Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Filosofia 11º Ano
Filosofia 11º Ano
verdade em Descartes.
O que significa dizer que a dúvida é hiperbólica? Por que razão Descartes
decide aplicar a dúvida de forma hiperbólica?
R: A dúvida é hiperbólica porque, em termos gerais, se baseia no princípio
metodológico de que falso é igual a aparentemente duvidoso. O que parece
duvidoso não é provavelmente verdadeiro, mas sim falso. Entre verdade e
falsidade não há meio-termo, ou seja, não há compromisso possível.
Por que razão não se pode afirmar que Descartes é um cético? Consegue
contudo Descartes suplantar completamente o argumento cético de que o
conhecimento não é possível?
R: Descartes não é nem nunca foi um cético. O ceticismo é precisamente o
seu adversário. Contra o argumento cético da regressão infinita da
justificação das nossas crenças, Descartes vai argumentar mostrando que há
crenças básicas – que se sustentam a si próprias. Essas crenças são a
existência do sujeito pensante, a distinção real entre alma e corpo e a
existência de Deus.
Será que Descartes supera o desafio cético? Todo o problema reside no papel
que atribui a Deus – podemos perguntar se esta importância atribuída a Deus
tem a ver com razões epistemológicas ou releva de motivações pessoais e
sociais, tais como não ser incomodado pela censura religiosa e fazer de conta
que a sua filosofia é uma declaração de guerra ao ateísmo. Deus é que
garante que não me engano quando penso clara e distintamente. Esta garantia
não se estende ao Cogito – verdade que nada pode pôr em causa e que se
auto-justifica absolutamente. Ou seja, o primeiro princípio do sistema do
saber não precisa da garantia epistemológica conferida pela veracidade
divina.
São os resultados das operações do sujeito pensante – da razão – que, no
entender de Descartes, precisam da garantia de que Deus não engana. Se
concebo clara e distintamente que o triângulo é um polígono de três lados e
que 45 + 3 = 48, por mais evidente que isto me pareça, preciso de ter a
certeza de que Deus existe como ser perfeito ou não enganador. As ideias
claras e distintas, exceto a da minha existência como condição do acto de
duvidar. Ora, é aqui que começam, segundo vários críticos, os problemas. Em
primeiro lugar, a prova da existência de Deus parte da ideia clara e distinta
de perfeição. Pretende-se o quê? Provar a existência de um ser que garanta a
veracidade das ideias claras e distintas que o sujeito pensante forma. Mas isto
é um argumento circular: prova-se o que se quer concluir mediante a própria
conclusão.
8 – A ideia de perfeito existe. O que existe tem de ter uma causa. Não pode,
neste caso, ser o sujeito pensante. Logo, Deus tem de existir.
7
Descreva sucintamente como Descartes parte da dúvida e atinge uma verdade
indubitável.
R: Só a dúvida separa o verdadeiro do falso. Vou duvidar para encontrar um
conhecimento absolutamente verdadeiro que sirva de fundamento a todos os
outros, um princípio primeiro e absoluto. Como quero encontrar um
conhecimento desse tipo, não vou fazer a mínima concessão. Considerarei
falso o que por pouco que seja me pareça duvidoso. Se houver uma razão para
duvidar de uma crença, deixarei de lhe dar qualquer crédito. Como não vou
percorrer o vasto conjunto das minhas crenças de uma ponta à outra, basta
que submeta a exame as crenças fundamentais em que se baseia o saber dos
meus contemporâneos.
Nenhuma dessas crenças resiste. A crença de que o conhecimento começa
com a experiência não pode ser fundamento de nada porque os sentidos são
enganadores e os erros perceptivos muito frequentes. A crença imediata na
existência do mundo físico é abalada pela suspeita desencadeada pela enorme
dificuldade em distinguir o que é real do que é imaginário. E a crença na
capacidade intelectual da minha razão/entendimento é abalada pela suspeita
de que posso ter sido criado por um ser que virou todo o meu intelecto do
avesso e me faz confundir o verdadeiro com o falso sem eu disso me
aperceber.
