os requisitos que
deverão ser observados para que seja emitido o laudo de servidão pela ANM?

Sim, é possível a constituição de servidão mineral em propriedades


particulares mesmo sem firmar, inicialmente, acordo “amigável” entre o
minerador e o superficiário que, devido à resistência inicialmente imposta ao
minerador para acessar sua propriedade, o mesmo poderá ser compelido,
judicialmente, a autorizar o uso de sua propriedade para que terceiros
promovam a pesquisa e a lavra de jazidas minerais, considerando a prevalência
do Princípio da Primazia do Interesse Público sobre o Privado, o que faculta que
as citadas Servidões poderão, também, ser instituídas sem haver,
necessariamente, a concordância do proprietário e ou possuidor do imóvel
serviente.
De acordo com o ordenamento jurídico, o aproveitamento dos recursos
minerais ou da propriedade minerária pertencentes à União é prioritário sobre o
da propriedade do solo devido ao enquadramento da utilidade pública do
aproveitamento industrial das minas e jazidas, declarada no art. 5º, “f”, do
Decreto-Lei 3.365/1941, no art. 2º, “c”, da Resolução CONAMA 369/2006 e do
art. 41 do Decreto 9.406/2018, sendo este último dispositivo ainda pendente de
Resolução pela Agência Nacional de Mineração.

A suposição da presença de recursos minerais em qualquer área, até


prova em contrário, dá à União, sua proprietária, e/ou aos titulares de direitos
minerários outorgados pela União, legitimidade para propor a ação
objetivando obter autorização judicial para ocupar o solo e nele realizar
atividades minerárias, cujo rito é definido no art. 27, complementado pelos
artigos 60, 61 e 62 do Código de Mineração.

Seja pelo acordo entre as partes, ou seja, pela sentença constitutiva, o


ente expropriante adquire o direito instalar e usufruir da Servidão instituída no
terreno particular, desde que pague aos respectivos proprietários ou posseiros
uma renda pela ocupação dos terrenos e uma indenização pelos danos e
prejuízos que possam ser causados pelos trabalhos de pesquisa, observados os
Incisos I-V do artigo 27 do Código de Mineração.

Não obstante ao direito de o minerador usufruir de propriedades públicas


e/ou privadas para fins de instituição da servidão minerária, primeiramente,
torna-se necessário a autorização pelo ente regulador da Mineração – Agência
Nacional de Mineração por meio da emissão de Laudo de Servidão minerária
a seu favor.

Para que seja emitido o referido Laudo pela ANM, o requerente deverá
estar devidamente cadastrado no CTDM – Cadastro de Titulares de Direito
Minerário, formalizar a petição à Administração por meio de pré-requerimento
eletrônico específico e protocolizar ( em meio eletrônico) juntamente com
formulário específico para Área de Servidão disponível no site do DNPM, que
deverá conter o memorial descritivo do local abrangido para implantação das
estruturas, planta de situação da área requerida além de descrever
tecnicamente a finalidade da servidão e demonstrando sua essencialidade
para o bom funcionamento do empreendimento minerário, acompanhado de
Anotação de Responsabilidade Técnica do profissional responsável pelo
requerimento.

Após formalizado a petição com os elementos acima transcritos, a ANM


realizará a análise técnica da documentação entregue para verificar se de fato
a servidão minerária requerida é realmente indispensável e compatível com a
lavra da Jazida, o que já deverá ter sido demonstrada pelo minerador no Plano
de Aproveitamento econômico, conforme determina o item 27.1 da Instrução
Normativa DNPM n° 01/1983.

Além disto, o memorial descritivo da área requerida para a servidão será


objeto de análise pelo setor de Controle de áreas da Agência para fins de
apuração de possíveis sobreposições de áreas, mesmo não registrando
prioridade sobre o polígono minerário, para fins de elaboração da planta de
detalhe e de situação e memorial descritivo da área objetivada, em
observância ao item 27.4 da IN 01/1983.

Em etapa posterior à análise documental e à critério da ANM, poderá o


técnico da Agência realizar a vistoria no local para certificar se de fato a
servidão requerida é necessária ou conveniente para o bom funcionamento
daquele empreendimento ou pesquisa.

Concluída a análise e se considerado viável e satisfatória a


documentação apresentada na petição da servidão, será emitido pela ANM o
Laudo de servidão minerária favorável a implantação daquela estrutura
acessória ao empreendimento minerário para que, de posse dessa
documentação, o minerador possa realizar o acordo amigável ou judicial com
o superficiário cuja propriedade será impactada, restando ao minerador a
incumbência de apresentar à ANM o acordo efetivado com o superficiário para
possibilitar a averbação ao título de concessão de lavra, conforme
determinado nos itens 27.4.1 e 27.4.1.1 da Instrução Normativa DNPM n° 01/1983.

