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Rio de Janeiro, 29/08/2021

Carta das Opções B fernandokling@gmail.com


#7

“Não compre moto apenas por querer usar jaqueta de couro”

Você sofre da Por que tanta gente ainda perde dinheiro operando opções?.
Síndrome da Se tem uma coisa que o mercado financeiro dificilmente perdoa, é investidor que não sabe fazer conta. E isso não
Mega-Sena? significa que você precise ser doutor em matemática ou algum gênio das engenharias da vida (produção, civil ou
qualquer outra) para ter sucesso. Na verdade, se você dominar as quatro operações fundamentais (soma, subtração,
divisão e multiplicação), já vai estar na frente de muitos. Só precisa adicionar uma pitada de bom senso e pronto,
já estará pronto para se diferenciar de 99% das pessoas físicas que investem em bolsa no Brasil. Mas eu divago.
Por que a maioria das pessoas perde dinheiro operando opções? Porque elas sofrem da Síndrome da Mega-Sena.
Os acometidos desse mal dormem e acordam todos os dias sonhando que vão fazer uma operação milagrosa, com
todo ou quase todo o patrimônio, de forma a mudar esse sonhador de patamar. Alguns são até mais afetados,
acreditando que vão repetir esse feito mais duas ou três vezes até ficarem milionários. Acreditando então nas
promessas de "convexidade" e ganhos ilimitados, se enchem de opções, seja de compra ou de venda, acreditando
que vão ganhar em uma eventual disparada de determinado ativo, ou em algum colapso do sistema. Aqui chegamos
em dois grandes problemas, que esse especulador negligencia, seja por ignorância ou pela falta de orientação devida:

{ todo comprador de opções (sejam Calls ou Puts) paga para esperar alguma coisa acontecer, isso é, tem o theta,
ou tempo, jogando contra ele. Os efeitos do tempo são ainda mais poderosos quando as opções compradas são
aquelas OTM, fora do dinheiro, coincidentemente as normalmente escolhidas pelos sonhadores para especular.
{ compras simples de opções são vega positivo, ou seja, se beneficiam de um aumento da volatilidade. O problema?
O problema é que a maioria das pessoas chega sempre atrasada. Querem procurar proteção depois que a bolsa já
caiu, ou querem entrar depois que o ativo já disparou 20, 30%, cheios do viés de status quo, aquele que te faz
crer que o que está se movendo em uma direção vai continuar nessa direção.

O que mais vemos é uma combinação trágica (para os comprados) desses dois fatores citados. A Lei de Murphy
normalmente entra em cena, e tudo que poderia dar errado, dá. O tempo joga contra, o ativo objeto não se
desloca na direção desejada, ou pior, até vai, mas não na intensidade necessária (o famoso "ganha mas não leva") e
além disso a volatilidade ainda cai. Ou seja, o especulador que compra opções (especialmente as OTM) pura e
simplesmente depende de uma combinação improvável de fatores para conseguir ganhar dinheiro.

comportamento do delta com diferentes volatilidades

É fácil notar que, quanto maior a volatilidade implícita nas opções, maior vai precisar ser a amplitude do movimento
direcional para que o investidor consiga ser lucrativo. Isso significa o que, Fernando? Que em ambientes de
volatilidade alta, é menos provável que você ganhe dinheiro tomando posições direcionais.

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Menos é mais Toda super-simplificação é burra.
Opções, como falado em cartas anteriores, são simplesmente ferramentas de garantia de preço. Se tornou lugar
comum vermos várias pessoas por aí, investidores, influencers, gestores, não importa o cargo, que parecem sentir
prazer em complicar ainda mais algo que já é complexo. Parece que é difícil para eles usar uma linguagem do dia
a dia, menos tecniquês e mais realidade. É preciso dar direção a quem quer aprender, trazer clareza, não ficar
confundindo ainda mais a cabeça das pessoas com termos complexos. Menos é mais. O que não pode acontecer é
jogar o investidor na vala da "super-simplificação": coisas como "se acha que vai subir, compra call, se acha que vai
cair, compra put".

