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Pedro Ponse - 1751972

Turma 410

Fichamento sociologia - 4° bimestre

“Ocupar, resistir, produzir.” A questão da terra no Brasil

Podemos dizer que a questão da terra no Brasil teve início com a chegada dos
colonizadores portugueses, em 1500. E as primeiras vítimas dessa “invasão”, com a
consequente ocupação predatória das terras brasileiras, foram aqueles que aqui viviam –
os povos indígenas. O texto acima nos mostra que estes povos continuaram sendo
vitimados através dos séculos, massacrados pela expansão do “homem branco”, com
seus tratores e motosserras, suas estradas e fazendas, a criação de gado para a
exportação de carne e as plantações de soja administradas por modernas agroindústrias
capitalistas. O que acabamos de escrever não significa que somos “contra o
desenvolvimento econômico” Nada disso! Da mesma forma que os portugueses
ocuparam o território da dividida, para poder usufruir das eventuais riquezas que
encontrariam na América e na África. Os portugueses, por sua vez, não se contentaram
com o território que lhes coube e invadiram a parte espanhola, contando a seu favor com
o trabalho dos bandeirantes – aventureiros e mercenários que não hesitavam em
assassinar seus adversários. Hoje dão seus nomes a grandes rodovias como Fernão Dias,
Anhanguera etc. e a um monumento em sua homenagem, na cidade de São Paulo.
Passando bem rapidamente pela História do Brasil, a título de exemplo, perguntamos:
Terra de Santa Cruz somente com a intenção de extrair todas as riquezas possíveis,
“passando por cima” de quem estivesse no caminho, podese dizer, em se tratando da
questão da terra no Brasil, que essa história continua se repetindo – guardando as
diferenças e especificidades de cada época –, apresentando a mesma “lógica perversa”
nesta atual expansão capitalista do chamado “agronegócio”.

Questão de terra ou questão de gente?

A propriedade da terra no Brasil sempre esteve concentrada nas mãos de poucos.


Usaremos como imagem o momento em que todo o território da então colônia
portuguesa foi dividido em Capitanias Hereditárias, separado da colônia espanhola pelo
Tratado de Tordesilhas. Na época, houve “gritaria” de outros reinos europeus que
indagavam se “Deus havia dividido o mundo entre Portugal e Espanha”. Ingleses e
franceses protestaram e resolveram se apossar de parte da terra Nestes três exemplos,
apesar dos momentos históricos diferentes, uma mesma dinâmica acompanhou a luta
pela terra no Brasil – a lógica determinada pelos interesses econômicos e políticos da
classe dominante, formada por grandes proprietários de terras.

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Segundo o pesquisador Júlio José Chiavenato, uma norma que existia no Regimento de
1548 – que determinava as funções do primeiro governador-geral do Brasil, Tomé de
Sousa – foi a responsável não só pela instituição do latifúndio, como também da
monocultura, implantando um modelo de posse da terra que perdura até hoje. Essa
norma recomendava que “as terras apropriadas fossem doadas, livremente, para o
cultivo de cana e para a fundação de engenhos, às pessoas com ‘possibilidades’ de
desenvolver a empresa” (CHIAVENATO, 1996, p. 29). Esta decisão significava, de
acordo com Chiavenato, que os gigantescos latifúndios implantados pelas sesmarias
seriam ocupados, segundo o Regimento, somente pela monocultura da cana-de-açúcar,
impedindo a formação de pequenas propriedades. Essa realidade ficou inalterada até
1850, já durante o Império, quando a Lei n. 601, que ficou conhecida como Lei de
Terras, acabou com o sistema de posse, determinando que a terra somente poderia ser
adquirida através da compra. Mas, o que significou essa Lei de Terras, afinal? Uma das
suas características era elevar o preço das terras, obrigando o pagamento à vista. Dessa
forma, a venda das terras públicas era dirigida para uma elite social e o dinheiro
arrecadado seria aplicado na vinda de colonos europeus. “A Lei de Terras visava não só
consolidar a posse da terra nas mãos de uma elite, como também preparar um novo tipo
de mão de obra para a lavoura, pois sabia-se que o escravismo teria de acabar.”

Mas os trabalhadores do campo aos poucos se organizam...