Feitas as contas, nada parece poder servir de alicerce ao sistema do saber. O
sujeito que exerceu o acto de duvidar pôs em causa todo o tipo de objectos –
sensíveis e inteligíveis – e ficou sem certeza alguma. Mas no momento em que
parece render-se ao cepticismo, Descartes reflecte e vê que quem duvida é
iludido e enganado, tem pelo menos que existir. Isso é indubitável. Assim se
chega à primeira verdade fundamental: um sujeito que duvida de tudo, mas
que não pode duvidar de que existe. Essa existência é a condição sem a qual
não se pode exercer o acto de duvidar. A partir daqui, Descartes terá uma
base firme – puramente racional – para descobrir novas verdades sobre si e
sobre a realidade em geral.
8
O projecto cartesiano é o de dar um fundamento metafísico – absoluto – ao
conhecimento humano. Quais são os três princípios metafísicos fundamentais
do sistema do saber? Qual é o mais importante?
R: Dar um fundamento metafísico ao saber significa dar-lhe um fundamento
absoluto, isto é, que não se baseia na experiência.
Ao descobrir o Cogito, Descartes pensa ter descoberto tal fundamento
metafísico porque o Cogito – Penso logo existo – é uma verdade absoluta e
radical. Imediatamente a seguir, descobre a natureza ou essência do sujeito
pensante – é uma razão pura, uma alma que, não precisando do corpo para
existir, se distingue radicalmente deste. O corpo é algo que, no momento da
descoberta da primeira verdade, não sabemos se existe ou não. Estas duas
verdades metafísicas são alicerces do novo saber que Descartes pretende
constituir de forma ordenada e dedutiva. A primeira derrota o cepticismo e
afirma-se como modelo e critério de verdade, ao mesmo tempo que nos vai
dirigir para novos conhecimentos. A segunda é importante porque separa o
material do espiritual lançando as bases de uma ciência da natureza que vai
conceber o mundo físico como realidade puramente extensa (Uma máquina
dotada de extensão e movimento) e por isso plenamente inteligível, afastando
qualquer referência a uma visão teleológica e finalista própria do
aristotelismo.
Mas como o sujeito pensante não consegue por si garantir a verdade e
objectividade das ideias claras e distintas que forma sobre os objectos do
mundo, Descartes julga necessário recorrer à garantia divina e por isso se
empenha em provar a existência de um ser perfeito que afaste de vez a
suposição muito frágil, mas suficientemente inquietante, do Deus enganador.
Só assim a objectividade e imutabilidade dos saberes (o que é verdadeiro será
sempre verdadeiro) alcançados pelo sujeito racional se estabelece e justifica.
Por outras palavras, é o sujeito ou a razão que conhece, mas a garantia de
que eles não são subjectivos e variáveis só pode ser dada por Deus. Este é a
verdadeira raiz da árvore do saber.
O que há de curioso nesta posição é que todo o percurso cartesiano da dúvida
ao Cogito é determinado pela exigência de autonomia da razão em relação à
experiência e à tradição, pela vontade de devolver a razão à posse de si
mesma, libertando-a de dependências externas. Mas não é assim que a
história acaba. O próprio Descartes declara surpreendentemente que «O ateu
não pode ser geómetra». Descartes libertou a razão da dependência em
relação à experiência como racionalista convicto que era, mas tornou-a
dependente de Deus, tese para nós surpreendente, mas também novidade
para os seus contemporâneos. Que haja razões extrafilosóficas para esta
atitude não cabe nesta introdução ao pensamento cartesiano.
9
O que distingue o racionalismo cartesiano do racionalismo kantiano?
R: São vários os aspectos que diferenciam a gnosiologia kantiana da
cartesiana: