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O monumento na cidade contemporânea: três casos sul-americanos

Eixo temático: O patrimônio e a memória na cidade sul-americana contemporânea

Este texto investiga o monumento enquanto obra de arquitetura reconhecida por sua condição
simbólica de representar um período ou um fato através da história. Sua estruturação espacial
e capacidade narrativa contribui para a conformação da paisagem das cidades. Neste sentido,
procuramos compreender tais complexidades que envolvem a sua permanência ao longo do
tempo, como sua importância artística ou histórica, sua funcionalidade e seu estado de
preservação, entendendo que estas condicionantes estão intrinsecamente ligadas a condição
comportamental da sociedade que as mantém.
Para tal compreensão, resgatamos num primeiro momento um clássico texto sobre o tema da
virada do século XX, “O culto moderno dos monumentos” de Alois Riegl. Através de rigorosa
análise, Riegl reconhece as diferenças naturais dos monumentos a partir do desenvolvimento
cultural e percebe como o impacto dos valores de uma determinada época pode influenciar na
sua leitura. Salientamos sua compreensão dos monumentos não intencionais, que são
caracterizados por obras artísticas e de arquitetura, e os valores que lhe são atribuídos para a
sua preservação. De forma a atualizar essa abordagem, na compreensão dos períodos moderno
e pós-moderno, propomos a análise do texto Monument/ Memory and the Mortality of
Architecture, de 1982, de Kurt Foster. Este autor verifica a importância e a contemporaneidade
da pesquisa de Riegl na conservação e preservação dos monumentos, mas principalmente em
relação a obras novas. Com um olhar crítico, analisa algumas arquiteturas de forma a
estabelecer parâmetros de reconhecimento dos valores na atualidade.
Propomos então uma reflexão sobre o significado do monumento na contemporaneidade,
sobretudo em como identificar em certas arquiteturas recentes os valores que nos fariam
caracterizar a obra com importância flagrante para sua preservação. Um dos modos possíveis
para se reconhecer tais ícones é através da determinação de sua preservação através dos órgãos
de patrimônio histórico.
Como estudo de caso definimos três obras de relevância já comprovadas, de projetos datados
da década de 1960. São arquiteturas sul-americanas que tem como característica ser obras do
moderno tardio, chamadas de brutalistas. A primeira o edifício do Masp, em São Paulo, projeto
de Lina Bo Bardi, tombado pelo Condephaat em 1982. O segundo o edifício da COPELEC, em
Chillan, dos arquitetos Juan Borchers, Jesús Bermejo e Isidro Suárez, declarado monumento
histórico pelo Conselho de Monumentos Nacionais do Chile em 2008. E por último a Biblioteca
Nacional Mariano Moreno, em Buenos Aires, projeto de Clorindo Testa, Francisco Bullrich e
Alicia Cazzaniga, não preservada pelo patrimônio histórico da Argentina, mas listada aqui como
obra emblemática da arquitetura moderna, reconhecida por sua importância.
A análise tem como objetivo entender como estes valores apontados por Riegl e validados por
Foster podem ser interpretados em obras modernas. Também procura verificar como estas
obras se relacionam com o espaço público das respectivas cidades e qual a importância delas na
leitura urbana.
A hipótese colocada aqui é que estas obras podem ser identificadas como monumentos a seu
tempo, representando um período importante da arquitetura e mais ainda, possuem relevância
no contexto urbano na qual estão inseridas, assumindo assim uma identidade cultural.
Palavras-chaves: monumento, patrimônio histórico, arquitetura.

Referências:

FOSTER, W. Kurt. Monument/ Memory and the Mortality of Architecture. Texto originalmente publicado
na revista Oppositions, n. 25, 1982. In: HAYS, K. Michael. Oppositions Reader: Selected Essays 1973-
1984. Princeton Architectural Press, 1998.
RIEGL, Alois. O culto moderno dos monumentos e outros ensaios estéticos. Lisboa: Edições 70, 2013
O monumento na cidade contemporânea: três casos
sul-americanos

Mayra Simone dos Santos


Doutoranda em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São
Paulo. O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) -
Código de Financiamento 001.
mayrasantos@usp.br

Eixo: O patrimônio e a memória na cidade sul-americana


contemporânea

Algumas edificações se mantêm através da história como representativas de um período, de um


estilo arquitetônico, ou concretizam um evento, na tentativa de imortalizá-lo por gerações. Agindo
de modo contrário a ação do próprio tempo, que vai determinando a sua antiguidade e a
transformando em ruína, essas edificações são mantidas pelo seu significado e qualificadas pelo
apoio público, da crítica ou por questões políticas. Analisar o monumento é, portanto, compreender
esse jogo de simbolismos, o seu sentido narrativo de indicar as mudanças de comportamento de
uma sociedade.

Os monumentos narram a história das cidades: fazem parte da construção do tecido urbano, e por
vezes são sua maior referência. A sua permanência dá sentido ao contexto, ao mesmo tempo em que
o contexto tem a capacidade de valorizá-lo, como numa rede de interrelações.