O modelo citado de concentração fundiária somente começou a ser questionado na


segunda metade do século XX, após o processo de industrialização que determinou o
deslocamento dos trabalhadores e a crescente concentração urbana da população
brasileira. Agora, diferentemente do que ocorrera em Canudos e em outras regiões do
país, a população rural tinha “para onde ir”: empregar-se como trabalhador assalariado
nas empresas que comandaram o processo de modernização capitalista do Brasil. Como
operários, inclusive, esses trabalhadores tiveram acesso a benefícios adicionais e
inéditos. A partir da Era Vargas, após a Revolução de 1930, todas as categorias
profissionais reconhecidas pelo Estado tiveram a sua carteira de trabalho assinada, e
uma legislação que lhes garantia o recebimento de um salário mínimo, férias
remuneradas, a estabilidade no emprego e um sistema de previdência social que lhes
assegurava a assistência médica e a posterior aposentadoria. Porém, para aqueles que
permaneciam como lavradores, nada – o tempo estacionara no Brasil Império e na
Primeira República, sem qualquer legislação trabalhista, sem acesso a quaisquer direitos
previdenciários. Esse era o “pacto da classe dominante”, iniciado pelo Estado Novo do
presidente Getúlio Vargas (1937-1945) e seguido pela política da República Populista
(1946-1964): a modernização capitalista brasileira – com as suas consequências para o
trabalho assalariado – era um fenômeno exclusivamente urbano, sem qualquer
incidência no meio rural. O grande problema é que somente através de uma violência
brutal seria possível manter uma realidade marcada por tanta desigualdade no campo,
que pretendia a perpetuação da herança colonial do modelo com base no latifúndio,
controlado pelos ricos proprietários que formavam as “oligarquias rurais”.
Terra para quem nela trabalha: os trabalhadores sem-terra retomam a sua luta
histórica...

Após uma fase de violenta repressão às suas lideranças, comandada pelo aparato militar
que tomou o poder em 1964, a questão agrária voltou com força no final da década de
1970, impulsionada pelo aprofundamento da crise econômica capitalista mundial, com o
aumento do desemprego, da miséria e, consequentemente, do êxodo da população do
campo para a cidade. Neste contexto político explosivo, diversos movimentos sociais
contra a alta do custo de vida eclodiram nas maiores cidades, sob o comando de um
renovado movimento sindical em luta por melhores condições de trabalho e maiores
salários. Em relação a essa retomada das lutas do campo, teve grande destaque o papel
exercido por lideranças leigas e religiosas da Igreja católica que abraçaram as ideias da
Teologia da Libertação (maiores detalhes no capítulo sobre Religiosidade), criando, em
1975, a Comissão Pastoral da Terra (CPT), um órgão de assessoria política e jurídica
que contribuiu, efetivamente, para a organização dos trabalhadores rurais, de norte a sul
do país. Através da ação organizada da CPT, no Sul do Brasil, que associou militantes
católicos e luteranos, foi criado o Movimento dos Trabalhadores Rurais SemTerra
(MST), a partir das lideranças que se reuniam no acampamento da Encruzilhada
Natalino, em Ronda Alta, no Rio Grande do Sul, e o Movimento dos Agricultores
SemTerra do Oeste do Paraná (MASTRO), no final dos anos 1970. Rapidamente, esses
movimentos localizados se articularam nacionalmente com outras lutas isoladas que se
desenvolviam no campo, em diferentes regiões do país – como, por exemplo, dos
trabalhadores atingidos por barragens, obrigados a desocupar suas terras em decorrência
de projetos de construção de grandes hidrelétricas por parte do governo federal –,
fornecendo o corpo e a estrutura que viriam a formar o MST. Após a realização de
várias reuniões regionais de organização, o Encontro Nacional, que é considerado como
o marco de fundação do movimento, ocorre em janeiro de 1984, em Cascavel, no
Paraná. Com o lema “Terra para quem nela trabalha”, esse primeiro encontro do MST
reuniu lideranças de doze estados brasileiros, representantes da Abra – Associação
Brasileira de Reforma Agrária, da CUT – Central Única dos Trabalhadores, do Cimi –
Conselho Indigenista Missionário e da Pastoral Operária de São Paulo, comprovando a
forte ligação do movimento com os militantes católicos da Teologia da Libertação.
Desde então, o MST transformou-se numa referência internacional da luta dos
trabalhadores rurais, encontrando-se atualmente organizado em vinte e quatro estados,
por todas as regiões brasileiras, reunindo cerca de 350 mil famílias assentadas.
Transcrevemos a seguir o texto oficial do próprio movimento, que apresenta a sua
estrutura organizativa: Além dessa estrutura, o MST organiza, a cada cinco anos, o seu
Congresso Nacional com a participação de mais de quinze mil militantes na avaliação e
definição das linhas políticas do movimento. A cada dois anos, o MST também realiza o
seu Encontro Nacional, que analisa e atualiza as deliberações do Congresso.

