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INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

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INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS
Núcleo de Educação a Distância

PRESIDENTE: Valdir Valério, Diretor Executivo: Dr. Willian Ferreira.

O Grupo Educacional Prominas é uma referência no cenário educacional e com ações voltadas para
a formação de profissionais capazes de se destacar no mercado de trabalho.
O Grupo Prominas investe em tecnologia, inovação e conhecimento. Tudo isso é responsável por
fomentar a expansão e consolidar a responsabilidade de promover a aprendizagem.

GRUPO PROMINAS DE EDUCAÇÃO.


Diagramação: Ayrton Nícolas Bardales Neves
Revisora: Priscila Alves de Brito

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Prezado(a) Pós-Graduando(a),

Seja muito bem-vindo(a) ao nosso Grupo Educacional!


Inicialmente, gostaríamos de agradecê-lo(a) pela confiança
em nós depositada. Temos a convicção absoluta que você não irá se
decepcionar pela sua escolha, pois nos comprometemos a superar as
suas expectativas.
A educação deve ser sempre o pilar para consolidação de uma
nação soberana, democrática, crítica, reflexiva, acolhedora e integra-
dora. Além disso, a educação é a maneira mais nobre de promover a
ascensão social e econômica da população de um país.
Durante o seu curso de graduação você teve a oportunida-
de de conhecer e estudar uma grande diversidade de conteúdos.
Foi um momento de consolidação e amadurecimento de suas escolhas
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pessoais e profissionais.
Agora, na Pós-Graduação, as expectativas e objetivos são
outros. É o momento de você complementar a sua formação acadêmi-
ca, se atualizar, incorporar novas competências e técnicas, desenvolver
um novo perfil profissional, objetivando o aprimoramento para sua atua-
ção no concorrido mercado do trabalho. E, certamente, será um passo
importante para quem deseja ingressar como docente no ensino supe-
rior e se qualificar ainda mais para o magistério nos demais níveis de
ensino.
E o propósito do nosso Grupo Educacional é ajudá-lo(a)
nessa jornada! Conte conosco, pois nós acreditamos em seu potencial.
Vamos juntos nessa maravilhosa viagem que é a construção de novos
conhecimentos.

Um abraço,

Grupo Prominas - Educação e Tecnologia

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Olá, acadêmico(a) do ensino a distância do Grupo Prominas!..

É um prazer tê-lo em nossa instituição! Saiba que sua escolha


é sinal de prestígio e consideração. Quero lhe parabenizar pela dispo-
sição ao aprendizado e autodesenvolvimento. No ensino a distância é
você quem administra o tempo de estudo. Por isso, ele exige perseve-
rança, disciplina e organização.
Este material, bem como as outras ferramentas do curso (como
as aulas em vídeo, atividades, fóruns, etc.), foi projetado visando a sua
preparação nessa jornada rumo ao sucesso profissional. Todo conteúdo
foi elaborado para auxiliá-lo nessa tarefa, proporcionado um estudo de
qualidade e com foco nas exigências do mercado de trabalho.

Estude bastante e um grande abraço!


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Professora: Claudia Serpa Costa


Ribeiro Fleischhauer

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O texto abaixo das tags são informações de apoio para você ao
longo dos seus estudos. Cada conteúdo é preprarado focando em téc-
nicas de aprendizagem que contribuem no seu processo de busca pela
conhecimento.
Cada uma dessas tags, é focada especificadamente em partes
importantes dos materiais aqui apresentados. Lembre-se que, cada in-
formação obtida atráves do seu curso, será o ponto de partida rumo ao
seu sucesso profisisional.

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Esta unidade analisará a Parte Especial do Código Penal, que
apresenta os crimes em espécie. Especificamente, foram enfocadas: a)
crimes contra a pessoa b) crimes contra o patrimônio c) crimes contra
a dignidade sexual d) crimes contra a fé pública e) crimes contra a ad-
ministração pública. Trata-se de um estudo crítico das principais figuras
típicas, a partir da relevância do bem jurídico tutelado, de forma a ade-
quá-las aos princípios norteadores, limitadores e garantidores do Direito
Penal. Visa ainda, o fomento do raciocínio crítico-jurídico referente a
Parte Geral do Direito Penal, das Teorias da Sanção Penal e seus re-
flexos no estudo dos crimes em espécie, sempre pautado na filtragem
constitucional.
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Direito Penal. Parte Especial. Crimes em Espécie.

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Apresentação do Módulo _______________________________________ 11

CAPÍTULO 01
CRIMES CONTRA A PESSOA

Conceito de Vida ______________________________________________ 13


Homicídio – Artigo 121 do Código Penal _________________________ 14
Induzimento, Instigação e Auxílio ao Suicídio – Artigo 122 do
Código Penal __________________________________________________ 21

Infanticídio – Artigo 123 do Código Penal _______________________ 23


Aborto – Artigos 124 a 128 do Código Penal _____________________ 25

Lesões Corporais _______________________________________________ 31


Periclitação da Vida e da Saúde do Outrem _____________________ 37

Crimes Contra a Honra _________________________________________ 41


Recapitulando _________________________________________________ 48

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CAPÍTULO 02
CRIMES CONTRA A LIBERDADE INDIVIDUAL E CONTRA O
PATRIMÔNIO

Constrangimento Ilegal ________________________________________ 54


Ameaça _______________________________________________________ 55

Tráfico de Pessoas _____________________________________________ 56


Sequestro e Cárcere Privado ___________________________________ 57
Crimes Patrimoniais ___________________________________________ 57
Recapitulando _________________________________________________ 77

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CAPÍTULO 03
CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL, CONTRA A FÉ
PÚBLICA E CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Dos Crimes Contra a Dignidade Sexual __________________________ 82


Dos Crimes Contra a Fé Pública ________________________________ 86
Dos Crimes Contra a Administração Pública ____________________ 90
Recapitulando _________________________________________________ 98

Fechando Unidade ____________________________________________ 103

Referências ___________________________________________________ 106


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Inicialmente, será feita a análise do bem jurídico vida, seja ela in-
trauterina ou extrauterina, seus respectivos termos iniciais e finais para fins
de tutela penal e respectiva tipificação.
Posteriormente, será feito um estudo dos crimes contra a vida:
homicídio, induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio, infanticídio e as
modalidades de aborto.
No capítulo seguinte, será analisado o bem jurídico-penal inte-
gridade física, fisiológica e psíquica, bem como os critérios norteadores
para fins de flexibilização de sua indisponibilidade para fins de exclusão da
responsabilidade jurídico-penal em consonância com os princípios consti-
tucionais.
Serão analisadas, por meio de casos concretos, as figuras típicas
previstas no Código Penal e seu confronto com outras figuras típicas, tais
como os delitos contra a Honra, previstos na Legislação de Trânsito – Lei
n. 9503/1997 e na Lei n.11340/2006.
Após, será realizado o estudo da honra como fator de criminaliza-
ção bem como a compatibilidade dos tipos vigentes com a Carta Republi-
cana e as consectárias questões de direito constitucional.
Será objeto de estudo a particularidade da iniciativa da ação penal
que afeta os delitos contra a Honra, bem como os institutos do pedido de
explicações em juízo, retratação, e exceção da verdade.
Haverá também a delimitação do bem jurídico-penal patrimônio, a

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possibilidade de incidência do princípio da insignificância, os critérios nor-
teadores de tipificação da conduta e consequente cominação de sanção
penal a partir dos juízos de desvalor da conduta em relação ao desvalor
do resultado.
Para tanto, serão confrontadas as figuras típicas dos delitos de
furto, apropriação indébita, estelionato e receptação mediante o debate
de casos concretos e enfrentamento das recentes discussões doutrinário-
-jurisprudenciais. Serão estudadas as figuras típicas de roubo, extorsão e
extorsão mediante sequestro, bem como avaliaremos a possibilidade da
incidência dos institutos repressivos previstos na Lei n. 8072/1990 – Lei de
Crimes Hediondos.
Haverá os estudos dos delitos contra a dignidade sexual e, para
tanto, aplicaremos como elemento da dignidade humana a partir dos con-
ceitos de dignidade sexual e vulnerabilidade.
Ainda, serão identificadas as zonas de conflito de direito intertem-
poral advindas das alterações trazidas em 2018, sua filtragem constitucio-
nal face à moderna teoria do delito – tipicidade formal e material, bem como
as medidas de Política Criminal de Controle Penal adotadas para fins de
exclusão da responsabilidade jurídico-penal.
11
Por fim, será objeto de análise crítica a possibilidade de incidên-
cia dos institutos repressivos previstos na lei de Crimes Hediondos (Lei
n.8072/1990)
Serão também estudados os delitos contra a paz pública, com-
preendida como a tutela da manutenção da tranquilidade e segurança so-
ciais. Desta forma, serão analisadas formas de criminalidade que, segun-
do seu modus operandi, fomentam a prática de condutas típicas diversas
dotadas de maior juízo de reprovabilidade, razão pela qual, por critérios de
política criminal, aquelas deixaram de ser consideradas meros atos prepa-
ratórios destas e foram erigidas a figuras típicas autônomas.
Estudaremos também os delitos contra a fé pública a partir da
premissa de que, face à preponderância do interesse público e da credibili-
dade do sistema financeiro nacional, nos casos de delitos de moeda falsa,
bem como das próprias relações sociais entre indivíduos ou entre indiví-
duos e o Estado/Administração Pública, necessário identificar e descrever
os critérios de política criminal adotados para fins de tipificação, conse-
quente cominação de sanção penal ou exclusão desta, nas figuras típicas
de Moeda Falsa, Falsificação de Documentos Públicos ou Privados.
Ao final, serão analisados os delitos contra a administração públi-
ca, que se subdivide em crimes praticados por funcionário público contra a
Administração Pública e crimes praticados por particular contra a Adminis-
tração Pública.
Pelo fato de o bem jurídico tutelado englobar os princípios da Ad-
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ministração Pública, em especial o princípio da moralidade, pode-se veri-


ficar que não se pode fazer incidir certos princípios para afastar o crime,
como ocorre com o princípio da insignificância, conforme inclusive dispõe
a súmula 599 do STJ.
Por fim, haverá o estudo dos crimes praticados por particular con-
tra a Administração Pública e questões relevantes e atuais serão verifica-
das.

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DOS CRIMES CONTRA A
PESOSOA

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CONCEITO DE VIDA
Em um primeiro momento, é necessária a delimitação, para o
Direito Penal, do conceito de “vida humana”, a distinção entre vida in-
trauterina e extrauterina, bem como seus termos inicial e final.
Desta forma, em consonância com a adoção de um Direito Pe-
nal Constitucional, imperioso o reconhecimento de que o bem jurídico-
-penal vida deva abranger não só aspectos biológicos (naturais), como
também normativos de modo a partirmos da premissa que, em regra, o
bem jurídico tutelado é indisponível, sendo irrelevante o consentimento
da vítima.
No que concerne ao termo inicial da vida humana, para fins
penais, não obstante a questão seja extremante controvertida, o melhor
entendimento é no sentido da adoção da teoria conceptualista, segundo
a qual o início da vida intrauterina ocorre com a nidação, ou seja, no
momento em que o óvulo fecundado é fixado no útero materno. Nes-
te sentido Luiz Regis Prado afirma que “a gestação tem início com a
implantação do óvulo fecundado no endométrio” (PRADO, Luiz Regis.

13
Curso de Direito Penal Brasileiro. v.2.8.ed. São Paulo: Revista dos Tri-
bunais, 2010, p.86).
Assim, poderemos diferenciar os delitos contra a vida a partir
da distinção entre eliminação da vida intra ou extrauterina. No que con-
cerne à eliminação da vida intrauterina, tipificada pelo aborto criminoso,
este poderá ser praticado pelo agente desde o momento da concep-
ção (nidação) até o momento anterior ao início do parto, conforme se
depreende da interpretação do disposto no art.123, do Código Penal,
que faz expressa menção de que a mãe atuaria durante o parto ou logo
após.
Por outro lado, para fins de caracterização do término da vida
extrauterina, o critério a ser adotado encontra-se previsto no art. 3º, da
Lei n.9434/1997, que dispõe sobre a remoção de órgãos, tecidos e par-
tes do corpo humano para fins de transplante e tratamento, segundo o
qual o término da vida extrauterina ocorre com a morte encefálica, que
ocorre com a “parada das funções neurológicas segundo os critérios
da inconsciência profunda sem reação a estímulos dolorosos, ausên-
cia de respiração espontânea, pupilas rígidas, pronunciada hipotermia
espontânea e abolição de reflexos” (Dicionário Médico Blakiston, apud,
CAPEZ, Fernando, Curso de Direito Penal. V.2. 10.ed, pp 36).

HOMICÍDIO. ART.121 DO CÓDIGO PENAL.


Disposições Gerais
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O delito de homicídio caracteriza-se pela eliminação da vida


extrauterina. Por se tratar de um delito material, com a admissibilidade
da tentativa, a consumação se dá com a ocorrência do resultado natura-
lístico. Trata-se ainda de um crime instantâneo de efeitos permanentes.

I. Homicídio Privilegiado, previsto no §1º do art. 121, CP:


Uma vez reconhecido o privilégio, a doutrina é unânime em es-
tabelecer que se trata de direito subjetivo do réu à diminuição de pena.
Por motivo de relevante valor social pode-se entender aquilo que venha
a atender os interesses da coletividade, como por exemplo, o caso clás-
sico apresentado na Exposição de Motivos da Parte Especial do Código
Penal, item n.39, que seria a morte de um traidor da pátria. Motivo de
relevante valor moral seria aquele levasse em conta os interesses do
agente, como o caso do homicídio eutanásico, o caso de um pai que
mata o estuprador da filha. A segunda parte do art. 121§1º apresenta a
hipótese de o agente estar totalmente influenciado pela emoção aliado
a praticamente um ato reflexo à provocação da vítima.

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II. Homicídio Qualificado, previsto no §2º do art. 121:
Ainda de acordo com a Exposição de Motivos da Parte Espe-
cial do Código Penal, item n.38, in verbis:
“As circunstâncias qualificativas estão enumeradas no § 2º do
artigo 121. Umas dizem com a intensidade do dolo, outras com o modo
de ação ou com a natureza dos meios empregados; mas todas são es-
pecialmente destacadas pelo seu valor sintomático: são circunstâncias
reveladoras de maior periculosidade ou extraordinário grau de perversi-
dade do agente” (...).
► O homicídio qualificado e a incidência dos institutos re-
pressores da Lei n. 8072/1990 – Lei de Crimes Hediondos.
Consoante expressa previsão legal, art.1º, da Lei n. 8072/1990,
o delito de “homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de
grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio
qualificado (art. 121, § 2o, I, II, III, IV e V)” é considerado hediondo, con-
sumado ou tentado, de modo a incidirem todos os institutos repressores
da Lei de Crimes Hediondos aos condenados pelo respectivo delito.
► Concurso de pessoas e incomunicabilidade das cir-
cunstâncias de caráter pessoal
Conforme dispõe o art.30, do Código Penal, no caso de con-
curso de pessoas as circunstâncias de caráter pessoal não se comu-
nicam. Desta forma, para que possamos analisar a comunicabilidade
ou não, seja do privilégio, seja das qualificadoras, faz-se necessária a

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identificação da natureza da circunstância.
No que concerne ao privilégio, este se caracteriza como motivo
determinante do crime, logo circunstância de caráter pessoal, incomu-
nicável.
Em relação às qualificadoras, pode-se dizer que se subdividem
em: motivos qualificadores determinantes, meios e modos de execução
qualificadores. No que concerne aos primeiros, não há que se falar em
comunicabilidade no caso de concurso de pessoas.
Por outro lado, no caso de qualificadoras de natureza objetiva,
ou seja, afetas aos meios e modos de execução do delito, caso o agente
que concorra para o delito tenha conhecimento destas é plenamente
possível a sua comunicabilidade.
► Homicídio qualificado privilegiado e a caracterização da
hediondez:
A questão aqui diz respeito à possibilidade da incidência simul-
tânea do privilégio, causa especial de diminuição de pena e a qualifica-
dora no delito de homicídio. O entendimento doutrinário e jurispruden-
cial dominante é no sentido da possibilidade, desde que a qualificadora
seja de natureza objetiva, como, por exemplo, os meios e modos de
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execução (art. 121,§2°, III, CP).
Quanto a incidência ou não, no delito de homicídio qualificado-
-privilegiado, dos institutos repressores da Lei n.8072/1990 – Lei de Cri-
mes Hediondos, prevaleceu o entendimento pela inaplicabilidade dos
institutos repressores da Lei de Crimes Hediondos ao delito de homicí-
dio qualificado-privilegiado, manifestou-se o Superior Tribunal de Jus-
tiça, através da analogia, no sentido de que se faz necessário aplicar
a norma contida no art. 67, do Código Penal, segundo a qual devem
preponderar os motivos determinantes do crime (privilégio), de modo
a afastar a incidência da Lei de Crimes Hediondos. Além disso, como
o critério para a identificação de um crime hediondo é o critério legal,
essa modalidade de homicídio não está no rol taxativo do art. 1º da Lei
de Crimes Hediondos. Logo, incabível entender que seria caso de delito
hediondo
III. O delito de homicídio culposo e a natureza jurídica da
sentença que concede o perdão judicial, prevista no art.121, §5º,
CP.
O perdão judicial, causa extintiva de punibilidade prevista no
art.107, IX do Código Penal, vem a ser um direito subjetivo do réu de
caráter unilateral, no qual o Estado-juiz deixa de aplicar a pena em cir-
cunstâncias expressamente previstas em lei, como por exemplo nos
casos de homicídio e lesões corporais culposas (art.121, §5º e art. 129,
§8º, ambos do Código Penal).
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Nos casos de homicídio culposo, aplica-se o perdão judicial


quando o sofrimento do agente já seria uma espécie de punição, de
forma que a sanção penal passa a ser desnecessária. O STJ sumulou,
através do Verbete de Súmula n.18, no sentido de que a sentença con-
cessiva do perdão judicial tem natureza de decisão declaratória de ex-
tinção de punibilidade não gerando qualquer consequência para o réu.
Ainda, no com relação ao instituto do perdão judicial questio-
na-se a possibilidade de sua incidência nos delitos de homicídio e le-
são corporal culposos previstos no Código de Trânsito. Nestes casos,
entendimento predominante tem sido no sentido da admissibilidade da
aplicação da causa de extinção de punibilidade principalmente com
base nas razões do veto.
Na Doutrina, Nucci assevera que não mais se aplica o tipo pe-
nal do § 3.º do art. 121 ao homicídio cometido na direção de veículo
automotor, pois o Código de Trânsito Brasileiro (Lei 9.503/97), no art.
302, estipulou um tipo incriminador específico. Aliás, como criticamos
no tópico anterior, a pena é mais elevada do que o homicídio culposo
fora do trânsito, evidenciando como está cada vez mais baixa, em com-

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paração, a sanção do homicídio culposo no Código Penal1.
IV- Causa de aumento de pena trazida pela Lei 12.720/2012

Historicamente, “milícia” era entendida como as tropas que


exerciam uma reserva auxiliar ao Exército, uma espécie de tropa de se-
gunda linha. Pelo fato de a polícia militar, por muito tempo, ser conside-
rada uma tropa reserva do exército, utilizou-se então, a palavra milícia
para ser feita referência à polícia militar.
A lei faz menção às milícias privadas, que inicialmente eram
formadas por policiais e ex-policiais que tinham por objetivo proteger
comunidades localizadas em certas regiões e que cobravam valores
individuais para remunerar serviços por eles prestados. E pelo fato de
estarem armados, eram comuns os confrontos com pequenos crimino-
sos e com traficantes.
A referida lei trouxe ao crime do homicídio uma novatio legis
in pejus, ao introduzir uma causa de aumento de pena ao homicídio
quando este for praticado por milícia privada quando esta estiver sob o
pretexto de praticar segurança privada.
A referida causa de aumento também é aplicável para os casos
de o homicídio ser cometido por grupo de extermínio.
V. Feminicídio
O Código Penal sofreu uma alteração no ano de 2015, com o
advento da lei 13.104. Inseriu-se uma qualificadora ao crime de homicí-

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dio que diz respeito ao crime ser cometido contra a mulher em razão de
condições do sexo feminino.
O feminicídio é uma espécie de homicídio qualificado motivado
pelo ódio contra as mulheres, caracterizado por circunstâncias especí-
ficas em que o pertencimento da mulher ao sexo feminino é o motivo
pelo qual o delito é praticado, ou seja, não é crime de homicídio contra
a mulher mas sim em razão do menosprezo à condição de mulher. O
crime de homicídio cometido contra a mulher se chama Feminicídio.
Entre essas circunstâncias estão incluídos: os assassinatos
em contexto de violência doméstica/familiar, e o menosprezo ou discri-
minação à condição de mulher. Os crimes que caracterizam a qualifica-
dora do feminicídio ligam-se à destruição da identidade da vítima e de
sua condição de mulher.
Atualmente, existe uma controvérsia com relação à natureza
da qualificadora do feminicídio. A doutrina amplamente majoritária sus-
tenta que seria de natureza subjetiva, de forma que a consequência
seria a impossibilidade se combinar o feminicídio ao privilégio do art.
1 Nucci, Guilherme de Souza Curso de Direito Penal: parte especial: arts. 121 a 212 do
Código Penal / Guilherme de Souza Nucci. – 3. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2019.

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121 §1º. Já a jurisprudência do STJ defende que a qualificadora do fe-
minicídio teria natureza objetiva, de forma que seria compatível aplicar
o privilégio nos casos em que houver a prática do feminicídio.
O Enunciado nº 23 (005/2015) da COPEVID traz também que
a natureza da qualificadora seria de ordem objetiva: “A qualificadora do
feminicídio, na hipótese do art. 121, § 2ºA, inciso I, do Código Penal, é
objetiva, nos termos do art. 5º da Lei n. 11.340/2006 (violência domésti-
ca, familiar ou decorrente das relações de afeto), que prescinde de qual-
quer elemento volitivo específico.” (Aprovado na II Reunião Ordinária do
GNDH e pelo CNPG em 22/09/2015).
A Lei nº 13.771/2018 alterou três causas de aumento de pena
do feminicídio (art. 121, § 7º do Código Penal).

Antes da Lei 13.771/2018 ATUALMENTE


Art. 121 (...) § 7º A pena do femini- Art. 121 (...) § 7º A pena do femini-
cídio é aumentada de 1/3 (um terço) cídio é aumentada de 1/3 (um terço)
até a metade se o crime for praticado: até a metade se o crime for praticado:
I – durante a gestação ou nos 3 (três) Não foi alterado. Continua a mesma
meses posteriores ao parto; redação.
II – contra pessoa menor de 14 (qua- II – contra pessoa menor de 14 (ca-
torze) anos, maior de 60 (sessenta) torze) anos, maior de 60 (sessenta)
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anos ou com deficiência; anos, com deficiência ou portadora


de doenças degenerativas que acar-
retem condição limitante ou de vulne-
rabilidade física ou mental;
III – na presença de descendente ou III – na presença física ou virtual de
de ascendente da vítima. descendente ou de ascendente da
vítima;
Não havia inciso IV IV – em descumprimento das medi-
das protetivas de urgência previstas
nos incisos I, II e III do caput do art.
22 da Lei nº 11.340, de 7 de agosto
de 2006.

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As qualificadoras objetivas são as que dizem respeito ao crime,
enquanto as subjetivas vinculam-se ao agente. Enquanto as objetivas
dizem com as formas de execução (meios e modos), as subjetivas co-
nectam-se com a motivação do crime.

VI. Homicídio funcional

Foi editada a Lei 13.142, de 06.07.2015, que inseriu o inc. VII


ao § 2.º do art. 121 do CP, criando mais uma modalidade qualificada,
na hipótese em que o agente praticar o crime de homicídio contra au-
toridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da CF/1988, integran-
tes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no
exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge,
companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão des-
sa condição.
Para que incida a qualificadora em questão é preciso que o
homicídio tenha sido praticado enquanto algumas das autoridades ou
agentes acima mencionados estiverem no exercício da função ou em
decorrência dela. Assim, não é pelo fato de ser vítima de homicídio uma

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autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da CF que, automati-
camente, entenderemos pelo homicídio qualificado. Isso porque a morte
de uma dessas pessoas poderá ser ocasionada por diversos outros mo-
tivos, que podem vir a afastar a qualificadora em questão. Assim, se du-
rante uma discussão sobre política, o agente acaba causando a morte
de um policial militar, que com ele se encontrava no interior de um bar,
o fato não pode ser caracterizado com a qualificadora prevista no inc.
VII, do § 2.º do art. 121 do CP, uma vez que não se encaixa na condição
de o crime ter sido praticado em razão do cargo ou no exercício desse.
O legislador também quis preservar o cônjuge, companheiro
ou parente consanguíneo até terceiro grau, de alguma das autorida-
des ou agentes descritos nos arts. 142 e 144 da CF, em razão dessa
condição, fazendo com que houvesse também e incidência da referida
qualificadora. No entanto, existe uma flagrante inconstitucionalidade no
referido artigo quando a lei faz menção a parente consanguíneo até
o terceiro grau. Parentes consanguíneos seriam pai, mãe e filhos (em
primeiro grau), irmãos, avós e netos (em segundo grau), e tios, sobri-
nhos, bisavós e bisnetos (em terceiro grau). Parentes por afinidade, que
não estão abrangidos pela qualificadora em estudo, são sogro, sogra,
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genro, nora, padrasto, madrasta, enteados e cunhados. “Como a lei uti-
lizou a palavra consanguíneo, como ficaria a situação do filho adotivo,
mesmo que a Constituição Federal, em seu art. 227, § 6.º tenha proibido
quaisquer designações discriminatórias? O art. 1.593 do CC diz que o
parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou
outra origem. Assim, temos que concluir, forçosamente, que não existe
consanguinidade quando o filho for adotivo, mesmo que não possamos
mais utilizar essa expressão discriminatória. Não há consanguinidade,
ou seja, relação de sangue, que permita o reconhecimento de um tron-
co comum com relação ao filho adotivo. Dessa forma, infelizmente, se
o homicídio for praticado contra o filho adotivo de um policial, em razão
dessa condição, não poderemos aplicar a qualificadora do inc. VII do
§ 2.º do art. 121 do CP, tendo em vista que, caso assim fizéssemos,
estaríamos utilizando a chamada analogia in malam partem.” (GRECO,
2015)

O homicídio preterdoloso não está previsto ao teor do art. 121


do Código Penal, mas trata-se de uma espécie qualificada de lesão cor-
poral, lesão corporal seguida de morte. In casu, o resultado morte ocor-
re a título de culpa. Configura lesão corporal seguida de morte, prevista
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ao teor do art. 129, §3º, do Código Penal, e não sendo crime doloso
contra a vida, NÃO É JULGADO perante o Tribunal do Júri.