Também tem grande importância na conformação da paisagem das cidades, como um marco para
localizar-se em meio a trama urbana. A forma da cidade é resultado de um processo de construção
espacial do tecido urbanístico e arquitetônico, na qual a qualidade ambiental ou sua legibilidade,
como coloca Kevin Lynch (2011), denota da facilidade com que suas partes podem ser reconhecidas e
organizadas de forma coerente. Os elementos da cidade se inter-relacionam produzindo uma
imagem ambiental, que deve ter um significado para o observador, seja de ordem prática no seu
cotidiano ou de ordem emocional, a fim de que a paisagem resultante seja lembrada. O monumento
como marco faz parte desta rede de aspectos que proporcionam a leitura da paisagem, tornando-se
em alguns momentos a própria imagem da cidade. Não apenas estruturam, mas também reforçam a
leitura: captado como símbolo, referência espacial, estabelece conexões entre o local e a população.
Por isso a importância na preservação destes fatos urbanos artísticos, como valor de memória.

Henry Lefebvre, em seu texto “The Urban Revolution” de 1970, analisa a complexidade da sociedade
urbana moderna através do monumento, abordando aspectos positivos e negativos. Primeiro,
Lefebvre se posiciona contra o monumento, por remeter às grandes estruturas de poder, que
organizam o espaço entorno de si para oprimir. O simbolismo gerado na sua construção se perpetua
na consciência social e mesmo quando estes símbolos caem em desuso, servem a contemplação
passiva. Nesta compreensão, o monumento seria potencialmente repressivo uma vez que impõe
uma ordem simbólica estritamente hierárquica e centralizada, colocando em xeque, portanto, o seu
uso, seja obra de arte ou arquitetônica, por instituições governamentais e de mercado, como uma
representação ou afirmação do seu poder ou do seu legado.

Já numa perspectiva positiva, Lefebvre constata que o monumento reúne, é o local da vida coletiva,
remetendo, de algum modo, ao espaço público nas cidades. Tem como característica transcender
seu próprio sentido de ser, como no caso das catedrais, que são transfuncionais, ou dos túmulos que
são transculturais (LEFEBVRE In: WOOD, HULKS, POTTS, 2007, p.298). Ao mesmo tempo que
transcendem são centralidades, marcos no tecido urbano, onde a sociedade pode se reconhecer e
pertencer.

Sentidos tão antagônicos como estes exemplificados por Lefebvre, nos fazem refletir sobre o que de
fato nos faz determinar e manter os monumentos ao longo do tempo. Para Argan (1998. p. 86), se
conservamos os monumentos, seja tolerando ou desejando, é porque eles ainda têm um significado,
entendendo que sua sobrevivência vai muito além das questões de gosto, mas que também depende
de sua funcionalidade, ou seja, além do sentido afetivo ligado a imagem, da importância histórica e
da memória, o monumento está intrinsecamente ligado a um contexto espaço-temporal na qual está
inserido e sua preservação está ligada aos valores atuais que recaem sobre ele.

Em um texto clássico sobre o tema, “O culto moderno aos monumentos”, de 1903, Alois Riegl analisa
a natureza dos monumentos e os valores que incidem sobre eles. Este texto serviu de base teórica
para a legislação de Proteção aos Monumentos Históricos do Império Austro-húngaro, da qual era
presidente da Comissão. Inicia estabelecendo a diferença entre os monumentos intencionais –
aqueles feitos para imortalizar um acontecimento – dos monumentos artísticos e históricos – aqueles
que estão imbuídos de valor. A construção dos monumentos intencionais remonta às épocas mais
antigas da cultura humana, são aqueles feitos para manter presente os feitos humanos para as
gerações seguintes. Mas monumentos artísticos e históricos são diferentes, são obras de arte e de
arquitetura ligadas a uma percepção de valor moderna, um valor artístico, concepção esta que tem
ascendido desde o Renascimento. Estas obras são valoradas conforme a percepção da sociedade e
mantidas através do tempo. Logo, somos nós que atribuímos se são monumentos ou não.

O autor coloca que o valor artístico é um valor relativo, pois está condicionado as exigências da
vontade artística de cada época e que muda conforme o momento em que se encontram (RIEGL,
2013, p. 13), portanto uma obra preservada numa época, pode ser desvalorizada em outro
momento. Já o valor histórico compreende uma “noção de evolução”: tudo o que se seguiu é
condicionado pelo que lhe é anterior, ou seja, o reconhecimento de que um fato passado é
insubstituível. Esta evolução pode ser percebida ao longo de uma prática artística (partindo das
mudanças nas relações espaciais e do modo de percepção da obra, por exemplo) e a partir da análise
dos desenvolvimentos históricos. Neste ponto o autor faz uma ressalva, de que “todo o monumento
artístico sem exceção é simultaneamente um monumento histórico, pois representa um grau
evolutivo das artes plásticas” e o mesmo serve para o monumento histórico que é igualmente
artístico, pois guarda uma série de elementos artísticos na sua composição (RIEGL, 2013, p. 11).

Outros valores podem medir ainda um monumento dentro do que caracteriza as relações espaço-
tempo, que são os valores ligados à memória (relativo ao passado) e os valores de atualidade (do
tempo que se faz presente). O valor de memória leva em consideração o tempo corrido, as marcas
da idade. É quando o monumento se torna apenas um substrato sensível, capaz de produzir no
espectador um efeito afetivo, e neste sentido podemos dizer que o valor de memória tem validade
universal. É a partir dele que podemos condicionar o monumento num presente eterno – ou seja,
preservando-o conforme foi construído –; ou valorizar o passado tal como se apresenta, seja na
conservação de características históricas ou até mesmo como ruína.