Ao forçarmos a barra nas simplificações, simplesmente cortamos partes do aprendizado que não pode-
riam ser cortadas, partes que farão falta em algum momento. Como falado na seção anterior, boa parte das perdas
dos investidores tem origem na ingenuidade e na falta de conhecimento de base, isso também pode ser explicado
pela "super-simplificação", como essa do exemplo anterior. E o pior de tudo, depois que as perdas se concretizam,
aqueles que deveriam instruir e guiar ainda aparecem, se fazendo valer do viés de perspectiva, dizendo que "era
óbvio" que aquilo ia acontecer, verbalizando explicações detalhadas (a posteriori) para justificar cada detalhe do
que levou às perdas.

Madame "Eu-nunca-erro" e suas previsões de retrovisor

Me lembro como se fosse hoje de uma aula na graduação sobre "modelos", onde a definição de modelo era: uma
abstração do mundo real. Por abstração, entenda uma simplificação. Isso significa que nenhum modelo serve
pra nada? Não, muito pelo contrário. Muitos deles são sim, úteis, mas o usuário de qualquer modelo não pode
esquecer que ele é nada mais que isso: só um modelo. Simplifiquemos então nossas operações e estruturas com
opções, mas não o domínio ao qual elas estão se aplicando (ações, commodities, índices, moedas). A quantidade
de moving parts nesses ecossistemas é tão grande que qualquer modelagem já nasce torta e fadada ao fracasso,
podendo ser altamente perigosa, com grande potencial de prejuízos financeiros.

"todos os modelos estão errados, alguns são letais"

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Escavador de Matando a cobra e mostrando o pau.
opções Na Carta #6 eu mostrei uma operação que tinha feito com opções em VALE3, a título educacional, justamente
para exemplificar como colocar em prática o que hoje discorro com mais detalhes na seção 1. Para os que não
viram ou não se lembram, montei junto com os alunos do Muito Além do Básico (meu curso completo de opções) a
seguinte estrutura:

Operação montada com os alunos do MAB

Vou transcrever aqui o racional usado, assim como escrevi na última carta:
Eu, particularmente, adoro esses momentos para operar na ponta vendida da volatilidade, basicamente vendendo vol
para quem não sabe o que está fazendo. A volatilidade pode sim subir indefinidamente, mas ela é uma variável que
tem fortes tendências de retorno às médias. Basta que as incertezas comecem a se dissipar para que a volatilidade
volte a cair. Esse efeito da subida da volatilidade infla os preços das opções (prêmios), deixando-as caras para
aqueles que querem comprar. A maioria dos investidores está agora ávida por comprar PUTs de VALE, depois da
ação já ter caído mais de 15%. O atrasado, no mercado financeiro, não come cru, ele simplesmente paga caro e
normalmente perde o bonde (e dinheiro).

Uma semana depois, avisei a todos da saída:

Oportunidades como essa passam na nossa frente a cada mês, só precisamos ter o olhar atento e sabermos o que
estamos procurando. Não tem necessidade de ficar "caçando" trade, até porque todo mundo tem sua vida, seu
trabalho, sua família, e isso não pode ser uma coisa que vai consumir seu tempo e sua energia. Pelo contrário, temos
que pensar as opções como um meio de potencializar os retornos de nossas carteiras, aumentar a rentabilidade, e
não como um fim em si mesmas, assim como frisei na seção 1. Se cure da síndrome da mega-sena, ainda dá tempo.

Essa estrutura consumiu cerca de 9k de garantia (não teve desembolso de capital, dado que era uma estrutura
de crédito), o que significa um retorno de 20% em cima da garantia empregada, em pouco mais de 5 dias. Teve
muito aluno pagando o investimento no MAB só com essa operação.
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Indicadores e Monitorando o que acontece na terra do Tio Sam.
Insights Nos Estados Unidos, tivemos alguns report dando bons sinais quanto à percepção do gringo em relação ao Brasil:

JP Morgan otimista com Brasil

Além disso, o otimismo segue por lá quanto ao próprio índice norte americano, o S&P500, conforme relatório dessa
semana do UBS. A reunião em Jackson Hole serviu pra vermos que o tapering (a decisão de quando diminuir o
programa de compra de títulos) não vai ser um problema por agora. O Presidente do Fed destacou que ritmo de
redução dos estímulos segue dependente de dados e reforçou que tapering não é aumentar as taxas de juros (hoje
próximas a zero). Essas falas serviram para aliviar as tensões e "empurrar com a barriga" o problema para a reunião
do final do ano (novembro).

projeção do UBS de que o S&P passe dos 5 mil pontos ainda esse ano

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Enquanto isso, Fluxo gringo e trégua institucional.
na Aqui no Brasil, tivemos sinalizações de que nossa batalha entre os poderes, parece ter chegado a uma trégua, coma
Brasil-lândia devolutiva do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, rejeitando o pedido de impeachment do ministro do STF
Alexandre de Moraes. :

Sinalizações de paz, ou pelo menos uma trégua

Além disso, tivemos ainda o alívio quanto ao "meteoro" dos precatórios, uma saída para que o fantasma do estouro
do teto de gastos pare de nos assombrar em 2021.

