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Processo : 2018.01.1.017261-9
Classe : AÇÃO PENAL
Autor : MINISTÉRIO PÚBLICO DO DF E TERRITÓRIOS
Réu : ROBERTO DE FIGUEIREDO CALDAS
SENTENÇA
Vistos, etc.
O Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor de ROBERTO
DE FIGUEIREDO CALDAS, qualificado nos autos, atribuindo-lhe a
autoria da contravenção penal tipificada no art. 21 do Decreto-lei nº
3.688/41, por duas vezes e dos crimes previstos no art. 147, caput,
e no art. 146, caput, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal, todos em
situação de violência doméstica e familiar contra a mulher, assim
descrevendo a conduta delituosa:
1º Fato:
No dia 23 de outubro de 2017, por volta de 10h, na SHIS QL 26,
Conjunto 7, Casa 19, Lago Sul, Brasília/DF, o denunciado,
voluntariamente, praticou vias de fato contra sua companheira
MICHELLA MARYS SANTANA PEREIRA.
O denunciado, seguidamente, empurrou a vítima, arrastou-a e a
puxou pelos cabelos, derrubando-a no chão mais de uma vez.
2º Fato:
Na mesma ocasião, o denunciado, voluntariamente, praticou vias de
fato contra sua funcionária GISELLE RESIO GUIMARÃES.
O denunciado deu uma pancada na perna da vítima GISELLE,
quando ela tentou intervir nas agressões dele contra a vítima
MICHELLA, para afastar a ação defensiva de GISELLE.
3º Fato:
Ainda na mesma ocasião, o denunciado, voluntariamente, visando
afetar a tranquilidade psíquica da vítima, ameaçou, por palavras e
gestos, causar mal injusto e grave à sua companheira MICHELLA
MARYS SANTANA PEREIRA.
Após as primeiras agressões contra a vítima, o denunciado disse
para a ela, aproximadamente o seguinte: "EU VOU NA COZINHA
PEGAR UMA FACA E VOU MATAR" e, para intimidar ainda mais a
vítima, de fato, se dirigiu a cozinha.
4º Fato:
Antes dos fatos acima relatados, o denunciado, consciente e
voluntariamente, tentou constranger a vítima MICHELLA, mediante
grave ameaça, a fazer o que a lei não manda.
O denunciado telefonou para a pessoa ELIENE LIMA DA SILVA, que
trabalhava como cozinheira no local e disse aproximadamente o
seguinte: "DONA ELIENE, SUBA E DIGA A DONA MICHELLA QUE
ATENDA O TELEFONE SENÃO EU VOU ENXOTAR ELA DE CASA".
Esse crime não se consumou, pois, a vítima resistiu à ameaça e não
atendeu o telefone.
quem iria acreditar nela e que iriam dizer que a declarante se bateu.
Narrou que sua pior ferida era não ser acreditada. (30:35)
questionada sobre o motivo dos fatos terem ocorrido em outubro de
2017 e de ter ido a delegacia apenas em abril de 2018, a declarante
respondeu que tinha medo, que gostava dele, sentia culpa como
mulher, pois quando a mulher passa por isso o homem reverte e faz
com que a mulher se sinta culpada por tudo que ele faz. Disse que
se sentia culpada por tudo que acontecia; (31:05) disse que a
psicóloga a ajudou muito nesses seis anos que foi nela e porque
ROBERTO também tinha ido nessa psicóloga e contou para ela
porque era agressivo e de outras agressões que ele tinha sofrido no
passado dele; (...) (34:38) relatou que estava fragilizada demais
para pensar racionalmente e não via perspectiva no seu futuro, pois
quando brigavam, ROBERTO dizia para irem na delegacia e que
ninguém iria acreditar na declarante prestar queixa, e também dizia
que a declarante iria ficar na sarjeta, na lama e que iria tirar os filhos
da declarante. Relatou que atualmente ROBERTO está cumprindo
tudo que disse, que ROBERTO inclusive pediu medida protetiva para
que a declarante não chegasse perto dos filhos. Reiterou que tudo
que ele ameaçou fazer durante o casamento se a declarante abrisse
a boca, ROBERTO está fazendo e a declarante está sofrendo. Disse
que se não tivesse filhos teria fugido, pois está pagando um preço
muito alto por ter denunciado ele e, por isso, o medo de denunciar
ROBERTO, sendo a maior ferida da declarante ser desacreditada;
(35:56) Esclareceu que quando estavam na psicóloga ELIENE
estava histérica e gritando, por estar muito nervosa, pois ELIENE é
que foi pegar um pau para bater em ROBERTO quando ele foi pegar
a faca. Esclareceu que pelo que as funcionárias disseram, Roberto
chegou a ir até a gaveta, mas como NEUMA e GISELA foram atrás
dele, parece que ROBERTO não pegou a faca, esclarecendo que
como ELIENE ouviu que ROBERTO ia pegar a faca e chegou próximo
a gaveta das facas, ELIENE pegou um pedaço de lenha para dar
nele se ele viesse com a faca, sendo que por isso ELIENE estava
mais nervosa que as outras funcionárias. (36:48) Relatou que
ELIENE fugiu por ter muito medo de ROBERTO; (...) (39:09) disse