Mas é quando teoriza sobre os valores de atualidade em relação a preservação dos monumentos que
Riegl mostra sua preocupação com o destino da arte e da arquitetura em seu tempo. Esta questão
pode ser analisada sob dois aspectos: o valor de uso e o valor artístico. O valor de uso está conectado
à produção arquitetônica: quando um edifício antigo ainda está em uso, a chance de ser conservado
em boas condições é maior. Já o valor artístico pode ser tanto um valor relativo, ou seja, com relação
a capacidade que um monumento tem em sensibilizar o homem moderno, quanto um valor de
novidade, que teria preferência perante o velho.

A coesão do novo, de fresca feitura, que se expressa no mais simples critério –


forma íntegra e policromia pura – pode ser apreciado por qualquer pessoa,
mesmo que desprovida da formação adequada. Daí que o valor de novidade seja,
desde sempre, o valor artístico das grandes massas de pessoas com poucos ou
nenhuns conhecimentos, em contraposição ao atual valor artístico relativo, pelo
menos desde o início da época moderna, só pode ser apreciado por pessoas
esteticamente educadas (RIEGL, 2013, p. 49).

Com base nessa reflexão, que culminou em detalhada classificação, Riegl pode reconhecer as
diferenças naturais dos monumentos a partir do desenvolvimento cultural e perceber como o
impacto dos valores de uma determinada época pode influenciar na sua leitura. Verificou também
uma mudança na percepção contemporânea do passado: que o valor que resta aos monumentos,
depois da perda da beleza e utilidade, acabava por ser aquele ligado à sua própria idade. A única
coisa que poderia ir de modo contrário a este avanço do tempo, seria a novidade. É por isso que
reconhece a possibilidade de conflito entre esses valores, constatando que o valor de novidade é o
maior adversário do valor de antiguidade. Para Riegl, a eliminação de “toda marca perceptível de
dissolução mediante forças naturais” foi claramente o objetivo de toda a conservação de
monumentos no século XIX (RIEGL, 2013, p. 50). Somente com o aparecimento do valor de
antiguidade no final do século XIX é que nasceu este conflito entre valores e que estava, na época de
seu texto, no centro de toda a discussão.

Não podemos deixar de levar em consideração que no século XIX, em muitas obras arquitetônicas
novas, havia o emprego de valores históricos como valores de novidade, deturpando assim a
condição do edifício dentro da história. Esta prática seria baseada em empregar o valor histórico
enquanto estilo. Podemos constatar que a recuperação de uma linguagem formal fora de uma
linearidade histórica gerava um estado fictício, um conflito de valores que impossibilitaria a análise
de sua época, visto que cancelava tanto o seu valor documental como sua capacidade de transmitir
uma sensação de distância histórica. Dentro desta perspectiva, a leitura de Riegl nos faz
compreender a importância de se preservar os sinais de decadência, de desgaste natural, que
marcam o índice do tempo.
“A concepção moderna exige para as obras humanas de recente feitura não só
uma coesão sem mácula na forma e na cor, mas também no estilo, quer dizer a
obra moderna deve lembrar o menos possível, na concepção e no tratamento dos
detalhes de forma e cor, as obras mais antigas. Exprime-se aí, claro está, a
tendência evidente de separar com maior rigor possível o valor de novidade e o
valor de antiguidade (...)” (RIEGL, 2013, p. 52).

Com estas palavras pode-se dizer que Riegl pressentiu que uma nova compreensão estava surgindo.
No início do século XX a “vontade artística” da época haveria de eliminar todo possível resquício de
estilo do passado e assim preservar certo afastamento temporal. Os valores, tal qual Le Corbusier
colocou em “Por uma arquitetura”, agora estavam ligados a produção industrial, da lógica dos
automóveis, aviões e transatlânticos, que pediam por uma nova arquitetura que pudesse refletir a
era da máquina. A arquitetura moderna se pautava pela abstração da linguagem, limitando os
elementos a pura geometria formal, gerando novos espaços mais integrados que condissessem com
o novo modo de vida. Mas essa arquitetura, na sua forma urbana, também pretendia fazer tábula
rasa das cidades: a implantação de um desenho urbano que organizasse a vida cotidiana de modo
funcional e, portanto, suprimisse o tecido urbano existente.

É notório também a discussão neste período sobre o patrimônio histórico das cidades, ilustrado por
exemplo na Carta de Atenas, resultante do IV Congresso Internacional de Arquitetura Moderna
(CIAM) de 1933, no respeito pelos valores arquitetônicos passados e pela história das cidades. Porém
a presença de tais obras a serem preservadas não podia ser prejudicial a legibilidade urbana proposta
pelo Movimento Moderno.

