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Raízes Jurídicas

ISADORA ISSN
GOMES 1981–3872
MAZUCATTO

ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE TRABALHO: COMPLIANCE


COMO INSTRUMENTO DE MITIGAÇÃO DE OCORRÊNCIAS

MORAL HARASSMENT IN WORK ENVIRONMENT: COMPLIANCE


AS AN INSTRUMENT FOR MITIGATING OCCURRENCES

Isadora Gomes Mazucatto1

RESUMO
A modernização das relações de trabalho e as novas exigências do mercado acerca do
perfil do trabalhador contribuíram para o estabelecimento de relações humanas que
partem de uma lógica utilitária, favorecendo a rivalidade e hostilidade, o que permite a
configuração de um cenário propício a situações de violência psicológica no trabalho,
com especial grau de ocorrência de assédio moral. Partindo dessas premissas, o artigo
analisa as características e alcance do assédio moral no ambiente de trabalho, a fim
de demonstrar que a prevenção por meio de programas de compliance é mais eficaz
na promoção da ética ergonômica e, consequentemente, na mitigação dos episódios
de assédio moral.

PALAVRAS-CHAVE
Meio ambiente de trabalho. Assédio moral. Prevenção. Programas de compliance.

ABSTRACT
The modernization of work relationships and the new demands of the market about
the worker profile contributed for establishment of human relations from a utilitarian
logic, which favors the competition and hostility, and allows the configuration of a
scenario conducive to psychological violence situations at work, especially to moral
harassment occurrence. Based on these premises, the paper analyzes the characteristics
and reach of the moral harassment in the workplace to show that prevention through
compliance programs is more effective to promote ergonomic ethics and, consequently,
to mitigate moral harassment cases.

KEYWORDS
Work environment. Moral harassment. Prevention. Compliance programs.

1 Mestre em Direito pela Universidade de Coimbra e sócia-fundadora do escritório Gomes de Freitas


Sociedade de Advogados. E-mail: isadoragmazucatto@gmail.com.

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ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE TRABALHO: COMPLIANCE COMO INSTRUMENTO DE MITIGAÇÃO DE OCORRÊNCIAS

INTRODUÇÃO
A luta por melhores condições de trabalho definitivamente não é assunto do
século passado. Pelo contrário, ganha cada vez mais vivacidade e adeptos.
Fato é que as intensas exigências sobre o perfil de trabalhador que o mercado
tem procurado tiveram por consequência o estabelecimento de relações humanas que
se pautam numa lógica utilitária do outro, de severa competitividade, com efeitos que
refletem e prejudicam a manutenção de um ambiente de trabalho sadio.
Por isso, é insuficiente pensar no ambiente de trabalho restritivamente como
um espaço físico. É preciso assimilar que tudo o que está posto neste ambiente se
relaciona, porquanto, fala-se em meio ambiente de trabalho, que deve ser ergonômico
e sadio para o trabalhador, razão pela qual é tutelado constitucionalmente e ocupa
lugar entre as obrigações do empregador.
No entanto, eventualmente ocorrem conflitos na gestão das atividades
desenvolvidas e dos recursos humanos de determinada organização, visto que todo
e qualquer trabalho possui certo grau de exigência, o que gera atritos esporádicos. O
detalhe está em como estes atos de gestão se desenvolvem, ao passo que se ocorridos
repetidamente os conflitos e se hostis os comportamentos, corre-se sério risco de estar
diante de uma situação de assédio moral.
Sendo assim, é imprescindível que se saibam os limites dos atos de gestão e
os contornos do assédio moral. Isso porque, hodiernamente, as ocorrências de assédio
moral representam, para além do desgaste do ambiente de organizacional, um custo
significativo para a empresa.
A fim de atingir esses objetivos, num primeiro momento, buscou-se traçar
breve panorama sobre a modernização das relações de trabalho e a intensificação de
episódios de assédio moral, seguido pelos critérios de análise para caracterização do
assédio moral no ambiente de trabalho e suas consequências práticas e jurídicas. Por
fim, tendo sido demonstrada a necessidade de implementação de condutas preventivas
realmente eficazes com relação ao assédio moral, aproxima-se a figura dos programas
de compliance como alternativa para mitigar as ocorrências desses episódios no
ambiente de trabalho.
O presente estudo não se pretende exaustivo, considerando a amplitude
dos assuntos relacionados ante a modesta pretensão de demonstrar que a prevenção
do assédio moral nas empresas através da criação e implementação de um método
de operação coeso (consubstanciado em programas de compliance), que viabilize a
prática da ética ergonômica, é o meio menos desgastante e custoso e mais eficaz para
obstar as ocorrências de assédio moral no ambiente de trabalho.