que quando questionada pela psicóloga se tinha força para ir à
delegacia, a declarante não sabia se tinha força para separar dele,
pois gostava dele e foi muito apaixonada por ROBERTO e se culpava
porque, mesmo sofrendo, era apaixonada por ele, tendo muita
vergonha de ser julgada e ser chamada de mulher de bandido,
apanha por que gosta, pois ouviu muitas vezes que se o marido
bateu e a mulher continua é porque gosta de apanhar. Narrou que
não tinha força para separar e a própria psicóloga disse que achava
que a declarante não iria suportar ir na delegacia, pois, na época
estava com uma depressão muito séria e 45 quilos mais gorda.
Disse que na época quase não saia do quarto, que estava a base de
medicamente e que dormia quase 14 horas por dia; (40:15) relatou
que a psicóloga falou que se a declarante ainda não tinha força para
denunciar, pelo menos pedisse para as funcionárias que estavam
com ela lá e escrevessem o que elas viram e reconhecesse firma;
(...) (41:47) relatou que saíram de carro sem rumo e quando a
declarante ligou para a amiga MARIA DA GRAÇA e contou que
ROBERTO tinha colocado a declarante para fora de casa, que não
sabia o que fazer e que ELIANE tinha sugerido o reconhecimento de
firma em cartório, MARIA DA GRAÇA disse para a declarante
consultar um advogado. Narrou que a própria MARIA DA GRAÇA
ligou para a advogada CARLA LOBO e depois ligou para a
declarante falando que, ao invés do reconhecimento de firma
deveria ser feita uma ata notarial para que tivesse fé pública, por ser
feita na frente de um tabelião. MARIA DA GRAÇA disse ainda que
CARLA estava esperando a declarante no escritório dela com as
funcionárias NALVINA, ELIENE e GISELE; (43:19) esclareceu que
embora NALVINA não estivesse presente na ocasião dos fatos, foi
NALVINA que acolheu a mãe da declarante quando ROBERTO
colocou a mãe da declarante para fora de casa, GISELE ligou para
NALVINA para que ela também fosse para falar de outros fatos e
não desse dia especifico. (43:40) relatou que chegando na
advogada CARLA, por coincidência, tinha amiga de Carla que era
tabeliã no Maranhão, chamada ALICE e, depois de conversarem,
advogada disse que parecia que a declarante ainda gostava de
ROBERTO, ou talvez estivesse fragilizada emocionalmente,
alertando-a que se a declarante fosse a delegacia iria ser notícia
mundial, pois ROBERTO era o maior exemplo defesa de direitos
humanos e que essa notícia poderia vazar. (...) (45:02) relatou que
quando estavam indo ao cartório e Roberto passou a enviar
mensagens para Giselle para saberem onde estavam, pois acha que
Luana pode ter avisado para Neuma que a declarante queria leva-la
no cartório e Neuma ter avisado a ele. (45:15) Esclareceu que,
através de mensagens, pensando que a dec
larante estava no Cartório, ROBERTO passou a lhe amansar dizendo
para a declarante voltar para casa para conversarem e perguntando
se a declarante estava no cartório ou na delegacia, tendo a
advogada Carla dito que ele devia estar preocupado por ter batido
na declarante e quase a matado e, por isso, ele podia estar achando
que a declarante iria a uma delegacia; (45:48) esclareceu que foram
no cartório para preservar a prova, mas que, como em todas as
brigas que tiveram, sempre quando ele "coisava" (fazendo gesto de
surra) depois vinha (fazendo gesto de alisar) e a declarante cedia,
sentindo-se culpada porque cedia; (46:11) disse que com essas
coisas da separação, ROBERTO tentou camuflar uma volta para
tentar segurar a declarante para que não falasse, mas que não
voltaram a se relacionar; (...) (47:28) confirmou que ficaram
separados até a data da ocorrência policial, em 13.04.2018, mas que
Roberto sempre ameaçava a declarante dizendo que ela tinha que
sair da casa, que ROBERTO mandava advogados e, depois,
mediadora dizendo que a guarda dos filhos ficaria para e que isso
mexia com a declarante, pois ROBERTO sempre fazia ameaças que,
se separassem, ROBERTO ficaria com os filhos e que era melhor a
declarante aceitar a separação amigavelmente. (...) (48:43) Relatou
que sua advogada no cível, então, a convenceu de ir à delegacia
após esclarecer para a declarante que a agressão não era só física e
que ROBERTO já a estava xingando, pelo whatsapp, de bandida,
interesseira e queria que a declarante saísse da casa. Narrou que
tinha áudios que nem se recordava, tendo se lembrado na delegacia
dos áudios relativos ao trabalho que fazia com a psicóloga. (49:19)
mostradas as fotografias de fls. 83/86, esclareceu que essas fotos
se refere as fotos da declarante tiradas pela amiga ADRIANA.