Aos poucos, uma nova relação com o monumento ia ser discutida, ainda no moderno, com a
necessidade de criação de centros cívicos e edifícios públicos que requalificassem o tecido urbano,
espaços simbólicos voltados para a reunião da população. É isso que irá tratar o manifesto “Nine
Points on Monumentality”, escrito em 1943 por J. L. Sert, F. Léger e S. Giedion, ao afirmar que as
pessoas querem edifícios que representem sua vida social e comunitária mais do que a satisfação
funcional que eles promovem e o arquiteto moderno, por sua vez, deveria planejar os locais para
esses novos monumentos de modo a estar integrado a um esquema urbano mais amplo. A
modernidade então também produziria os seus monumentos.
Com o devido afastamento, vimos que a abstração e a funcionalidade das vanguardas não
conseguiram por si mesmas trazer a tão sonhada transformação social e foram já no final da década
de 1950 e início de 1960 objeto de revisão. Os valores arquitetônicos e artísticos mudariam
novamente, com o retorno do espaço narrativo nas cidades através de seus edifícios, qualificados por
sua história e leitura urbana. Alguns livros trataram dessa mudança como “Morte e vida nas grandes
cidades” de Jane Jacobs, que critica as ações urbanistas modernas em favor de uma diversidade que
garantisse a vitalidade urbana; “A imagem da cidade” de Kevin Lynch, que trata da paisagem urbana
como um organismo complexo de elementos de significados importantes para a leitura na cidade; e
“Arquitetura da cidade” de Aldo Rossi, que analisa os processos de estruturação e transformação das
cidades a partir do problema da tipologia. Toda esta revisão de algum modo trata da recuperação da
memória coletiva através de uma releitura dos elementos estruturadores das cidades para a
compreensão das mesmas. Podemos entender o monumento como um dos pontos chaves deste
retorno.

Visto que “O Culto Moderno dos Monumentos” é datado da virada do século, ou seja, no início da
compreensão moderna do monumento (e como coloca Riegl, uma compreensão em curso), Kurt W.
Foster retoma este ensaio em 1982, em editorial da revista Oppositions, na esperança de, ao fazer o
mesmo caminho, entender as mudanças que ocorreram com o advento do pós-moderno,
identificando desta forma a sua atualidade.

O que torna o estudo dos monumentos de Riegl e sua especulação sobre o


destino histórico da arte e da arquitetura um critério para o nosso próprio
pensamento hoje? Ao mesmo tempo em que o empréstimo ocasional de formas
históricas para novos edifícios é posto para sinalizar o fim da arquitetura
moderna, a autêntica perspectiva do historiador é sóbria e desafiadora. Quando
ataques à luz do dia em um corpo já saqueado de arquitetura histórica estão
novamente se tornando rotina em algumas escolas de arquitetura, há todas as
razões para refletir sobre as circunstâncias históricas na ascensão do modernismo.
Central à ideia do novo é, naturalmente, sua relação com a história. E, na era
moderna, a história encontra-se diante de nossos olhos na forma de seus
"monumentos”. (FOSTER in: HAYS, 1998, p. 18. Tradução nossa).

Para Foster, com Riegl podemos compreender o porquê de algumas obras serem descartadas
enquanto outras são restauradas e que o nosso interesse por elas pode mudar em diferentes
momentos da história. É por conta desta vicissitude que a sobrevivência de monumentos de arte e
arquitetura continua a ser precária: quando perdem a sua utilidade ficam sujeitas a mudanças de
condições econômicas e mudanças de interesse, confiadas a gestores públicos ou privados. Cita
como exemplo o caso da obra Villa Savoye de Le Corbusier, que na década de 1960 foi salva da
demolição iminente por André Malraux que a decretou como monumento nacional na França, mas
que na década de 1980, em um contexto antimodernista, poderia ter tido claramente um fim
diferente (FOSTER in: HAYS, 1998, p.18).

Foster verifica no texto de Riegl um sentimento de conclusão de um ciclo, que ocorreu em muitas
mentes críticas de sua época (FOSTER in: HAYS, 1998, p.18 e 19). Verifica também que, apesar da
clareza de sua análise histórica, o presente mostrava-se inexato, confuso ao lidar com restos do
passado. É nesse momento, quando analisa as arquiteturas do século XIX e verifica o uso de uma
roupagem histórica com a finalidade de conferir a elas valor de novidade, que Foster encontra a
conexão para relacionar com as obras do período pós-moderno. Fez uso do posicionamento de Riegl
- a favor do desgaste natural das obras - para embasar seu discurso: ”nada poderia ilustrar melhor a
perda de precisão do senso histórico, que o consumo irrefletido de formas e esquemas
historicamente determinadas” (FOSTER in: HAYS, 1998, p.25).

É fato que nesta época houve uma postura crítica ao modernismo voltada para questões como o
enfrentamento do consumo e da industrialização crescentes e a aceitação do universo da
propaganda. Questões estas que são tratadas por Robert Venturi e Denise Scott Brown, nos livros
“Complexidade e Contradição em Arquitetura” e “Aprendendo com Las Vegas”. Eles não só olham
para a realidade ao criticar o moderno, como aceitam as suas condições sociais e econômicas. Por
isso, levam a sério a interpretação e apropriação cultural que o público faz dos monumentos e
retomam o simbolismo e a narrativa desprezados pelo modernismo. Mas, diferente do monumento
intencional, o simbolismo que pretendem é um simbolismo ordinário: aquele que não está
relacionado aos grandes problemas do mundo. Não de outro modo olharam para a paisagem de Las
Vegas, da sua strip comercial, luzes e outdoors.