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1 A MODERNIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO E O ASSÉDIO MORAL


A Revolução Industrial foi o marco histórico que impulsionou as primeiras
manifestações de oposição às condições de trabalho a que os indivíduos eram
submetidos. A partir de então, os movimentos em defesa dos trabalhadores irradiaram-
se pelo mundo e diversas foram as iniciativas para mudar a realidade de hostilidade
dos ambientes de trabalho, que iam dos aspectos relacionados à própria estrutura do
local em que as atividades eram realizadas até os termos sobre os quais se desenvolvia
a relação entre gestores e trabalhadores.
Inicialmente, a principal reivindicação era a de um ambiente físico de
trabalho adequado, que garantisse a segurança dos trabalhadores e cumprisse regras
básicas de higiene. Além disso, limitação de jornada e regulamentação do trabalho de
mulheres e crianças eram verdadeiras conquistas.
Contudo, notava-se, cada vez mais, que a relação de trabalho não se
estabelece apenas de forma objetiva, mas se desenvolve com a combinação de
inúmeros fatores, adquirindo certo grau de complexidade.
Diante disso, as expressões local e ambiente de trabalho parecem
insuficientes para representar o contexto que hoje envolve o trabalho. Fala-se, por
isso, em meio ambiente do trabalho.
Não se trata de simples rigor linguístico, mas de uma necessária
reformulação do conceito com o intuito de dar completude ao que se quer expressar,
haja vista que o termo ambiente exprime o conjunto de elementos e a palavra meio,
por sua vez, contextualiza a interação entre tais elementos. Logo, a expressão meio
ambiente se manifesta mais rica de sentido (enquanto conexão de valores) sendo,
portanto, mais adequada para referenciar o universo do trabalho (SILVA, 1997, p. 02).
Ainda que sob outro viés, tal ajuste se justifica. A dignidade da pessoa
humana é o elemento central na organização da sociedade brasileira e do Estado
democrático de direito, instituído pela Constituição da República Federativa do Brasil
de 1988 (CF/88), motivo pelo qual se pode afirmar, em breve síntese, que o conceito
de meio ambiente adotado pelo ordenamento jurídico pátrio compreende a totalidade
dos elementos materiais e imateriais que circundam os seres humanos e são essenciais
para a manutenção da sua integridade física e para a qualidade de vida.
Diante disso, infere-se que todas as ações nos espaços públicos e privados,
artificiais e naturais, materiais e imateriais, deverão primar pela manutenção do
equilíbrio necessário à integridade física e psíquica dos indivíduos (FIORILLO, 2012,
p. 68-74).
Portanto, sendo o conceito de meio ambiente assumido pelo ordenamento

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onipresente e estando ele vinculado à ideia de dignidade da pessoa humana, não há


como afastar de seu âmbito de incidência os locais de trabalho (SILVA, 1997, p. 05).
Em razão disso, a proteção do meio ambiente do trabalho encontra tutela
constitucional na medida em que a saúde e o trabalho integram o rol dos direitos
sociais (artigo 6º da CF/88), encontra lugar ao relacionar os direitos dos trabalhadores
urbanos e rurais (incisos XXII, XXIII e XXVIII do artigo 7º da CF/88) e reaparece
no rol mínimo de competências do Sistema Único de Saúde (artigo 200 da CF/88), ao
fixar, no inciso VIII, a colaboração na proteção do meio ambiente, nele compreendido
o do trabalho.
Denota-se que a proteção da qualidade de vida no meio ambiente do
trabalho ocorre sob diversas perspectivas jurídicas, razão pela qual o tema não é
estranho a outros ramos do Direito, incluindo o Direito Ambiental, restando a este o
escopo de proporcionar ao trabalhador um meio ambiente de trabalho sadio, valendo-
se de todos os meios jurídicos aptos para a redução de riscos inerentes ao trabalho
(FIGUEIREDO, 2013, p. 259-260).
Neste contexto é que encontra lugar a ergonomia (do grego: ergon que
significa trabalho e nomos que quer dizer leis ou normas) que, segundo a Organização
Mundial do Trabalho (OIT) é “o estudo da interrelação entre seres humanos,
ferramentas e equipamentos que eles usam no local de trabalho e o ambiente em que
trabalham” (OIT, 2014, p. 171)
A Norma Regulamentadora nº 17 (NR-17) do Ministério do Trabalho e
Emprego (MTE) normatiza isso ao prever que as condições ambientais de trabalho
devem estar adequadas às características psicofisiológicas dos trabalhadores e à
natureza do trabalho a ser executado (item 17.5.1) (BRASIL, 1978).
É certo que observar o ambiente físico, identificar e ponderar os riscos
provenientes do espaço e do uso de ferramentas e equipamentos para o desenvolvimento
das atividades já não basta.
É preciso que, antes de tudo, considere-se a existência do próprio trabalhador
enquanto ser humano dotado de subjetividade, que traz consigo a sua própria carga de
vida e é condicionado a conviver com outros indivíduos – que igualmente detêm tais
características por força do trabalho.
Diante disso, viabilizar um meio ambiente de trabalho harmônico parece
mais desafiador do que cuidar, por exemplo, da segurança do trabalhador. Até porque,
quanto a este último aspecto existem inúmeras regras destinadas a nortear a sua
efetivação, mas sobre o primeiro, em que pese existirem estudos e orientações de
conduta, o fato de dirigir-se à gestão de pessoas, essas regras podem ser mais ou