(50:00) mostrada as fotografias com laudos perícias de áudios, as
fls. 1026/1158, esclareceu que os áudios foram periciados por um
pessoal da polícia federal que estão aposentados; (...) (51:40)
esclareceu que sua maior ferida era, além de sofrer tudo que sofreu,
ser desacreditada, pois ROBERTO sempre dizia "quem vai acreditar
em você?"; (...) (01:03:39) questionada sobre as consequências
sofridas afirmou que não consegue se livrar da culpa, que não se
acha merecedora de nada e que, inclusive teve pensamentos
suicidas; (01:04:31) Disse que depois de separar emagreceu 45
quilos e está resgatando sua alma, mas acha que nunca mais
poderá ser uma mulher por inteiro, continuando a fazer tratamento
psicológico; (...).
De se notar que, em todas as oportunidades em que indagada
acerca dos fatos, a vítima apresentou versão coerente e coesa,
estando as declarações de Michella, em Juízo, em harmonia com as
informações por ela prestadas no cartório extrajudicial e no
inquérito policial.
Ressalte-se, outrossim, que as declarações da vítima, em delitos
que envolvem violência doméstica e familiar contra a mulher,
possuem especial relevância, mormente quando verossímeis e
coerentes com as demais provas produzidas, como é o caso dos
autos. Aliás, nesse sentido, pacífico é o entendimento do e. TJDFT,
conforme se vê no seguinte julgado:
PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. AMEAÇA.
CRIME FORMAL. DEPOIMENTO DA VÍTIMA COERENTE E
DETALHADO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Em situações de violência
doméstica e familiar, a palavra da vítima tem especial relevância,
notadamente quando apresenta os fatos de forma firme e coerente.
2. Condicionar, de forma irrestrita, a validade do depoimento da
vítima a outros elementos probatórios afasta toda a proteção à
mulher que a Lei Maria da Penha busca conferir, especialmente
quando inexistem quaisquer testemunhas, como na maioria dos
casos de violência doméstica e familiar praticada contra a mulher. 3.
Recurso conhecido e desprovido. (Acórdão 1258151,
00072521020188070016, Relator: SEBASTIÃO COELHO, 3ª Turma
Criminal, data de julgamento: 18/6/2020, publicado no PJe:
30/6/2020. Pág.: Sem Página Cadastrada.)
ando "enganar ROBERTO e tirar dinheiro dele"; que por essa razão a
declarante solicitou uma reunião com MICHELLA e ROBERTO no dia
23.10.2017; (...) que no dia 23.10.2018 MICHELLA acusou a
declarante de estar mostrando suas contas pessoais para
ROBERTO, que a declarante disse que não estava mostrando
nenhuma conta de MICHELLA para ROBERTO, que então MICHELLA
deixou a declarante em seu closet e pediu que ela encontrasse
referidas contas; (...) que ROBERTO pegou a declarante chorando
no closet porque estava muito sensível; que nesse dia MICHELLA
não humilhou nem ameaçou ou agrediu a declarante, apenas
questionando a declarante se ela sabia de alguma coisa contra
ROBERTO; que a declarante viu quando ROBERTO puxou
MICHELLA pelo braço e começaram uma discussão; que a
declarante entrou no meio de ambos e pediu que eles parassem;
que MICHELLA começou a ir para cima de ROBERTO tentando
provoca-lo, e a declarante ficou no meio de ambos tentando
apaziguar a situação; que em nenhum momento ROBERTO puxou
MICHELLA pela escada; que os três foram descer as escadas; que a
declarante estava descendo as escadas entre o casal; que já no
último degrau MICHELLA tropeçou e caiu, momento em que a
declarante a levantou junto com GISELE; que a declarante ouviu
ROBERTO dizer durante a discussão "QUE MICHELLA ERA
BANDIDA; QUE ELA AGIU IGUAL BANDIDO; QUE ELA MANIPULAVA
AS PESSOAS"; que a declarante não ouviu ROBERTO dizer que ia
pegar uma faca para matar MICHELLA e não viu GISELE intervir na
referida situação; que a declarante afirma que nesse momento não
presenciou empurrões ou socos; que por diversas vezes durante a
discussão GISELE saia e voltava; entretanto a declarante ficou perto
de ROBERTO e MICHELLA o tempo todo; que a declarante não
presenciou ROBERTO bater em MICHELLA em nenhum momento;
que a declarante não presenciou nenhuma ameaça; que a
declarante apenas recorda de ter visto ROBERTO empurrar
MICHELLA próximo ao elevador da residência, mandando ela sair de
perto dele; (...) que a declarante nunca presenciou MICHELLA com
lesões aparentes a não ser por tratamentos estéticos; (...)
"(...) (00:35) afirmou que até o dia dos fatos não conhecia
MICHELLA, tendo passado a conhecê-la após os fatos quando
identificaram algumas pessoas de amizade comum. Afirmou que
agora conhece MICHELLA, mas não tem amizade; (01:24)
confirmou que prestou declarações na DEAM e que suas
declarações correspondem a verdade; (01:43) Confirmou que
acompanhou a vítima e algumas pessoas até o cartório,
esclarecendo que estava almoçando com CARLA em um
restaurante no lago sul quando CARLA recebeu o telefonema de
uma amiga pedindo que ela atendesse uma pessoa como cliente e
que era emergência, tendo CARLA dito que não poderia terminar o
almoço e como a declarante estava de carona com CARLA foram
para o escritório de CARLA. Afirmou que quando chegaram no
escritório chegaram junto com um carro onde tinha várias mulheres
e essas mulheres estavam chorando bastante e como entrou no
escritório junto com elas não tinha como não ouvir o que tinha
acontecido. (02:58) Narrou que uma das mulheres estava um pouco
machucada e que uma outra passou mal, tendo até sido um
remédio para essa mulher. Relatou que CARLA estava conversando
com MICHELLA e a orientando, pois MICHELLA queria ir na
delegacia imediatamente, mas CARLA disse que se fossem na
delegacia o marido de MICHELLA poderia ser preso e isso poderia
ser ruim para MICHELLA e para os filhos. Disse que CARLA também
disse que seria bom preservar as provas e, como essa questão de
preservar as provas, CARLA perguntou se a declarante poderia
acompanha-las ao cartório, tendo a declarante concordado. (04:11)
A declarante afirmou que, em razão de sua profissão, sabia que
para preservar as provas seria interessante pois a coisa tinha
acabado de acontecer e, por isso, as pessoas acabam lembrando
de fatos e situações que seriam relatados e comprovados na hora.
(04:33) relatou que as acompanhou até o Cartório JK. (04:35)
afirmou que MICHELLA estava machucada, mas tinha uma outra
mulher reclamando de dor no dedo e no pé, pois teria se envolvido
na confusão da briga de marido e mulher. Ressaltou que não estava
presente na briga de marido e mulher, mas que presenciou o relato
dessas mulheres. Afirmou que também tinha uma outra mulher, a
cozinheira, que estava passando mal e teve que tomar um calmante.
Relatou que havia 04 mulheres, MICHELLA, a cozinheira, a
motorista e uma outra que usava óculos. (05:35) Afirmou que todas
as mulheres eram unânimes de que tinha acabado de acontecer um
fato na casa de MICHELLA e que esse fato era uma briga da
MICHELLA com o marido; (...) (07:22) afirmou que as mulheres
comentaram que estavam com muito medo porque ROBERTO era
uma pessoa muito violenta, muito bruto, muito poderoso e que elas
tinham medo des
a. Afirmou que quando lavrou o ato das funcionárias foi que inseriu
as informações na ata das escrituras declaratórias das funcionárias.