Foster também faz uma análise (para ele mais inquietante) a partir da destruição dos monumentos
provocada tanto pela guerra quanto por decisões ou atitudes erradas, onde a última poderia ser
considerada a pior das destruições. Trata principalmente de obras de valor histórico significativo que
sofrem por falta de manutenção, definhando ao longo do tempo. Situação que exemplifica com os
italianos: enquanto os projetos de Aldo Rossi estão impregnados nas estratégias da arquitetura
italiana dos anos de 1930, muitos edifícios construídos durante estes anos estariam degradados
(FOSTER in: HAYS, 1998, p.29). Diferentemente de Venturi, Rossi parte da questão italiana (colocada
por Foster) para estabelecer uma continuidade entre o moderno e o contexto – numa ideia de
preservação da história da cidade. Para tanto, investigou os elementos principais da arquitetura,
através dos seus componentes geométricos elementares, representados pelo triângulo, quadrado e
círculo.

Três casos latinos

Já tratamos aqui da importância dos monumentos na leitura das cidades: sua estruturação espacial e
capacidade narrativa contribuem na conformação da paisagem, operando como marcos, construindo
uma identidade urbana. São a expressão de uma cultura social que satisfazem de certa forma a
necessidade de simbolizar o coletivo. Como coloca Riegl, monumentos não intencionais, aqueles que,
com o devido afastamento temporal, ganham valor ao longo da história, são atribuídos por nós, ou
seja, criam certo grau de representatividade.

Com Riegl podemos entender o quanto é importante a caracterização dos valores artísticos e
arquitetônicos para determinação de um monumento. Seus estudos até hoje seguem como um guia
para a preservação do patrimônio. Com Foster podemos entender o quanto esses valores são
dinâmicos e estão sujeitos a reinterpretação. Hoje, ainda lidamos com estas questões para definir ou
não um monumento, procurando, com o devido afastamento temporal, identificá-los.

Num passado recente o movimento moderno foi capaz de criar edifícios que simbolizavam o
progresso e uma nova forma de vida. Mais do que isso, alguns de seus exemplares, no intuito de
buscar relações com o contexto urbano, adotaram características monumentais na sua forma e
espacialidade, se integrando ao cotidiano da população.

O movimento moderno nos países latino americanos, mais cedo em alguns países do que em outros,
mesclou características das vanguardas positivas, como a crença na racionalização e industrialização,
com aspectos da cultura local, num processo de construção de uma identidade, que contribuísse
para estruturação social e política. A modernização que se fazia latente nestes países auxiliou no
desenvolvimento de uma linguagem e de um discurso arquitetônicos, que tiveram visibilidade no
plano internacional1.

A fim de rebater tais considerações no campo do monumento, examinaremos três estudos de caso,
de relevância já comprovadas, de projetos datados da década de 1960. São arquiteturas sul-
americanas que tem como característica ser obras do moderno tardio, chamadas de brutalistas. A
primeira o edifício do Masp, em São Paulo, projeto de Lina Bo Bardi, tombado pelo Condephaat em
1982. O segundo o edifício da COPELEC, em Chillan, dos arquitetos Juan Borchers, Jesús Bermejo e
Isidro Suárez, declarado monumento histórico pelo Conselho de Monumentos Nacionais do Chile em
2008. E por último a Biblioteca Nacional Mariano Moreno, em Buenos Aires, projeto de Clorindo
Testa, Francisco Bullrich e Alicia Cazzaniga, não preservada pelo patrimônio histórico da Argentina,
mas listada aqui como obra emblemática da arquitetura moderna, reconhecida por sua importância.

MASP

Figura 01: Museu de Arte de São Paulo, 2006. Fonte: Wikipédia Commons

Desde sua fundação em 1947 por Assis Chateaubriand na rua Sete de Abril, até a inauguração de sua
sede definitiva na avenida Paulista em 1968 a ideia que permeava o MASP era de promover na

1
Como por exemplo nas duas exposições emblemáticas do MoMA, Brazil Builds: Architecture New and Old (1943); e Latin
American Architecture since 1945 (1955).
cidade uma renovação cultural, não só se valendo da apresentação e conservação de obras de arte,
mas também através do ensino como forma de difundir a arte. Para tanto, uma nova arquitetura e
projeto expositivo eram fundamentais para a disseminação desta proposta. Coube a arquiteta Lina
Bo Bardi desenvolver este raciocínio.

A prefeitura cedeu o terreno do antigo Belvedere e financiou as obras. Uma interpretação do termo
de doação do terreno, que previa que o espaço continuasse público, conduziu ao partido do projeto
em dividir a construção em dois volumes: um suspenso do chão e outro abaixo do nível da Avenida
Paulista, moldando-se a topografia. O edifício tornar-se-ia um marco para cidade de São Paulo, já
naquele período de transformação da avenida, ainda com poucos edifícios altos construídos.

Foram 10 anos do projeto a sua inauguração. O projeto de Lina Bo Bardi preservou a visual que
existia no Belvedere suspendendo o edifício do chão, estruturado através de dois pórticos,
resultando num vão livre de 74 metros, o maior vão livre do mundo feito em concreto na época, com
cálculo estrutural de Figueiredo Ferraz. O vão livre tornou-se um grande espaço de apropriação
pública, cenário de eventos culturais, sociais e políticos.

