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FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS O CORPO NO CINEMA

HISTÓRIA DO CINEMA
26 de novembro de 2021

MODERN TIMES / 1936


(Tempos Modernos)

Um filme de Charlie Chaplin

Realização: Charlie Chaplin / Argumento: Charlin Chaplin / Direção de Fotografia: Rollie


Totheroh e Ira Morgan / Direção Artística: J. Russell Spencer / Cenários: Charlin Chaplin e J.
Russell Spencer / Caracterização: Elizabeth Arden / Música: Charlin Chaplin, Edward Powell,
David Raksin, Paul Neal e Frank Maher / Montagem: Charlin Chaplin e Willard Nico /
Assistente de Realização: Carter Dehaven / Interpretação: Charlin Chaplin (o operário),
Paulette Goddard (a orfã), Henry Bergman (p proprietário do café), Tiny Sandford (Big Bill),
Chester Conklin (o mecânico), Hank Mann (o ladrão), Stanley Blystone (pai da orfã), Al Ernest
Garcia (presidente da fábrica), Richard Alexander (o companheiro de cela), Cecil Reynolds
(Ministro), Mira McKinney (esposa do Ministro), Murdock MacQuarrie (J. Widdecombe
Billows), Wilfred Lucas (o oficial juvenil), Edward LeSaint (Sheriff Couler), Fred Malatesta (o
chefe do café), Sammy Stein (operário), Juana Sutton, Ted Oliver (assistente de Billows)

Produção Charlie Chaplin para Charlie Chaplin Film Corporation / Duração: 89 minutos /
Estreia Mundial 5 de fevereiro de 1936 / Estreia em Portugal 2 de março de 1937

Modern Times é um dos pontos mais altos da obra de Charlie Chaplin e um dos filmes mais
importantes na História do Cinema, centrando-se na icónica personagem Little Tramp e nas
alterações políticas, sociais e económicas provocadas pela sociedade industrializada.

Numa altura em que o cinema já usufruía do som como forma de integração narrativa há
quase uma década, Chaplin emprega as técnicas sonoras utilizando-as para fins cómicos,
resultando numa visão que perspetiva o som cinematográfico como algo pouco natural. Ao
longo do filme, são predominantes os sons das máquinas fabris e do relógio, remetendo ao
espectador a ideia de que aquilo que importa mais é a produção e a eficácia da fábrica.

Quando Chaplin conheceu Mahatma Gandhi, com quem discutiu sobre a sociedade moderna e
as tecnologias industriais, ganhou uma nova perspetiva sobre as mudanças sociais e sobre os
efeitos da industrialização na humanidade – um olhar que era enfatizado numa década em que
os efeitos da crise de 1929 eram altamente notáveis. É assim, numa viagem pela Europa, em
1931, que nasce a ideia de Modern Times, um filme com pouquíssimas falas – numa altura em
que o cinema já não era apenas mudo –, que toda a gente pode entender o que é retratado,
sem qualquer tipo de barreira linguística.

A primeira parte do filme inicia-se com o operário (Little Tramp) da fábrica Electro Steel
Corporation que trabalha, incansavelmente, na linha de montagem, ao lado dos seus colegas,
não tendo sequer o direito a uma pausa que lhe permita terminar de fumar um cigarro. A
ocupação que desempenha caracteriza-se por ser
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extremamente monótona, o que o leva a repetir os movimentos próprios da linha de produção


em situações fora do trabalho, quase como uma espécie de “tiques automáticos” provenientes
da industrialização. A exaustão e o cansaço do protagonista enquanto operário contrasta com
a liberdade e com o corpo “desamarrado” que está patente em Little Tramp quando este, para
garantir emprego como empregado de mesa, cede ao improviso da letra de uma música – este
momento marca também a primeira vez que ouvimos a voz do protagonista. A ausência da
premeditação inerente ao improviso opõe-se aos automatismos próprios dos movimentos
repetitivos do operário, que resultam numa expropriação da criatividade e da felicidade, como,
aliás, nos é sugerido nos primeiros minutos do filme. O plano de uma multidão em direção ao
local de trabalho assemelha-se visualmente ao plano das várias ovelhas, sendo possível fazer
uma analogia entre os humanos e os animais, que, nesta sociedade industrializada, em muito
pouco se distinguem – ambos são meios para atingir fins.

A superioridade da Máquina face ao Homem é notória em todos os minutos do filme. A


premissa é simples: quanto mais se produzir em menos tempo, melhor, e o relógio – tal como
o seu som – realça essa importância dos tempos modernos, bem como a nova máquina de
refeições que chega à fábrica. Precisamente na cena em que a máquina de refeições é testada,
o espectador tem uma nova – entre várias – confirmação de que, de facto, a produção e o
lucro supera o bem-estar e social dos humanos, pois, mesmo após ser percetível de que existe
sofrimento e desconforto em Little Tramp, os criadores do aparelho insistem em fazer
experiência repetidamente de modo a tentar vender o equipamento. Depressão, colapsos
nervosos e confusão são o resultado da exploração intrínseca à realidade da sociedade
industrializada que, neste caso, conduzem também à prisão indevida do protagonista, não
fosse este sistema injusto e abusivo. No entanto, a detenção do mesmo destaca a
precariedade e o movimento acelerado da cidade, dado que Little Tramp sente mais liberdade
na prisão – livre dos “automatismos da industrialização” e da noção do tempo que é impossível
de ser esquecida – do que fora dela. É, aliás, profundamente triste para ele receber a notícia
de que irá sair da prisão, já que isso implica o fim da sua liberdade.

Procurando escapar à forma de fugir da “prisão” das greves perigosas e da rebelião dos
desempregados, o ex-prisioneiro conhece a órfã – mais uma vítima do sistema –,
acontecimento esse que impulsiona o seu desejo de construir uma família feliz e saudável e,
consequentemente, a vontade de arranjar um emprego. É essa a sua motivação.

O ambiente cómico do filme contrabalança com a realidade sombria a que este recorre. Os
dois protagonistas, na busca da sua felicidade, estão destinados à exploração do trabalho, não
podendo fugir disso, pois são vítimas da sociedade, não sendo possível escapar a este sistema,
tal como acontece em Ladri di biciclette (1948).

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