(13:44) Afirmou que fez o ato inteiro de Michella, mas que depois
MICHELLA foi lá para fazer novas declarações, todavia ela se
arrependeu e não quis mais inserir essas declarações porque
também não daria para fazer um ato com duas pessoas fazendo, ou
seja não daria para MICHELLA fazer declarações para a depoente e
para outro funcionário, pois não tem como duas pessoas atestando
um fato; (14:16) confirmou que gravou as declarações das
empregadas pois se tratava de escrituras declaratórias; (14:22)
questionada se gravou as declarações de Michella naquele dia,
esclareceu que poderia verificar se gravou as declarações de
MICHELLA, esclarecendo que naquele dia, não colheu informações
de MICHELLA; (14:32) questionada se fez a ata notarial de Michella
no mesmo dia em que ouviu as empregadas, em 23.10.2017, no dia
em que gravou os depoimentos delas ou em data posterior, a
depoente respondeu que fez a ata notarial em momento posterior;
(14:48) questionada porque não imprimiu as declarações de
Michella reduzidas a termo naquele mesmo dia, a depoente
respondeu que só pode fazer a lavratura com a autorização do
cliente, mas mesmo estando presente e naquele dia, MICHELLA não
autorizou a lavratura do ato. (15:01) Explicou que quando alguém vai
ao cartório e diz que quer fazer um ato, a declarante faz o ato,
imprime o rascunho e pergunta se a pessoa autoriza que o ato seja
lavrado, esclarecendo que sem autorização do cliente, o ato não
pode ser lavrado pois o ato tem que ser pago e assinado; (15:20)
confirmou que o ato feito com MICHELLA ficou no computador da
depoente e quando MICHELLA retornou ao cartório para assinar o
ato, em abril, a depoente estava de licença, tendo o colega da
depoente lhe telefonado informando que MICHELLA estava no
Cartório e queria lavrar a ata notarial dela, tendo a depoente
autorizado ao colega que lavrasse o ato, desde que não existisse
nenhuma modificação. (15:40) Esclareceu que não teria problema
se MICHELLA quisesse fazer modificação nas as próprias
declarações, mas que não poderia ter nenhuma alteração nas
declarações da depoente; (...)
Com efeito, com relação à ata notarial não ter sido lavrada no
mesmo dia em que foram colhidas as declarações de Michella, dia
23.10.2017, devidamente esclarecido pela cartorária, de forma bem
didática, que a vítima só autorizou a lavratura da ata notarial em
13.04.2018, mesmo dia em que Michella registrou a ocorrência
policial contra o ora acusado.
Frise-se que, todas as vezes em que foi ouvida, Michella afirmou
que, por ocasião dos fatos, optou por se dirigir ao Cartório
Extrajudicial e não a delegacia por não se sentir preparada para se
separar do acusado, por ter receio de sua palavra ser
desacreditada, além do medo do acusado, por ele ser pessoa
poderosa. Diante disso, não se verifica qualquer estranheza de que
a vítima tenha solicitado a lavratura da ata notarial no mesmo dia em
que fez o registro da ocorrência policial, em 13.04.2018.
Com relação ao pleito da Defesa do acusado para desclassificação
para o crime de injúria real, não merece prosperar eis que
sobejamente comprovado que as agressões perpetradas pelo
acusado contra a vítima se deram com intuito claro de ofender a
integridade física da vítima e não de atingir sua honra subjetiva.
Nesse sentido, vejamos os seguintes julgados de nosso e. TJDFT:
APELAÇÃO CRIMINAL. LESÃO CORPORAL. VIOLÊNCIA
DOMÉSTICA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE.
DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE INJÚRIA REAL. NÃO
CABIMENTO. DOSIMETRIA DA PENA. ADEQUADA ANÁLISE DAS
CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. SENTENÇA MANTIDA. 1. Não cabe a
aplicação do princípio da insignificância ao delito de lesão corporal,
ainda que de natureza leve, praticado no âmbito das relações
domésticas, pois a Lei Maria da Penha tem por escopo a proteção
da dignidade humana. 2. Provado que o crime foi perpetrado com
objetivo de causar lesão física à vitima, não há como ser acolhido o
pleito de desclassificação para o delito de injúria real, o qual se
caracteriza pela agressão à honra subjetiva. 3. A fixação da pena-
base acima do valor mínimo cominado não merece censura se
devidamente valoradas quatro circunstâncias judiciais em desfavor
do réu. 4.Recurso conhecido e NÃO PROVIDO. (. (acórdão 676676,
20120111642355APR, Relator: HUMBERTO ADJUTO ULHÔA, 3ª
Turma Criminal, Data de Julgamento: 09/05/2013, Publicado no
DJE: 16/05/2013. Pág.: 125)
EMENTA
PENAL - VIOLÊNCIA DOMÉSTICA - LESÕES CORPORAIS -
ABSOLVIÇÃO - DESCLASSIFICAÇÃO - VIAS DE FATO - AUSÊNCIA
DE LAUDO - DOSIMETRIA. I. Inviável a absolvição quando provadas
as agressões pela palavra da vítima e prova testemunhal. II. O crime
de lesões corporais é delito material. Imprescindível a realização de
exame pericial. Só seria possível suprir a falta por outros elementos
de prova se os vestígios tivessem desaparecido ou não fosse
possível a realização do exame. Não é o caso dos autos.