Nos dois pavimentos suspensos funcionam a administração e espaços expositivos. No primeiro


pavimento, onde estão localizadas grandes vigas protendidas, o espaço é dividido entre sala de
exposição, que é central, e as áreas de administração que ficam voltadas para as fachadas de vidro,
de modo que o limite entre uma área e outra está definido pela própria posição da viga. No segundo
pavimento está localizada a pinacoteca, um piso inteiro livre com o acervo permanente do museu. Os
subsolos abrigam o auditório, restaurante, café, depósitos e espaços expositivos. O piso expositivo
do subsolo ainda conta com um pé-direito duplo e uma escada rampa para circulação. Um elevador e
escada fazem a conexão vertical desses espaços.

A liberdade era algo salientado no projeto, visto através da qualidade pública de seu chão, que
permitia múltiplos usos e possibilitava a integração visual da avenida Paulista, Parque Trianon e
avenida Nove de Julho. Liberdade que também se mostrava na caixa suspensa, que através do vidro
unia a cidade e a instituição de forma continua e democrática, muito próximo do uso do material por
Mies van der Rohe, uma pele que integrava o interior com o exterior, desmistificando o contentor.
Por último, liberdade na forma de apreender e compreender a própria arte, com uma nova proposta
de expografia, resumida pelo uso do cavalete de cristal, que colocava obras de épocas diferentes no
mesmo espaço. Um projeto pensado de forma a abranger o acervo num único espaço, uma nova
forma de compreensão das obras aliado a um projeto didático.

O cavalete de cristal, feito de placa de vidro e base de concreto, era uma ação afirmativa
questionadora dos meios tradicionais de exposição, modelo vinculado aos museus europeus datados
do século XVII, que organizava as telas nas paredes com uma leitura linear da histórica da arte
através de salas sucessivas. O museu de Lina Bo Bardi também não se fazia próximo aos primeiros
museus da arquitetura moderna, como o MoMA, de Philip L. Goodwin e Edward Durell Stone de
1939, ou o Guggenheim de Nova York de Frank Lloyd Wright de 1959.

Era necessária uma nova compreensão, uma “dessacralização” da obra de arte, para que o público
criasse sua própria estratégia de fruição, um caminhar errante, uma experiência quase infantil de
permear os espaços livremente, vendo e apropriando as obras aos poucos, sem uma ordem a ser
seguida. O que a arquiteta almejava com isso era uma proximidade maior do público com as obras,
perseguindo por impulso ou intuição aquelas que mais lhe agradavam e analisando por diferença as
obras que estavam ao lado, buscando assim compreender o todo.

Toda essa liberdade caracterizada pelo projeto diferia de certa forma do período político que o país
estava passando na época da inauguração do edifício, mostrando-se como um respiro e alento a
população que ansiava pela democracia.

O MASP de Lina Bo Bardi então surge como um divisor de águas, tanto com relação ao espaço
museológico, que até hoje repercute com simpatizantes e divergentes do seu conceito, quanto com
relação ao edifício em si e sua monumentalidade característica, do grande volume suspenso que
permite um chão fluido. Um edifício icônico, reconhecido como um marco na Avenida Paulista e para
a cidade de São Paulo, tombado pelo Condephaat como “monumento de interesse cultural,
integrante da paisagem urbana” em 1982.
COPELEC

Figuras 02 e 03: COPELEC, 2012 e 2007 respectivamente. Fonte: Wikipédia Commons

O edifício da Cooperativa Elétrica de Chillán, COPELEC, localizado na Rua Maipón 1079, Chillán, é uma
obra importante para a arquitetura chilena. Projeto do escritório de Juan Borchers junto com os
arquitetos Isidro Suarez e Jesús Bermejo, o edifício relativamente pequeno, de aproximadamente
630m², foi construído entre os anos de 1962 e 1965.

Sua história, contudo, não pode ser dissociada de um evento: o terremoto que atingiu Chillán em
1939, de 8,3 graus na escala Richter, que destruiu praticamente toda a cidade, deixando poucas
construções em bom estado. Após o terremoto, houve uma oportunidade incomum de se reconstruir
quase toda a região. Período que coincidiu com a primeira geração de arquitetos graduados sob a
reforma do ensino de arquitetura do Chile (PERAN, 2019. p. 56), o que propiciou o seu
desenvolvimento dentro das linhas modernas. Desta forma, a arquitetura moderna constitui um dos
patrimônios materiais de maior valor de Chillán e, quiçá, do próprio Chile.

Como todos os edifícios públicos construídos após o grande terremoto – como, por exemplo, o
edifício da Catedral (1942-1960) e o edifício do Governo Regional de Ñube (Intendencia) – o edifício
da COPELEC possui características modernas, como o uso da planta livre, a expressão estrutural e o
uso do concreto armado. Por representar este período e por características intrínsecas ao projeto, o
edifício em 2008 foi declarado Monumento Nacional a ser preservado pelo Conselho de
Monumentos Nacionais do Chile.