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menos adequadas ou eficazes num ou outro contexto, não havendo fórmula exata para
lograr êxito neste ponto.
Hodiernamente as composições hierárquicas têm sido mais flexíveis, com
foco em projetos e contratos temporários para responder com rapidez às exigências do
mercado e manter os padrões de competitividade. Contudo, esta configuração que não
permite perpetuidade atinge (e corrói) as relações sociais, havendo uma segmentação
dos coletivos de trabalhadores e um estímulo a relações temporárias, marcadas por
uma “superficialidade degradante” (SENNET, 2005, p. 106).
Referidas condições resultam no desenvolvimento de meio ambientes
de trabalho orientados por uma lógica de “instrumentalização do outro” e de
competitividade severa entre os colegas de trabalho (HELOANI, 2004, p. 03).
Somando a isso está o fato de haver uma distância maior entre os dirigentes
e os trabalhadores, restando impraticável a comunicação e o diálogo franco e aberto
nas organizações, o que contribui para o agravamento e intensificação de episódios
de assédio moral.
Por um lado, exige-se um trabalhador competitivo, qualificado, criativo e
polivalente. Por outro, paira sobre esse trabalhador (o tempo todo) a crença de que não
estar apto a estas novas condições pode significar a perda do emprego, gerando tensão
constante (SCHMIDT, 2013, p. 91).
Ora, notadamente os processos de globalização e modernização das
relações de trabalho contribuíram para uma realidade de relações humanas centradas
numa lógica utilitária, permeada de rivalidade e hostilidade, cenário que favorece as
situações de violência psicológica no trabalho, tendo especial grau de ocorrência o
assédio moral (EBERLE, 2009, p. 105-135).
Contudo, imprescindível lembrar que antes de tudo, a modernização das
relações de trabalho deve levar em conta os direitos da pessoa humana de maneira
irrestrita, o que, muitas vezes, é derradeiramente negligenciado nos contextos
organizacionais.

2 CARACTERÍSTICAS E ALCANCE DO ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE


TRABALHO
Embora o assédio moral seja tão antigo quanto o próprio trabalho, apenas a
partir de 1990 foi identificado como um fenômeno altamente destruidor dos ambientes
de trabalho, não só por comprometer a produtividade, mas também por favorecer o
absenteísmo, em razão dos intensos desgastes psicológicos que ocasiona.
O assédio moral (termo concebido por Marie-France Hirigoyen - 1998,

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França) no contexto das relações de trabalho deve ser entendido como toda e qualquer
conduta abusiva, que se manifeste sobretudo por comportamentos, palavras (orais
ou escritas), atos e gestos que possam ocasionar dano à personalidade, dignidade ou
integridade física ou psíquica de uma pessoa, pôr em perigo seu emprego ou degradar
o ambiente de trabalho (HIRIGOYEN, 2011, p. 65).
Juridicamente, pode ser encarado como um abuso emocional ocorrido
no ambiente de trabalho, de forma intencional, sem cunho sexual ou racial, com a
intenção de afastar o trabalhador das relações profissionais (SCHMIDT, 2013, p. 90).
Prova de que o assédio moral é o mal, talvez mais devastador, que atinge o
ambiente do trabalho está no fato de o Senado Federal (BRASIL, 2011) e o Ministério
da Saúde (BRASIL, 2015) terem tomado a iniciativa de criar e disponibilizar materiais
informativos, em forma de cartilhas, destinados a tratar do assunto.
Ambas as cartilhas chamam atenção para a diferenciação entre o assédio
moral e atos de gestão ou conflito, o que é imprescindível neste cenário, tendo em
vista que toda relação de trabalho requer certo grau de exigências que são próprias da
execução do contrato de trabalho, o que está longe de ser assédio moral.
A diferença está substancialmente em como as cobranças são realizadas.