Desclassificação operada. III. Recurso parcialmente provido. (APR:
20110610038558 DF 0003825- 79.2011.8.07.0006, Relator:
SANDRA DE SANTIS, Data de Julgamento: 06/11/2014, 1ª Turma
Criminal, Data de Publicação: Publicado no DJE : 11/11/2014 . Pág.:
93)
EMENTA
APELAÇÃO CRIMINAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA EX-
COMPANHEIRA E FILHA. VIAS DE FATO E AMEAÇA.
IMPOSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO PELO CRIME DE LESÃO
CORPORAL, EM FACE DA AUSÊNCIA DE LAUDO PERICIAL.
RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. I - A ofensa à integridade
física de ex-companheira e filha é fato que se amolda ao artigo 21
do Decreto Lei 3.688/41, combinado com o artigo 5º, inciso III, da
Lei 11.340/2006. II - Prenunciar, livre e conscientemente, mal
injusto, futuro e grave contra ex-companheira e filha, valendo-se de
relações íntimas de afeto, é fato que se amolda ao crime previsto no
artigo 147 do Código Penal c/c artigos 5º, inciso III, da Lei
11.340/06. III - É inviável a condenação por crime de lesão corporal
quando, de forma injustificada, a vítima deixa de comparecer ao
setor responsável pela perícia, a fim de aferir os vestígios do delito,
inexistindo nos autos qualquer outra prova apta a demonstrar as
lesões sofridas. IV - Recurso CONHECIDO e NÃO PROVIDO.
(Acórdão n.847824, 20131010065394APR, Relator: JOSÉ
GUILHERME , 3ª Turma Criminal, Data de Julgamento: 05/02/2015,
Publicado no DJE: 11/02/2015. Pág.: 141)
fato.
Ressalto não haver causa de isenção de pena que milite em favor do
acusado. Também não vislumbro nos autos qualquer circunstância
que exclua a ilicitude do fato ou que exclua ou diminua a
culpabilidade do acusado, pois era imputável, tinha plena
consciência do ato delituoso que praticou e era exigível que se
comportasse em conformidade com as regras do direito.
DO CRIME DE AMEAÇA
Finda a instrução criminal, em respeito às garantias constitucionais
do contraditório e da ampla defesa, em que pese o pleito
absolutório formulado pela Defesa, entendo que a denúncia merece
procedência. Senão vejamos.
Compulsando os autos, verifica-se que existem provas mais que
suficientes da materialidade e da autoria dos delitos em questão,
descrito no item 3 da peça acusatória. Os elementos produzidos
durante a fase inquisitorial foram devidamente confirmados em
Juízo, durante a instrução criminal, conforme especificado acima,
não havendo causas excludentes da ilicitude ou da culpabilidade
militando em favor do acusado.
Não bastasse isso, foram acostadas aos autos escrituras públicas
declaratórias das funcionárias Giselle Résio e Eliene afirmando que
o acusado ameaçou Michella Marys de morte para que saísse do lar
conjugal. Por essa razão, saliento de início, que não há como
acolher o pedido de absolvição formulado pela Defesa.
Com relação ao crime de ameaça, dispõe o artigo 147 do Código
Penal: "Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer
outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave".
Nesse sentido, cabe ressaltar que o crime de ameaça se caracteriza
e se consuma por meio de palavras, gestos ou qualquer outro ato
pelo qual o agente, com antecedência, prediz a sua intenção de
causar mal grave ou injusto à vítima, perturbando-lhe a
tranquilidade e atingindo a sua paz de espírito.