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Além dessa estrutura, o MST organiza, a cada cinco anos, o seu Congresso Nacional
com a participação de mais de quinze mil militantes na avaliação e definição das linhas
políticas do movimento. A cada dois anos, o MST também realiza o seu Encontro
Nacional, que analisa e atualiza as deliberações do Congresso. A luta do MST ganhou
notoriedade principalmente em 1995-1996. Ao lado das já históricas ocupações de terras
improdutivas – ou seja, de terras férteis abandonadas ou subutilizadas para a produção
de gêneros alimentícios –, o movimento promoveu uma caminhada de mil quilômetros
até Brasília, em abril de 1996, em defesa da reforma agrária e do emprego, contra as
políticas neoliberais do governo federal. Foi nesse período, entretanto, que ocorreram os
massacres de Corumbiara, em Rondônia, e de Carajás, no Pará, com diversas lideranças
do movimento entre os trabalhadores assassinados e presos. A ocupação de terras
avaliadas como “improdutivas” continua sendo a “tática” principal da ação política do
MST, provocando sempre fortes reações dos proprietários de terras e dos grandes
empresários dos meios de comunicação, que não reconhecem as terras como
improdutivas e sempre se referem às ocupações como “invasões de propriedade”,
configurando-as como “crimes” contra o capital.

A Sociologia e a questão da terra no Brasil

Neste capítulo, nos preocupamos em apresentar informações gerais sobre o modelo de


concentração de terras implantado historicamente em nosso país pelas classes sociais
dominantes que, mesmo sob o ponto de vista do desenvolvimento capitalista, resultou
em um projeto politicamente conservador. Afirmar isto significa o entendimento que a
não realização de uma reforma agrária, durante os nossos séculos de História, significou
uma opção por um modelo de capitalismo atrasado, dependente e subalterno em relação
aos interesses do capital internacional. Mas, o que isso tem a ver com os que moram nas
cidades? Entre as consequências da opção por esse modelo, podemos citar não só a
manutenção da condição de pobreza entre os camponeses brasileiros, como as
migrações contínuas do campo para as periferias das cidades, levando ao “inchaço” das
regiões metropolitanas, com a multiplicação de favelas, a ocupação desordenada do
espaço urbano e o aumento da violência. A ausência de políticas públicas adequadas
contribui para o agravamento da questão social brasileira, onde a situação do uso e da
distribuição da terra é um dos elementos mais importantes e que precisa constar em
todos os debates sobre o presente e o futuro do nosso país. Achamos importante
destacar o processo de organização dos trabalhadores do campo na luta contra um
modelo altamente concentrador e excludente, mesmo sob a perspectiva capitalista.
Assim, nos preocupamos em apresentar o MST como um exemplo da luta e da
organização dos trabalhadores rurais, que se articula com as lutas urbanas, mas cujas
ações geram inúmeros conflitos no campo e produzem polêmicas de peso em diversos
setores da sociedade brasileira. Um exemplo, nesse sentido, pode ser encontrado nas
condenações que o MST tem recebido em algumas instâncias do Poder Judiciário,
interpretadas como uma tentativa de “criminalização” do movimento social. No campo
de estudo da Sociologia, o investimento em pesquisas sobre esse tema é entendido como
parte da Sociologia Rural, disciplina presente em diversas universidades públicas
brasileiras. Em termos gerais, podemos dizer que a Sociologia Rural é o estudo da
organização social do camponês – termo que significa “homem do campo” (derivado do
latim campus) –, sujeito que se diferencia do “homem da cidade” em função do seu
contexto social e histórico específico; das sociedades rurais em geral ou ainda o estudo
do “modo de vida rural e a natureza das diferenças rurais e urbanas”. Nesses estudos,
tem especial destaque as mudanças sociais provocadas pela penetração do modo de
produção capitalista no campo, com as suas opções pela monocultura e pelo latifúndio,
ou pela modernização tecnológica e mecanização das lavouras, assim como a
implantação de empresas multinacionais e do agronegócio e o papel assumido pelo
Estado nesse processo. Então, como se pôde perceber neste capítulo, a questão da terra
no Brasil não se trata de um assunto ”menor” neste país cada vez mais urbanizado ou
que diga respeito apenas a quem vive no campo ou que vivencia os conflitos apontados
no texto.

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