2.1 CARACTERÍSTICAS DO ASSÉDIO MORAL


O assédio moral não deve ser confundido com atos de gestão ou meros
conflitos. Atos como atribuição de tarefas aos subordinados, transferência do
trabalhador para outro posto de trabalho, alteração da jornada não se caracterizam
como assédio moral. Igualmente estão o fato de o exercício da atividade em si ser
psicologicamente estressante ou desgastante, as críticas construtivas ou avaliações
realizadas por colegas ou superiores – desde que não sejam realizadas em público
e exponham o trabalhador a situações vexatórias – e os conflitos esporádicos com
colegas ou chefias. Tais acontecimentos são meramente decorrentes da gestão e
próprio desenvolvimento das atividades da empresa.
A diferença está substancialmente em como as cobranças são realizadas.
Para que se caracterize uma situação de assédio moral deve-se constatar
a recorrência dos comportamentos hostis por um período de tempo estendido e a
intencionalidade de prejudicar, anular ou excluir um ou alguns alvos.
São, portanto, requisitos do assédio moral: i) habitualidade – os
comportamentos ofensivos devem ocorrer repetidas vezes e por um período
prolongado de tempo, sendo uma prática continuada e insistente (atos isolados não
configuram assédio moral); ii) ataques psicológicos – podem ser ações ou omissões

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que induzem desconforto psicológico, ofendem e humilham e apresentam gravidade


significativa; iii) intencionalidade – intenção de prejudicar, anular ou excluir; o
objetivo das condutas é destruir a pessoa, anular seus espaços de ação ou forçar um
desligamento de um projeto, função ou até do emprego; os ataques se apresentam
na forma de armadilhas, sutis ou explícitas, premeditadas e direcionadas sempre às
mesmas pessoas; iv) pessoalidade – o alvo das agressões é uma pessoa específica, o
processo de perseguição é direcionado e pessoal (SOBOLL, 2008, p. 30-31).
Está entre os elementos caracterizadores do assédio moral a: repercussão
da conduta abusiva na saúde física e psíquica da vítima (ARAÚJO, 2007, p. 203-
214). Porém, quanto a este requisito, entende-se que não precisa haver manifestação
de doença propriamente, mas basta que se vislumbre sinais exteriores de tensão
emocional e abalo psicológico do assediado (COLOMBO FILHO, 2016, p. 94).
Não se confundem com o assédio moral a figura do mobbing (Heinz
Leymann – Mobbing: la persécusion au travail - 1993, Suécia) e do bullying
(Lazarus – Estudos sobre o estresse social – 1984, New York). O primeiro refere-se
às perseguições coletivas e à violência ligada à organização (mera organização com
a finalidade de desestabilizar a vítima mediante agressões sistemáticas), enquanto o
segundo envolve casos de violência individual (existe ameaça à vítima). O assédio
moral, por sua vez, pode ocorrer de um grupo para um indivíduo (organizacional)
ou de uma pessoa para outra (interpessoal) (SOBOLL, 2008, p.30-31; COLOMBO
FILHO, 2016, p. 101).
Registra-se que o assédio moral tem estreita relação com dois elementos
específicos, quais sejam: o abuso do poder, que é rapidamente desmascarado e não é
necessariamente aceito pelos trabalhadores e a manipulação perversa que se instala
de forma mais insidiosa e que, no entanto, causa devastações muito mais significativas
(HIRIGOYEN, 2011, p. 66).

2.2 MODALIDADES
O assédio moral pode ocorrer em qualquer relação tipo havida na
organização, razão pela qual diz-se que ele pode manifestar-se sob três modalidades
distintas: vertical – relações de trabalho marcadas pela diferença de posição hierárquica,
abrigando tanto a forma descendente quanto ascendente; horizontal – relações de
trabalho sem distinção hierárquica, ou seja, entre colegas de trabalho sem relação de
subordinação; e mista – cumulação dos assédios morais vertical e horizontal.
Ainda assim, a maior parte dos casos ocorre entre superior e subordinado
(assédio moral vertical descendente). Sob tal perspectiva, nota-se estreita relação
entre o assédio moral e o medo e a sua instrumentalização, que se difunde de diversas

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formas na realidade organizacional das empresas (HIRIGOYEN, 2005, p. 111).