Acrescente-se, ainda, que basta que o mal prometido seja injusto e
grave, não exigindo a lei que corresponda a um tipo penal, apesar
de, em grande maioria dos casos, fazer-se referência a algum crime
ou contravenção. Além disso, exige-se o dolo específico que, na
espécie, constitui na vontade do agente em intimidar, incutir medo
na vítima, não sendo necessário, portanto, a verdadeira intenção de
realizar o mal prometido.
A conduta deve ser exteriorizada por meio suficiente a causar temor
à vítima, independentemente de qualquer resultado, haja vista ser
crime formal.
De se ressaltar, ademais, que a promessa de mal pode ser contra a
própria vítima, contra pessoa próxima ou até contra seus bens.
O acusado, quando da instrução do feito, ratificando as declarações
prestadas em juízo, negou ter proferido ameaça contra a
companheira e afirmou que no dia em questão, após Michella sair
de casa, foi a cozinha beber água, consoante se verifica do trecho
de suas declarações em que foi questionado sobre esse ponto,
ROBERTO afirmou o seguinte (mídia fl. 1327):
(...) (35:23) questionado sobre o terceiro fato da denúncia, se o
interrogando teria ameaçado MICHELLA falando que ia na cozinha
pegar uma faca para mata-la, tendo se dirigido a cozinha, o
interrogando negou que isso tivesse ocorrido. Afirmou que não
proferiu a palavra faca e que nunca ameaçou MICHELLA de morte.
(35:53) questionado sobre o que aconteceu depois que o
interrogando ajudou MICHELLA a se levantar, o interrogando narrou
que MICHELLA saiu calmamente. (...) (37:11) Narrou que MICHELLA
saiu e o interrogando foi na cozinha beber agua. (37:23) Afirmou
que MICHELLA saiu com GISELE. Relatou que após tomar água
voltou e abriu a porta tendo visto MICHELLA, GISELE e BENEUMA,
momento em que o interrogando chamou BENEUMA dizendo que
queria conversar com ela. Disse que MICHELLA perguntou "eu
também?" tendo o interrogando respondido "Não, MICHELLA. Vai.
Sai daqui, por favor". (…)
Em que pese a negativa de autoria, o acusado nada trouxe em seu
favor, não apresentando nenhum elemento que pudesse colocar em
xeque a solidez das declarações de Michella, especialmente
porque, embora as funcionárias do ex-casal, Eliene e Beneuma,
tenham afirmado não terem ouvido o acusado ameaçar a vítima,
como se verá em seguida, a versão do acusado contém importantes
divergências com as declarações dessas testemunhas.
Noutro giro, não há como afastar a veracidade dos relatos
apresentados pela ofendida, uma vez que se revestem de seriedade
e firmeza suficientes a ensejar um juízo de convicção quanto à
efetiva ocorrência da ameaça imputada ao acusado. Necessário
destacar a equivalência entre as declarações judiciais e aquelas
prestadas em sede policial, bem como pela farta prova dos autos.
Quando ouvida em juízo, confirmando as declarações prestadas
perante a autoridade policial, sobre as ameaças, Michella Marys
Santana Pereira afirmou que prestou as declarações já transcritas
acima, afirmando que já estava na parte de baixo da escada, depois
de ter sido agredida pelo acusado, ele a ameaçou de morte e se
dirigiu para a cozinha, tendo depois retornado e a agredido de novo.
Confira-se
e porque senão daria merda. Relatou que voltou para a cozinha, mas
desceu já não se sentindo bem; (...) (07:53) negou que tivesse
falado para MICHELLA que ROBERTO teria falado que se ela não
atendesse o telefone iria enxotar MICHELLA de casa, mas
confirmou que dá segunda vez que foi dar o recado para MICHELLA
pediu para ela atender o telefone pelo amor de Deus, pois senão
daria merda. (...) (37:30) afirmou que os fatos ocorreram no dia
23.10.2017. Esclareceu que quando ROBERTO ligou pela primeira
vez, a declarante estava na cozinha, NEUMA estava no quarto com
MICHELLA e GISELE. Afirmou que na primeira ligação ROBERTO
estava nervoso e pediu para a declarante ir até MICHELLA e pediu
para que ela atendesse o telefone. Afirmou que não ouviu discussão
dentro do quarto onde MICHELLA estava com NEUMA e GISELE.