Essa conjunção de fatores tirou pressão da curva de juros nos últimos dias, além de ter ajudado a trazer o IBOV de
volta da faixa dos 114k pontos até os 121k novamente. Importante ressaltar ainda que quem estava vendendo era
basicamente local, emocionado com o retorno dos 2 dígitos nos pré-fixados. O fluxo gringo continua forte, com
saldo positivo, como podemos ver na imagem abaixo:

Podemos esperar então, dada uma continuidade desse movimento institucional e de Brasília, que a bolsa não
volte a chacoalhar como na penúltima semana. Se o clima de tensão escalar, dependendo do que acontecer nas
manifestações de 7 de setembro, poderemos ver novamente descolamentos entre o Brasil e os pares emergentes,
sem contar os EUA. Pode voltar a abrir oportunidades, mas exige muito sangue frio e estômago para lidar com a
volatilidade. Vamos seguir acompanhando, vigilância constante, afinal, aqui até o passado é incerto.

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Enquanto isso, A década perdida, v2.
na A história do milagre econômico na gestão dos militares, para depois passarmos pelo que a história chamou de
Brasil-lândia, "década perdida" em 1980 é conhecida de quase todos. O que parece que muitos têm fechado os olhos é que, a dé-
parte 2 cada que compreendeu os anos de 2011 até 2020 foi tão ruim quanto, em termos de crescimento econômico, a de 1980

Não só perdemos a chance de continuarmos nossa trajetória de estabilização econômica, com melhora de produtividade
e geração de riqueza, mas nosso flerte com o populismo e depois o nacionalismo, numa clara representação de como
é difícil nos livrarmos de nosso passado estrutural, nos fez perder participação e relevância em termos globais:

Faço questão de utilizar esse meio de comunicação para trazer esses dados, como um apelo a você, leitor, que se
lembre disso na hora de escolher seus posicionamentos no futuro próximo. Tudo que fazemos e, principalmente, o
que deixamos de fazer, cobra seu preço mais cedo ou mais tarde. Na vida e nos negócios, ou você está subindo ou
você está caindo, está andando para frente ou está andando para trás. Não tem essa de “estou parado”, estou na
segurança... a inércia é o começo da queda.

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Seção A turma está se superando.
vergonha Depois da chuva de IPOs que tivemos nos últimos meses, a turma parece ter tirado um pouco o pé. A maioria aqui
alheia já deve saber, a essa hora, que entrar em IPO é uma péssima assimetria, pelo menos do ponto de vista informacional.
Existem os bons IPOs e existem os péssimos. Grande parte das empresas que vieram para a bolsa no último ano
não estava pronta, essa é a grande verdade. Faz-se um conluio entre a empresa, os donos e a turma dos bancos de
investimento, que levam uma bolada nessa brincadeira, e quem paga o pato é o minoritário iludido. Coloquei em
cartas anteriores o desempenho dos IPOs recentes vs o IBOV, e foi duro de engolir.
Agora, não satisfeitos com o péssimo desempenho de suas ações no mercado, vemos tragédias como essa nas redes
sociais:

Parece digno de uma cena daquele filme (excelente, por sinal) A Origem, quando tentam plantar uma ideia na
cabeça das pessoas. Estamos vivendo pra ver uma empresa listada em bolsa patrocinar um post para dizer que
determinado banco, coincidentemente o que coordenou a oferta, tem visão positiva para as ações da companhia. É
ou não é digno de roteiro de comédia? Parece aquelas cenas de quando você chega em casa e seu cachorro está
lambendo as próprias bolas. Mas, em terra de poema em release de resultados, de fato relevante com relatório de
casa de research, essa aí é só mais uma página lamentável no manual do "como não fazer".
Nos vemos domingo que vem na Carta #8, meus amigos. Forte abraço e boa semana!

7/7

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