(b) Caso seja outorgado o Alvará de Pesquisa, é possível que ABC S.A. realize
pesquisa mineral na área e futuramente aproveite economicamente o material
contido na barragem? Como pode a XYZ S.A. evitar que isso ocorra?

Considerando que fora concedido o laudo de servidão mineral à


empresa XYZ que conta com título de Lavra em vigor ou (suspenso), há que se
aplicar exclusivamente o requisito objetivo, extraído a partir da interpretação
conjuntada do art. 6º, “b”, com o art. 59, parágrafo único, “h”, todos do Código
de Mineração, qual seja: se os rejeitos que foram depositados em barragens ou
pilhas integrantes da estrutura da mina, fora da poligonal do título de lavra em
vigor (ou suspenso), a própria titular, responsável por tais estoques de resíduos,
tem direito de reaproveita-los.

Caso contrário - ou seja, em se tratando de pilhas e barragens vinculadas


a um título de lavra já extinto (por exemplo: caducado, cassado, decaído ou
mesmo com prazo de vigência encerrado) ou resíduos da mineração que não
foram estocados, mas devolvidos ao meio ambiente - tal direito não deve ser
reconhecido. Nesse último caso, admite-se o aproveitamento desse material
por terceiros que pleitearem e obtiverem direito de lavra na forma da lei.

É evidente, também, o aproveitamento do estéril/rejeito deve se restringir


à(s) substância(s) mineral(is) constantes do título. Havendo interesse do titular da
lavra de aproveitar economicamente qualquer outro bem mineral não
constante do título de lavra - seja ele o próprio rejeito/estéril, seja outra
substância mineral contida no material - há necessidade de aditamento do
título de lavra, conforme exigido pelo parágrafo único do art. 47 do Código de
Mineração.
Cabe salientar que a existência de requerimento ou autorização de
pesquisa não restringe a outorga da servidão mineral sobreposta àquela área
ou vice-versa, haja vista que áreas de servidão minerária não registram
prioridade sobre requerimentos de pesquisa mineral, tão pouco em área
tituladas, conforme disposto nos itens 27.2 e 27.3 do art.27 da IN nº 01/1983.

Por outro prisma, se outorgado à empresa ABC S.A a autorização para


pesquisar uma área que “já contenha uma barragem de rejeitos” ou uma “pilha
de estéril”, o fato de ser detentora do título de autorização de pesquisa, tel
condição não lhe confere o direito de contemplar como recursos
medidos/inferidos e tão pouco “aproveitar economicamente” o material
contido na barragem ou pilha de estéril, considerando tratar-se de estruturas
integrantes da mina (XYZ) em operação e a necessária redução da área aos
limites da jazida pesquisada à ser apresentado por ABC S.A à ANM junto do
relatório final de pesquisa que, certamente, não poderá contar com as possíveis
reservas constantes nas referidas estruturas (Barragem e/ou pilha de estéril) que,
apesar de estar inseridas no interior do polígono outorgado, não estão sob o
domínio da união e tão pouco do detentor daquele título (ABC), mas sim
pertencentes à empresa XYZ enquanto o título estiver em vigor (mesmo que
suspenso temporariamente) por ser proveniente da lavra por ela realizada .

Logo, considerando que a empresa XYZ.SA detém o direito de


reaproveitar o material contido em estruturas integrantes do título minerário que
lhe fora concedido, mesmo que essas estruturas (Barragem/pilha de estéril)
estejam localizadas fora da poligonal titulada, não restará prejudicada as
atividades de recuperação mineral contido nessas estruturas se cumprido
fielmente o disposto no Plano de Aproveitamento econômico apresentado à
ANM.

Por fim, para evitar futuros conflitos de interesses com a empresa ABC e
para o bom desempenho das atividades de “recuperação do material contido
na barragem”, poderá a empresa XYZ S.A, por meio do diálogo e negociação,
propor à empresa ABC a realização de cessão total dos direitos minerários
(Alvará de pesquisa) em favor de XYZ S.A, mesmo não sendo legalmente
necessário tal procedimento para que XYZ S.A acesse a área de servidão e
realize o reaproveitamento dos possíveis recursos minerais alí contidos.

Aluno: GUSTAVO SANTOS FERNANDES – (Engº. de Minas)


Orientador: Tiago de Mattos.
Curso: Direito e Mineração.

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