Afirmou que quando ROBERTO ligou pela segunda vez continuava
nervoso, tendo pedido que a declarante fosse até MICHELLA para
falar para ela atender o telefone, tendo a declarante retornado a
porta do quarto de MICHELLA e pedido pelo amor de Deus que ela
atendesse o telefone, porque vai ter merda. (40:28) questionada
porque tinha ficado nervosa e achado que ia dar merda, a
declarante respondeu que foi pelo tom de voz de ROBERTO por
nunca ter visto ROBERTO com aquele tom de voz, esclarecendo
que ROBERTO não estava agressivo, mas que a voz de ROBERTO
estava alterada, tendo a declarante ficado com medo por nunca ter
visto ROBERTO com aquela voz. Esclareceu que quando bateu no
quarto de MICHELLA e deu o recado de ROBERTO, nem MICHELLA,
nem NEUMA, nem GISELE disseram nada para a declarante (...)
Como se verá a seguir, embora a testemunha Eliene, em juízo, tenha
negado que ROBERTO falou que a enxotaria de casa, ainda assim a
cozinheira afirmou ter ficado nervosa pelo alterado tom de voz de
ROBERTO, tendo dito a Michella que se não atendesse o telefone
iria dar merda.
Ao ser ouvida, em juízo, Michella declarou que estava conversando
com Beneuma no closet e Gisele entrado para arrumar o quarto,
quando Eliene, por duas vezes, foi pedir que ela atendesse o
telefonema de ROBERTO, esclarecendo que na segunda vez, Eliene
chegou no quarto chorando e se tremendo toda, pedindo que ela
atendesse o telefone, pois senão ROBERTO iria tanger a declarante
de casa. Vejamos (declarações Michella, áudio 1187):
(04:02) que estava no closet com a governanta conversando sobre
despesas e correspondências bancárias de uma conta pessoal da
declarante que estavam sumidas do Closet e que só a governanta
tinha acesso. Narrou que nesse momento GISELE entrou para
arrumar quarto e, de repente, ELIENE chega nervosa e fala para
declarante ligar rápido para ROBERTO porque ele queria falar com a
declarante naquele momento. Afirmou que não ligou para ROBERTO
porque estava conversando para saber o destino de suas
correspondências e coisas pessoais que estavam sumidas. (04:51)
Disse que, na segunda vez, ELIENE chega no quarto chorando, se
tremendo toda, com o rosto vermelho, pedindo, pelo amor de Deus
para a declarante atender o telefone, pois senão ROBERTO iria
tanger a declarante de casa; (05:02) Afirmou que, nesse momento,
pegou o telefone para gravar, pelo WhatsApp, um áudio para ele
para dizer que estava conversando com NEUMA, todavia, quando já
estava gravando o áudio, ROBERTO chegou xingando a declarante
de bandida e deu um tapa na declarante (...);(18:36) Confirmou que
ELIENE esteve no closet onde a declarante estava por duas vezes,
mas só da segunda vez é que ELIENE disse que ROBERTO iria
coloca-la para fora de casa, reiterando que no primeiro momento
ELIENE disse apenas que era para a declarante ligar para ROBERTO
com urgência; (...)(27:41) esclareceu que tanger significa "botar
para fora" (...)
No mesmo sentido foram as declarações de Giselle Résio
Guimarães ao afirmar, em juízo, que na última vez que a cozinheira
Eliene foi no quarto pediu para Michella atender o telefone porque
senão iria dar merda, conforme se verifica na mídia de fls. 1.187:
(...) (06:15) confirmou que, antes dos fatos, ELIENE foi várias vezes
no quarto pedir que MICHELLA atendesse o telefone de ROBERTO.
Relatou que estava no quarto com MICHELLA quando ELIENE
chegou dizendo que ROBERTO estava na linha e pedia para que
MICHELLA atendesse o telefone, que ELIENE saiu, mas depois
voltou dizendo que ROBERTO estava insistindo que MICHELLA
atendesse o telefone, tendo MICHELLA salvo engano respondido
que ia atender. Esclareceu que foi umas 3 ou 4 vezes que ELIENE
pediu para MICHELLA atender o telefone, mas MICHELLA não
atendeu e ROBERTO chegou na casa. (07:00) relatou que ELIENE
disse que ROBERTO estava muito nervoso e, salvo engano, na
última vez ou em uma das vezes que ELIENE foi falar com
MICHELLA disse que ROBERTO teria dito que se MICHELLA não
atendesse ia ficar muito feio e que ia acontecer uma merda. Disse
que ELIENE estava muito nervosa e pediu pelo amor de Deus que
MICHELLA atendesse o telefonema. (...) (22:50) Afirmou que
ROBERTO nunca tinha dado esse tipo de