Importante lembrar que não se pode confundir homicídio com


genocídio, uma vez que o crime de genocídio tutela a diversidade hu-
mana e, por isso, tem caráter coletivo ou transindividual, não atraindo,
por si só a competência do Tribunal do Júri. Ocorre que uma das formas
de praticar genocídio é por meio da morte de membros do grupo. A com-
petência constitucional para o julgamento de crimes contra a vida é do
júri. Sendo o delito de genocídio atraído pelo Tribunal do Júri.
O Supremo Tribunal Federal, já decidiu que no caso de geno-
cídio com morte, o agente responde por homicídio mais genocídio, em
concurso formal impróprio.
Por fim, vale salientar que o Superior Tribunal de Justiça deci-
diu ao final do ano de 2019 que compete à Justiça Federal julgar crime
contra a vida em desfavor de policiais militares, consumado ou tentado,
praticado no contexto de crime de roubo armado contra órgãos, autar-
quias ou empresas públicas da União.

20
Compete à Justiça Estadual julgar o crime de homicídio praticado contra po-
liciais militares estaduais, ainda que no contexto do delito federal de contra-
bando (STJ. 3ª Seção. CC 153.306/RS, Rel. p/ Acórdão Min. Maria Thereza
de Assis Moura, julgado em 22/11/2017). Ex: o sujeito ativo trazia cigarros
importados em seu veículo e, para fugir de uma blitz, atirou e matou um dos
policiais militares. Haverá desmembramento: a Justiça Federal julgará o con-
trabando e a Justiça Estadual julgará o homicídio. Situação diversa, entretan-
to, é aquela em que o crime contra a vida em desfavor de agentes estatais,
consumado ou tentado, é praticado no contexto de crime de roubo armado
contra órgãos, autarquias ou empresas públicas da União. Isso porque, nesta
hipótese, a íntima relação entre a violência, elementar do crime de roubo, e
o crime federal (roubo armado) atrai a conexão. Ex: o sujeito ativo cometeu
roubo contra os Correios; depois de consumado, passou a ser perseguido
por policiais militares e atirou contra eles, matando um e ferindo o outro. O
roubo e os delitos de homicídio serão julgados conjuntamente pela Justiça
Federal. STJ. 3ª Seção. CC 165.117-RS, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado
em 23/10/2019 (Info 659).

INDUZIMENTO, INSTIGAÇÃO E AUXÍLIO AO SUICÍDIO. ART.122,


DO CÓDIGO PENAL.
A autolesão.
De acordo com o princípio da lesividade, não é possível haver
a incriminação de condutas que não excedam o âmbito do próprio autor.
Assim, não será possível punir aquele indivíduo que de alguma forma

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


tente se matar e não consiga.
Em razão disso, existem duas as razões de Política Criminal:
1. caráter repressivo da sanção penal (não pode recair sobre
um cadáver);
2. caráter preventivo da sanção penal (a ameaça da pena que-
da-se inútil ante aquele indivíduo que nem sequer teme a morte).
(CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Parte Especial,
v.2.10. ed. São Paulo: Saraiva. p. 121).

Consumação e Tentativa.
O momento consumativo desse crime e a admissibilidade de
punição pela tentativa restam controvertidos. A primeira corrente é no
sentido de que por ser um delito instantâneo e de mera conduta, os
resultados lesão grave e morte são apenas condições de punibilidade.
Neste caso, seria correto afirmar que o delito se consuma com o mero
induzimento, instigação ou auxílio. (Neste sentido Luiz Regis Prado.
PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. v.2. 8.ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p.70). Já a segunda corrente é no

21
sentido de que se trata de um delito material e por isso, os resultados
lesão grave e morte são elementares do tipo. Dessa forma, a consu-
mação exige a ocorrência de tais resultados. Caso contrário, a conduta
será atípica. (Fernando Capez. Op. Cit, pp 127).
Vale lembrar que seja qual for o entendimento adotado, não é
possível a punição pela tentativa
► A causa de aumento de pena do parágrafo único, inciso
II do art.122, do Código Penal e o alcance da expressão “menori-
dade da vítima”.
O referido artigo, ao mencionar a menoridade da vítima, na
verdade, refere-se ao menor de 21 e maior de 14 anos, pois, segundo
melhor entendimento, face à interpretação extensiva do disposto no art.
217-A, do Código Penal, o menor de 14 anos, considerado vulnerável
pelo ordenamento jurídico pátrio, a princípio, não teria capacidade de
discernimento para fins de ser instigado, induzido ou auxiliado a praticar
seu suicídio, razão pela qual, nestes casos, a conduta de terceiro carac-
terizar-se-ia o delito de homicídio.
► Pacto de Morte.
O pacto de morte, também denominado ambicídio, caracteriza-
-se pelo acordo realizado entre duas pessoas com vistas à eliminação
simultânea de suas vidas. A questão deve ser analisada com cuidado
uma vez que se um dos agentes vier a praticar conduta correspondente
a ato executório do homicídio de outrem, terá sua conduta como incursa
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

neste delito.
Em doutrina, Nucci trata do motivo egoístico, salientando que
trata-se de causa de aumento, chegando ao ponto de duplicar a pena,
relativa ao excessivo apego a si mesmo (agente), o que evidencia o
desprezo pela vida alheia, desde que algum benefício concreto adve-
nha ao agente (art. 122, parágrafo único, I, CP)2.
Este é um nítido fator negativo de personalidade, explora-
do, pelo legislador, somente em alguns tipos penais, como o presente
exemplo, mas não há qualificadora, nem causa de aumento e também
inexiste agravante mencionando-o. Deve, então, o julgador incluir o mo-
tivo egoístico no campo das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP,
que menciona genericamente os “motivos” do crime. Logicamente, me-
rece maior punição. Exemplos típicos: induzir alguém a se matar para
ficar com a herança ou para receber valor de seguro.
No tocante ao exemplo supra mencionado, vale lembrar que a
Súmula 610 do Superior Tribunal de Justiça prevê que:
Súmula 610-STJ: O suicídio não é coberto nos dois primeiros
2 Nucci, Guilherme de Souza Curso de Direito Penal: parte especial: arts. 121 a 212 do
Código Penal / Guilherme de Souza Nucci. – 3. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2019.

22
anos de vigência do contrato de seguro de vida, ressalvado o direito do
beneficiário à devolução do montante da reserva técnica formada. STJ.
2ª Seção. Aprovada em 25/04/2018, DJe 07/05/2018.

INFANTICÍDIO. ART. 123, DO CÓDIGO PENAL.

O bem jurídico tutelado nesse delito é a vida extrauterina,


a qual será eliminada pela própria mãe do neonato durante ou
logo após o parto, desde que a mesma esteja sob a influência
do estado puerperal. Por tratar-se de crime material, consuma-se
com a morte do nascituro, sendo admissível a tentativa, haja vista
tratar-se de crime plurissubsistente
Natureza jurídica do estado puerperal.
O Estado Puerperal é uma elementar do tipo penal e sendo um
critério fisiopsíquico a ser aferido mediante laudo pericial com vistas à
atenuação da culpabilidade.
Para Guilherme de Souza Nucci, o estado puerperal “é o esta-
do que envolve a parturiente durante a expulsão da criança do ventre
materno (...) sendo uma hipótese de semi-imputabilidade que foi tratada
pelo legislador (...) sendo o puerpério o período que se estende do iní-

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


cio do parto até a volta da mulher às condições pré-gravidez”. (NUCCI,
Guilherme de Souza, Código Penal Comentado, 9 ed. pp 612).
No entanto, se for retirada total ou parcialmente a capacidade
de entendimento ou de autodeterminação da parturiente em decorrên-
cia do grau de desequilíbrio fisiopsíquico, aplicar-se-ão as disposições
do art. 26, caput ou parágrafo único do CP. (CUNHA, Rogério Sanches.
Direito Penal. Parte Especial. 2 ed. pp 38)
Lapso temporal: durante o parto ou logo após. Para Genival
Veloso de França, puerpério, sobreparto ou pós-parto é “o espaço de
tempo variável que vai do desprendimento da placenta até a involução
total do organismo materno às suas condições anteriores ao processo
gestacional. Dura, em média, seis a oito semanas. Seu diagnóstico é
muito importante nas questões médico-legais ligadas a sonegação, si-
mulação e dissimulação do parto e da subtração de recém-nascidos,
principalmente nos casos em que se discute a hipótese de aborto ou
de infanticídio, ou ainda de parto próprio ou alheio” (FRANÇA, Genival
Veloso de. Medicina Legal. 6 ed. Rio de Janeiro: Guanabara koogan,
2001. Página 225).

23
Questões Relevantes

Concurso de pessoas no delito de infanticídio: possibilida-


de e comunicabilidade do estado puerperal.
Para fins de esclarecimentos sobre o tema, analisemos a se-
guinte narrativa e consectários:
Narrativa: Mãe que, sob a influência do estado puerperal,
mata o próprio filho e a possibilidade da interferência de conduta de
terceiro. (Luiz Regis Prado)
Hipótese 1: mãe e terceiro realizam o núcleo do tipo. Ambos
respondem pelo delito de infanticídio por força do art.29, CP;
Hipótese 2: mãe mata o nascente e é ajudada pelo terceiro;
ambos respondem pelo delito de infanticídio por força do art.30, CP. Ele,
entretanto, na condição de partícipe.
Hipótese 3: o terceiro mata a criança, com a participação da
mãe. Neste caso, há a quebra da teoria unitária do concurso de pes-
soas, sendo o terceiro responsabilizado pelo delito de homicídio e a
mãe, infanticídio por força do disposto no art.67, do Código Penal.
Na doutrina, Nucci salienta que a lei penal menciona que o
infanticídio pode ter lugar durante o parto ou logo após. Nesta última
hipótese, não há dúvida: inexiste aborto. Entretanto, o problema mais
sensível é descortinar o momento exato em que a criança deixa de ser
considerada feto para ser tratada como nascente com a ruptura da bol-
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

sa (parte das membranas do ovo em correspondência com o orifício


uterino), pois a partir daí o feto se torna acessível às ações violentas
(por instrumentos ou pela própria mão do agente). Assim, iniciado o par-
to, torna-se o ser vivo sujeito ao crime de infanticídio. Antes, é hipótese
de aborto3.
Vejamos entendimento do Superior Tribunal de Justiça sobre
o assunto.

HABEAS CORPUS IMPETRADO EM SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO PRE-


VISTO NO ORDENAMENTO JURÍDICO. 1. NÃO CABIMENTO. MODIFICA-
ÇÃO DE ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL. RESTRIÇÃO DO REMÉ-
DIO CONSTITUCIONAL. MEDIDA IMPRESCINDÍVEL À SUA OTIMIZAÇÃO.
EFETIVA PROTEÇÃO AO DIREITO DE IR, VIR E FICAR. 2. ALTERAÇÃO
JURISPRUDENCIAL POSTERIOR À IMPETRAÇÃO DO PRESENTE WRIT.
EXAME QUE VISA PRIVILEGIAR A AMPLA DEFESA E O DEVIDO PRO-
CESSO LEGAL. 3. HOMICÍDIO CULPOSO POR INOBSERVÂNCIA DE
REGRA TÉCNICA. 4. INICIADO O TRABALHO DE PARTO NÃO HÁ FA-
LAR MAIS EM ABORTO. 5. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. MEDIDA
EXCECIONAL. 6. ORDEM NÃO CONHECIDA (...) 3. Os fatos descritos na
3 Nucci, Guilherme de Souza Curso de Direito Penal: parte especial: arts. 121 a 212 do
Código Penal / Guilherme de Souza Nucci. – 3. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2019.

24
denúncia são claros e determinados, podendo caracterizar, em tese, o crime
de homicídio culposo por inobservância de regra técnica, não prosperando
a alegação de ocorrência de “aborto culposo provocado por terceiro” ou de
crime impossível em razão do bebê ter sido retirado do ventre materno sem
vida, pois consta dos autos que a mãe já havia entrado em trabalho de par-
to há mais de oito horas e os batimentos cardíacos foram monitorados por
todo esse período até não mais serem escutados. 4. Iniciado o trabalho de
parto, não há falar mais em aborto, mas em homicídio ou infanticídio,
conforme o caso, pois não se mostra necessário que o nascituro tenha
respirado para configurar o crime de homicídio, notadamente quando
existem nos autos outros elementos para demonstrar a vida do ser
nascente, razão pela qual não se vislumbra a existência do alegado cons-
trangimento ilegal que justifique o encerramento prematuro da persecução
penal (...) (STJ, HC 228.998/MG, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE,
QUINTA TURMA, julgado em 23/10/2012, DJe 30/10/2012).

ABORTO. ART.124 A 128, CÓDIGO PENAL.


Considera-se aborto a eliminação dolosa da vida intraute-
rina, seja por meio da expulsão do útero materno, seja por meio da
interrupção dolosa da gravidez, levada a termo por terceiro – gestan-
te (art.124, Código Penal) ou terceiro (art.125 e art. 126, Código Pe-
nal). É irrelevante para a caracterização do delito de aborto o estágio
de desenvolvimento da gestação, bem como a capacidade de vida
independente. Por se tratar de delito material, consuma-se com a morte
do produto da concepção, sendo irrelevante que a mesma ocorra dentro

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


ou fora do útero materno.
A doutrina classifica as espécies de aborto para fins de tipifi-
cação das condutas ou para o reconhecimento de condutas atípicas e
justificadas, ou seja, acobertadas por causas excludentes de ilicitude.
Acerca do tema, cabe apresentar algumas das espécies elencadas por
Rogério Sanches Cunha: (CUNHA, Rogério Sanches. Direito Penal –
parte especial. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, p 39)
a) natural: geralmente ocorre por problemas de saúde da gestante – irrele-
vante penal (atípico).
b) acidental: decorrente de quedas, traumatismos e acidentes – em regra,
atípico.
c) criminoso: previsto nos art. 124 a 127, Código Penal
d) legal ou permitido: previsto no art. 128, Código Penal.

I. Autoaborto.
Nesta figura típica, é possível a prática das condutas do auto
aborto pela gestante ou do consentimento, pela gestante, para que ter-
ceiro o pratique.

25
Na primeira modalidade, estamos diante de um delito de mão
própria, ou seja, que exige, para a sua prática a pessoalidade do sujeito
ativo. Logo, não será admissível, no caso de concurso de pessoas, a
coautoria, mas, somente, a participação.
Na segunda modalidade, aborto consentido, o legislador optou
pelo rompimento com a teoria unitária do concurso de pessoas, sendo
a conduta da gestante tipificada no art. 124, CP e a do terceiro, no art.
126, CP.
Questão controvertida: No caso da conduta do auto aborto,
com a participação de terceiro, no qual resulte lesões corporais gra-
ves ou a morte da gestante, qual será a responsabilização penal do
partícipe? O melhor entendimento é no sentido de que o terceiro será
responsabilizado pela participação na figura típica do art. 124, Código
Penal em concurso formal perfeito com a modalidade culposa afeta aos
resultados mais gravosos – art.121, §3º ou art. 129, §6º c.c art. 124
n.f art. 70, 1ª parte, todos do Código Penal, uma vez que o art. 127 do
Código Penal é aplicável somente aos artigos 125 e 126 do mesmo
diploma legal.
Questão controvertida: gestante que tente se suicidar sem,
contudo, lograr êxito nesta empreitada. Neste caso, sua conduta será
incursa na figura típica do delito de aborto na modalidade tentada ou
consumada, haja vista a lesão ao bem jurídico vida intrauterina e, con-
sequente reconhecimento de que o feto é o sujeito passivo do referido
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

delito.
II. Aborto provocado por terceiro com o consentimento da ges-
tante – art. 126 do CP.
Como dito anteriormente, nesta figura típica há o rompimen-
to com a teoria unitária do concurso de pessoas no que concerne à
conduta da gestante que consente com a prática do aborto, sendo sua
conduta tipificada como incursa no art. 124, CP. Por configurar crime
comum – pode ser praticado por qualquer pessoa, admite a ocorrência
de concurso de pessoas em quaisquer de suas modalidades (coautoria
ou participação). Cabe lembrar ainda que a gestante poderá desistir da
conduta mesmo após o início dos atos executórios (durante a opera-
ção), desde que, antes da interrupção da gravidez, caso em que será o
terceiro responsabilizado, caso prossiga com a conduta, pelo crime do
art. 125.
► Questão controvertida: Validade do Consentimento e ca-
pacidade para consentir. A menor de 18 anos pode consentir para a prá-
tica do aborto e, portanto ser a conduta do terceiro que praticar o aborto
tipificada no art. 126, Código Penal. Entretanto, se a gestante for menor
de 14 anos, consoante o disposto no art. 126, parágrafo único, Código
26
Penal, o terceiro será responsabilizado pelo delito de aborto provocado
por terceiro sem o consentimento da gestante.

III. Aborto provocado por terceiro sem o consentimento da


gestante.
Nesta figura típica, a gestante e o produto da concepção (óvulo,
embrião ou feto) são sujeitos passivos da conduta praticada por tercei-
ro. Questão de suma importância é a compreensão acerca da ausência
de consentimento da gestante, podendo ser o dissenso real (nos casos
de emprego de fraude, grave ameaça ou violência contra a gestante) ou
presumido (nos mesmos moldes da caracterização da “vulnerabilidade”
da vítima prevista no art.217-A, CP - se a gestante não é maior de qua-
torze anos).
Caso terceiro mate a gestante ciente da gravidez será juridica-
mente responsabilizado pelos dois resultados – homicídio e aborto sem
o consentimento da gestante, em concurso formal imperfeito de crimes
(art. 121 c.c art. 125 n.f art. 70, parte final, todos do Código Penal).

IV. Aborto qualificado pelo resultado lesão corporal de


natureza grave ou morte.
A figura majorada prevista no art. 127, Código Penal, configu-
ra-se como figura preterdolosa e, somente, é aplicável às figuras típicas
previstas nos art. 125 e 126, Código Penal, ou seja, ao terceiro que

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


pratica o aborto e não à gestante, no caso de lesões corporais de natu-
reza grave por questões de política criminal, haja vista o ordenamento
jurídico não sancionar, em regra, a autolesão (princípio da alteridade).
Se em virtude dos meios empregados para provocar o aborto
não houver a morte do feto, embora ocorra a lesão de natureza grave ou
a morte da gestante, o melhor entendimento é no sentido de aplicar-se
a figura majorada consumada, pois por ser delito preterdoloso, não há
que se falar em tentativa (PRADO, Luiz Regis. Op. cit, p 92).

Aborto Legal.
O art.128, do Código Penal apresenta causas especiais de ex-
clusão de ilicitude e compreende os denominados aborto necessário e
aborto humanitário.
Possui por fundamento o disposto no item n. 41, da Exposição
de Motivos da Parte Especial do Código Penal.

Aborto Necessário ou terapêutico.


Neste caso, face à ponderação de interesses, o melhor enten-
dimento é no sentido de que não há a exigência do consentimento da
27
gestante e tampouco a autorização judicial para a prática do aborto.
Cabe salientar que é aplicável à junta médica, no caso de erro de diag-
nóstico a descriminante putativa prevista no art. 20,§1º, CP (CAPEZ,
Fernando. Curso de Direito Penal. v.2. 10 ed. São Paulo: Saraiva, pp
159).
São requisitos para a sua realização que o aborto seja pratica-
do por médico, que haja perigo para a vida da gestante e que não seja
possível a outro meio para salvá-la.
► Necessidade de autorização judicial para sua realiza-
ção. Acerca da discussão sobre cabe transcrever breve trecho de deci-
são proferida pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul:
Por outro lado, destaco que quando se trata de aborto neces-
sário (art. 128, inc. I – “se não há outro meio de salvar a vida da ges-
tante”), conforme leciona E. Magalhães Noronha (DIREITO PENAL, 2º
vol., 9ª edição. fls. 61). “É ao médico que cabe a enorme responsabili-
dade de dizer se deve ou não sacrificar a spes personae. A ele incumbe
pronunciar-se acerca da necessidade e do momento da intervenção.”.
Resulta, daí, que se, no caso concreto, houver necessidade de interven-
ção imediata, deverá o médico responsável tomar tal decisão, sequer
necessitando de autorização judicial. (Apelação Crime n. 70026698019,
Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco
Aurélio de Oliveira Canosa, Julgado em 16/10/2008).
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Aborto Humanitário, ético ou sentimental


Esta norma permissiva tem por escopo o “reconhecimento cla-
ro do direito da mulher a uma maternidade consciente” (Jimenez de
Asúa apud Luiz Regis Prado, op.cit., p 95). Ainda é possível falar-se
no direito ao afeto, bem como “nada justifica que se obrigue a mulher a
aceitar uma maternidade odiosa, que dê vida a um ser que lhe recorda-
rá, perpetuamente, o horrível episódio da violência sofrida” (HUNGRIA,
Nelson apud CUNHA, Rogério Sanches, op. cit. p 43)
Neste caso é indispensável o consentimento da gestante ou de
seu representante legal. Por outro lado, não é necessária a autorização
judicial ou a existência de uma sentença condenatória pelo delito con-
tra a dignidade sexual, cabendo ao médico, por questões de cautela,
verificar a existência de certidões ou cópias de boletins de ocorrências
policiais, testemunhos colhidos perante a autoridade policial ou, na au-
sência destes, de atestado médico ou prontuário de atendimento médi-
co afeto às lesões decorrentes da conjunção carnal ou da prática de ato
libidinoso forçada.

28
Questão do aborto de feto anencéfalo: foi de fundamental
importância a manifestação o STF no julgamento da APPF n.º 54 no
sentido de autorizar a interrupção da gestação no caso de aborto de
fetos anencéfalos, de forma que esses casos venham a ser resolvidos
de uma maneira mais rápida e eficiente.
O ponto principal do estudo enfrentado é que existe vida no
feto anencefálico. Essa conclusão torna-se clara baseada no fato de
que o anencéfalo possui apenas uma parte do encéfalo comprometida
pela doença, e não todo ele, como sugere o nome anencefalia. No en-
tanto, não há viabilidade de vida fora do útero.
A melhor justificativa para que se permita o aborto de fetos por-
tadores de anencefalia está na Constituição da República, uma vez que
estamos diante de um conflito de direitos fundamentais. De um lado, a
dignidade humana da mãe e do outro o direito à vida do feto. O direito
à vida, como já foi mencionado, é um direito fundamental constante no
rol das cláusulas pétreas, as quais não podem ser modificadas. Como
há vida intrauterina, ela está a salvo desde o momento da concepção.
A dignidade humana da genitora também está igualmente amparada

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legalmente, já que o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana é um
dos fundamentos da Constituição, não podendo ser afastada em hipó-
tese alguma.
Sabe-se que não há direitos absolutos e por isso não há mo-
tivo para se falar que o direito à vida está acima de todos os outros,
visto que a própria Constituição Federal permite a pena de morte em
casos de guerra declarada. Dessa forma, em casos de conflitos com os
demais direitos, deve-se dar ênfase, e portanto, maior privilégio àquele
que menos se distancie da dignidade de uma pessoa.
Ao se aplicar esse raciocínio ao tema em questão, temos por
um lado a vida do feto anencéfalo que apesar de se encontrar vivo no
útero materno, ao nascer, poderá viver apenas por alguns momentos, já
que sua vida é inviável. De outro lado, uma mulher que sempre sonhou
em ser mãe e tem a sua vida transformada em um pesadelo após o
diagnóstico de tão grave doença, e que a espera do parto é uma ver-
dadeira tortura. A mulher grávida que participará intensamente daquela
dor, não estará correndo risco de vida. No entanto, o sofrimento daque-
les meses de gestação serão comparados à morte.
Assim, com base no fundamento da Constituição Federal Bra-
29
sileira constante no art.1o, inciso III, que é o direito de todas as pessoas
terem uma vida digna, não há motivos para que se proíba o aborto de
fetos anencéfalos, sob pena de se colocar sob suspeita a constituciona-
lidade do ordenamento em situações como essas.
Ademais, não há falar em tentativa de aborto (CP, art. 124, c/c
o art. 14, II), a não ser na mente da mulher (crime, portanto, imaginá-
rio). Em tais casos, aplica-se a figura contida no art. 17 do CP (crime
impossível).
 Importante ressaltar que está em tramitação a ADPF 442 que
discute a questão relativa à recepção, pela Constituição Federal de 1988,
dos artigos 124 e 126 do Código Penal, que instituem a criminalização
da interrupção voluntária da gravidez, pela ordem normativa vigente. Os
autores da Ação argúem não observância de preceitos fundamentais tais
como: a dignidade,  a cidadania, a não discriminação, a inviolabilidade
da vida, a liberdade, a igualdade, a proibição de tortura ou o tratamento
desumano e degradante, a saúde e o planejamento familiar das mulheres
e os direitos sexuais e reprodutivos.
Em artigo publicado a Dra. Luciane Lourdes Webber Toss4, ad-
vogada, professora universitária e mestre em Ciências Sociais salienta
que:
“No Brasil a discussão sobre aborto sempre se desloca da mu-
lher para outras questões como a religião e a moralidade. Quase 1 em
cada 5 brasileiras de áreas urbanas, dos 18 aos 40 anos já realizou,
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pelo menos, um abortamento. Há uma maior frequência entre mulheres


de menor escolaridade. O índice é de 22% para aquelas com até quar-
ta série/quinto ano e de 11% para quem tem nível superior. Quanto à
renda, o percentual é de 16% entre as brasileiras com renda familiar de
até 1 salário mínimo e cai para 8% nas famílias com mais de 5 salários
mínimos. Quase a metade das mulheres necessita de internação após
o aborto (48%) o que aponta para o risco do aborto clandestino fora da
rede de saúde.  O aborto é a 5ª causa de morte materna no País. Os
dados estatísticos são importantes porque, além de revelar a questão
social no qual devemos inserir políticas de Estado, eles também definem
4 Luciane Lourdes Webber Toss, Consultora de Gênero e Direitos Humanos na Ó Mu-
lheres!, Advogada, Professora Universitária, Mestre em Ciências Sociais e Especialista em Direito
Privado pela Unisinos, Especialista em Nuevos Rectos de Derecho Público pela Universidad de
Burgos – UBU (ESP) , em Derechos Humanos y Derecho del Trabajo pela Universidad Castilla La
Mancha de Toledo – UCLM (ESP) e em Direito do Trabalho e Previdência Social pela Fundação
Escola da Magistratura Trabalhista – FEMARGS. Atualmente cursa especialização em Direitos
Humanos e Políticas Públicas, também pela Unisinos. Integra o grupo de pesquisas CNPQ UFRGS
Trabalho e Capital: Retrocesso Social e Avanços Possíveis. É professora na FEMARGS e na Fun-
dação do Ministério Público – FMP. Ocupa a Vice-Presidente da Associação Gaúcha de Advogados
Trabalhista – – AGETRA e é Membro das Comissões de Relações de Trabalho e de Feminismo da
Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas – ABRAT.

30
quais políticas púbicas podem conter, reduzir ou evitar a repetição ou
piora de dados negativos (...) O aborto é uma realidade no Brasil entre
mulheres de diversas classes e credos. A discussão que deve ser feita
é sobre descriminalização do aborto, ou seja, entre aborto legal e
aborto clandestino. A criminalização alcança basicamente mulheres em
situação de vulnerabilidade. Por fim, considerando que o aborto é uma
questão de saúde pública, a saúde da mulher deve ser uma questão
de Estado, uma política pública e não uma definição pautada por uma
crença religiosa e por moralismos”5.