O volume, um paralelepípedo de três andares, está inscrito no terreno junto aos alinhamentos
frontal e laterais, respeitando assim o alinhamento das fachadas continuas do traçado original de
Chillán. Possui um rasgo no volume, na lateral leste, de pé-direito duplo, onde se encontra o acesso
para automóveis. No terceiro andar o edifício se sobrepõe a este acesso e fecha o desenho da
fachada.

Ao adentrar no edifício no pavimento térreo encontra-se uma grande área de pé-direito duplo, com
pilares soltos, chamados de duplo cone invertido, que conferem verticalidade e monumentalidade ao
espaço. Um espaço livre também qualificado pelos volumes soltos e curvos, como uma rampa que
conduz ao segundo pavimento e uma parede curva próxima ao acesso do edifício. No terceiro
pavimento, de planta livre, estão localizados canhões de iluminação zenital.

Para dar coesão a forma física do edifício, ao desenho complexo de seus elementos internos e
externos, foi escolhido como material o concreto armado. Cada elemento do projeto foi convertido
em um trabalho a parte que estava sujeito a modificações ao longo da construção, o que Borchers
chamou de “projeto elementar”: as peças eram objeto de desenvolvimento próprio e aberto dentro
da construção, que havia de ser revisado e refinado até o produto final, como por exemplo os pilares
de cone duplo invertido, o desenho da fachada com filtro de luz e as superfícies curvilíneas como a
escada e a parede próxima ao acesso.

Outro ponto característico da obra é a forma como os arquitetos pensaram a questão da luz natural,
com iluminação zenital e aberturas e tratamentos específicos para cada fachada. O sistema complexo
de aberturas, volumes e brises que compõe as fachadas norte e sul provocam entradas de luz que
fazem um refinado desenho interior.

Apesar do arquiteto Juan Borchers estabelecer conexões com as vanguardas, principalmente na


abordagem teórica de Le Corbusier (PERAN, 2019. p. 115), propôs também uma contribuição original
e crítica com leitura do contexto e com um processo de projeto próprio. Tomada as devidas
proporções, não há de se negar que o edifício possui certos aspectos da fase tardia de Le Corbusier,
como por exemplo o edifício do secretariado de Chandigarh de 1952 ou o convento de La Tourette
de 1953. O jogo de luz interno e seus elementos curvilíneos que rompem a organização espacial
interna indicam sintonia de Borchers com o arquiteto.

Estas decisões projetuais nos fazem refletir que o edifício foi pensado e desenvolvido para além de
seu programa – um edifício de escritórios –, ou seja, são espaços livres na qual poderíamos encaixar
outros usos. Por essa qualidade espacial o edifício foi restaurado e atualmente abriga o "Centro
Artístico e Cultural Copelec", além de um Museu Elétrico.

Biblioteca Nacional Mariano Moreno

Figura 04: Biblioteca Nacional, 2005. Fonte: Wikipédia Commons

Na Argentina, entre os anos de 1940 e 1950, sob o debate internacional sobre o racionalismo e da
técnica, somado a uma consolidação do concreto na construção civil no país (LIERNUR, 2001. p. 220),
surge uma geração de arquitetos modernos tais como o Grupo Austral2 (do qual fez parte o arquiteto
Amâncio Willians) e o escritório SEPRA3. Iniciando sua carreira na década de 1950, Clorindo Testa

2
Clorindo Testa, recém formado, colabora com o escritório no Plan Regulador de Buenos Aires em 1948.
3
Escritório na qual Clorindo Testa vai se associar no final da década de 1950 e vence o concurso para o Banco de Londres.
absorve as ideias desta primeira geração e torna-se um arquiteto representativo da arquitetura
moderna argentina, principalmente pela expressão plástica que alcança com o concreto aparente.

Seu projeto para a Biblioteca Nacional, feito em conjunto com Francisco Bullrich e Alicia Cazzaniga,
foi vencedor do concurso internacional em 1961 e tornou-se um ícone da arquitetura moderna
argentina. Localizada entre as ruas Austria, Agüero e a avenida Libertador, no bairro da Recoleta, o
edifício possui uma solução inovadora garantindo assim a paisagem do local, cercado pelo verde.

Assim como o MASP, o partido dividia o volume em duas partes: o primeiro volume, das as salas de
leitura, ficaria suspenso, liberando o solo para a apropriação pública; o segundo volume, onde
estariam as salas para armazenamento de livros, ficaria enterrado no terreno. O volume suspenso é
apoiado em 4 núcleos estruturais, onde se encontram a circulação vertical do edifício e
infraestruturas. Com essa solução a proposta era dar continuidade a paisagem no nível do térreo,
garantindo a preservação do espaço verde do declive da topografia e criando uma grande praça
pública coberta no nível térreo. O volume suspenso ficaria acima do nível das árvores, criando um
mirante no último andar do edifício, que possibilita a visão até o rio da Prata.

A construção, iniciada apenas em 1971, sofreu atrasos e ficou suspensa por alguns anos, só sendo
inaugurada no início da década de 1990. Nestas três décadas que separaram o concurso até a
conclusão da obra, o projeto sofreu poucas atualizações – resumindo-se a infraestrutura e
instalações técnicas –, mantendo sua solução original. Apenas os brises metálicos do volume
suspenso, que amenizariam a incidência solar, não foram instalados por cortes na verba destinada a
finalização do edifício.