LESÕES CORPORAIS
Conceito de Integridade Física e Saúde Corporal.
Compreende-se por integridade física a “alteração anatômica,
interna ou externa, do corpo humano [...] a saúde fisiológica diz respeito
ao equilíbrio funcional do organismo [...] e a saúde mental, à pertur-
bação de ordem psíquica (CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal.
Parte Especial. v 2.10 ed. São Paulo: Saraiva, p166).
Como já mencionado anteriormente, a autolesão não é puni-
da pelo ordenamento jurídico face ao princípio da lesividade. Nos ca-
sos expressamente previstos em lei – art.171, §2º, V, Código Penal e
art.184, Código Penal Militar, não há punição da autolesão, mas sim do
bem jurídico protegido nos crimes em questão.

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Disponibilidade do bem jurídico tutelado.

Em decorrência do princípio da dignidade da pessoa humana,


bem como do interesse social na manutenção da incolumidade física e
mental dos indivíduos, o bem jurídico tutelado é considerado um bem
público indisponível.
Entretanto, tal indisponibilidade foi mitigada com o advento da
Lei n. 9099/1995 – Juizado Especial Criminal, ao estabelecer que, nos
casos de lesões corporais culposas e de natureza leve, a ação penal de
iniciativa pública passou a ser condicionada à representação da vítima
ou de seu representante legal (art. 88, da Lei n. 9099/1995).
No mesmo contexto podemos também questionar a validade
do consentimento do ofendido e, consequente, disponibilidade do bem
jurídico em determinadas situações, tais como: lesões desportivas, in-
tervenções cirúrgicas, dentre elas, por exemplo, o transplante de órgãos
e tecidos, cirurgia transexual e esterilização cirúrgica.
5 Criminalização do aborto e a opção pela morte de mulheres. Disponível em: http://es-
tadodedireito.com.br/criminalizacao-do-aborto-e-a-opcao-pela-morte-de-mulheres/. Acesso em: 12
de abril de 2020.

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As lesões desportivas e as intervenções médico cirúrgicas en-
contram-se dentre as causas excludentes de ilicitude decorrentes do
exercício regular de direito, desde que consentidas pela vítima (art.23,
III, Código Penal).
Fernando Capez defende o entendimento de que, sob a pers-
pectiva da imputação objetiva do resultado, as lesões desportivas con-
figuram condutas atípicas (CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. v
2. 10.ed. São Paulo: Saraiva,, 2010. p 167).
No caso de intervenções médico cirúrgicas, admite-se, inclu-
sive, sua realização sem o consentimento da vítima quando configurar
estado de necessidade (art. 24 e art. 146,§3º, I, ambos do Código Pe-
nal).
No que concerne ao transplante de órgãos e tecidos, o melhor
entendimento é no sentido de compreender-se como exercício regular
de direito no caso de doador “juridicamente capaz”, haja vista a finalida-
de terapêutica do procedimento.
Artigo 9 - É permitida à pessoa juridicamente capaz dispor gra-
tuitamente de tecidos, órgãos ou partes do próprio corpo vivo para fins
de transplante ou terapêuticos.
§3º. Só é permitida a doação referida neste artigo quando se
tratar de órgãos duplos, de partes de órgãos, tecidos ou partes do corpo
cuja retirada não impeça o organismo do doador de continuar vivendo
sem risco para a sua integridade e não represente grave comprometi-
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mento de suas aptidões vitais e saúde mental e não cause mutilação ou


deformação inaceitável, e corresponda a uma necessidade terapêutica
comprovadamente indispensável à pessoa receptora.

Art. 226 - A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.


§ 7º - Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paterni-
dade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, compe-
tindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício
desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições ofi-
ciais ou privadas.

O referido procedimento encontra-se previsto na Constituição


da República – art. 199,§4º e regulado na Lei n. 9434/1997 – art.9º. O
mesmo entendimento é adotado em relação à esterilização cirúrgica,
ou seja, tem sido considerada conduta atípica, haja vista fundar-se em
princípios constitucionais – planejamento familiar e paternidade respon-
sável, bem como pelo fato de estar expressamente regulada em lei –
art.10, da Lei n. 9263/1996 e art. 226,§7º, CRFB.
Em relação à cirurgia transexual (tratamento de transgeni-
talismo), configura, em tese, lesão corporal gravíssima prevista no
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art.129,§2º, IV, do Código Penal, face à mutilação de órgãos e perda da
função reprodutora.
Todavia, a partir do reconhecimento de que a referida cirurgia
configura-se como tratamento, não há que se falar em tipicidade da
conduta médica (neste sentido, Guilherme de Souza Nucci, Manual de
Direito Penal. 6 ed. São Paulo: RT, p 656).
Ainda, sobre o tema, o Conselho Federal de Medicina, em
seu Projeto de Diretrizes, bem como por meio da Resolução CFM n.
1955/2010 estabeleceu regras para o denominado tratamento de trans-
genitalismo.

Incidência do principio da insignificância.


Nos casos de perfuração do corpo para a colocação de ade-
reços, faz-se necessária a flexibilização da indisponibilidade do bem
jurídico tutelado face à adoção do princípio da adequação social bem
como do principio da insignificância por serem pequenas lesões corpo-
rais consentidas pela vítima, juridicamente capaz.

Conflito aparente de normas e concurso de crimes com demais


figuras típicas.

É possível que, em alguns casos concretos, possamos nos


deparar com situações nas quais tenhamos dúvidas acerca da correta

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tipificação da conduta de lesões corporais, quando esta “concorrer” com
outras figuras típicas, seja através do conflito aparente de normas, seja
através da incidência de concurso de crimes.

Analisaremos a seguir algumas destas hipóteses

a) Crime de lesão corporal leve e injúria real.

Neste caso, o ponto distintivo resulta do animus do agente,


ou seja, se “a violência exercida for ultrajante, havendo a intenção de
humilhar, envergonhar a vítima, ofender a sua dignidade ou decoro” es-
tará configurada a figura típica de injúria real. Por outro lado, caso haja
significativa lesão corporal, consoante o disposto no §2º, do art.140,
do Código Penal, será possível a aplicação concomitante de ambas as
sanções por força da caracterização de concurso de crimes.

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b) Lesões corporais culposas no Código Penal e no Códi-
go de Trânsito Brasileiro (Lei n. 9503/1997).

Neste caso, estamos diante de um conflito aparente de normas


a ser solucionado pelo princípio da especialidade, segundo o qual o
qual a norma especial, a legislação de trânsito ao exigir que o agente
pratique a conduta na condução de veículo automotor, afasta a incidên-
cia da norma geral prevista no Código Penal.
Distinção entre violência doméstica e violência de gênero
discriminatório contra a mulher.
Questão a ser analisada com cuidado é o confronto entre as
figuras típicas de lesões corporais qualificadas e majoradas mediante
a caracterização da violência doméstica (art. 129, §§, 9°, 10 e 11 do
Código Penal) e a violência doméstica e de gênero prevista na Lei n.
11340/2006 (Lei Maria da Penha).
Inicialmente temos de observar que a Lei n.11340/2006 não
tipificou condutas, mas, sim, estabeleceu critérios de política criminal
a serem adotados nos casos de violência doméstica contra a mulher,
conforme se depreende da interpretação do disposto no art.5º, da Lei
n.11340/2006, in verbis:

Art. 5º, Lei n. 11340/2006. Para os efeitos desta Lei, configura violência
doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão base-
ada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou
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psicológico e dano moral ou patrimonial

Desta forma, não há que se confundir violência doméstica com


violência de gênero. Compreende-se por violência doméstica a pratica-
da no âmbito da vida em família, independentemente da existência de
parentesco.
Por outro lado, a violência de gênero, no caso da Lei n.
11340/2006, possui caráter eminentemente discriminatório contra a mu-
lher, tendo, a referida lei abarcado os dois conceitos.
Neste sentido assevera Luiz Regis Prado:

A violência de gênero se refere a atos de agressão ou de violência exerci-


dos contra determinada pessoa por força de seu sexo feminino e a violência
doméstica diz respeito à sua prática no âmbito doméstico ou intrafamiliar, ou
a ele diretamente relacionado (PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal
Brasileiro. v.2. 8.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p 122)

Deve-se atentar que o disposto nos parágrafos 9º, 10 e 11, do


art.129, do Código Penal, apresentam, como dito anteriormente, figuras

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qualificadas e majoradas a serem aplicadas nos casos de lesões cor-
porais praticadas sob a caracterização de “violência domestica”, e não
para casos exclusivos de “violência de gênero”, apesar de tais parágra-
fos terem sido inseridos no Código Penal pela Lei 11.340/2006, senão
vejamos:
No caso de lesões corporais de natureza leve praticadas con-
tra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com
quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente
das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, a pena
cominada passa a ser de detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos
(art.129, §9º, Código Penal).
Para as lesões corporais de natureza grave ou qualificada pelo
resultado morte, praticadas no âmbito de violência doméstica, as penas
serão majoradas em um terço (art.129, §10, Código Penal). No caso de
lesões corporais praticadas no âmbito de violência doméstica contra
pessoa portadora de deficiência, as penas serão majoradas em um ter-
ço (art.129, §11)
Vale lembrar que conforme as lições de Fernando Capez,
“a  modificação  da  Lei n. 10.886/04  acabou sendo tímida, visto que a
conduta continua a configurar infração de menor potencial ofensivo e
a ação penal, condicionada à representação do ofendido. Na hipótese
de lesões de natureza grave, gravíssima e de lesão seguida de morte
(CP, art. 129, §§ 1º, 2º e 3º), não incide a qualificadora do mencionado

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§ 9º, até por uma razão óbvia: a pena nele cominada é bastante inferior,
de maneira que seria extremamente vantajoso agredir um parente, um
cônjuge ou a companheira de modo grave ou gravíssimo. Evidentemen-
te, não é o caso. A qualificadora incide mesmo apenas em relação às
lesões dolosas leves”. (Curso de Direito Penal - Parte Especial, v.2)

INF. 506, STJ. DIREITO PENAL. LESÃO CORPORAL LEVE


PRATICADA NO ÂMBITO FAMILIAR. IMPOSSIBILIDADE DE SUBS-
TITUIÇÃO DE PENA. Não é possível a substituição da pena privativa
de liberdade por restritiva de direitos em caso de condenação por crime
de lesão corporal previsto no art. 129, § 9º, do CP. A substituição da
pena privativa de liberdade por restritiva de direitos pressupõe, entre
outras coisas, que o crime não tenha sido cometido com violência ou
grave ameaça. A violência física se expressa de inúmeras maneiras,
sendo comum a todas elas o uso da força e a submissão da vítima, que
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fica acuada. Embora haja casos de violência doméstica com requintes
de crueldade extrema e outros que se restrinjam às vias de fato (tapas,
empurrões, socos, por exemplo), a violência praticada em maior ou
menor grau de intensidade caracteriza-se pelo simples fato de o agente
utilizar a força, de forma agressiva, para submeter a vítima. O termo
“violência” contido no art. 44, I, do CP, que impossibilita a substituição
da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, não comporta
quantificação ou qualificação. A Lei Maria da Penha surgiu para
salvaguardar a mulher de todas as formas de violência (não só física,
mas moral e psíquica), inclusive naquelas hipóteses em que a agressão
possa não parecer tão violenta. Precedentes citados: HC 182.892-MS,
DJe 20/6/2012, e HC 192.417-MS, DJe 19/12/2011. HC 192.104-MS,
Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 9/10/2012.

Perdão judicial.
Em relação ao instituto do perdão judicial, causa extintiva de
punibilidade prevista no art. 107, IX do Código Penal e, em relação ao
delito de lesões corporais culposas, no art. 129,§8º, ambos do Código
Penal, utilizaremos os mesmos tópicos analisados na aula afeta ao de-
lito de homicídio e a incidência do instituto do perdão judicial nos casos
de homicídio culposo previsto no Código Penal e na legislação de trân-
sito.
A representação como condição de procedibilidade da ação
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penal para o delito de lesões corporais leves e culposas.


Com o advento da Lei n.9099/1995, por critérios de Política
Criminal, o art. 88 passou a exigir que fosse preenchida a condição de
procedibilidade para os delitos de lesões corporais leves e culposas, ou
seja, é necessária a representação da vítima.
Nos casos de violência doméstica contra a mulher aplica-se a
referida condição de procedibilidade?
Nesse caso, a questão foi enfrentada pelo STF, tendo sido ob-
jeto de Ação Declaratória de Inconstitucionalidade (ADI 4424) ajuizada
pela Procuradoria-Geral da República (PGR) quanto aos artigos 12, in-
ciso I; 16; e 41 da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006).
O Plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria de vo-
tos, vencido o presidente, ministro Cezar Peluso, julgou procedente, na
sessão do dia 09 de fevereiro de 2012, a Ação Direta de Inconstitucio-
nalidade n. 4424 e decidiu no sentido da possibilidade de o Ministério
Público dar início a ação penal sem necessidade de representação da
vítima, bem como pela incompetência dos Juizados Especiais Criminais
em relação aos crimes cometidos no âmbito da Lei Maria da Penha.
Isso porque, dispõe o art. 41 da Lei Maria da Penha que não é aplicável
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a Lei 9.099/95 aos casos de violência contra a mulher. Vale lembrar que
a ação penal para os delitos de lesão corporal leve somente passou a
ser pública condicionada à representação, após o advento da Lei dos
Juizados Especiais, conforme dispõe seu art. 88.
Vejamos na prática jurisprudência sobre o assunto:

EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - LESÃO CORPORAL - LEI


MARIA DA PENHA - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - AUTORIA E
MATERIALIDADE COMPROVADAS. Comprovadas a materialidade e
a autoria delitivas, a partir da palavra da vítima e dos demais ele-
mentos de prova constantes dos autos, mantém-se a condenação
do réu pelo cometimento do crime de lesão corporal no âmbito
de relação doméstica.  (TJMG - Apelação Criminal 1.0701.17.009757-
3/001, Relator(a): Des.(a) Luziene Barbosa Lima (JD Convocada) , 8ª
CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 20/02/2020, publicação da súmula
em 27/02/2020).

PERICLITAÇÃO DA VIDA E DA SAÚDE DE OUTREM


No direito penal, temos o resultado naturalístico e o normativo.
O resultado naturalístico é a mudança do mundo exterior, provocada
pela conduta do agente. Ex. ofensa à integridade. Ex.2. a lesão ocorrida
na lesão corporal. Resultado normativo: é a lesão ao bem jurídico que

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se tutela. Ex. no homicídio será a lesão ao bem jurídico “vida”.
Nem todo crime possui resultado naturalístico. Nem todo crime
gera consequência no mundo exterior a partir da conduta do agente.
Um crime pode ter resultado naturalístico ou não.
Assim, podemos classificar crimes materiais (tem que ter re-
sultado naturalístico), formais (pode ter resultado naturalístico, mas não
exige para sua consumação) e os de mera conduta (não tem resultado).
Apenas pode classificar o crime em formal, material ou de mera conduta
pela exigência do resultado naturalístico.
No resultado jurídico / normativo, os crimes podem ser de dano
ou de perigo.
Os crimes de perigo podem ser concreto ou abstrato; e, perigo
individual ou coletivo. Nos crimes de dano, a norma descreve um dano
ao bem jurídico que ela tutela. Ex. homicídio: crime de dano ao bem
jurídico vida. Porem existem outros crimes que não são de dano, pois
o agente pratica uma conduta que é perigosa ao bem jurídico (crime de
perigo). Assim, por exemplo, dirigir sem habilitação, em alta velocidade;
manter relações com outras pessoas sem preservativo, e sem saber se

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possui doença venérea, etc.
O perigo pode ser concreto, no qual efetivamente deverá criar
uma hipótese de perigo (terá que analisar posteriormente ao ato). Ex.
dirigir sem habilitação. É crime de perigo? Dependerá da geração, no
caso concreto, de geração de dano.
Porem existem crimes que, de antemão, poderá ser analisado
ser hipótese de crime (crimes de perigo abstrato). A análise é feita ex
ante. Há uma presunção absoluta do perigo. O legislador antecipa a
barreira penal. Antes de atingir o dano concreto, o direito penal barra
para que a sociedade não possa ultrapassar o limite legal. Ex. dirigir
embriagado é crime – independente de causar o dano. Ex.2. Entregar
carro para pessoa não habilitada é crime.
Além disso, o crime de perigo pode ser individual (pessoas de-
terminadas estarão sendo expostas à uma situação de perigo) [art. 130
ao 136] ou coletivo (pessoas indeterminadas estarão sujeitas à situação
de perigo). [Art. 250 ao 285, CP].
Analisaremos agora os crimes de perigo individual. O agente
está cometendo um crime que a lei reputa perigosa. Não se exige para
a consumação do delito a efetiva lesão ao bem jurídico penalmente tute-
lado, sendo suficiente a exposição do bem jurídico a uma probabilidade
de dano.
Cuidado. Neste capitulo analisaremos os crimes de perigo à
VIDA e à SAÚDE. Então, por exemplo, se estiver relacionada ao patri-
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mônio, não haverá aplicação dos referidos artigos.

PERIGO DE CONTÁGIO VENÉREO


Pessoa contaminada por DOENÇA VENÉREA (DST). Não
pode ser qualquer doença. Ademais, o agente sabe, ou, ao menos, de-
veria saber.
Sujeito passivo: pessoa não contaminada pela mesma doença
venérea. Caso contrário, será crime impossível.
É um crime de forma vinculada, pois não é de qualquer forma
que se pratica o crime. Será por intermédio de ato sexual ou ato
libidinoso.
Ex. emprestar roupa intima, sabendo estar infectada por doen-
ça venérea. Não seria hipótese do art. 130, mas sim do art. 132, CP.
Neste crime, não precisa que a vitima sofra da infecção da
doença. Se a vitima se contaminar, continua sendo esse crime. (Obs.
neste caso, não é correto falar que o crime é formal. Crime formal diz
respeito aos resultados naturalísticos. Neste caso, estamos analisando
o crime de perigo – resultado normativo).
§1, art. 130. Se o agente quer transmitir a doença, não pode
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ser crime de perigo. Não há crime de perigo com dolo de dano (para
Cleber Masson, é um crime de perigo com dolo de dano). Ainda que a
pessoa não seja contaminada, haverá a incidência do art. 130.
No caput do art. 130, não quer contaminar. Apenas quer ter
uma relação sexual. Não quer transmitir doença. Há aqui, dolo de pe-
rigo. Pode ser praticado com dolo direto (sabe estar contaminado) ou
dolo eventual (ou que deveria saber da contaminação).
No §1º, o agente quer ter uma relação sexual PARA CONTA-
MINAR alguém.
E se tiver consentimento? Cuidado!!! Consentimento para ato
sexual é diferente de consentimento de doença. Obs. Se tiver consen-
timento, para parte da doutrina, afastaria o crime. Para outra parte da
doutrina, seria irrelevante, pois se trata de crime contra a saúde (não
poderia haver consentimento).
- pode manter relação sexual, com intenção de transmitir
(DOLO DIRETO), e não contaminar;
- contaminar e causar lesão leve (§1, art. 130);6
- contaminar e causar lesão grave;
- contaminar e causar lesão gravíssima;
- contaminar e causar a morte;
Havendo dolo, se causar lesão grave, gravíssima ou morte:
aplica-se a pena da lesão corporal respectiva. Isto apenas se aplicará
às hipóteses do §1º. Para o caput, o resultado é indiferente (o caput diz

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respeito ao risco).
Bem jurídico protegido: incolumidade física (vida e saúde).
Não se admite conduta omissiva.
Sujeito ativo: crime próprio/especial (é preciso que o sujeito
esteja infectado pela moléstia venérea) e é de mão própria (pois não ad-
mite delegação à outra pessoa). Não é admissível a coautoria, embora
seja possível que haja participação.
Poderá ser praticado em concurso com outros crimes – como,
por exemplo, estupro.

PERIGO DE CONTÁGIO DE MOLÉSTIA GRAVE


Neste caso, a pessoa tem que estar contaminada por doença
grave (que não pode ser venérea) e expõe alguém a contaminação –
não importa de que forma. Qualquer ato que possa expor a doença –
seja por ato sexual ou não.
Não admite dolo eventual e nem modalidade culposa.
O que é doença grave? Doenças assim classificadas pela me-
dicina.
6 Responderá pelo §1 do art. 130, pois a pena da lesão leve é mais baixa do que esta.

39
O art. 131 é diferente do art. 130, pois este último fala de crime
de perigo e no §1º fala de crime de dano. No art. 131, o agente quer
praticar desde o inicio o ato para contaminar outra pessoa. Assim, o art.
131 não pode ser considerado crime de perigo, mas sim de dano.
Para ter o crime do art. 131, é necessário que queira transmitir.
Ainda que não transmita, ou se transmitir lesão leve = art. 131,
caput. Se causar lesão grave, gravíssima ou seguida de morte, aplica-
-se o art. 129, CP.
Para Cleber Masson, admite-se qualquer meio de transmissão
(pode ser na forma direta – contato físico; ou indireta – por algum ob-
jeto). Ademais, a moléstia venérea, se grave, de acordo com o referido
autor, poderá enquadrar-se no crime previsto no art. 131, porem, desde
que o perigo de contagio não ocorra em razão do ato sexual ou libidi-
noso.

PERIGO PARA A VIDA OU SAUDE DE OUTREM


A regra é a especialidade. Se não for nenhum outro crime, será
este (caráter subsidiário). Ao agir de acordo com o art. 131, por exem-
plo, estará atuando também de acordo com o art. 132. O art. 132 é uma
hipótese geral sobre qualquer geração de perigo à vida ou saúde de
outrem. (SUBSIDIARIEDADE).
Ex. art. 308, CTB. Necessidade de estar em via publica. Se
estiver em via particular, não poderia usar o CTB, mas poderia o art.
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132, CP. Ex.2. Art. 311, CTB. Proximidade de escola, hospital, etc., com
grande número de pessoas. Se for na rodovia, com velocidade incom-
patível. Não poderia aplicar o art. 311 do CTB, pois não se amolda.
Mas, poderia o art. 132, CP. Ex.3. Art. 15, Estatuto do desarmamento.
Via publica, local habitável. Se não for nos moldes desta hipótese, será
art. 132, CP.
Delito de ação livre, pois admite qualquer modalidade de exe-
cução – na forma comissiva ou omissiva. É um crime de perigo con-
creto. Não bastará a pratica da conduta ilícita. É necessário comprovar
que, em razão do comportamento do agente, a vítima teve sua saúde
submetida a risco de lesão.
SAIBA MAIS
MOLÉSTIA GRAVE – TRANSMISSÃO – HIV – CRIME DOLO-
SO CONTRA A VIDA VERSUS O DE TRANSMITIR DOENÇA GRAVE.
Descabe, ante previsão expressa quanto ao tipo penal, partir-se para o
enquadramento de ato relativo à transmissão de doença grave como a
configurar crime doloso contra a vida.
Obs. DOLO TEM QUE COBRIR TODOS OS ELEMENTOS DO
TIPO. E NÃO APENAS EM RELAÇÃO AO RESULTADO.
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CRIMES CONTRA A HONRA
Conceito de Honra
A honra integra o direito fundamental de personalidade previs-
to no art.5º, X, da CRFB e pode ser compreendida como o “conjunto
de predicados da pessoa que lhe conferem condição social e estima
própria” (NORONHA, Edgar Magalhães. Direito Penal. v.2. São Paulo:
Saraiva, 1972, p 111).
Para que possamos identificar a qual tipo penal a conduta po-
derá ser incursa, é importante se fazer uma distinção entre honra obje-
tiva e subjetiva.
A honra objetiva “relaciona-se à reputação e à boa fama que o
indivíduo desfruta no meio social em que vive”, enquanto a honra subje-
tiva, “à dignidade e ao decoro pessoal da vítima, isto é, o juízo que cada
indivíduo tem de si – estima própria” (CUNHA, Rogério Sanches Direito
Penal. Parte Especial, 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,2009, p
80-81).
Disponibilidade do bem jurídico-penal.
No âmbito jurídico-penal o direito à honra apresenta-se como
disponível e, portanto, passível de validade do consentimento do ofen-
dido para fins de exclusão de responsabilidade. Para que o consenti-
mento do ofendido seja válido é necessário que: o bem jurídico tutelado
seja disponível; o ofendido tenha capacidade para consentir e que o
consentimento seja válido

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Dessa forma, necessário identificar o momento no qual o ofen-
dido consente com a prática da ofensa para, então, analisar suas con-
sequências. Ou seja, caso o consentimento do ofendido seja prévio à
ofensa, a conduta será atípica. Por outro lado, no caso do consentimen-
to ser posterior à ofensa, será caracterizado o perdão, lembrando que
para sua validade, deve ser aceito pela outra parte, dada a bilateralida-
de do ato.
A pessoa jurídica como sujeito passivo dos delitos contra a
Honra.
A questão é controvertida e possui como elemento disparador
o disposto na Constituição da República, art.. 225, § 3º, e art. 173, §5º,
in verbis:
► Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impon-
do-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo
para as presentes e futuras gerações.
§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente su-
jeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e admi-
nistrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

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► Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a explo-
ração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando
necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse
coletivo, conforme definidos em lei.
§ 5º - A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da
pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às
punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem
econômica e financeira e contra a economia popular.

Desta forma, a partir da interpretação do disposto nos disposi-


tivos constitucionais citados, cabíveis algumas observações:
► A responsabilidade pessoal dos dirigentes não se confunde
com a responsabilidade da pessoa jurídica.
► O Superior Tribunal de Justiça, em Verbete Sumular, esta-
belece que a pessoa jurídica pode sofrer dano moral, o que significa
dizer que reconhece a existência de reputação para pessoa jurídica –
Verbete de Súmula n.227.
► A doutrina tem se manifestado pela impossibilidade da pes-
soa jurídica ser sujeito passivo do delito de calúnia, sob o argumento
de que ela não possa figurar como sujeito ativo de delito sob a ótica da
teoria finalista da ação.
Sobre o tema, assevera Cezar Roberto Bitencourt que a Cons-
tituição não dotou a pessoa jurídica de responsabilidade penal. Ao con-
trário, condicionou a sua responsabilidade à aplicação de sanções com-
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patíveis com a sua natureza. (op. cit. p 274-275).

Os menores e os incapazes como sujeitos passivos dos delitos


contra a Honra.
No que concerne à possibilidade dos menores e incapazes fi-
gurarem como sujeitos passivos dos delitos contra a honra, a questão
mostra-se um pouco menos controvertida sendo necessário, entretanto,
identificar que, face ao direito à dignidade e ao respeito, desde que te-
nham capacidade de discernimento para sentir ofendidas, é plenamente
possível a caracterização dos delitos de difamação e injúria.
Cabe ressaltar que o consentimento feito pelo responsável é
juridicamente ineficaz para fins de exclusão de responsabilidade penal
do ofensor.
No sentido da possibilidade dos inimputáveis figurarem como
sujeitos passivos no delito de injúria esclarece Luiz Regis Prado ser
a caracterização do delito “condicionada à sua possibilidade de per-
cepção do caráter ultrajante da palavra ou gesto que lhe é endereça-
do, avaliada segundo o caso concreto” (PRADO, Luiz Regis. Curso de
Direito Penal Brasileiro. v.2.8.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
42
2010, p 210).
Por fim, não há que se falar do delito de calúnia, face à impos-
sibilidade da prática de crime por ausência de um de seus elementos
– a culpabilidade.
Ofensas praticadas no mesmo contexto fático:
Nesse caso, de forma que se possa identificar a ocorrência de
concurso de crimes ou conflito aparente de normas é necessário, inicial-
mente, identificar a espécie de honra lesionada.
O melhor entendimento é no sentido de que, caso as condutas
ofensivas lesionem espécies de honra distintas, por exemplo, calúnia e
injúria ou difamação e injuria, será possível o concurso de crimes.
Por outro lado, caso condutas ofensivas lesionem o mesmo
bem jurídico, por exemplo, calúnia e difamação, caracterizar-se-á con-
flito aparente de normas a ser solucionado pelo princípio da absorção.
(Neste sentido, CUNHA, Rogério Sanches. Direito Penal. Parte Espe-
cial. v.3.2ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p 81).
Semelhanças e diferenças entre os delitos de Calúnia, Difama-
ção e Injúria.  

► Na calúnia e na difamação há a imputação de um fato concreto, que na


primeira deve ser falso e tipificado como crime (não se aplica à contravenção
penal), não exigidos na difamação. Ambos lesionam a honra objetiva.
► Na injúria, por sua vez, há lesão à honra subjetiva ao serem atribuídas à
vítima qualidades negativas à sua dignidade ou decoro.

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

43
QUADRO COMPARATIVO

Calúnia Difamação Injúria

Art. 138 - Caluniar alguém, Art. 139 - Difamar alguém, im- Art. 140 - Injuriar alguém,
imputando-lhe falsamente putando-lhe fato ofensivo à sua ofendendo-lhe a dignidade
fato definido como crime: reputação: ou o decoro:

Pena - detenção, de seis Pena - detenção, de três meses Pena - detenção, de um a


meses a dois anos, e multa. a um ano, e multa. seis meses, ou multa.

HONRA OBJETIVA HONRA OBJETIVA HONRA SUBJETIVA

CHEGAR AO CONHECI- CHEGAR AO CONHECIMENTO CHEGAR AO CONHECI-


MENTO DE TERCEIRO DE TERCEIRO MENTO DO PRÓPRIO
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OFENDIDO

IMPUTA-SE FATO DEFINI- IMPUTA-SE FATO OFENSIVO IMPUTA-SE UMA OFENSA


DO COMO CRIME À REPUTAÇÃO

EXIGE-SE FALSIDADE DA NÃO SE EXIGE FALSIDADE NÃO SE EXIGE FALSIDADE


IMPUTAÇÃO DA IMPUTAÇÃO DA IMPUTAÇÃO

44
COMPORTA EXCEÇÃO DA EXCEÇÃO DA VERDADE NÃO HÁ QUE SE FALAR
VERDADE SOMENTO EM CASO DE FUN- EM EXCEÇÃO DA VER-
CIONÁRIO PÚBLICO DADE

A Exceção da Verdade nos crimes contra a honra:


A exceção da verdade caracteriza-se como incidente proces-
sual ou forma de defesa indireta que deve ser oposta no momento da
resposta preliminar obrigatória prevista no Art.396-A, do Código de Pro-
cesso Penal, in verbis:

Art. 396-A. Na resposta, o acusado poderá arguir preliminares e alegar tudo o


que interesse à sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar
as provas pretendidas e arrolar testemunhas, qualificando-as e requerendo
sua intimação, quando necessário.

Aqui haverá a oportunidade na qual o acusado do delito de


calúnia ou, excepcionalmente no caso de difamação contra a honra de
funcionário público no exercício de suas funções, possa provar que não
proferiu ofensa e, sim, falou a verdade.
A admissibilidade da prova da verdade é prevista no art. 138,
§3º e art.139, parágrafo único, do Código Penal
As consequências devem ser levadas de acordo com a espé-

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


cie de delito no qual tenha sido arguida e admitida, as consequências
serão distintas. Se o delito praticado for o de calúnia configurará causa
excludente de tipicidade, uma vez que é elementar do crime de calúnia
o fato ser considerado falso; no delito de difamação, causa excludente
de ilicitude.
► Em regra, a ação penal é deflagrada por iniciativa do ofendi-
do que tem o prazo decadencial de seis meses para o oferecimento da
queixa, a contar da data em que tiver conhecimento da autoria do delito
(art.38, do Código de Processo Penal).
► A ação penal será de iniciativa pública condicionada à repre-
sentação do ofendido nos casos de crimes praticados contra funcionário
público no exercício de suas funções, injúria real da qual resulte lesão
corporal, injúria discriminatória e, condicionada à representação do Mi-
nistro da Justiça, quando perpetradas contra a honra do Presidente da
República, ou contra chefe de governo estrangeiro.
►De acordo com o que dispõe a Súmula 714 do STF, a legiti-
midade para propositura da ação penal no caso de crime praticado con-
tra a honra do funcionário público é concorrente. Ou seja, é facultado

45
ao funcionário a propositura de queixa crime para oferecimento da ação
penal ou representar ao Ministério Público para que o parquet possa
oferecer a denúncia.

SÚMULA 714 DO STF: É concorrente a legitimidade do


ofendido mediante queixa, e do Ministério Público, condicionada à
representação do ofendido, para a ação penal por crime contra a honra
de servidor público em razão do exercício de suas funções.

Injúria Discriminatória ou Preconceituosa e seu confronto com


os delitos previstos na Lei n.7716/1989.

A figura típica de injúria qualificada, preconceituosa ou discrimi-


natória prevista no art. 140, §3° do CP não se confunde com os delitos
de discriminação ou preconceito de raça e cor, pois, enquanto naquela a
conduta visa à ofensa a honra de outrem, no delito de racismo, previsto
na Lei n. 7716/1989, a conduta do agente visa à segregação em função
da raça ou cor.
Em outras palavras, não há que se confundir a conduta de “xin-
gar”, voltada à lesão à honra, à dignidade da vítima, praticada mediante
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

a ofensa em função de raça ou cor com o delito de racismo, no qual o


agente, em função da raça ou cor pretende, consoante assevera Rogé-
rio Sanches Cunha, “marginalizar, pôr à margem de uma sociedade” o
ofendido (CUNHA, Rogério Sanches. Op.cit. p 89) e que, portanto, visa
impedir que o indivíduo tenha o livre exercício de seus direitos.
No entanto, recentemente, no julgamento dos embargos de
declaração de decisão tomada em Agravo Regimental no Recurso Ex-
traordinário nº 983.531, do Distrito Federal, o Supremo Tribunal Federal
(STF), por meio de sua 1ª Turma, reconheceu a equiparação dos crimes
de injúria racial e racismo e, por conseguinte, a imprescritibilidade e
inafiançabilidade daqueles.
Na ocasião, o STF ratificou a decisão emitida pelo STJ,
que reconheceu não ser taxativo o rol dos crimes previstos na Lei nº
7.716/1989, encontrando-se presentes o preconceito e a intolerância da
conduta tipificada como injúria racial.
Trata-se do episódio em que um jornalista chamou outro jorna-
lista de “negro de alma branca” e que “não conseguiu revelar nenhum
atributo para fazer tanto sucesso, além de ser negro e de origem humil-
de”. As publicações foram feitas, na internet, ainda nos idos de 2009.
46
O caso levou o Ministério Público do Distrito Federal a apre-
sentar denúncia por racismo. Em primeira instância, o juiz tipificou o cri-
me como injúria racial e declarou extinta a punibilidade do crime, já que
entendeu que a injúria racial era prescritível. O caso foi encaminhado
para o Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em 2015, o autor do fato foi
condenado pela 6ª Turma que concluiu que injúrias raciais são impres-
critíveis, por representarem mais um delito no cenário do racismo. O
réu, por sua vez, apresentou recurso ao STF, que rejeitou os embargos,
criando o seu primeiro precedente nesse sentido.
De acordo com tal entendimento, em relação ao crime de in-
júria racial, é possível a realização de investigação, oferecimento de
denúncia, condenação e execução de pena, independentemente da
ocorrência dos prazos de prescrição previstos no art. 109 do CP.

Causas especiais de exclusão dos delitos de difamação e in-


júria.

O art.142, do Código Penal apresenta, sob a denominação de exclusão do


crime, situações nas quais as ofensas de difamação e injúria não terão rele-
vância jurídico-penal. O tema gera controvérsia na doutrina no que concerne
à natureza jurídica do referido dispositivo legal de modo a ensejar três en-
tendimentos:
► Causa excludente de ilicitude por tratar-se de exercício regular de direito.
Neste sentido: Cesar Roberto Bitencourt e Guilherme de Souza Nucci.

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► Causa excludente de tipicidade. Neste sentido Heleno Fragoso.
► Causa excludente de punibilidade. Neste sentido Magalhães Noronha

47
QUESTÕES DE CONCURSOS

QUESTÃO 1
Ano:  2014  Banca:  FCC  Órgão:  DPE-PB Prova:  Defensor Público
Nível: Superior.
Mediante promessa de pagamento de cem reais, a intrometida vi-
zinha Florisbela participa dolosamente do infanticídio executado
pela jovem mãe Aldegunda que, em desespero, se encontrava en-
tão sob forte influência do estado puerperal. Sobre Florisbela, à
vista do entendimento hoje dominante na doutrina, com esses da-
dos em princípio pode-se afirmar que
a) responderia por homicídio doloso qualificado, caso a lei brasileira
classificasse o infanticídio como modalidade privilegiada de homicídio.
b) responderia por homicídio privilegiado, com Aldegunda, caso a lei
brasileira classificasse o infanticídio como modalidade privilegiada de
homicídio.
c) responde por homicídio qualificado.
d) responde por infanticídio qualificado.
e) responde por infanticídio privilegiado, com Aldegunda.

QUESTÃO 2
Ano: 2014 Banca: PC-SC Órgão: PC-SC  Prova:  Agente de Polícia
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Nível: Médio.
De acordo com o Código Penal, assinale a alternativa correta.
a) Comete infanticídio qualquer pessoa que matar, sob a influência do
estado puerperal ou não, o próprio filho, durante o parto ou jogo após.
b) Comete infanticídio qualquer pessoa que matar, sob a influência do
estado puerperal, criança, durante o parto ou logo após.
c) Comete infanticídio a mulher que matar, sob a influência do estado
puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após.
d) Considera-se lesão corporal de natureza grave aquela que resulta
incapacidade para as ocupações habituais por mais de quinze dias.
e) Considera-se lesão corporal de natureza grave aquela que resulta
incapacidade para as ocupações habituais, por mais de sete dias.

QUESTÃO 3.
Ano:  2014  Banca:  VUNESP  Órgão:  TJ-RJ Prova:  Juiz Substituto
Nível: Superior
Maria, 22 anos, aos 7 meses de gestação decide praticar um aborto
em si mesma. Para tanto, pede e obtém auxílio de sua irmã Ana,
24 anos, que adquire medicamento abortivo. Sem muita coragem,
48
mas mantendo seu propósito inicial, Maria pede a Ana que lhe ad-
ministre a substância, de forma endovenosa, o que é feito. Quando
se inicia a expulsão do feto, ambas arrependem-se da prática, e
procuram um serviço médico em busca de auxílio. O feto é expul-
so no hospital, mas em virtude do seu já adiantado estado de de-
senvolvimento, sobrevive sem sequelas. Maria, em razão da ação
do medicamento abortivo, sofre uma histerectomia. Diante desse
quadro, Maria
a) responderá por aborto tentado (tentativa imperfeita) em concurso
com Ana.
b) não será punida, em virtude do arrependimento eficaz, e Ana será
punida por lesão corporal gravíssima (perda de função reprodutiva).
c) será punida por autoaborto, e Ana, por provocar aborto com con-
sentimento de terceiro, mas ambas na modalidade tentada (tentativa
imperfeita).
d) e Ana não serão punidas, em virtude do arrependimento posterior.

QUESTÃO 4.
Ano:  2014  Banca:  VUNESP  Órgão:  TJ-RJ Prova:  Juiz Substituto
Nível: Superior
Determinado sujeito, que acabara de se desiludir amorosamente,
decide matar sua até então namorada. Toma emprestado o auto-
móvel de seu vizinho e, durante o trajeto, por descuido, abalroa

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


gravemente um outro veículo, causando sério prejuízo material.
Mas, faltando-lhe coragem para consumar o homicídio, estaciona
próximo a um bar, às portas da casa de sua ex-namorada e inten-
cionalmente se embriaga, a fim de ganhar valentia para executar
seu plano. Abandona o veículo, vai a pé até a casa da ex-namorada
e, mediante asfixia, tira-lhe a vida. À luz do Direito Penal, o sujeito
cometeu
a) dano e homicídio duplamente majorado, pela embriaguez dolosa e
asfixia.
b) homicídio qualificado pela asfixia.
c) homicídio qualificado pela asfixia e agravado pela embriaguez pré-
-ordenada.
d) dano e homicídio qualificado pela asfixia, em concurso material.

QUESTÃO 5
Ano:  2014  Banca:  VUNESP  Órgão:  PC-SP Prova:  Médico Legista
Nível: Superior
Artaxerxes cometeu o crime de homicídio contra Valenciano. Apu-
rou-se que Artaxerxes cometeu o crime sob o domínio de violenta
49
emoção logo em seguida a injusta provocação de Valenciano. Nes-
sa hipótese, pelo que dispõe o Código Penal e desconsiderando
outros eventuais fatores, é correto afirmar que
a) Artaxerxes deverá responder pelo crime de homicídio qualificado.
b) o juiz poderá reduzir a pena de Artaxerxes.
c) Artaxerxes poderá ter a sua pena aumentada pelo juiz.
d) o juiz deverá aplicar a pena de homicídio simples, sem qualquer re-
dução ou aumento de pena.
e) o juiz deverá deixar de aplicar a pena, nesse caso, em razão de Va-
lenciano ter provocado Artaxerxes injustamente.

TREINO DISSERTATIVO

Jupira, que estava grávida de 9 meses, foi internada no dia 5 de julho


de 2012, por volta das 13 horas, no Hospital Miguel Souto, sentido for-
tes dores, uma vez que se iniciara o trabalho de parto. Assim que foi
internada, Lidiane, médica plantonista que havia realizado exames de
ultrassom em JUPIRA e a atendido durante todo pré-natal, não estava
presente, mas foi cientificada pelas enfermeiras do quadro de JUPIRA,
o qual apresentava sérias complicações. LIDIANE limitou-se a passar
orientações pelo telefone, não se dignando a comparecer ao hospital
para verificar a situação de JUPIRA e do bebê. Apurou-se ainda que
LIDIANE determinou às enfermeiras que aplicassem em JUPIRA medi-
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

camento destinado a aumentar a dilatação para que se realizasse par-


to normal. Entretanto, a própria LIDIANE havia comunicado à JUPIRA
que o procedimento correto deveria ser a cesariana. LIDIANE também
passou orientações às enfermeiras para que observassem os batimen-
tos cardíacos do feto. Estes permaneceram normais até as 21h40min,
ocasião em que uma enfermeira entrou em contato com a denunciada,
informando que não mais os ouvia. Somente nesse momento LIDIANE
se dirigiu ao hospital e, não conseguindo identificar os batimentos car-
díacos, mobilizou equipe para que se realizasse uma cesariana de ur-
gência. No entanto, ao retirar o feto, verificou-se que ele já não apresen-
tava sinais vitais, restando frustrada a tentativa de reanimação. Diante
do caso concreto, a conduta de LIDIANE é típica? Responda de forma
fundamentada.

TREINO INÉDITO

Jarbas, gerente de uma multinacional, durante o horário de seu expe-


diente, proferiu as seguintes palavras: “O atual candidato ao cargo de
gerente nessa empresa, que se mostra defensor da família, posando
50
com esposa e filhos para fotos, foi flagrado na semana passada entran-
do em um motel com uma prostituta! É esse tipo de pessoa que você
quer trabalhando ao seu lado?”.
A partir do caso exposto, assinale a opção que indica o delito praticado
por Jarbas.
a) Calúnia
b) Difamação, prevista no Código Penal.
c) Injúria, previsto no Código Eleitoral.
d) Fato atípico, uma vez que comprovada a veracidade

NA MÍDIA

Aborto e eugenia
A Islândia está prestes a erradicar a síndrome de Down do modo mais
macabro possível: matando seus portadores ainda no ventre de suas
mães

Gazeta do Povo

Normalmente, a erradicação de uma doença, seja em um país, seja


globalmente, é motivo de comemoração. No entanto, um caso especí-
fico chama a atenção por um outro motivo. A Islândia está perto de não
registrar mais nenhum nascimento de bebês com síndrome de Down.

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


No país de 330 mil habitantes, há no máximo dois casos por ano de
crianças que nascem com a doença, causada por uma anomalia cro-
mossômica.
O canal de televisão norte-americano CBS trouxe o caso à luz e expli-
cou a razão dessa estatística: testes pré-natais que identificam doenças
genéticas estão disponíveis para todas as gestantes do país desde o
início da década passada – entre 80% e 85% delas fazem os exames. E
a legislação islandesa permite o aborto de fetos acima de 16 semanas
em casos de má formação que incluem a síndrome de Down. Assim,
quase 100% das mães que recebem o diagnóstico de que seu bebê tem
a doença optam pelo aborto. E as crianças que chegam a nascer com
Down não necessariamente vêm ao mundo por uma escolha consciente
dos pais: na maioria dos casos, elas tiveram a sorte de a trissomia não
ter sido detectada no exame.
E isso nos traz de volta à nossa ideia inicial: o fim da síndrome de Down
na Islândia é para ser comemorado? Uma coisa é eliminar uma doença
erradicando seu vetor ou agente causador; outra coisa é eliminar uma
doença matando todos os doentes – é o que os islandeses escolheram
fazer. Por mais que Helga Sol Olafsdottir, funcionária de um hospital
51
ouvida pela CBS, tente amortecer sua consciência dizendo que “não
vemos o aborto como assassinato”, não há como escapar da realidade
óbvia de que seres humanos indefesos e inocentes estão sendo mortos
no ventre das mães. Isso é, sim, assassinato – e, no caso islandês,
também é eugenia.”

Fonte: Gazeta do Povo


Disponível em : <https://www.gazetadopovo.com.br/opiniao/editoriais/
aborto-e-eugenia-cprl7zkxxdkqd56yx54y3tnzr/>

NA PRÁTICA

ADPF

Na ADPF 442, o partido questiona os artigos 124 e 126 do Código Pe-


nal, que criminalizam a prática do aborto. O PSol pede que se exclua
do âmbito de incidência dos dois artigos a interrupção voluntária da gra-
videz nas primeiras 12 semanas de gestação, alegando a violação de
diversos princípios fundamentais.
Discorra sobre a possibilidade de interrupção voluntária da gravidez an-
tes de 12 semanas de gestação.
A questão versa sobre o momento que se pode mencionar sobre a exis-
tência de vida intrauterina, bem jurídico tutelado no crime de aborto
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

DECISÃO ISOLADA DO STF – HC 124.306/RJ – MIN MARCO AURÉ-


LIO – INFORMATIVO 849
“......Em segundo lugar, é preciso conferir interpretação conforme a
Constituição aos próprios arts. 124 a 126 do Código Penal – que ti-
pificam o crime de  aborto  – para excluir do seu âmbito de incidência
a interrupção voluntária da gestação efetivada no primeiro trimestre. A
criminalização, nessa hipótese, viola diversos direitos fundamentais da
mulher, bem como o princípio da proporcionalidade. 4. A criminalização
é incompatível com os seguintes direitos fundamentais: os direitos se-
xuais e reprodutivos da mulher, que não pode ser obrigada pelo Estado
a manter uma gestação indesejada; a autonomia da mulher, que deve
conservar o direito de fazer suas escolhas existenciais; a integridade
física e psíquica da gestante, que é quem sofre, no seu corpo e no seu
psiquismo, os efeitos da gravidez; e a igualdade da mulher, já que ho-
mens não engravidam e, portanto, a equiparação plena de gênero de-
pende de se respeitar a vontade da mulher nessa matéria. 5. A tudo isto
se acrescenta o impacto da criminalização sobre as mulheres pobres.
É que o tratamento como crime, dado pela lei penal brasileira, impede
que estas mulheres, que não têm acesso a médicos e clínicas priva-
52
das, recorram ao sistema público de saúde para se submeterem aos
procedimentos cabíveis. Como consequência, multiplicam-se os casos
de automutilação, lesões graves e óbitos. 6. A tipificação penal viola,
também, o princípio da proporcionalidade por motivos que se cumu-
lam: (i) ela constitui medida de duvidosa adequação para proteger o
bem jurídico que pretende tutelar (vida do nascituro), por não produzir
impacto relevante sobre o número de abortos praticados no país, ape-
nas impedindo que sejam feitos de modo seguro; (ii) é possível que o
Estado evite a ocorrência de abortos por meios mais eficazes e menos
lesivos do que a criminalização, tais como educação sexual, distribui-
ção de contraceptivos e amparo à mulher que deseja ter o filho, mas se
encontra em condições adversas; (iii) a medida é desproporcional em
sentido estrito, por gerar custos sociais (problemas de saúde pública
e mortes) superiores aos seus benefícios. 7. Anote-se, por derradeiro,
que praticamente nenhum país democrático e desenvolvido do mundo
trata a interrupção da gestação durante o primeiro trimestre como crime,
aí incluídos Estados Unidos, Alemanha, Reino Unido, Canadá, França,
Itália, Espanha, Portugal, Holanda e Austrália. 8. Deferimento da ordem
de ofício, para afastar a prisão preventiva dos pacientes, estendendo-se
a decisão aos corréus.”

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

53
DOS CRIMES CONTRA A
LIBERDADE INDIVIDUAL &
CONTRA O PATRIMÔNIO
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CONSTRANGIMENTO ILEGAL
Para que se configure o crime em questão, existe a necessida-
de de haver violência e grave ameaça, uma vez que funcionam como
elementares do tipo. Assim, se uma pessoa ficar presa na porta giratória
do banco não é constrangimento ilegal pela carência das elementares
“violência e grave ameaça”.
Trata-se da imposição de obrigação que a lei não determina.
Somente a lei pode obrigar regras de condutas à terceiros. Protege a
capacidade de determinação da pessoa natural. É um crime que ofende
a liberdade individual, de escolha, de vontade, de ação.
Por não exigir uma qualidade especial do autor do fato, trata-se
de crime comum.
Sujeito passivo: qualquer pessoa que tenha capacidade de
compreensão da ilicitude do constrangimento.
Para fins da configuração deste delito, a imposição do autor do

54
fato deve ser ILEGITIMA. Se a pretensão for legitima, não será cons-
trangimento ilegal, mas sim exercício arbitrário das próprias razões.
Estamos diante de um crime de natureza material. Assim, a
consumação do crime opera-se quando o agente efetivamente adota
comportamento ao qual é obrigado. Nelson Hungria leciona que esta
consumação é material, pois o tipo penal prevê a terminologia constran-
ger “a”. Diferente seria se o tipo penal trouxesse previsão de constran-
ger “para”, caso em que seria um crime formal. Logo, há necessidade
de efetivação do constrangimento de fazer ou deixar de fazer algo.

AMEAÇA
Trata-se de crime que configura uma promessa de mal injusto
e grave. Não é qualquer ameaça que tem o condão de atingir a capaci-
dade psíquica da pessoa. Ex. “você vai ver só” – não é crime de amea-
ça. Para que seja caracterizado o delito de ameaça, deve ser feita uma
efetiva promessa de mal injusto e grave. Quando a pretensão é licita,
haverá exercício regular do direito - e não ameaça.
Diferentemente do crime de sequestro e outros crimes que res-
tringem a liberdade, a ameaça atinge a ordem moral (tranquilidade es-
piritual / psíquica) – ou seja, retira a possibilidade de se viver uma vida
tranquila. O objeto da ameaça deve ser determinado ou determinável
e pode ser somente na esfera moral, mas que, dentro da racionalidade
humana, deve ser verossímil. Por isso, deverá levar em consideração

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


a vítima e as circunstâncias do caso concreto. Devemos levar em consi-
deração, por exemplo, a idade, sexo, cultura, superstição, etc.
A consumação do delito de ameaça independe da obtenção de
um resultado naturalístico, pois se trata de crime de natureza formal.
Não é necessário que a vitima se sinta ameaçada. Basta haver a ido-
neidade da ameaça.
Por fim, destaco que, sendo a ameaça um crime formal, sua
consumação dispensa a real intenção do agente de causar mal à vítima;
basta que o fato seja capaz de acarretar-lhe temor.
Vejamos ementa jurisprudencial envolvendo a prática do crime
de ameaça:
Ementa:  APELAÇÃO CRIME. AMEAÇA. LEI 11.340/06. SU-
FICIÊNCIA PROBATÓRIA. No mérito, entendo que da leitura dos de-
poimentos da vítima é possível observar que a mesma é coerente nas
duas vezes em que foi ouvida. Em crimes dessa natureza, a palavra
da ofendida, desde que harmoniosa em ambas as fases procedi-
mentais, possui destaque frente aos demais elementos probató-
rios, pois as ameaças geralmente ocorrem em meio a relação ín-

55
tima de afeto, âmbito que, em geral, não comporta testemunhas
capazes de compreender os pormenores do vínculo entre agressor
e ofendida. Assim, tornando o depoimento da vítima essencial para
esclarecer o contexto em que as ameaças ocorreram. Na época dos
fatos a ofendida registrou ocorrência e manifestou seu desejo de re-
presentar contra o acusado, como já mencionado, o que demonstra o
temor provocado pelas palavras do acusado. RECURSO NÃO PRO-
VIDO.(Apelação-Crime, Nº 70080850712, Segunda Câmara Criminal,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rosaura Marques Borba, Julgado
em: 16-05-2019).

TRAFICO DE PESSOAS
Art. 149-A, CP.
É um crime contra a liberdade individual/pessoa. O Brasil já
reprimia o trafico de pessoas para fins de exploração sexual. O legislador,
para adequar à realidade, às convenções e tratados, tipificou o tráfico
de seres humanos – não apenas para fins de exploração sexual, como
também para outras hipóteses.
Foi incluído pela lei 13.344/2016 e se trata de uma lei de cará-
ter multidisciplinar. Foram revogados os arts. 231 e 231-A, em aspecto
formal. O conteúdo do injusto migrou para o art. 149-A, inciso V. Houve
a aplicação do princípio da continuidade normativo típica, de forma que
não houve abolitio criminis; apenas uma revogação formal do tipo. E por
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

ser uma lei mais grave, não pode retroagir ao tempo.


Temos um tipo misto alternativo sobre o modus operandi do
traficante. Se as condutas mistas alternativas estão vinculadas à essas
formas de atuação, significa que, se a vítima consentir validamente em
seu próprio tráfico (se consentir validamente com os núcleos legais) –
não haverá o que se falar em imputação penal.
Em tese, mediante uma contraprestação / pagamento, discute-
-se se a vítima iria se submeter aos núcleos previstos na lei. A mercan-
cia não considera valido o consentimento da vítima. No entanto, isso
não foi importado para o tipo penal brasileiro. Pelo CP, não estaria, nes-
te caso, caracterizado o tipo penal.
O vulnerável não pode emitir um consentimento válido. Assim,
não pode se submeter à uma situação de tráfico. Não pode consentir
sobre sua dignidade e liberdade. E o conceito de vulnerável aqui seria
o menor de 18 anos e não o menor de 14 anos previsto no art. 217A,
pois maior de 14 anos e menor de 18 anos poderia consentir a relação
sexual mas não poderia consentir a prática do tráfico.
O referido tipo penal possui como elemento subjetivo além do

56
dolo, um especial fim de agir que é o tráfico de órgãos, adoção ilegal,
exploração sexual, etc.

SEQUESTRO E CARCERE PRIVADO


O legislador utilizou duas palavras para esse tipo penal, de for-
ma que não são sinônimas. O cárcere privado se caracteriza por um
local onde o espaço de restrição da liberdade é maior quando compa-
rada ao sequestro. No sequestro, há possibilidade de locomoção (ex.
ficar presa em um sítio). No cárcere, a vítima fica presa em um carro, ou
ficará algemada, por exemplo. Fala-se aqui da liberdade ambulatorial
(ir, vir e permanecer em algum lugar).
Esse crime poderá ser cometido com a permanência da vitima
em um local que já se encontrava antes, impossibilitando sua saída. Ex.
médico que impossibilita a alta de um paciente que já está curado.
O crime em questão necessariamente é doloso e por se tratar
de delito permanente, subsiste enquanto perdurar a restrição da liberda-
de da vítima. O tempo de privação tem que ser mínimo, não demandan-
do uma extensão temporal muito grande.. Não há fórmula doutrinaria
explicitando seu significado. Tem que haver supressão da liberdade da
vitima, e tem que leva-la à algum lugar. Caso contrário, poderá haver
o sequestro tentado, por exemplo. Ex. polícia que pega em flagrante o
agente com a vítima no porta-malas do carro.
A antijuridicidade da conduta está sob controle do agente. O

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agente determina o início e fim do sequestro de acordo com sua von-
tade. A consumação se prolonga / protrai no tempo, de acordo com a
vontade do autor. Assim, o estado flagrancial estará também sempre se
renovando (poderá haver flagrante a qualquer momento).

CRIMES PATRIMONIAIS
Conceito de Patrimônio para fins penais.
Antes de iniciarmos o estudo sobre os delitos contra o patri-
mônio, devemos estabelecer o conceito de patrimônio para fins penais.
Patrimônio, no âmbito do direito penal, abrange apenas os créditos (ou
seja, que possa ser apreciado economicamente) e tudo aquilo que te-
nha valor meramente afetivo, que Rogério Greco chama de valor de tro-
ca e valor de uso respectivamente. (GRECO, Rogério. Curso de Direito
Penal. Parte Especial. V.III.7 ed.2010, p 11).
O patrimônio sempre foi objeto de proteção por parte do direito.
Segundo Nelson Hungria, a opção pela terminologia “patrimônio” em
lugar de propriedade tinha por escopo eliminar controvérsias sobre o

57
âmbito da proteção lançada pelo direito penal. A noção, assim, de patri-
mônio, para o direito penal, se confunde com aquela do direito civil. Isto
é, conjunto de bens que pertencem a uma pessoa e que por essa razão,
devem ser objeto de proteção. Não obstante, destacava Hungria que o
direito penal é essencialmente realístico, não se afeiçoando a determi-
nadas ficções da lei civil.
Bem jurídico tutelado: Para caracterização do bem jurídico tu-
telado nos referidos delitos haverá não só a propriedade, mas, também
a posse e a detenção da coisa móvel. (Neste sentido: Rogério Greco,
Rogério Sanches Cunha, Cezar Roberto Bitencourt, Luiz Regis Prado).
Objeto material: Os delitos em análise possuem como obje-
to material a coisa móvel sendo certo que, para fins de Direito Penal,
considera-se “móvel tudo aquilo que pode ser transportado de um lugar
para o outro, sem perder sua identidade” (CUNHA, Rogério Sanches.
Direito Penal. Parte Especial. 2 ed., pp 122)

FURTO. Questões Relevantes e Controvertidas. Art.155, Có-


digo Penal.
Consumação e tentativa. Não obstante a controvérsia doutri-
nária sobre o momento consumativo do delito de furto, os Tribunais Su-
periores firmaram entendimento no sentido da adoção da teoria Amotio,
segundo a qual “dá-se a consumação quando a coisa subtraída passa
para o poder do agente, mesmo que num curto período de tempo, inde-
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pendentemente do deslocamento ou posse mansa e pacífica” (CUNHA,


Rogério Sanches. Direito Penal. Parte Especial. 2 ed. pp123/124.)
Neste sentido, vide decisão proferida pelo Superior Tribunal de
Justiça:
EMENTA. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. DIREITO PE-
NAL. ART. 155 DO CP. FURTO. DESNECESSIDADE DA POSSE TRAN-
QUILA DA RES. CONSUMAÇÃO DO DELITO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA
ROUBO. IMPOSSIBILIDADE. VIOLÊNCIA DIRECIONADA PARA A RES.
1. O tipo penal classificado como furto consuma-se no momento, ainda que
breve, no qual o agente se torna possuidor da res, não se mostrando neces-
sária a posse.
2. Segundo consta nos autos, o atual agravado, na tentativa de subtrair a
res, “acabou empurrando a vítima. A vítima então acabou indo de encontro a
um muro e o réu saiu correndo do local na posse da mochila”.
3. Irretocável o acórdão estadual com relação à inexistência, in casu, de su-
posta ocorrência de roubo, pois, consoante se depreende do voto condutor
do decisum, a violência foi dirigida à res, portanto não se configura a modali-
dade descrita no art. 157 do
Código Penal – roubo.
4. Segundo lição do Ministro Moreira Alves, no voto condutor do RE n.
102.490/SP, há quatro teorias que explicam a consumação dos tipos do rou-

58
bo e do furto. Pela teoria da contrectatio, a consumação se dá com o simples
contato entre o agente a coisa alheia. Pela apprehensio ou amotio, a con-
sumação se dá quando a coisa passa para o poder do agente. Na ablatio, a
consumação se dá quando a coisa, além de apreendida, é transportada de
um lugar para outro e, finalmente, na illatio, a consumação se dá quando a
coisa é transportada ao local desejado pelo agente para tê-la a salvo.
5. O art. 155 do Código Penal traz como verbo-núcleo do tipo penal do delito
de furto a ação de “subtrair”; pode-se concluir que o direito brasileiro adotou
a teoria da apprehensio ou amotio, em que os delitos de roubo ou de furto se
consumam quando a coisa subtraída passa para o poder do agente, mesmo
que num curto espaço de tempo, independentemente de a res permanecer
sob sua posse.
6. O agravo regimental não merece prosperar, porquanto as razões reunidas
na insurgência são incapazes de infirmar o entendimento assentado na de-
cisão agravada.
7. Agravo regimental improvido. (STJ, AgRg no Resp 1226382 / RS, Ministro
SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Sexta Turma, Julgado em 15/09/2011)

c. Detectores antifurto.
Questão a ser analisada é a utilização, no caso concreto, dos
denominados detectores antifurto como causa excludente de tipicidade,
face ao reconhecimento do crime impossível, ou mera causa de diminui-
ção de pena pela tentativa.
O STJ firmou o entendimento no sentido de que o sistema de
vigilância realizado por monitoramento eletrônico, por si só, não torna

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impossível a configuração do delito de furto. Foi então, editada a Súmu-
la 567 do STJ

Súmula 567-STJ: Sistema de vigilância realizado por monitora-


mento eletrônico ou por existência de segurança no interior de estabe-
lecimento comercial, por si só, não torna impossível a configuração do
crime de furto.
STJ. 3ª Seção. Aprovada em 24/02/2016. DJe 29/02/2016.

Furto Qualificado- Privilegiado: admissibilidade.

Em algumas situações concretas pode a conduta agente ade-


quar-se às figuras privilegiada e qualificada do delito de furto o que pode
ensejar a discussão acerca da compatibilidade de aplicação concomi-
tante da qualificadora e da causa de diminuição de pena.

59
Em uma primeira análise o juízo de reprovabilidade da qualifi-
cadora afastaria a incidência do privilégio, todavia, devemos analisar a
natureza das circunstâncias qualificadoras presentes no caso concreto
sendo, portanto, possível a compatibilidade entre privilégio e qualifica-
dora, desde que esta tenha natureza objetiva, de forma a se fazer o
mesmo raciocínio empregado para concluir pela possibilidade de com-
binação do privilégio com a qualificadora no crime de homicídio
Neste sentido, é a orientação recente do Supremo Tribunal Fe-
deral ao afirmar que não há qualquer incompatibilidade teórica ou legal
da incidência do privilégio do § 2º do art. 155 do CP às hipóteses de
furto qualificado, desde que as qualificadoras sejam de ordem objetiva
e que a pena final não fique restrita à multa (STF, HC n.102.490/SP. Pri-
meira Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 01/06/2010
Ainda, a Sexta Turma do Superior Tribunal vem reconhecendo
a compatibilidade entre o furto qualificado e o privilégio disposto no § 2º
do art. 155 do CP, conforme a orientação do Supremo Tribunal Federal.

Súmula 511 STJ


É possível o reconhecimento do privilégio previsto no § 2º do
art. 155 do CP nos casos de crime de furto qualificado, se estiverem
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presentes a primariedade do agente, o pequeno valor da coisa e a


qualificadora for de ordem objetiva.

Furto de energia:

Segundo Hungria, energia é tudo aquilo que permite o fun-


cionamento de determinados objetos, ou que represente, na natureza,
essa mesma ideia (furto de sêmen de boi – furto de energia genética).
Para o autor, estariam incluídas todas as energias existentes, e aquelas
que ainda poderiam vir a ser criadas.
Existe uma controvérsia com relação ao que teríamos quanto
ao sinal de TV a cabo. Para uns, não se equipara à energia, pois não
proporciona funcionamento de certos equipamentos. O fato é atípico.
Para outros, o sinal de TV a cabo é equiparado à energia, tem valor eco-
nômico, e pode ser levado de um lugar a outro. Logo, há furto em sua
subtração. O STJ vinha encaminhando decisão neste sentido (REsp
1076207). Contudo, o STF, ao enfrentar o tema (HC 97.261) recusou a
equiparação e entendeu que o fato é atípico.
No furto, como circunstancia de maior punibilidade, o legisla-

60
dor coloca determinadas circunstancias relativas ao modo de execução,
que se comunicam à todos os coautores ou partícipes que delas tenham
ciência – inclusive o abuso de confiança, que é circunstancia pessoal.
Predomina na jurisprudência o entendimento de que o obstá-
culo é tudo aquilo que se coloca entre o agente e o ato de subtração,
tornando mais difícil a realização do tipo. Segundo Nélson Hungria, é
indiferente se o obstáculo possui o objetivo de proteger a coisa ou não
– basta que seja algo que passe a exigir um desforço do autor.
Ex. o indivíduo entra em um local com porta aberta, furta um
bem. Ao sair, a porta estava trancada. Arromba porta para sair do local,
já estando com bem. Houve arrombamento de obstáculo? Divergência.
Para Hungria, se o sujeito já subtraiu a coisa, e após se apossar, destrói
parte desta para ter acesso ao conteúdo – o furto é simples – pois a
subtração já ocorreu.
É de Nelson Hungria a interpretação no sentido de que a
resistência da própria coisa à subtração não qualifica o furto.
Para o STJ, furtar a bolsa dentro carro e quebrar o vidro do car-
ro para isso, seria furto qualificado. Quebrar o vidro para furtar o carro
seria furto simples
Abuso de confiança: é uma relação especial que se estabelece
entre autor e vítima e permite o rebaixamento da vigilância, e com isso,
o furto. Não se confunde com a apropriação indébita, que exige posse
legitima e desvigiada da coisa. Ou seja, apropriação indébita é o único

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


delito patrimonial em que o agente possui a coisa de forma lícita desde
o começo. Nas demais hipóteses, a posse vem de maneira ilícita.
Obs. em empresas/supermercados, etc., não basta que o em-
pregado lide com dinheiro. A relação de confiança existe em alguns car-
gos – ex. gerente, tesoureiro, etc.

Desvio de valor por meio de internet banking: furto ou estelio-


nato? A pessoa pega a senha, transfere o dinheiro. O banco entrega o
dinheiro enganado, acreditando ser o correntista. Seria caso de estelio-
nato do que para furto. Para o STJ, o furto se apresenta sob a forma de
desvio de valores por meio de internet banking e que tem, como sujeito
passivo o banco sendo o correntista mero prejudicado.
Furto mediante escalada: escalada é o ingresso no local da
subtração por vias anormais, exigindo do agente esforço físico inco-
mum. Escalada pode ser pular muro, passar pela via de esgoto, etc. No
entanto, para a jurisprudência, a escalada apenas se configura quando
61
há concretamente um obstáculo contínuo ao ingresso do local.
Destreza: fala-se em destreza para se referir à uma habilidade
que permite ao agente subtrair a coisa sem que a vítima perceba. O
agente retira o bem sem que a vítima perceba. Ex. batedor de carteira.
Não é incompatível com a tentativa, desde que seja um terceiro que
perceba o delito.
Emprego de chave falsa: chave é todo instrumento destinado
à abrir dispositivos acoplados à uma fechadura. Para Hungria, chave
falsa é toda aquela que não é a verdadeira. Magalhães Noronha, contu-
do, insere na noção de chave falsa a chave verdadeira obtida de modo
irregular (subtraída, achada ou perdida).
Para Hungria, por exemplo, cópia da chave feita pelo dono: é
verdadeira. Feita por outra pessoa: é falsa. Chave falsa não necessaria-
mente terá aparência de chave. Ex. grampo de cabelo, chave de fenda,
etc.
Mediante concurso de duas ou mais pessoas – cc art. 29, CP.
A jurisprudência entende que a qualificadora do concurso se caracteriza
pelos requisitos do concurso de agentes. Hungria, porém, entendia ser
necessário uma atuação na fase executiva do delito, sem o que não se
justificava maior punibilidade.
Com relação ao que está previsto no §5º. “que venha a ser
transportado para outro estado ou exterior”, Damásio de Jesus sustenta
que a qualificadora só incide diante do efetivo transporte do veículo para
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

o exterior ou para outro estado, pois ela atende à uma recomendação


da ONU para maior punibilidade dos crimes que envolvem dois ou mais
países. Trata-se de um resultado qualificador que é acrescido à conduta
do furto com o reconhecimento do autor, ainda que não seja o próprio
quem conduza o veículo automotor. Não há tentativa nesta figura. Ape-
nas incide se for levado para outro estado ou para o exterior. A tentativa
poderá ser do furto, mas não desta qualificadora. Se está em crime
tentado, não haverá esta qualificadora. Ex. está em fuga, passando da
fronteira de RJ-MG. Não houve a consumação ainda.
O furto de semoventes foi inserido no código como sendo uma
figura qualificada de furto. Recebe-se o nome de “Abigeato”. O legisla-
dor teve a intenção de aumentar a pena, mas nem sempre será assim.
Se houvesse concurso de agentes (movimentos sociais – ex. MST) a
pena seria de 02 a 08 anos, sendo agora reduzida.
- Vaca, cavalo, porco, etc. Animais que podem ser domestica-
dos.
Estelionato – art.171, do Código Penal.

62
De acordo com o que dispõe o princípio da intervenção míni-
ma e outros, tais como fragmentariedade e adequação social, no caso
concreto a distinção entre ilícito civil e ilícito penal tem se tornado muito
tênue uma vez que a própria sociedade se mostra tolerante com as
fraudes praticadas no cotidiano.
Desta forma, ao levar em consideração a teoria constituciona-
lista do delito, as pequenas fraudes utilizadas, por exemplo, durante um
negócio de compra e venda e que visem à valorização de um produto
não possuem relevância penal, por ausência de tipicidade material.
O estelionato tem como requisitos o emprego da fraude para
induzir ou manter terceiro em erro com o fim de obter vantagem ilícita
em prejuízo alheio, sendo este de natureza patrimonial (econômica) e
não necessariamente a vantagem indevida.
Será caracterizado o induzimento a erro se a fraude for empre-
gada em momento anterior à conduta; caso seja empregada concomi-
tante à conduta, manutenção em erro; por outro lado, caso o emprego
da fraude seja posterior à conduta de obtenção da vantagem ilícita, a
conduta não será tipificada como estelionato, mas como apropriação
indébita, prevista no art.168, do Código Penal.
Consumação e tentativa. O crime de estelionato se consuma
com a obtenção da vantagem e por ser plurissubsistente, a tentativa
é possível quando, ainda que tenha induzido a vítima a erro, porém o
agente não alcance seu intento por circunstâncias alheias à sua vonta-

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


de.
Torpeza bilateral: ocorre quando, no delito de estelionato, a
vítima também age de má-fé. A caracterização da torpeza bilateral não
tem a capacidade de afastar o delito de estelionato
De acordo com o que dispõe a jurisprudência, temos que

Direito Penal. Estelionato. TORPEZA BILATERAL “Acusada que, passan-


do-se por inspetora de polícia, negocia ‘preço’ com possíveis candidatos,
prometendo-lhes vaga nos quadros da polícia civil sem que eles tenham que
se submeter a concurso público. Ao pagarem o ‘preço’ exigido pela acusada
as vítimas sabiam da absoluta ilicitude de suas pretensões, configurando-
-se, assim, a TORPEZA BILATERAL, que torna impunível a conduta da
acusada. E o crime de falsa identidade ‘foi perpetrado para o cometimento
do crime-fim, que seria o do art. 171 CP, e, pelas mesmas razões acima
expostas, não merece subsistir como delito autônomo’” (TJRJ Apelação n.
2008.050.07209, Quinta Câmara. Criminal, Rel. Des. Sérgio de Souza Vera-
ni, julgado em: 08.10.2009).

....................................................................................................
A reparação do dano não apaga o crime de estelionato. Dependendo o

63
momento, poderá caracterizar arrependimento posterior (se for antes do
recebimento da denúncia); poderá haver atenuante genérica (art. 65, III,
b, CP) se for antes da sentença. Se posterior à sentença, não terá efeito
algum.
Estelionato judiciário: a busca desordenada da prestação ju-
risdicional para satisfazer algum interesse pessoal, ainda que fundada
em argumentos absurdos e completamente inadequados, não pode ser
considerado um meio fraudulento. Não há crime naquilo que se conven-
cionou chamar de estelionato judiciário.

STF. Assistencia judiciária gratuita e cobrança de honorários


advocatícios. Segundo o STF, não haverá crime de estelionato o fato de
o advogado pactuar com o cliente, em contrato de risco, a cobrança de
honorários em caso de êxito da ação proposta. Neste sentido, S. 450,
STF.

O terceiro destinatário da vantagem ilícita que não participa da


conduta criminosa não será participe do crime de estelionato, uma vez
que não concorreu para o delito. Porem, se receber bem ciente de sua
origem criminosa, responderá por receptação dolosa própria. Art. 180,
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

caput, 1ª parte. Se pudesse ser presumida a origem criminosa, respon-


derá na forma culposa. Art. 180 §3º.
Estelionato contra idoso: art. 171, §4º. Haverá aumento de
pena dos crimes previstos no caput e no §2º.
Se o sujeito abusa, em proveito próprio ou alheio, de necessi-
dade ou inexperiência de menor, ou da debilidade mental de outrem: o
crime será abuso de incapazes – art. 173, CP.
No estelionato, deverá haver um dolo específico – qual seja:
obtenção de lucro indevido, para si ou para outrem. Não se admite a
modalidade culposa.
Estelionato x curandeirismo: quem faz falsa promessa de cura
de problemas poderá estar caracterizando curandeirismo ou esteliona-
to. O curandeiro acredita ser capaz, com sua atividade, de resolver os
problemas da vitima. O estelionatário aproveita-se da vulnerabilidade
para obter vantagem ilícita da vitima. Obs. Os trabalhos religiosos e
espirituais no caracterizam crime, desde que praticados gratuitamente.
Por fim, é importante salientar que, com a entrada em vigor da
lei denominada Pacote Anticrime (Lei nº 13.964/2019), houve altera-
ção da natureza da ação penal nos crimes de estelionato, vejamos:
64
Art. 171 do Código Penal (...) § 5º Somente se procede mediante repre-
sentação, salvo se a vítima for: I - a Administração Pública, direta ou
indireta; II - criança ou adolescente; III - pessoa com deficiência mental;
ou IV - maior de 70 (setenta) anos de idade ou incapaz.

FIGURAS EQUIPARADAS AO ESTELIONATO - art. 171, 2º.

Inciso I. O sujeito finge ser proprietário de determinado bem


móvel ou imóvel, e realiza uma das condutas típicas à terceiro de boa
fé, sem ter autorização para tanto, vindo a causar prejuízo patrimonial
à esta pessoa.
Inc. IV. O crime pressupõe a existência de negócio jurídico en-
volvendo duas pessoas, no qual o sujeito responsável pela entrega do
objeto material fraudulentamente o modifica, entregando-o em seguida
à vítima. É imprescindível a utilização de fraude, pois o mero inadimple-
mento da obrigação contratual não caracteriza o delito.
Inc. V. cheque emitido sem fundo OU pagamento de cheque
frustrado. Sujeito ativo: é o titular da conta bancária. Crime próprio ou
especial. Sujeito passivo: é o tomador do cheque. Pessoa física ou ju-
rídica que suporta o prejuízo patrimonial em razão da recusa do paga-
mento pelo sacado.
Obs. Importante: se uma pessoa de qualquer forma se apode-
ra de folha de cheque alheia e a preenche indevidamente, utilizando-a
como meio fraudulento para induzir ou manter alguém em erro e, por

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


corolário, obter vantagem ilícita em prejuízo alheio, estará cometendo o
crime de estelionato previsto no CAPUT!
O crime irá se consumar no momento em que o sacado (ban-
co) se nega a efetuar o pagamento do cheque. .

SÚMULA. 554, STF. A jurisprudência considera valida esta su-


mula, em que pese a posterior redação dada ao art. 16 do CP (arrepen-
dimento posterior) dado pela lei 7209/84. O pagamento do cheque sem
provisão de fundos até o recebimento da denuncia impede o prossegui-
mento da ação penal.

A emissão de cheque sem fundos para o pagamento de obriga-


ções naturais (ex. dividas provenientes de jogos ilícitos) não configura o
crime em analise. Art. 814, caput, CC. O cheque emitido sem suficiente
provisão de fundos para pagamento de divida não exigível no juízo cível

65
será penalmente atípico ainda que não compensado pelo banco saca-
do, diante da ausência de intenção de fraudar. Não se pode ofender o
patrimônio de quem não tem a possibilidade jurídica de exigir o paga-
mento de divida não amparada pelo direito.
Estelionato circunstanciado/agravado: art. 171, §3º. Não obs-
tante a vitima seja determinada, os indivíduos ofendidos pela conduta
criminosa são inúmeros e indeterminados.

A possibilidade de configuração de efeitos permanentes ao delito de


estelionato previdenciário:

O estelionato classifica-se como delito instantâneo, todavia,


doutrina e jurisprudência divergem no que concerne à possibilidade de
produção de efeitos permanentes, por exemplo, nos casos de fraude
para recebimento de valores de natureza previdenciária, consoante o
disposto no art.171, §3°, do Código Penal, na qual o agente manteria
terceiro em erro com o fim de obter o benefício por um determinado
período de tempo.
A referida questão tem relevância para fins de cômputo do pra-
zo prescricional da pretensão punitiva, ou seja, se seriam adotadas as
regras afetas aos delitos instantâneos ou aos delitos permanentes. Se
considerarmos o delito como instantâneo com efeitos permanentes apli-
caremos o disposto no art.111, I, do Código Penal.
Ainda, em relação ao estelionato previdenciário, questiona-se
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

se, no caso da ocorrência do estelionato do qual advém o recebimento


reiterado das parcelas previdenciárias, como por exemplo, rendas men-
sais, se haveria a caracterização de crime permanente ou continuidade
delitiva.
A questão dá ensejo a dois entendimentos:

pela caracterização do crime permanente: de modo a considerar que a tem-


po só ocorre com a cessação da última conduta. (Neste sentido: AMARAL,
Leonardo Coelho do. Crimes fiscais e continuidade delitiva. Boletim IBCCrim,
São Paulo, ago. 1999).
pela caracterização de crime continuado: entendimento predominante na
jurisprudência e na doutrina, segundo o qual [...] “cada conduta praticada
pelo agente é isolada, com consumação instantânea, não podendo se co-
gitar de permanência delitiva porque [...]” (GOMES, Luiz Flávio. Estelionato
previdenciário: Crime instantâneo ou permanente? Crime único, continuado
ou concurso formal. Boletim IBCCrim, São Paulo, fev. 2001, Disponível em:
www.ibccrim.org.br)

66
Por fim, com relação ao reconhecimento da continuidade deliti-
va e do termo a quo para a contagem do prazo prescricional, imperioso
destacar o disposto no art.119, do Código Penal e no verbete de Súmula
n. 146, do Supremo Tribunal Federal, in verbis:
► Furto mediante fraude e Estelionato
No delito de furto mediante fraude o agente utiliza-se do ardil
para distrair o titular da res e há a subtração da coisa no momento em
que a vigilância sobre o bem é desviada em face do ardil; no delito de
estelionato a fraude é empregada para obter a entrega voluntária do
próprio bem pelo proprietário em decorrência do induzimento a erro, ou
seja, o titular da res a entrega, pois sua vontade está viciada.
Para fins de esclarecimentos sobre o tema, analisemos as se-
guintes narrativas e consequências aplicáveis
► Narrativa 1: agente se veste com uniforme de manobrista
de um restaurante e, tão logo um dos clientes lhe entrega as chaves do
seu carro para que estacione, o agente espera que o cliente entre no
restaurante e foge com o veículo. Neste caso configura-se o delito de
estelionato, previsto no art.171, do Código Penal, haja vista o fato do
veículo ter sido “voluntariamente” entregue pelo dono ao fictício mano-
brista.
► Narrativa 2: agente se veste com uniforme de manobrista
de um restaurante e, tão logo um dos clientes sai do carro para entregar
as chaves para que outro manobrista o estacione, o agente aproveita-se

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


do fato do cliente estar distraído falando com o manobrista e foge com o
veículo. Neste caso configura-se o delito de furto mediante fraude, pre-
visto no art.155,§4°, II, do Código Penal, haja vista o fato de o veículo
ter sido “subtraído” no momento em que o dono do veículo diminuiu sua
vigilância sobre a res.

Furto e Apropriação Indébita

No delito de apropriação indébita, previsto no art.168, do Có-


digo Penal, a coisa é entregue licitamente ao agente, sua posse sobre
a coisa é desvigiada, bem como o especial fim de agir de assenhorea-
mento definitivo é posterior à posse. Por outro lado, no delito de furto o
agente não tem a posse do bem, apoderando-se deste contra a vontade
da vítima, ou seja, o dolo na conduta é anterior à sua posse.
Em síntese, de forma a facilitar a visualização da distinção en-
tre os institutos, temos o seguinte quadro

67
Apropriação indébita Furto mediante fraude Estelionato
Tradição livre Subtração Tradição livre
Dolo superveniente Dolo ab initio Dolo ab initio
Posse desvigiada Fraude para afastar a Posse desvigiada e a
possibilidade de vigilân- fraude é empregada de
cia forma a pressupor van-
tagem e prejuízo
ROUBO - Art.157, do Código Penal.

A delimitação das expressões violência e grave ameaça.


A grave ameaça configura-se como vis compulsiva, ou
seja, grave ameaça é a promessa a prática de mal grave e iminente; já a
violência, física, vis absoluta, é o uso de força física capaz de dificultar,
paralisar os movimentos do ofendido ou impedir sua defesa. (CAPEZ,
Fernando. Curso de Direito Penal. v.2, 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2010,
p 460 - 461). Quanto à expressão “qualquer meio” contida no art. 157
caput do Código Penal, Luiz Regis Prado entende ser caso de interpre-
tação analógica para definir “todos aqueles que produzem um estado
físico-psíquico na vítima, aptos a reduzir ou suprimir totalmente sua ca-
pacidade de resistência” (PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal
Brasileiro. v.2. 8 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p 321).
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

No caso do art. 157 caput temos a violência própria, que é o


emprego da vis compulsiva e da vis absoluta, na sua primeira parte.
No entanto, não se pode esquecer da existência da chamado violência
imprópria, que vai estar presente no momento em que a vítima tiver tido
reduzia a sua possibilidade de oferecer resistência.

Roubo como crime complexo e (im)possibilidade de aplicação


do princípio da insignificância.
A partir da premissa de que o delito de roubo caracteriza-se
como delito complexo e, portanto, compreende as figuras típicas do de-
lito de furto e constrangimento ilegal e/ou lesão corporal, indaga-se se,
no caso concreto, a res furtiva for de valor patrimonial insignificante
seria possível a aplicação do princípio da insignificância para fins de
exclusão da tipicidade da conduta.
O melhor entendimento é no sentido de que, sendo o delito
perpetrado mediante o uso de violência ou grave ameaça à pessoa, não
há que se falar em incidência do princípio da insignificância em decor-
rência do maior juízo de reprovabilidade da conduta do agente.
Neste sentido afirma Fernando Capez que “ainda que a ofensa
68
ao patrimônio seja mínima, tal não afasta o desvalor da ação repre-
sentado pelo emprego de violência ou grave ameaça à pessoa” (CA-
PEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. V.2. 10.ed. São Paulo: Saraiva
, 2010, p 464).

Roubo próprio e roubo impróprio – distinção.

No delito de roubo próprio, previsto no caput do art.157,


do Código Penal, a violência ou grave ameaça é empregada antes ou
concomitantemente à subtração da res.
Por outro lado, no roubo impróprio, previsto no §1°,
art.157, do Código Penal, a violência ou grave ameaça é empregada
após a subtração, em relação de imediatidade. A conduta deve ser pra-
ticada para assegurar a detenção da coisa ou para garantia da impuni-
dade do agente.
Desta forma, para a caracterização do delito roubo impróprio,
necessário o cumprimento dos seguintes requisitos: “efetiva retirada da
coisa, emprego de violência ou grave ameaça, logo depois da subtração
e a finalidade de assegurar o crime ou a detenção da coisa para si ou
para terceiro” (CAPEZ, op. cit. p 468).
Não confunda violência imprópria com roubo impróprio. Como
já mencionado anteriormente, no roubo impróprio, a violência ou amea-
ça são empregadas após ter havido a subtração, de forma que o agente
possa assegurar o produto do crime. Já na violência imprópria tempos a

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


redução da vítima à sua possibilidade de oferecer resistência,

Consumação e tentativa.
Para a análise da consumação do delito de roubo próprio,
art.157, caput, do Código Penal, são aplicáveis os ensinamentos afetos
ao delito de furto, ou seja, prevalece o entendimento nos Tribunais Su-
periores a adoção da teoria amotio, segundo a qual para a consumação
do delito basta a inversão da posse, ainda que por um curto período de
tempo, não sendo necessária a posse desvigiada da res.

Súmula 582-STJ: Consuma-se o crime de roubo com a inver-


são da posse do bem mediante emprego de violência ou grave ameaça,
ainda que por breve tempo e em seguida à perseguição imediata ao
agente e recuperação da coisa roubada, sendo prescindível a posse
mansa e pacífica ou desvigiada.

69
Questão controvertida: O delito de roubo impróprio e a (im)pos-
sibilidade de aplicação do instituto da tentativa.
A partir da premissa de que a conduta inicial no delito
de roubo impróprio amolda-se à da figura típica do furto e que, somente
no momento em que o agente emprega a violência ou grave ameaça
com o fim de assegurar a posse do bem, restará a conduta como incur-
sa no delito de roubo, surge a controvérsia acerca da possibilidade de
tentativa ao referido delito.
Tal questionamento enseja controvérsias na doutrina e
jurisprudência de modo a termos dois entendimentos sobre o tema:
► Pela impossibilidade: O crime se consuma no mo-
mento do emprego da violência ou da grave ameaça e, por conseguinte,
não admite tentativa. Neste caso, a conduta do agente deverá ser tipifi-
cada pelo concurso de crimes entre o delito de furto na forma tentada e
o delito resultante do emprego da violência ou grave ameaça, por exem-
plo, lesões corporais. (Neste sentido Luiz Regis Prado, op. cit. p 321).
► Pela possibilidade. Violência e grave ameaça são em-
pregadas antes de consumada a subtração e, portanto, a consumação
se dá nos moldes do roubo próprio (Neste sentido NUCCI, Guilherme de
Souza. Manual de Direito Penal. Parte Geral. Parte Especial. 6.ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p 724-725).
O emprego de arma de brinquedo (simulacro) e o delito de rou-
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

bo.
O emprego de arma de brinquedo (simulacro) não tipifica o rou-
bo majorado, pois, ainda que possua potencialidade intimidatória, não
possui potencialidade lesiva. Cabe salientar que o Verbete de Súmula
n. 174, do Superior Tribunal de Justiça foi cancelado.
Além disso, o Código Penal sofreu uma alteração em 2018,
na qual foi revogada também a incidência da agravante do emprego da
arma branca no crime de roubo. Assim, aquele que se utiliza de uma
faca para praticar o roubo, pratica a grave ameaça elementar do crime.
Todos aqueles que anteriormente tiveram a incidência da majorante,
devem se beneficiar com a revisão da pena

Possibilidade do concurso material de crimes entre o delito de


roubo majorado pelo concurso de pessoas e o delito de associação cri-
minosa (art. 288, Código Penal).
Sobre a admissibilidade de aplicação simultânea da majorante
pelo concurso de pessoas ao delito de roubo em concurso material de
crimes com o delito de associação criminosa, previsto no art.288, do
Código Penal, o melhor entendimento é no sentido da possibilidade e,
70
portanto, não configuração de bis in idem (dupla valoração pelo mes-
mo fato), haja vista a distinção entre a objetividade jurídica entre os
delitos e, consequentemente, bem jurídico tutelado em cada um deles.
A majorante do concurso de pessoas e a (des)necessidade de
identificação dos corréus.
Ainda, sobre o tema roubo majorado pelo concurso de pes-
soas, questiona-se a necessidade, para fins de aplicação da majorante
prevista no §2°, II, do art.157, da identificação dos corréus, prevalecen-
do o entendimento de que esta não é obrigatória caso as demais provas
colhidas em juízo corroborem com a afirmação de que o delito foi per-
petrado em concurso de pessoas.
Sobre o tema vide Informativo de Jurisprudência n.472, do Su-
perior Tribunal de Justiça.

A majorante do emprego de arma e a (des)necessidade de


apreensão.

Em relação à incidência da majorante pelo emprego de arma


de fogo, prevista no §2°, I, do art.157, questiona-se a necessidade da
apreensão do referido instrumento do crime, prevalecendo o entendi-
mento de que esta não é obrigatória, utilizando-se para tanto, os mes-
mos argumentos estudados em relação à majorante pelo concurso de
pessoas, ou seja, caso as demais provas colhidas em juízo corroborem

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


com a afirmação de que o delito foi perpetrado com o emprego de arma
de fogo, incidirá a majorante.
Por fim, cabe salientar que, no caso de concorrência de mais
de uma majorante ao delito de roubo, o Superior Tribunal de Justiça já
firmou entendimento no sentido de que “O aumento na terceira fase de
aplicação da pena no crime de roubo circunstanciado exige fundamen-
tação concreta, não sendo suficiente para a sua exasperação a mera
indicação do número de majorantes” (Verbete de Súmula n.443).
Latrocínio.
O delito de roubo qualificado pelo resultado morte, tipificado
como delito hediondo pela Lei n.8072/1990, recebeu desta a denomina-
ção expressa de “latrocínio” em seu art.1º, II.
Ainda que no crime de latrocínio o resultado morte possa ser
proveniente de conduta dolosa, face à inserção topográfica do delito no
rol de delitos contra o patrimônio, prevalece a competência do Juiz Sin-
gular para o processo e julgamento do referido delito. Tal entendimento
foi sumulado no Verbete n. 603, do Supremo Tribunal Federal.
Questão controvertida em tema de latrocínio diz respeito à pos-
sibilidade de caracterização da figura tentada, bem como a necessidade
71
ou não da consumação da lesão patrimonial para a configuração da
figura consumada.
Por tratar-se de crime qualificado pelo resultado e plurissub-
sistente é possível a caracterização da tentativa, desde que, uma vez
iniciados os atos executórios, não haja a consumação em decorrência
de circunstâncias alheias à vontade do agente.
A questão é: o que preponderará para fins de consumação do
delito: o resultado da subtração da res ou o resultado morte da vítima
da violência?
Não obstante, como dito anteriormente, a inserção topográfica
do delito no rol de crimes contra o patrimônio, imperiosa sua interpre-
tação em consonância com os princípios norteadores de Direito Penal
insertos na Constituição da República, segundo os quais, deverá pre-
ponderar o bem jurídico-penal vida.

Súmula n. 610 - Há crime de latrocínio, quando o homicídio se


consuma, ainda que não se realize o agente a subtração de bens da
vítima.
Para fins de esclarecimentos sobre o momento consumativo e
possibilidade de caracterização da tentativa no delito de latrocínio, inte-
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

ressante trazermos à análise situações propostas por Rogério Sanches


Cunha: (CUNHA, Rogério Sanches. op.cit. p 138.)

MORTE SUBTRAÇÃO LATROCÍNIO


CONSUMADA CONSUMADA CONSUMADO
CONSUMADA TENTADA CONSUMADO

Verbete de Súmula
610 STF
TENTADA TENTADA TENTADO
TENTADA CONSUMADA TENTADO

DIFERENÇA ENTRE ROUBO E EXTORSÃO

A distinção entre os dois crimes reside na imprescindibilidade


de colaboração da vítima para que o agente obtenha a vantagem. No

72
crime de extorsão, a produção do resultado somente irá acontecer se
houver colaboração da vítima. Já no delito de roubo, essa situação não
ocorre pois o agente poderá alcançar o resultado independentemente
de colaboração da vítima.
Importante saber que, com a entrada em vigor da lei denomi-
nada Pacote Anticrime (Lei nº 13.964/2019), foram o acrescimento de
nova majorante ao artigo, senão vejamos:

Art. 157 do Código Penal (...) § 2º A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) até
metade: VII - se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de
arma branca; § 2º-B. Se a violência ou grave ameaça é exercida com em-
prego de arma de fogo de uso restrito ou proibido, aplica-se em dobro a
pena prevista no caput deste artigo.

Na prática sobre o estudo do crime de roubo, podemos ver re-


cente entendimento jurisprudencial do Tribunal de Justiça mineiro:

EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - ROUBO MAJORADO -


DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DE FURTO - NÃO CABIMEN-
TO - BEM SUBTRAÍDO MEDIANTE GRAVE AMEAÇA - PRINCÍPIO
DA INSIGNIFICÂNCIA - INAPLICABILIDADE - ATENUANTE - MENO-
RIDADE RELATIVA - REDUÇÃO DA PENA AQUÉM DO PATAMAR MÍ-
NIMO - IMPOSSIBILIDADE - SÚMULAS Nº. 231 DO STJ E Nº. 42 DO
TJMG - DECOTE DA MAJORANTE DO CONCURSO DE PESSOAS

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


- DESCABIMENTO - COMPROVADO LIAME SUBJETIVO ENTRE OS
AGENTES - TENTATIVA - NÃO CONFIGURADA - INVERSÃO DA POS-
SE. Incabível a desclassificação do delito de roubo para o delito
de furto, face a existência de elementos de convicção a evidenciar
que o agente empregou violência ou grave ameaça contra a pessoa
a fim de lhe retirar a res furtiva. A aplicação do princípio da insig-
nificância nos casos de roubo não encontra amparo na doutrina
e jurisprudência majoritária, uma vez que se trata de crime prati-
cado mediante violência ou grave ameaça, causando não apenas
a lesão ao patrimônio, mas também à integridade física e moral
da vítima. Fixada a pena-base no mínimo legal, o reconhecimento da
atenuante da menoridade relativa não têm o condão de reduzi-la aquém
desse patamar, consoante Súmula nº. 231 do STJ e Súmula nº. 42 do
TJMG. Comprovado o liame subjetivo entre duas pessoas para a práti-
ca do delito, não há que se falar em decote da majorante do concurso
de pessoas. O crime de roubo é consumado no momento em que
o agente se apodera da res furtiva, ainda que por pouco tempo,
sendo prescindível a posse mansa, pacífica, tranquila e desvigiada
do bem. Teoria da Amotio adotada pelo STJ.  (TJMG -  Apelação Cri-
73
minal  1.0024.19.031111-8/001, Relator(a): Des.(a) José Luiz de Mou-
ra Faleiros (JD Convocado) , 8ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em
13/02/2020, publicação da súmula em 18/02/2020).

EXTORSÃO E EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO

As figuras típicas de extorsão e extorsão mediante sequestro


contemplam tipos penais complexos, na medida em que, além de le-
sionar o bem jurídico patrimônio visam a lesão, respectivamente, da
integridade física e psíquica ou a liberdade do indivíduo.
Interessante salientar que conceito de vantagem previsto nos
delitos de extorsão é “mais abrangente que o previsto nos art. 155 e
157, CP, pois abarca, não só a coisa móvel corpórea, como também
todo o interesse ou direito patrimonial alheio” (PRADO, Luiz Regis. Cur-
so de Direito Penal Brasileiro. v.2.8.ed. São Paulo: Revista dos Tribu-
nais, 2010, p 331).
Ainda, ambos configuram-se como delitos formais, nos quais
a concretização do especial fim de agir de obtenção de indevida van-
tagem econômica, para si ou para outrem, apresenta-se como mero
exaurimento dos delitos.
O delito de extorsão consuma-se com o emprego da violência
ou grave ameaça, sendo um delito formal. A obtenção da vantagem
econômica indevida é considerada como mero exaurimento do delito.
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

Acerca do tema, o Verbete de Súmula n.96, do Superior Tri-


bunal de Justiça determina que a consumação do delito de extorsão
ocorre independentemente de obtenção da vantagem indevida
Lei n. 8.072/90.
O rol do art. 1º da Lei de Crimes Hediondos é um rol taxativo.
Sendo assim, o delito de extorsão somente será caracterizado como
hediondo quando for qualificado pelo resultado morte, sendo, portanto,
aplicáveis ao condenado pelo delito os institutos repressores da Lei de
Crimes Hediondos.

A Lei 11.923/2009 e a figura do “sequestro relâmpago”.


A Lei n.11923/2009, com vistas a terminar com a controvér-
sia existente acerca da tipificação da conduta na qual o agente restrin-
gia a liberdade da vítima como condição para a obtenção de vantagem
econômica, acrescentou o §3° ao tipo penal do art. 158, do Código Pe-
nal de modo a estabelecer mais uma qualificadora ao delito de extorsão.
Estamos diante, portanto, de novatio legis in pejus, afinal a
conduta já era anteriormente tipificada como extorsão; apenas, não ha-

74
via um juízo de reprovabilidade diferenciado pela restrição da liberdade
da vítima, o que gerava controvérsias entre doutrina e jurisprudência
a ensejar três entendimentos: tipificação da conduta como incursa na
figura típica do roubo majorado (art.157, §2°, V, do Código Penal); extor-
são (art.158, do Código Penal) e extorsão mediante sequestro (art.159,
do Código Penal).
A partir da distinção entre os delitos de roubo e extorsão face
à imprescindibilidade do comportamento da vítima neste, bem como a
distinção entre extorsão e extorsão mediante sequestro face à entrega
da vantagem indevida ser feita, respectivamente, pela própria vítima
ou por terceira à guisa de resgate, o legislador optou pela aplicação
da qualificadora ao delito de extorsão, previsto no art.158, do Código
Penal.
Assim, no caso de extorsão qualificada pela privação da liber-
dade da vítima, ainda que ocorra o resultado morte, não haverá o re-
conhecimento da hediondez, uma vez que o referido crime não está
previsto no rol taxativo da Lei 8072/90.

►Extorsão e Constrangimento Ilegal


A extorsão é uma forma especial de constrangimento ilegal,
diferenciando-se deste em decorrência da natureza da vantagem alme-
jada: se for moral trata-se de constrangimento ilegal, ao contrário, se a
vantagem for material restará caracterizado o delito de extorsão.

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


► Extorsão mediante sequestro.
Por tratar-se de delito permanente, no caso de sucessão de
leis penais no tempo, face à regra geral prevista no art. 4º do CP, apli-
ca-se a lei vigente à época da prática da conduta, sendo, desta forma,
aplicável a lei vigente ao término da permanência da conduta, ainda
que seja mais gravosa.
SAIBA MAIS
Súmula 711 STF - A lei penal mais grave aplica-se ao crime
continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à ces-
sação da continuidade ou da permanência.
Trata-se de delito formal e dessa forma, se consuma com o ato
de sequestrar, independentemente da obtenção da vantagem indevida
que configuraria mero Todas as modalidade do delito de extorsão me-
diante sequestro, são consideradas hediondas, sendo, portanto, aplicá-
veis ao condenado pelo delito os institutos repressores da Lei de Crimes
Hediondos.
O delito de extorsão mediante sequestro configura-se como
delito complexo, no qual, por expressa previsão legal, a privação da
liberdade da vítima configura meio para a execução do delito contra o
75
patrimônio questiona-se a distinção entre o delito de sequestro, previsto
no art.148 e a figura típica prevista no art.159, ambos do Código Penal.
Já na extorsão, delito inserido no rol de crimes contra o patrimô-
nio, há o especial fim de agir com relação à obtenção de vantagem, ao
passo que, no delito de sequestro, crime contra a liberdade individual,
não há intenção de obter qualquer vantagem de caráter patrimonial.
Vejamos na prática recente ementa jurisprudencial sobre o as-
sunto:
EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - DELITO DE EXTORSÃO
MEDIANTE SEQUESTRO - VANTAGEM COMO CONDIÇÃO OU PRE-
ÇO DO RESGATE - ELEMENTAR DO TIPO NÃO COMPROVADA -
CONSTRANGIMENTO MEDIANTE RESTRIÇÃO À LIBERDADE DA
VÍTIMA - CONDUTA DESCLASSIFICADA - NOVA CAPITULAÇÃO DO
COMPORTAMENTO - REPRIMENDA REESTRUTURADA. - Constata-
do que não houve efetivo arrebatamento dos ofendidos, com o in-
tuito de se obter vantagem consubstanciada em condição ou preço
de resgate, inviável condenar o acusado, pelo delito de extorsão
mediante sequestro. A prática de constrangimento mediante gra-
ve ameaça, com restrição à liberdade do ofendido e objetivando
vantagem econômica indevida, configura o delito de extorsão
qualificada, majorada a expiação pelo concurso de pessoas e em-
prego de arma de fogo (art. 158, § 1.º e § 3.º, do Código Penal).
V. A majorante prevista no § 1º do art. 158 do CP é aplicável so-
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

mente à hipótese de extorsão simples, havendo incompatibilidade


com o delito em sua forma qualificada.  (TJMG - Apelação Criminal
1.0441.17.003942-0/001, Relator(a): Des.(a) Beatriz Pinheiro Caires, 2ª
CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 05/03/2020, publicação da súmula
em 13/03/2020).

76
QUESTÕES DE CONCURSOS

QUESTÃO 1
Ano: 2014 Banca: VUNESP Órgão: DPE-MS Prova: Defensor Públi-
co Nível: Superior.
Quanto ao delito de furto, é correto afirmar que:
a) para a configuração da qualificadora prevista no § 5.º do art. 155 do
CP (veículo transportado para outro estado ou para o exterior) basta,
apenas, a caracterização de veículo, inclusive aquele movidos à eletri-
cidade ou por tração humana ou animal.
b) a diferença entre o furto mediante fraude e estelionato reside na for-
ma pela qual o agente se apropria da coisa, pois enquanto no primeiro
a vítima não percebe que a coisa lhe está sendo retirada, no segundo é
a própria vítima que entrega a coisa ao agente.
c) de acordo com o entendimento majoritário da doutrina, para caracte-
rização da majorante do abuso de confiança basta a relação emprega-
tícia com vínculo permanente.
d) não há necessidade de exame de corpo de delito quando o furto qua-
lificado com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coi-
sa deixar vestígios, bastando sua constatação por outro meio de prova.

QUESTÃO 2

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


Ano: 2014 Banca: ACAFE Órgão: PC-SC Prova: Agente de Polícia
Nível: Médio
De acordo com o Código Penal, analise as afirmações a seguir e
assinale a alternativa correta.
I - É considerado crime exigir cheque-caução, nota promissória ou
qualquer garantia, bem como o preenchimento prévio de formulá-
rios administrativos como condição para o atendimento médico-
-hospitalar emergencial.
II - É considerado crime participar de rixa, salvo para separar os
contendores.
III - Comete o crime de calúnia quem difamar alguém, imputando-
-lhe fato ofensivo à sua reputação.
IV - Comete o crime de furto quem subtrair coisa móvel alheia, para
si ou para outrem, mediante grave ameaça a pessoa, ou depois de
havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resis-
tência.
a) Apenas III e IV estão corretas.
b) Apenas II e III estão corretas.
c) Apenas I e II estão corretas.
77
d) Apenas I, II e III estão corretas.
e) Todas as afirmações estão corretas.

QUESTÃO 3
Ano:  2014  Banca:  FCC  Órgão:  TRF-4  Prova:  Analista Judiciário
Nível: Superior
Gerson subtraiu para si energia elétrica alheia de pequeno valor,
fazendo-o em concurso com Marcio, sendo ambos absolutamen-
te primários. Com esses dados, à luz da jurisprudência hoje do-
minante no Superior Tribunal de Justiça, classificam-se os fatos
como furto
a) simples.
b) de bagatela.
c) privilegiado.
d) qualificado.
e) privilegiado-qualificado.

QUESTÃO 4
Ano:  2014  Banca:  UFG  Órgão:  DPE-GO  Prova:  Defensor Público
Nível: Superior
G. S., primário e de bons antecedentes, furta R$ 10.000,00 de seu
próprio pai, um senhor de 55 anos. Na hipótese, conclui-se que G.
S.
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

a) fica isento de pena.


b) responde pelo crime de furto privilegiado.
c) responde pelo crime de furto simples.
d) responde pelo crime de furto agravado.
e) responde pelo crime de furto qualificado.

QUESTÃO 5
Ano:  2014  Banca:  VUNESP Órgão:  TJRJ  Prova:  Juiz Substituto
Nível: Superior
Nos estritos termos do CP, aquele que faz ligação clandestina de
energia elétrica junto a poste instalado na via pública e a utiliza em
proveito próprio
a) comete fato típico equiparado a furto.
b) comete fato típico equiparado a apropriação indébita.
c) não comete crime algum, por falta de expressa previsão legal.
d) comete estelionato.

TREINO DISSERTATIVO
Peter, advogado, após ser vencedor de um processo, apropria-se de va-
78
lores que deveriam ser repassados ao seu cliente, tendo sido inclusive
já constituído em mora.
Discorra sobre o eventual crime cometido por Peter.

TREINO INÉDITO
Robson pediu a Leonel que guardasse, em seu apartamento, um livro
muito raro. Após três meses, Leonel apodera-se do referido livro, sem
devolvê-lo a Robson quando foi solicitado, este crime configura-se:
a) apropriação indébita.
b) furto.
c) estelionato.
d) roubo.
e) peculato.

Saiba mais
Filme sobre o assunto: Assalto ao Banco Central
Acesse o link:
https://mpma.mp.br/arquivos/COCOM/arquivos/centros_de_apoio/
caop_crim/NOTA_T%C3%89CNICA/NOTA_TECNICA_02_2018_
CAOPCRIM_2.pdf

NA MÍDIA
Adolescente vítima de tráfico humano é resgatada no AC quando

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


era levada para Bolívia
Uma adolescente de 16 anos foi resgatada pela Polícia Federal do Acre
(PF-AC) quando era levada por um casal para Cobija, na Bolívia, que
faz fronteira com o estado acreano. As investigações apontam que o
casal é suspeito de tráfico de pessoas e trabalho escravo.
A mulher, uma acreana de 43 anos, e o marido dela, boliviano de 40, fo-
ram presos em flagrante na Delegacia da PF de Epitaciolândia, interior
do Acre, na terça-feira (18), quando pararam para o controle migratório.
O caso, porém, só foi divulgado nesta quinta-feira (20).
A vítima foi encontrada dentro do carro dos suspeitos. Ela é de família
humilde e mora na zona rural. Por segurança, a PF-AC não repassou a
localidade que a menor mora.
Fonte: G1
Data de publicação: 20/02/2020
Disponível em:
<https://g1.globo.com/ac/acre/noticia/2020/02/20/adolescente-vitima-
-de-trafico-humano-e-resgatada-no-ac-quando-era-levada-para-bolivia.
ghtml>

79
NA PRÁTICA

Antônio, prestador de serviços da empresa YZY materiais de constru-


ção, aproveita-se do acesso que tem as dependências da empresa, as-
sim como da confiança que detém do gerente do departamento finan-
ceiro e apropria-se de dois cheques assinados em branco (para fins da
realização de serviços externos da empresa). Tempos após, os preen-
che e deposita em sua conta corrente com o intuito de obter vantagem.
Ante o exposto, avalie a conduta de Júlio sob o aspecto jurídico-penal
No caso em exame, o dolo do agente, desde o momento em que se
apoderou dos cheques era desviá-lo para sua conta corrente o que ca-
racteriza o delito de estelionato.
Desta forma, consoante o disposto no Verbete de Súmula n.17, do Su-
perior Tribunal de Justiça, o delito de falsificação do cheque, não obs-
tante sua natureza de documento público enquanto endossável, restará
absorvido pelo delito de estelionato face à caracterização de delito pro-
gressivo.
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

80
CRIMES CONTRA A
DIGNIDADE SEXUAL, CONTRA
A FÉ PÚBLICA & CONTRA A

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Para que possamos estudar os delitos contra a Dignidade Se-
xual, é importante que se tenha conhecimento da substituição daquilo
que pode ser considerado costume pela a expressão dignidade sexual
e o conceito de cada um deles
Costume vem a ser a reiteração de uma conduta (elemento ob-
jetivo) em face da convicção de sua obrigatoriedade (elemento subjeti-
vo). Pode-se dizer que estamos diante de uma linha de comportamento
sexual imposto às pessoas por necessidades ou conveniências sociais
Já a Dignidade humana tem previsão com um dos fundamen-
tos da Constituição, prevista no art. 1º, III. É inerente a todas as pessoas
e impõe respeito mútuo, refletindo nas esferas físicas, morais, patrimo-
niais e sexuais
O Título VI da parte especial sofreu uma série de alterações no
ano de 2018 e ficou subdividido da seguinte forma:

81
TÍTULO VI DA PARTE ESPECIAL

CAPÍTULO I – Dos crimes contra a liberdade sexual –


213 A 217A

CAPÍTULO II – Dos crimes sexuais contra vulnerável –


217A A 218B

CAPÍTULO III – REVOGADO PELA LEI 11.106/2005

CAPÍTULO IV – Disposições gerais – 225 e 226

CAPÍTULO V – Do lenocínio e do tráfico de pessoa para fins de


prostituição ou outra forma de exploração sexual:
art. 227 a 230

CAPÍTULO VI – Do ultraje público ao pudor – art. 233 e art. 234

CAPÍTULO VII – Disposições gerais: art. 234A e 234B

DOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL.


Estupro.
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

Considerações Gerais
O crime de estupro está previsto no art. 213 do Código Penal e
traz a figura típica daquele que permite que o ato libidinoso se manifeste
de diversas formas, inclusive sem com contato de órgãos sexuais, ou
até mesmo quando o sujeito ativo do crime obrigue a vítima a praticar
atos em si própria, de possa que possa contemplar a vítima. Mas não se
pode negar que é exigível uma participação física da vítima na prática
do ato libidinoso.
Com a alteração trazida pela Lei 12015/2009, além da possibi-
lidade de o agente constranger a vítima mediante violência ou ameaça
à prática de conjunção carnal, o legislador prevê a possibilidade de que
ocorra o papel ativo da vítima quando descreve que o agente venha a
constranger alguém, mediante violência ou ameaça, a praticar outro ato
libidinoso. No entanto, existe também a possibilidade de que ele, ao
constranger alguém, mediante violência ou ameaça, permita que com
ele se pratique outro ato libidinoso.
Caracteriza-se como tipo subjetivamente complexo, haja vis-
ta a existência do dolo genérico afeto ao constrangimento ilegal, bem

82
como o especial fim de agir em relação à prática de conjunção carnal ou
qualquer outro ato libidinoso.
Por tratar-se de delito material, no que concerne à conjunção
carnal consuma-se com a introdução, ainda que parcial, do pênis na
cavidade vaginal; em relação à prática de qualquer outro ato libidinoso,
com a efetiva pratica do ato.

Questões relevantes a serem analisadas:

A classificação do estupro como tipo misto alternativo e a pos-


sibilidade de concurso de crimes em casos de prática de mais de uma
conduta no mesmo contexto fático.

A questão gera controvérsia. No sentido de se entender que se


trata de tipo misto cumulativo, temos o entendimento de Guilherme de
Souza Nucci, Luiz Regis Prado e Fernando Capez e da jurisprudência,
inclusive do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:

EMENTA. PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ESTUPRO


E ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. PROVAS PARA A CONDENAÇÃO.
EXPERIÊNCIA DAS VÍTIMAS. CRIME HEDIONDO. LEI Nº 12.015/2009.
ARTS. 213 E 217-A DO CP. TIPO MISTO ACUMULADO. CONJUNÇÃO CAR-
NAL. DEMAIS ATOS DE PENETRAÇÃO. DISTINÇÃO. CRIMES AUTÔNO-
MOS. SITUAÇÃO DIVERSA DOS ATOS DENOMINADOS DE PRAELUDIA

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


COITI. CRIME CONTINUADO. RECONHECIMENTO. IMPOSSIBILIDADE.
I - O exame do v. acórdão vergastado evidencia a existência de provas sufi-
cientes para amparar o juízo condenatório alcançado em primeiro grau. Ade-
mais, não se admite, na via eleita, que se proceda a nova dilação probatória.
II - O consentimento da vítima ou sua experiência em relação ao sexo, no
caso, não têm relevância jurídico-penal.
III - Na linha da jurisprudência desta Corte e do Pretório Excelso constituem-
-se os crimes de estupro e de atentado violento ao pudor (na antiga redação),
ainda que perpetrados em sua forma simples em crimes hediondos, subme-
tendo-se os condenados por tais delitos ao disposto na Lei nº 8.072/90.
IV - A reforma introduzida pela Lei nº 12.015/2009 unificou, em um só tipo
penal, as figuras delitivas antes previstas nos tipos autônomos de estupro e
atentado violento ao pudor.
Contudo, o novel tipo de injusto é misto acumulado e não misto alternativo.
V - Desse modo, a realização de diversos atos de penetração distintos da
conjunção carnal implica o reconhecimento de diversas condutas delitivas,
não havendo que se falar na existência de crime único, haja vista que cada
ato - seja conjunção carnal ou outra forma de penetração - esgota, de per se,
a forma mais reprovável da incriminação.
VI - Sem embargo, remanesce o entendimento de que os atos classificados
como praeludia coiti são absorvidos pelas condutas mais graves alcançadas

83
no tipo.
VII - Em razão da impossibilidade de homogeneidade na forma de execução
entre a prática de conjunção carnal e atos diversos de penetração, não há
como reconhecer a continuidade delitiva entre referidas figuras. Ordem de-
negada.
(STJ. HC 104724/MS. Relator. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma.
22/06/2010).

No entanto, a questão está longe de estar pacífica, pois em


sentido contrario, há também julgados no sentido de se tratar de crime
único uma vez que os diversos atos foram praticados num mesmo con-
texto fático. O reconhecimento de crime único implica em retroatividade
da Lei 12.015, por ser, nesse sentido, lei mais benéfica.

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. NÃO CA-


BIMENTO (RESSALVADO O ENTENDIMENTO PESSOAL DA RELATORA).
PENAL. CONDENAÇÃO POR CRIMES PREVISTOS NOS ARTS. 213 E
214, NA ANTIGA REDAÇÃO DO CÓDIGO PENAL. ADVENTO DA LEI N.º
12.015/2009. UNIÃO, NO MESMO TIPO PENAL, DAS CONDUTAS REFE-
RENTES AO ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR E AO
ESTUPRO. RECONHECIMENTO DE CRIME ÚNICO ENTRE OS ATOS
LIBIDINOSOS PRATICADOS CONTRA CADA UMA DAS VÍTIMAS. VIA-
BILIDADE. PRECEDENTES DE AMBAS AS TURMAS QUE COMPÕEM A
TERCEIRA SEÇÃO DESTA CORTE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVI-
DENCIADO. WRIT NÃO CONHECIDO. ORDEM DE HABEAS CORPUS
CONCEDIDA EX OFFICIO.
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

(...) 5. No julgamento do HC 205.873/RS, Rel. p/ acórdão Min. MARILZA


MAYNARD - Des. convocada do TJ/SE -, a Quinta Turma desta Corte Su-
perior de Justiça reconheceu, por maioria de votos, a ocorrência de cri-
me único quando o agente, num mesmo contexto fático, pratica conjun-
ção carnal e ato libidinoso diverso, devendo-se aplicar essa orientação
aos delitos cometidos antes da Lei n.º 12.015/2009, em observância ao
princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica.
6. Conforme entendimento sedimentado na Súmula n.º 611, do Supremo
Tribunal Federal, transitada em julgado a condenação, cabe ao Juízo das
Execuções proceder à realização de nova dosimetria da pena, conforme a
tipificação trazida pela Lei n.º 12.015/2009, resguardada a possibilidade de
valoração da pluralidade de condutas na primeira fase da aplicação da pena.
(STJ. HC 286885 / SP. Relatora: Min. Laurita Vaz. Quinta Turma. 08/05/2014)

A análise do grau de resistência da vítima (neste sentido


Guilherme de Souza Nucci), bem como a prova do referido delito:
materialidade a autoria a partir da palavra da vítima.
No que concerne à palavra da vítima, não obstante
o entendimento doutrinário e jurisprudencial dominantes no sentido de
que a mesma tenha valor probatório relativo, no caso de delitos contra

84
a dignidade sexual, tal valor probatório ganha relevância, mormente se
corroborado pelos demais elementos probatórios, face ao fato destes
delitos serem realizados, em sua maioria, “na clandestinidade”, ou seja,
sem a presença de qualquer testemunha.
A Lei n.12.015, seus reflexos na tipificação das condutas e
consequente conflito de Direito Intertemporal.
Com o advento da Lei n.12015/2009, a figura típica prevista no
art.214, CP (atentado violento ao pudor) foi revogada, sem, contudo, ter
ocorrido abolitio criminis, mas, apenas, a denominada continuidade
normativa. Desta forma, questão a ser analisada é a utilização, no caso
concreto, do princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica, pre-
visto no art.2º, parágrafo único, do Código Penal.
Ação Penal nos Crimes contra a Dignidade Sexual.
Consoante a atual redação do art.225, do Código Penal, em
regra, a ação penal é pública incondicionada. Vale lembrar que estamos
diante de norma penal mais grave sendo que a regra referente ação pe-
nal é norma de natureza mista, de modo que, por versar sobre direitos
fundamentais, deverá ser tratada com a regra de direito intertemporal
aplicável ao direito material.
Assim, se o fato foi praticado antes da entrada em vigor da al-
teração ocorrida em setembro de 2018, aplica-se a redação do art. 225
à época, uma vez que a representação é uma condição de procedibili-
dade da ação penal e se não exercida no prazo decadencial, opera-se

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


a decadência, nos termos do art. 107, IV do CP
Por fim, vale salientar que nos crimes que envolvem violência
sexual contra criança e adolescente, a colheita do de provas do (a) me-
nor será realizado através de depoimento especial, conforme preceitua
o procedimento da lei nº 13.431/2017.
Ressalto que o termo a quo dos prazos prescricionais varia de
acordo com a figura delitiva, conforme se verifica no art. 111 do Código
Penal, que estabelece que a prescrição começa a correr, saliento que
nos crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes, pre-
vistos neste Código ou em legislação especial, da data em que a vítima
completar 18 (dezoito) anos, salvo se a esse tempo já houver sido pro-
posta a ação penal. Esse dispositivo (art. 111, V), foi inserido no Código
Penal pela Lei n. 12.650/2012.
Atualmente todos os crimes contra a dignidade sexual de
menores de idade apuram-se mediante ação pública incondiciona-
da (art. 225, parágrafo único, do CP) e, por isso, não se sujeitam a
prazo decadencial.
Assim, se uma criança de 10 anos for vítima de crime de es-
tupro de vulnerável e o delito não for apurado, o lapso prescricional só
85
terá início na data em que ela completar 18 anos.
Na doutrina, Estefam salienta que existe uma ressalva no texto
legal, segundo a qual a prescrição começará a correr antes de a vítima
completar 18 anos se a esse tempo já tiver sido proposta ação penal
para apurar a infração penal. Ex.: crime contra criança de 10 anos em
que a vítima conta o ocorrido aos pais e o Ministério Público oferece
denúncia quando ela tem 15 anos. O prazo prescricional neste caso co-
meçará a correr da propositura da ação penal, e não da data do crime;
se até o oferecimento da denúncia a prescrição não estava correndo, o
termo inicial é o da propositura da ação, não retroagindo à data do fato.
Aliás, caso a vítima morra antes de completar 18 anos e antes de ser
iniciada a ação penal, o termo a quo do prazo prescricional é a data do
falecimento, e não a da consumação do crime, porque, nos termos da
lei, o prazo não estava ainda em andamento7.

DOS CRIMES CONTRA A FÉ PÚBLICA


Para que possamos estudar os delitos contra a Fé Pública,
torna-se imperiosa a identificação do bem jurídico-penal, de natureza
supra individual, tutelado neste Capítulo.
O bem jurídico fé pública pode ser definido, a partir da noção
desenvolvida na seara de Direito Público, como a credibilidade conferi-
da aos documentos emitidos por autoridades públicas, ou privadas por
ela delegados, no exercício de suas funções de modo a presumir-se,
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

face à preponderância do interesse público, sua legitimidade e veraci-


dade.
Há alguns requisitos a serem preenchidos para que seja possí-
vel configurar o crime de falso, que são:

1. Imitação da verdade: ou seja, o objeto material do crime deve de fato


apresentar semelhança com o verdadeiro, podendo ser confundido. Se a fal-
sificação for grosseira, haverá atipicidade da conduta. (Súmula 73 do STJ)
2. Dano potencial, ou seja, a falsidade deve realmente gerar dano a alguém.
3. O documento falsificado deve ser capaz de iludir ou enganar um número
indeterminado de pessoas.
Dolo: todos os crimes contra a fé pública são dolosos

Falsificação de documento
Documento é todo escrito a mão ou mecânico, contendo expo-
sição de fatos ou declaração da vontade e ainda dotado de relevância
jurídica e que por si só pode causar um dano por ter valor probatório
7 Direito penal esquematizado – parte geral / André Estefam; Victor Eduardo Rios Gonçal-
ves. – Coleção esquematizado / coordenador Pedro Lenza - 9. ed. – São Paulo : Saraiva Educa-
ção, 2020.

86
O bem jurídico tutelado: diretamente a fé pública e, indireta-
mente, terceiro prejudicado com a falsificação. Consuma-se no momen-
to em que o documento é criado (falsidade total) ou modificado (falsi-
dade parcial) e seja apto a enganar terceiros, sendo, irrelevante seu
uso, haja vista tratar-se de crime formal. O objeto material do delito
é o documento e se ele for considerado documento público, é aquele
compreendido como emanado do poder público. A doutrina classifica o
documento público em três categorias:

a)formal e substancialmente público: emana do funcionário público no exer-


cício de suas funções e seu conteúdo relaciona-se ao interesse público;
(CUNHA, Rogério Sanches. Direito Penal. Parte Especial. 2.ed. RT, 2009,pp
347).
b) formalmente público e substancialmente privado: emana do funcionário
público no exercício de suas funções e seu conteúdo relaciona-se ao inte-
resse privado.
c) documento público por equiparação. É aquilo que se encontra previsto no
art. 297 § 2º.

►Distinção entre falsidade material e ideológica.


Na falsidade material, o documento não é autêntico. Ou seja, a
falsidade recai sobre seus elementos extrínsecos. Já na falsidade ideo-
lógica, o documento externamente é autêntico, seu conteúdo, no entan-
to é que será falso
Ainda, na falsidade material há dois tipos penais distintos: fal-

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


sidade de documento público (art. 297) e falsidade de documento par-
ticular (art. 298)
► Falsificação de documento público e estelionato – con-
curso de crimes ou conflito aparente de normas.
1ª corrente: por tutelarem bens jurídicos distintos, configura-
-se o concurso material de crimes, caso haja pluralidade de condutas ou
resultados (JESUS, Damásio E. de. Direito Penal: Parte especial: Dos
crimes contra a fé pública a dos crimes contra a administração pública.
V.4. 13.ed. ver. E atual. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 54). No entanto,
caso o falso se esgote no estelionato, sem maior potencialidade lesiva,
será por este absorvido (Verbete de Súmula, 17, do Superior Tribunal
de Justiça). Neste sentido, Rogério Greco (GRECO, Rogério. Curso de
Direito Penal: parte especial. volume IV. 4.ed. pp.276)
2ª corrente: por tutelarem bens jurídicos distintos, configura-se
o concurso formal de crimes, pois há unidade de conduta e pluralidade
de resultados. Neste sentido, já se manifestou o Supremo Tribunal Fe-
deral, no Informativo n 541.
3ª corrente: trata-se de conflito aparente de normas a ser so-

87
lucionado pelo princípio da consunção, sendo o delito de estelionato
absorvido pela falsidade de documento público, delito mais grave.

► Falsificação e uso de documento público falso pelo


falsário.
Neste caso, o delito previsto no art.304, do Código Penal será
absorvido pelo art.297, do Código Penal, haja vista configurar mero
exaurimento (pós fato impunível).
► Falsidade grosseira e caracterização de estelionato,
apropriação indébita ou outro delito que não o de falso. Quando
a falsificação for grosseira, acaba por tornar a conduta de falso atípica
face à caracterização do crime impossível; todavia, nada impede que
a falsidade, ainda que grosseira, seja apta à caracterização de outra
figura típica, tal como o delito de apropriação indébita ou estelionato
(art.168 e 171, do Código Penal).
► A substituição de fotografia em documento de
identidade.
Caso muito comum é a substituição da fotografia em documen-
to de identidade. Nesse caso, surgem dois entendimentos. O primeiro,
segundo o qual a conduta é de falsidade de documento público, tem
por fundamento a assertiva de que a foto é parte integrante deste; por
outro lado, para o entendimento que sustenta a caracterização de falsa
identidade, argumenta que o documento permanece autêntico.
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

► Preenchimento abusivo de documento em branco assi-


nado por outrem.

Caso interessante a ser analisado é o preenchimento abusivo


de documento em branco assinado por outrem. Para fins de esclareci-
mentos sobre o tema, analisemos as seguintes narrativas e consectá-
rios:
Narrativa 1: O agente recebe licitamente o papel assinado em
branco para posterior preenchimento e o preenche indevidamente.
Neste caso, restará caracterizado o delito de falsidade ideológica.
Narrativa 2: O agente subtrai o papel assinado em branco e o
preenche. Neste caso, restará caracterizado o delito de falsidade mate-
rial – documental.
► Falsa declaração de pobreza.
Questão que demanda questionamento é a tipificação ou não
da conduta de quem, para fins de obtenção de assistência judiciaria
gratuita, afirma, mediante falsa declaração, pobreza.
O Superior Tribunal de Justiça, já proferiu decisão no sentido
de que a referida conduta não configura as figuras típicas de falsidade
88
ideológica ou uso de documento falso, pois a referida declaração é pas-
sível de comprovação posterior, de ofício ou a requerimento. Isso ocorre
porque haveria uma presunção de veracidade relativa. Para os casos
de declaração falsa, a própria Lei 1060/50 prevê a multa de até dez ve-
zes o valor das custas judiciais como punição.

MOEDA FALSA

Os delitos previstos neste capítulo tutelam o bem jurídico “fé


pública”, que neste caso, significa, nas palavras de Luiz Regis Prado:
a “confiança que a própria ordem de relações sociais e sua atuação
prática determinam entre os indivíduos, ou entre a Administração Pú-
blica e os cidadãos, relativamente à emissão e circulação monetária[...]
(PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro, v.3, 6.ed, 2010,
pp196).
No crime de moeda falsa, a expressão falsificar, que está na
figura típica fundamental compreende o fabrico (ou seja, cunhagem do
papel-moeda ou moeda metálica) e a alteração (que consiste em modi-
ficar ou adulterar a moeda existente).
Da mesma forma que no documento falsificado, no crime de
moeda falsa, é imprescindível a imitatio veritatis (imitação da verdade),
ou seja, exige-se que a cédula falsa tenha a eficácia de enganar o ho-
mem médio, induzindo a engano número indeterminado de pessoas.

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


Caso a falsificação seja grosseira, mas tenha sido capaz de enganar
ainda que momentaneamente uma pessoa, fica caracterizado o crime
de estelionato, conforme entendimento sumulado pelo Superior Tribunal
de Justiça – Súmula n. 73.
► Impossibilidade de reconhecimento do princípio da in-
significância nos crimes de moeda falsa
Isso ocorre porque no caso da moeda falsa, ao contrário dos
crimes patrimoniais onde se pode invocar o reconhecimento do referido
princípio, protege-se um bem jurídico intangível, que é a credibilidade
do Sistema Financeiro, tendo sido esse entendimento aplicado pelo Su-
premo Tribunal Federal, no Informativo 514
Não podemos esquecer que os petrechos para falsificação, a
falsificação e colocação em circulação da moeda falsa, quando o sujei-
to ativo é a mesma pessoa caracteriza verdadeiro conflito aparente de
normas a ser solucionado pelo princípio da consunção, no qual o delito
de moeda falsa absorve os demais.
No que concerne à competência para julgamento do crime, por
tratar-se de delito contra a fé pública, prevalece o disposto no art.109,
da CRFB/1988, ou seja, a competência para processo e julgamento
89
será da Justiça Federal.
Para o Direito Penal, a expressão Administração Pública deve
ser definida, conforme preconiza Luiz Regis Prado, como toda a ativida-
de funcional do Estado, seja subjetivamente (órgãos instituídos para a
concreção de seus fins), seja objetivamente (atividade estatal realizada
com fins de satisfação do bem comum).

DOS CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA


Nos delitos contra a Administração Pública, o agente público,
atuando isoladamente ou unidade de desígnios com pessoas estranhas
à Administração Pública atua de forma contrária aos princípios da le-
galidade, impessoalidade, eficiência e moralidade pública e, portanto,
realiza verdadeiro desvio de poder de modo a lesionar a probidade ad-
ministrativa.
Com relação ao conceito de funcionário público, para fins pe-
nais, dispõe expressamente o art.327, do Código Penal, que será fun-
cionário público aquele que exerce cargo, emprego ou função pública,
ainda que transitoriamente ou sem remuneração.
Há ainda o funcionário público por equiparação, consoante
dispõe o parágrafo primeiro do respectivo dispositivo legal, aquele que
venha a exercer cargo, emprego ou função pública em entidade paraes-
tatal e ainda aquele que trabalha para empresa prestadora de serviços
contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Admi-
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

nistração Pública, conforme determina o art. 327§1º do Código Penal.


Neste sentido assevera Fernando Capez: “o que importa é a natureza
da função exercida pelo agente e não a forma de investidura na Admi-
nistração” (CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. V.4. 4.ed. São
Paulo: Saraiva, 2010, pp 53).
No que concerne aos crimes contra a Administração Pública,
não há que se cogitar a incidência do princípio da insignificância para
fins de exclusão da tipicidade da conduta, ainda que, em alguns casos
sejam atendidos os requisitos afetos à lesão patrimonial, pois, segundo
o melhor entendimento, busca-se tutelar não apenas o erário (patrimô-
nio) público, mas, principalmente, a moralidade e probidade da Adminis-
tração Pública no exercício de suas funções.
Crimes praticados por funcionário público contra a Administra-
ção Pública:
- Peculato. Art.312, do Código Penal - as condutas dolosas
previstas descrevem figuras especiais dos delitos de apropriação indé-
bita (caput) e de furto (§1º), caracterizando-se, portanto, como delitos
funcionais impróprios ou mistos.

90
Por outro lado, no caso da conduta culposa, o agente público,
por meio da quebra do dever objetivo de cuidado, concorre para a prá-
tica de peculato doloso por outrem.
O peculato configura-se como delito próprio, mas admite o con-
curso de pessoas, desde que o estranho à Administração Pública tenha
conhecimento da condição do sujeito ativo. No que concerne ao sujei-
to passivo, o Estado figura tanto como sujeito passivo indireto, quanto
direto, na medida em que ocorre a lesão ao seu patrimônio moral e
patrimonial.
► Peculato-apropriação: configura delito especial de apropria-
ção indébita, caracterizada pela qualidade do sujeito ativo, pela lesão
ao patrimônio público, bem como à moralidade administrativa – à fun-
ção exercida pelo Estado presentado pelo agente público.
►Peculato-desvio (malversação): neste caso, o funcionário dá
destinação diversa a res, em benefício próprio ou de terceiro. O referido
benefício pode ser material ou moral, bem como a vantagem não será,
necessariamente, de cunho econômico.
► Peculato Impróprio, também denominado peculato-furto, en-
contra-se previsto no §1º, do art. 312, do Código Penal.
► Peculato culposo: previsto no §2º, do art. 312, do Código
Penal. Trata-se de uma hipótese na qual o funcionário público, por agir
de forma desidiosa, acaba concorrendo para que outrem venha praticar
um crime lesivo ao patrimônio da Administração. Para Guilherme de

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


Souza NUCCI, trata-se de participação culposa em crime doloso (Ma-
nual de Direito Penal.6.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. pp
989)
► Peculato mediante erro de outrem. Art.313, caput, do Có-
digo Penal. Nesta figura típica, o terceiro, mediante uma falsa percep-
ção da realidade, entrega dinheiro ou utilidade – qualquer vantagem
ou lucro a funcionário público que não esteja autorizado a recebê-los e
este dolosamente não informa o terceiro e nem a Administração Pública
acerca do erro com o fim de assegurar a sua apropriação. Pode ocorrer
ainda a situação na qual o funcionário público seja competente para
receber o valor, entretanto, o terceiro por erro, paga um valor a maior e
o funcionário dolosamente, apropria-se da diferença.
►Peculato Eletrônico: Forma especial do delito de peculato,
previsto no art. 313-A, do Código Penal e configura-se como delito de
mera atividade. Na verdade, configura-se uma forma especial do crime
de peculato, uma vez que a vantagem indevida é auferida pelo fato de
o funcionário utilizar-se de um especial modo de agir, que é o meio ele-
trônico.
► Concussão. Art. 316, do Código Penal. - A conduta dolosa
91
prevista descreve uma figura especial do delito de extorsão caracteri-
zando-se, portanto, como delito funcional impróprio ou misto. Diferen-
cia-se do delito de extorsão na medida em que no crime do art. 158
do Código Penal há a utilização de violência ou grave ameaça para a
obtenção da vantagem, ao passo que na concussão, o funcionário não
se vale de violência nem de ameaça.
Importante salientar que com a entrada em vigor da nova lei
denominada Pacote Anticrime (Lei nª 13.964/2019), o crime de con-
cussão passou a ter pena de reclusão de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e
multa, sendo alterada a antiga redação que previa pena de 2 (dois) a 8
(oito) anos, e multa.
A concussão se diferencia do delito de corrupção passiva,
art.317, do Código Penal, pois neste o núcleo do tipo descreve a condu-
ta de “solicitar”, diferentemente do delito de concussão, no qual o agen-
te “exige” para si ou para outrem a vantagem indevida, ou seja, impõe à
vítima a prática de uma conduta que o beneficie e esta cede por “temor”
a possíveis represálias.
Trata-se de delito formal, ou seja, consuma-se no momento da
exigência da vantagem, sendo que a obtenção desta vem a ser mero
exaurimento do crime.
► Excesso de exação (art.316, §1º, Código Penal) - configura-
-se como a exigência rigorosa de tributos (imposto, taxa ou contribuição
de melhoria) ou contribuição social e perfaz-se mediante duas modali-
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

dades: exigência indevida do tributo ou contribuição social e cobrança


vexatória ou gravosa não autorizada em lei (CAPEZ, Fernando. Curso
de Direito Penal. V.3. 8.ed. São Paulo: Saraiva, 2010, pp 491).
► Corrupção passiva. Art. 317, do Código Penal - o ordena-
mento jurídico prevê condutas típicas tanto para o agente que se cor-
rompe, quanto para o terceiro à Administração Pública que o corrom-
pe – hipótese em que terceiro responderá por corrupção ativa. Houve,
desta forma, rompimento à teoria unitária do concurso de pessoas pre-
visto no art.29, do Código Penal. Insta salientar que a bilateralidade de
condutas nem sempre ocorrerá. Configura-se como tipo penal de ação
múltipla ou tipo misto alternativo face à possibilidade da realização das
seguintes condutas:
a) solicitar vantagem indevida – a proposta emana do agente
público e consuma-se independemente da entrega da vantagem;
b) receber vantagem indevida - a proposta emana do terceiro e
consuma-se no momento em que o agente recebe a vantagem indevida.
c) aceitar promessa de tal vantagem: neste caso, não é ne-
cessário o recebimento da vantagem; o delito restará consumado com
o mero consentimento do agente público.
92
Vale lembra ainda que a conduta obrigatoriamente deve guar-
dar relação com a função exercida pelo funcionário público. Significa
dizer que deve existir relação de causalidade entre a solicitação, o rece-
bimento ou o aceite da promessa de vantagem indevida com a contra-
prestação do agente público, seja por meio de uma conduta comissiva
ou omissiva, de sua competência específica.
De acordo com os princípios da intervenção mínima e ade-
quação social, grande parte da doutrina, dentre os autores, Fernando
Capez, tem sustentado que as gratificações usuais de pequena monta
e as pequenas doações ocasionais relacionadas às festas de fim de
ano não configurariam a figura típica do art.317, do Código Penal face
à incidência do princípio da adequação social (neste sentido Fernan-
do Capez, Guilherme de Souza Nucci.). No entanto, os Tribunais tem
se mostrado reticentes acerca da possibilidade do reconhecimento da
atipicidade da conduta em decorrência da adoção do princípio da insig-
nificância.
► Corrupção passiva qualificada: nesta conduta, prevista no
§1º, o agente público realiza o prometido ao terceiro na conduta prevista
no caput do referido artigo. Neste caso, o exaurimento do delito foi con-
siderado fato punível, na verdade, caracterizado como causa especial
de aumento da figura típica. Entretanto, caso esta conduta, no caso
concreto, configure delito autônomo, restará caracterizado o concurso
de delitos entre a corrupção passiva e esta suposta conduta, sem, con-

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


tudo, a incidência da majorante do §1º, sob pena de incidência de bis
in idem.
► Corrupção passiva privilegiada: nesta figura típica, prevista
no §2º, do dispositivo em exame, o agente público não visa atender
interesse próprio, mas cede à solicitação de terceiro “comum na reci-
procidade do tráfico de influência” (CUNHA, Rogério Sanches. Direito
Penal. Parte Especial. 2.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. pp 392).

► Prevaricação. Art.319, do Código Penal - Caracteriza-se como delito for-


mal, ou seja, consuma-se independentemente da efetiva satisfação de inte-
resse ou sentimento pessoal e admite a modalidade tentada somente nas
condutas comissivas sendo que “interesse ou sentimento pessoal” deve ser
compreendido como interesse que não tenha caráter econômico, mas no
qual o agente público coloca seu interesse acima do interesse público.

► Prevaricação imprópria - art. 319-A, do Código Penal e re-


cebeu o nomen iuris de prevaricação de agente penitenciário para os
casos nos quais o agente deixa de vedar ao preso o acesso a aparelho
telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros
presos ou com o ambiente externo.
93
DOS CRIMES PRATICADOS POR PARTICULAR CONTRA A ADMI-
NISTRAÇÃO PÚBLICA
► Usurpação de Função Pública – art. 328 do Código Penal - a
expressão “usurpar” compreende a conduta de exercício indevido, ou
seja, a efetiva prática de ato específico de determinada função pública.
Por tratar-se de delito formal consuma-se no momento em que o agen-
te pratica algum ato de ofício inerente ao exercício da função pública,
independentemente da ocorrência de efetivo prejuízo à administração.
Para a configuração do delito em exame é imprescindível a presença do
funcionário público, ou seja, que este tome ciência da conduta desres-
peitosa no momento de sua prática.
► Resistência. Art. 329, do Código Penal - Também denomi-
nada resistência ativa pelo fato de o agente opor-se ao cumprimento
de ato legal mediante o emprego de violência ou ameaça. A violência
deve ocorrer durante a prática do ato legal com a finalidade de impedir
sua execução. Caso seja praticada em momento anterior ou posterior
à execução do referido ato legal, a conduta poderá configurar-se como
outro delito, tal como lesão corporal (CAPEZ, Fernando CAPEZ. Curso
de Direito Penal. v.3. 8.ed. São Paulo: Saraiva: 2010, p 545). Caso a
violência seja praticada contra a coisa, não há que se falar no delito
em exame, mas na figura típica de dano qualificado (art.163, parágrafo
único, III, do Código Penal).
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

Questão interessante a ser enfrentada diz respeito à prática do


delito de resistência em seguida ao delito de roubo podendo ensejar a
incidência do concurso de crimes. Para fins de esclarecimentos sobre o
tema, analisemos as duas situações hipotéticas e consectários:
1ª situação: a violência é empregada contra o agente público
após a consumação do roubo – neste caso haverá concurso de crimes
entre a figura do roubo próprio (art.157, caput, CP) e o delito de resis-
tência.
2ª situação: o agente subtrai a res e, em seguida, emprega
violência ou grave ameaça contra policial a fim de evitar sua prisão em
flagrante. Neste caso, a violência ou grave ameaça integram a figura
típica do roubo impróprio (art.157, §1º, CP). (Neste sentido Fernando
Capez, op. cit. p 549).
Ainda, assevera Guilherme de Souza Nucci que “a violência
para assegurar a posse da coisa é uma, não se podendo confundir com
a outra, usada para afastar o funcionário público do exercício de sua
função, ainda que no mesmo contexto” (op.cit, p. 1025)
► Desobediência. Art.330, do Código Penal – Também é de-

94
nominado de resistência passiva. Trata-se de delito formal que se con-
suma no momento em que o agente desobedece ou infringe ordem le-
gal endereçada diretamente a ele, independentemente da ocorrência de
efetivo prejuízo à administração. Para sua caracterização, é essencial
que haja o descumprimento de ordem legal por quem tem, diretamente,
o dever legal de cumpri-la.
► Desacato. Art. 331, do Código Penal - Esta figura típica con-
templa como objetos materiais o funcionário público e sua honra. Sig-
nifica dizer que a expressão “desacatar” compreende as condutas de
menosprezar, desrespeitar ou humilhar o funcionário público no exer-
cício de sua função ou em razão dela. Trata-se de delito formal que
se consuma no momento em que o agente desacata o agente público,
independentemente da ocorrência de efetivo prejuízo à administração.
No caso dos delitos de difamação e injúria, estes serão absorvidos pelo
delito de desacato. Por outro lado, no caso de calúnia, caso o desacato
constitua uma calúnia, restará caracterizado o concurso formal imper-
feito de crimes.
►Tráfico de influência. Art. 332, do Código Penal - Configu-
ra-se como tipo de ação múltipla (alternativo) podendo a conduta do
agente comportar desde a solicitação até a exigência ou recebimento
da vantagem indevida, sendo que essa expressão, não terá, necessa-
riamente, natureza econômica. O delito em análise se caracteriza por
ser delito formal, haja vista consumar-se no momento em que o agente

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


pratica qualquer um dos atos descritos na figura típica, independente-
mente a obtenção da vantagem indevida, exceto em relação à conduta
de obter, situação na qual o delito caracteriza-se como delito material.
Para Magalhães Noronha o delito configura verdadeiro este-
lionato perpetrado contra a Administração Pública, “pois o agente ilude
e frauda o pretendente ao ato ou providência governamental, alegando
um prestígio que não possui e assegurando-lhe um êxito que não está
ao seu alcance[...]” (NORONHA, Edgar Magalhães apud GRECO, Ro-
gério. Curso de Direito Penal: parte especial. v. IV, 2.ed. Niterói: Impe-
tus, p 997).
Diferencia-se do crime de estelionato porque para a caracteri-
zação do delito do art. 332, faz-se necessário o emprego de meio frau-
dulento, isto é, o agente se diz influente com determinado funcionário
quando, na realidade, não exerce nenhum prestígio e o sujeito ativo
deve tratar-se de funcionário público. No caso de não cumprimento de
quaisquer destes requisitos a conduta restará tipificada como incursa na
figura de estelionato (art.171, do Código Penal)
A figura típica contempla uma causa de aumento que tem por
fundamento o eventual desprestígio à conduta do agente público, nos
95
casos em que o agente insinua que a vantagem é também destinada
ao funcionário.
►Corrupção ativa. Art. 333, do Código Penal – Cuida-se de
delito formal, que se consuma no momento em que o agente oferece
ou promete a vantagem indevida ao funcionário público, independen-
temente do aceite por parte deste. Por não caracterizar-se como delito
bilateral em relação ao delito de corrupção passiva é plenamente possí-
vel a ocorrência simultânea ou isolada das figuras típicas de corrupção
ativa e passiva.
A figura típica contempla uma causa de aumento, prevista no
parágrafo único do art.333, do Código Penal, sendo para sua caracteri-
zação, imprescindível que o agente pratique ato de natureza ilícita, ou
seja, infringindo dever funcional.
Quando se fala no delito de corrupção, não podemos deixar
de fazer menção à conhecida “carteirada”. Para Guilherme de Souza
Nucci, a “carteirada” não configura delito de corrupção ativa, mas, no
máximo, tráfico de influência. Assevera o autor que a “carteirada” com-
preende o “ato de autoridade que, fazendo uso de sua função, exibe
seu documento funcional para conseguir algum préstimo de outra au-
toridade ou funcionário público” (NUCCI, Guilherme de Souza. Material
Didático).
De forma diversa, há entendimentos no sentido de que a “car-
teirada” configura delito de abuso de autoridade previsto no art.4º, h,
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

da Lei n. 4898/1965 (Lei de Abuso de Autoridade). Nesse sentido, te-


mos entendimento do STJ, no julgamento do AgRg no Ag 5.749/SP,
Sexta Turma, Rel. Min. José Cândido de Carvalho Filho, julgado em
04.12.1990
►Contrabando e descaminho – Art. 334 e 334-A do CP - Nesta
figura típica o legislador rompeu com a teoria unitária do concurso de
pessoas na medida em que optou por tipificar de forma autônoma, no
art. 318 do Código Penal, a conduta do agente que, na verdade, realiza
conduta acessória ao delito de contrabando e descaminho.

A expressão descaminho, compreende “toda fraude empregada para ilu-


dir, total ou parcialmente, o pagamento de impostos de importação, expor-
tação ou consumo (cobrável na própria aduaneira antes do desembaraço
das mercadorias importadas)”. Atualmente, com a alteração trazida pela Lei
13.008/2014, o referido delito tem previsão no art. 334 do CP.
Já a expressão contrabando compreende toda a “importação ou exportação
cujo ingresso ou saída do País seja absoluta ou relativamente proibida”(PRA-
DO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. v.3.6.ed. São Paulo: Re-
vista dos Tribunais, 2010, p.448-449). Atualmente, com a alteração trazida
pela Lei 13.008/2014, o referido delito encontra-se previsto no art. 334-A do

96
CP. Trata-se, para esse caso, de novatio legis in pejus, uma vez que a pena
prevista atualmente passa a ser de 2 a 5 anos e não mais de 1 a 4 anos, pena
essa que agora é somente para o crime descaminho.
Pelo fato de serem delitos formais e plurissubsistentes, admitem a modali-
dade tentada.
A competência para processo e julgamento dos crimes em questão, conso-
ante o enunciado de Súmula n. 151, do Superior Tribunal de Justiça, define-
-se pela prevenção do Juízo Federal do lugar da apreensão dos bens.
Vale lembrar que com a referida modificação legal, a regra relativa à incidên-
cia do princípio da insignificância é válida somente para o crime de descami-
nho, previsto no art. 334 do CP. Caso o valor das mercadorias não ultrapasse
R$ 10.000,00 e preenchidos os demais requisitos, haverá a aplicação do
princípio da insignificância.
Esse entendimento ocorre em virtude da interpretação dada ao disposto no
art. 20 da Lei nº 10.522/02, que estabelece o arquivamento dos autos de exe-
cuções fiscais, sem baixa na distribuição, dos débitos inscritos como Dívida
Ativa da União, de valor consolidado igual ou inferior a dez mil reais, sendo
esse o entendimento amplamente majoritário nos Tribunais Superiores.

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

97
QUESTÕES DE CONCURSOS

QUESTÃO 1
Ano: 2012 Banca: TJ-SC Órgão: TJ-SC Prova: Titular de Serviços
de Notas e de Registros - Provimento
Não constitui crime contra a dignidade sexual:
a) Exploração sexual de vulnerável.
b) Rapto violento ou mediante fraude.
c) Violência sexual mediante fraude.
d) Estupro de vulnerável.
e) Favorecimento à prostituição.

QUESTÃO 2
Ano: 2018 Banca: CONSULPLAN Órgão: TJ-MG Prova: Juiz de Direito
Substituto
MA, preocupada com o desempenho escolar insatisfatório de sua fi-
lha AL, de 13 (treze) anos de idade, pediu ao vizinho V, de 19 (deze-
nove) anos de idade, universitário, para ministrar aulas particulares
para AL. Ao fazer o pedido, MA mencionou para V a idade de AL e
as dificuldades que ela enfrentava com a disciplina de matemática.
Na data combinada, V foi à residência de AL e foi por esta recebido e
conduzido até seu quarto. MA, estava na sala de TV, que fica ao lado
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

do quarto de AL, de modo que pôde ouvir com clareza o inteiro teor da
conversa travada entre V e AL. Depois de alguma conversa entre eles,
AL convidou V para “ficarem”. V ficou indeciso inicialmente, mas AL
insistiu e afirmou que não haveria problema algum, porque sua mãe
MA estava na sala entretida com a novela e não os interromperia. De-
pois da insistência por parte de AL, V concordou com a proposta e
acabaram mantendo relação sexual. MA, que ouviu toda a conversa,
achou melhor não interferir e continuou a assistir à novela. Diante
dessa situação hipotética, assinale a alternativa que contém a solu-
ção jurídica correta para o caso.
a) Somente V responde pelo crime de estupro de vulnerável.
b) V e MA respondem pelo crime de estupro de vulnerável, em coautoria.
c) V e MA respondem pelo crime de estupro de vulnerável, V na modalida-
de comissiva e MA na modalidade omissiva.
d) V e MA respondem pelo crime de estupro de vulnerável, V na modalida-
de comissiva e MA na modalidade omissiva, sendo aplicada à MA a causa
de aumento de pena prevista no artigo 226, II, do Código Penal (condição
de ascendente).

98
QUESTÃO 3
Ano: 2018 Banca: CESPE Órgão: TJ-CE Prova: Juiz Substituto
Considerando a jurisprudência dos tribunais superiores acerca
dos crimes contra a dignidade sexual, julgue os seguintes itens.
I Ato sexual praticado por maior de idade com menor de quatorze
anos de idade não configura estupro de vulnerável se tiver havido
consentimento da parte menor.
II Toques e apalpações fugazes nos seios e na genitália da vítima
são atitudes insuficientes para configurar o tipo de estupro de vul-
nerável.
III O trauma psicológico sofrido pela vítima de estupro de vulne-
rável é justificativa para a exasperação da pena-base imposta ao
agente da conduta delituosa.
Assinale a opção correta.
a) Nenhum item está certo.
b) Apenas o item II está certo.
c) Apenas o item III está certo.
d) Apenas os itens I e II estão certos.
e) Apenas os itens I e III estão certos.

QUESTÃO 4
Ano: 2018 Banca: VUNESP Órgão: PC-SP Prova: Escrivão de Polí-
cia Civil. Tendo em conta os crimes contra a dignidade sexual (ar-

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


tigos 213 a 234-B do Código Penal) e os crimes contra a fé pública
(artigos 289 a 311 do Código Penal), assinale a alternativa correta.
a) Ocultar documento público ou particular verdadeiro, em prejuízo
alheio, não configura o crime de supressão de documento (art. 305 do
CP), sendo típicas apenas as condutas de suprimir e destruir documen-
to público ou particular verdadeiro.
b) O cartão de crédito ou débito, para fins penais, é equiparado a docu-
mento particular.
c) A conduta de manter estabelecimento em que ocorra exploração se-
xual é atípica, desde que não envolva menor de 18 (dezoito) anos.
d) A conduta de atrair alguém à prostituição é atípica, desde que não se
trate de pessoa menor de 18 (dezoito) anos.
e) Os crimes de falso reconhecimento de firma ou letra (art. 300 do CP);
certidão ou atestado ideologicamente falso (art. 301 do CP) e falsidade
material de atestado ou certidão (art. 301, parágrafo 1° do CP) são pró-
prios de funcionários públicos.

99
QUESTÃO 5
Ano: 2018 Banca: MPE-BA Órgão: MPE-BA Prova: Promotor de
Justiça Substituto - Anulada
Assinale a alternativa correta.
a) A assertiva de que ninguém pode ser punido pelo que pensa ou pelo
modo de viver reflete o princípio da exteriorização do fato em direito
penal.
b)Na hipótese de estupro de pessoa maior de idade e que não seja vul-
nerável, mas com violência de que resulte lesão corporal grave, haverá
litisconsórcio facultativo entre o Ministério Público e o ofendido.
c) A derrogação é a revogação total da lei por enunciação expressa ou
tácita da nova lei ao regular o mesmo fato.
d) A caracterização do delito de falsidade ideológica se contenta com a
potencialidade de dano e imitação da verdade.
e) O crime progressivo e a progressão criminosa se identificam uma
vez que se dão ao mesmo tempo e no mesmo momento, ou seja, se
desdobram em dois atos.

TREINO DISSERTATIVO

No dia 06 de março de 2017, após a representação feita pela vítima,


CAIO foi denunciado pelo Ministério Público como incurso nas penas do
artigo 213 do Código Penal, em razão de ter apalpado publicamente, e
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

por cima da roupa, os seios de uma mulher.


A sentença monocrática, por entender que não houve violência, desclas-
sificou a conduta praticada por CAIO para contravenção penal, prevista
no artigo 65 do Decreto-Lei 3.688/41 (Lei das Contravenções Penais).
O parquet recorreu da decisão e pleiteou o enquadramento da conduta
de CAIO no crime previsto no artigo 215-A do Código Penal, acrescen-
tado recentemente pela Lei 13.718, de 24 de setembro de 2018.
Diante dos fatos narrados, o recurso do Ministério Público merece aco-
lhimento? Fundamente a sua resposta.

TREINO INÉDITO

O crime de estupro de vulnerável, previsto no art. 217-A, do Código


Penal, prevê a pena de oito a quinze anos de reclusão para aquele que
tiver conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de
catorze anos. De acordo com o entendimento sumulado pelo Superior
Tribunal de Justiça, bem como pelo que estabelece recente alteração
na legislação:

100
a existência de relacionamento amoroso da vítima com o agente é hipó-
tese de excludente de ilicitude do crime.
o consentimento da vítima para a prática do ato afasta o caráter delitivo
do crime, e constitui uma exclusão de ilicitude.
a experiência sexual anterior da vítima é imprescindível para a tipifica-
ção do delito.
incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput do
art. 217-A com alguém que, por enfermidade, não tem o necessário dis-
cernimento para a prática do ato.
o referido crime não é considerado hediondo.

NA MÍDIA
Saiba mais
Filme sobre o assunto: Paulina
Acesse o link:
http://www.criminal.mppr.mp.br/arquivos/File/Estudo_Lei_13718_2018_
Mudancas_nos_Crimes_Sexuais_versao_final_2.pdf

NA PRÁTICA

Professor espanhol que mora no Brasil há 20 anos, autor de atentados


terroristas na Espanha, tem sua identidade descoberta. O espanhol en-
trou no Brasil com documentos falsos e, ao ser questionado pela Polícia

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


Federal, apresenta seus documentos falsos. Há crime de uso de docu-
mento falso mesmo que o policial já soubesse se tratar de documento
falso?
Sim, porque o crime de falso é delito de perigo abstrato e, por mais que
não tivesse aptidão para enganar aquele policial específico, teria apti-
dão para enganar outros que não soubessem anteriormente da falsida-
de. E se ele não apresentasse os documentos, mas apenas dissesse
que estão em seu bolso? Nesse caso, seria possível também entender
que tem crime de uso de documento falso, pois o espanhol se reportou
aos documentos falsos, por mais que não tenha apresentado eles em
mãos ao policial.

NA MÍDIA

Procuradoria-Geral da República enviou nesta quarta-feira (29/05/2019)


ao Supremo Tribunal Federal (STF) uma denúncia contra o senador Fer-
nando Collor de Mello (Pros/AL) pelo crime de peculato. O parlamentar
licenciado é acusado de atuar para que a BR Distribuidora firmasse
contratos com a empresa Laginha Agro Industrial, de propriedade do
101
também alagoano João Lyra, com quem, segundo a acusação, Collor
mantém relações políticas, de amizade e familiares.
Fonte: Metrópoles
Disponível em: <https://www.metropoles.com/brasil/politica-br/raquel-
-dodge-denuncia-fernando-collor-de-mello-por-peculato>
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

102
GABARITOS

CAPÍTULO 01

QUESTÕES DE CONCURSOS

01 02 03 04 05
A C B C B

QUESTÃO DISSERTATIVA – DISSERTANDO A UNIDADE – PADRÃO


DE RESPOSTA

A questão versa sobre um acórdão do STJ


Processo: HC 228998 / MG, HABEAS CORPUS 2011/0307548-5 Rela-
tor(a): Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE (1150) Órgão Julgador: T5
- QUINTA TURMA Data do Julgamento: 23/10/2012 Data da Publicação/
Fonte: DJe 30/10/2012, RT vol. 928 p. 7273.
Os fatos descritos na denúncia são claros e determinados, podendo ca-
racterizar, em tese, o crime de homicídio culposo por inobservância de
regra técnica, não prosperando a alegação de ocorrência de “aborto cul-
poso provocado por terceiro” ou de crime impossível em razão do bebê
ter sido retirado do ventre materno sem vida, pois consta dos autos que

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


a mãe já havia entrado em trabalho de parto há mais de oito horas e os
batimentos cardíacos foram monitorados por todo esse período até não
mais serem escutados. 4. Iniciado o trabalho de parto, não há falar mais
em aborto, mas em homicídio ou infanticídio, conforme o caso, pois não
se mostra necessário que o nascituro tenha respirado para configurar o
crime de homicídio, notadamente quando existem nos autos outros ele-
mentos para demonstrar a vida do ser nascente, razão pela qual não se
vislumbra a existência do alegado constrangimento ilegal que justifique
o encerramento prematuro da persecução penal.

TREINO INÉDITO
Gabarito: B

103
CAPÍTULO 02

QUESTÕES DE CONCURSOS

01 02 03 04 05
B C E A A

QUESTÃO DISSERTATIVA – DISSERTANDO A UNIDADE – PADRÃO


DE RESPOSTA

HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. APROPRIAÇÃO


INDÉBITA. DEPÓSITO PARA PAGAMENTO DE EMPRESA VENCEDO-
RA EM DEMANDA JUDICIAL. LEVANTAMENTO PELO ADVOGADO
DE VALOR PERTENCENTE À MASSA FALIDA. HONORÁRIOS ADVO-
CATÍCIOS FIXADOS NA SENTENÇA. TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL
PRIVILEGIADO NA FALÊNCIA. JUSTA CAUSA PARA INSTAURAÇÃO
DE INQUÉRITO POLICIAL.
Advogado que levantou quantia resultante de êxito em demanda judi-
cial, depositada para o pagamento de sua constituinte, sob a alegação
de que o valor, correspondente a 10% (dez) por cento do total da con-
denação, equivale aos honorários advocatícios
. O paciente tinha em mãos um título executivo privilegiado na falência
--- a sentença condenatória --- que lhe assegurava honorários advocatí-
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

cios de 10% (dez por cento) do valor apurado em liquidação. Incumbia-


-lhe habilitar-se no Juízo Universal da Falência, nos termos do disposto
no artigo 24 do Estatuto da Advocacia, e não levantar, por conta própria,
o montante correspondente à primeira parcela depositada para o paga-
mento da empresa.
Conduta que poderá vir a ser enquadrada, em tese, tanto no tipo penal
correspondente à apropriação indébita (art. 168 do CP), quanto no ati-
nente ao exercício arbitrário das próprias razões (art. 345 do CP).
Presença de justa causa para instauração do inquérito policial. Ordem
denegada

TREINO INÉDITO
Gabarito: A

104
CAPÍTULO 03

QUESTÕES DE CONCURSOS

01 02 03 04 05
B C C B D

QUESTÃO DISSERTATIVA – DISSERTANDO A UNIDADE – PADRÃO


DE RESPOSTA

Em seu voto, a relatora destacou que, segundo a jurisprudência do STJ,


a controvérsia relativa à inadequada desclassificação para a contraven-
ção penal prevista no artigo 65 do Decreto-Lei 3.688/41 prescinde do
reexame de provas, sendo suficiente a revaloração de fatos incontrover-
sos explicitados no acórdão recorrido.
Além disso, a relatora ressaltou que, apesar de reprovável, a conduta
do réu não pode ser igualada ao crime de estupro, que requer o uso da
violência ou de grave ameaça.
Para Laurita Vaz, o caso analisado se enquadra na situação descrita
pelo recém-criado artigo 215-A do Código Penal, que tipificou o crime
de importunação sexual.
Seguindo o voto da relatora, considerando a superveniência de lei penal
mais benéfica ao réu, a turma readequou a classificação do tipo penal

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS


e fixou a condenação em um ano e dois meses de reclusão, em regime
inicial semiaberto.

TREINO INÉDITO
Gabarito: D

105
CUNHA, Rogério Sanches e outros. Comentários à Reforma Criminal
de 2009 e à Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro.v.2. 8 ed. rev.,
atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.
______ Curso de Direito Penal Brasileiro.v.3. 6 ed. rev., atual. e ampl.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.
BATISTA, Weber Martins.O Furto e o Roubo no Direito e no Processo
Penal. São Paulo: Forense, 1997.
CAPANO, Evandro Fabiani. Dignidade Sexual. Comentários aos no-
vos crimes do Título VI do Código Penal (art. 213 a 234-B) alterados
pela Lei n.12015/2009. São Paulo: Revista dos Tribunais,2009.
Nucci, Guilherme de Souza. Curso de Direito Penal: parte especial:
arts. 121 a 212 do Código Penal / Guilherme de Souza Nucci. – 3. ed.
– Rio de Janeiro: Forense, 2019.
Direito penal esquematizado – parte geral / André Estefam; Victor
Eduardo Rios Gonçalves. – Coleção esquematizado / coordenador Pe-
dro Lenza - 9. ed. – São Paulo : Saraiva Educação, 2020.
SARMENTO, Daniel e PIOVESAN, Flávia. Nos Limites da Vida - Abor-
to, Clonagem Humana e Eutanásia Sob a Perspectiva dos Direitos
Humanos. Rio de Janeiro: Lúmen Júris.
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

106
107
INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL E AO PROCESSO PENAL - GRUPO PROMINAS

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