A setorização do programa está organizada em três partes visualmente claras no edifício. A primeira
parte, que cabe ao volume enterrado, ocupa 4 subsolos, sendo três para depósito de livros e um para
a hemeroteca (que se encontra semienterrado). No subsolo há ainda um volume lateral onde se
encontra uma escola para bibliotecários. Sob este conjunto se encontra a esplanada, a praça pública,
onde há o hall de acesso para o edifício. Na segunda parte, um primeiro volume suspenso, menor,
estruturado na longitudinal do edifício, se encontram o 1° e 2° andares, que contam com o auditório,
café, área expositiva e parte da administração. A terceira parte, um grande volume suspenso, ficam o
3° ao 6° andares, onde estão midiateca, audioteca, arquivos, parte de área administrativa e as salas
de leitura. Nos pisos da sala de leitura (5° e 6° andares) uma rampa suspensa por cabos conecta os
dois níveis numa área cujo pé direito é duplo.

Esse modelo programático que separou as salas de leitura das salas de armazenamento de livros se
mostrou uma solução original, que dado o partido do edifício, possibilitava a expansão das salas do
subsolo, sem afetar a plástica do edifício.

O resultado disso constitui um volume de concreto expressivo, massivo, suportado pelos 4 núcleos
estruturais, e por conta disso associado ao brutalismo. Vê-se então a influência do desenho moderno
de Clorindo Testa, que se afasta do racionalismo puro e busca sua expressão na poética dos volumes,
tal como fez no Banco de Londres (1960-1966). A principal característica do seu projeto é o uso do
concreto aparente, no equilíbrio entre a técnica e a plasticidade, estrutura e beleza. Este aspecto é
claramente visto na biblioteca onde a topografia eleva o projeto como um pedestal de uma escultura
antiga, transformando o edifício em um marco urbano.

Conclusão

O monumento tem um papel crucial na nossa experiência no espaço urbano. Ele associa passado e
presente em um corpo físico, como um representante da história e de uma transformação social.
Apesar de, num primeiro momento, o movimento moderno ser contrário à ideia de monumento,
muito por conta da compreensão e do uso que estas edificações tinham no século XIX, criou obras de
excelência que manifestaram o espírito de uma época, configurados espacialmente de modo a se
tornar marcos urbanos nas cidades.

Na América Latina estes edifícios representaram um momento em que a modernização atingia seus
países. Caracterizados por uma linguagem internacional, mas imbuídos de valores culturais nacionais,
construíram uma identidade própria. Nos parâmetros de Riegl, essas arquiteturas, com o devido
afastamento temporal, passaram a representar um momento social e cultural, carregando consigo
valores históricos e artísticos. Logo, o movimento moderno passou a ser parte de uma narrativa das
cidades, fazendo parte de sua leitura. Sua relevância na cidade contemporânea sustenta sua
conservação e os mantém em pleno uso, cenário para as atividades humanas.

Mesmo tratando de um passado recente, MASP, COPELEC e Biblioteca Nacional são obras de
referência em seus países e fazem parte da história da arquitetura moderna. São exemplos de
edifícios que possuem relevância no contexto urbano, fazendo parte da paisagem das cidades no
qual estão localizados. Como fatos urbanos, assumem uma identidade social e cultural e carregam na
sua forma arquitetônica valores de memória coletiva. Portanto, são obras que podem ser
identificadas como monumentos a seu tempo.

Referências

ARGAN, Giulio Carlo Argan. História da Arte como História da Cidade. 4° ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
CARTA de ATENAS. Brasília: Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, 1933. Disponível em:
<http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Carta%20de%20Atenas%201933.pdf >. Acesso em: 20
ago. 2019.
FOSTER, W. Kurt. Monument/ Memory and the Mortality of Architecture. Texto originalmente publicado na
revista Oppositions, n. 25, 1982. In: HAYS, K. Michael. Oppositions Reader: Selected Essays 1973-1984.
Princeton Architectural Press, 1998. p.18-35
JACOBS, Jane. Morte e vida de grandes cidades. 3.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2011.
LEFEBVRE, Henry. The Urban Revolution, 1970. In: WOOD, J.; HULKS, D.; POTTS, A.. Modern Sculpture Reader.
Leeds: Henry Moore Institute, 2007. p. 297-298
LIERNUR, Jorge Francisco. Arquitectura em la Argentina del sigilo XX – La construción de la modernidade.
Buenos Aires: Fondo Nacional de las Artes, 2001.
LYNCH, Kevin. A imagem da cidade. 3° edição. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2011.
PERAN, Martin (ed). Chillán. Paisaje moderno. Territorios em transformacion. Santiago de Chile: Centro
Cultural de España, 2019.
RIEGL, Alois. O culto moderno dos monumentos e outros ensaios estéticos. Lisboa: Edições 70, 2013.
ROSSI, A. A arquitetura da cidade. São Paulo: Martins Fontes, 1995
SERT, J. L.; LEGER, F.; GIEDION, S. Nine points on monumentality. In: GIDEON, S. Architecture, you and me: The
diary of a development. Cambridge: Harvard University Press, 1958. p. 41-58

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