A permanente tensão decorrente da possibilidade de demissão, que nem
sempre é explícita, difunde-se nas políticas organizacionais e provoca um fundado
receio de ser vítima do desemprego e, por conseguinte, da exclusão social (EBERLE,
2009, p. 115). Por outro lado, existem os trabalhadores que não foram assediados, mas
vivem o temor de serem a próxima vítima.
Além disso, assume relevância os perfis das vítimas e dos agressores
(BRUGINSKI, 2013, p. 29-41). Em regra, quem assedia é autoritário, arrogante,
manipulador e abusa do poder conferido em razão do cargo ou função que ocupa; tem
prazer em ver o rebaixamento dos outros; não costuma assumir responsabilidades,
reconhecer suas falhas e valorizar o trabalho dos demais. O assédio moral pode ser
praticado por uma ou mais pessoas.
Em contrapartida, o assediado apresenta qualidades compatíveis com as
exigências da moderna forma de produção e organização do trabalho, que demandam
um profissional capacitado e flexível. Seus méritos profissionais e pessoais provocam
insegurança e rivalidade entre chefias e colegas, o que contribui para a prática do
assédio moral. O assédio moral pode ser praticado contra uma ou mais pessoas.
Destarte, há o assédio moral dito interpessoal e também o assédio moral
organizacional, que se diferenciam entre si basicamente pela proporção em que
acontecem. O primeiro referencia um processo mais direto e localizado, em que os
ataques são mais velados.
Já o assédio moral organizacional desenvolve-se na própria estrutura da
organização, estando presente implicitamente nas próprias políticas e práticas da
empresa, ou seja, a conduta degradante se dissipa através dos gestores, prepostos e
grupos de trabalho e a posição da empresa é de estímulo a tais práticas.
Nota-se que o assédio moral é um processo. Começa tímido e inofensivo,
mas propaga-se insidiosamente e cria raízes. Num primeiro momento, as pessoas
envolvidas não querem mostrar-se ofendidas e levam desavenças e maus-tratos na
brincadeira. Em seguida, tais ataques multiplicam-se e a vítima percebe-se cada vez
mais acuada.
Trata-se de um fenômeno circular, de modo que procurar quem está na
origem do conflito pouco resulta, visto que até as razões que desencadearam as
agressões já foram perdidas. Atos praticados deliberadamente pelo agressor destinam-
se a provocar ansiedade na vítima, o que faz com que esta aja defensivamente e, por
sua vez, novas agressões aconteçam (HIRIGOYEN, 2011, p. 66).

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2.3 EFEITOS PRÁTICOS


Vale asseverar que os efeitos do assédio moral não se restringem ao
trabalhador, mas alcançam também o empregador, o Estado e toda a sociedade
(RUFINO, 2006, p. 81). Por óbvio, os impactos diretos dos episódios de assédio moral
nas empresas são, em primeira linha, na saúde do trabalhador.
É certo que as condições individuais de cada pessoa interferem na medida
em que o constrangimento é sofrido, visto que nem todos processam da mesma
maneira os estímulos externos. Contudo, é inegável que a saúde é atingida pela
ocorrência de assédio moral, em maior ou menor grau, podendo haver consequências
psicopatológicas – ansiedade, insegurança, depressão, insônia, mudanças de
humor; psicossomáticas – hipertensão arterial, cefaleia, dermatites, gastrite; e até
comportamentais – agressividade contra si e contra outros, aumento do consumo de
álcool, cigarro e outras drogas, isolamento social, desordem de apetite, disfunções
sexuais.
Num segundo plano, as próprias organizações privadas são atingidas,
afinal, a diminuição da produtividade do trabalhador assediado reflete diretamente na
produtividade global da empresa, sendo que o ambiente de trabalho fica prejudicado e
impróprio ao progresso empresarial. Não obstante, o empregador sofre com os custos
da substituição do trabalhador (desligamento do assediado associado à contratação
do novo empregado para substituí-lo) e, por fim, o risco de que, com a publicidade
dos fatos, a imagem da empresa perante a sociedade e o próprio mercado reste
prejudicada, sem falar no aumento de contencioso judicial e os custos decorrentes do
próprio acionamento perante o judiciário e eventuais condenações.
Mais ainda, o fenômeno do assédio moral é causador de altos custos sociais,
pois causa alto grau de absenteísmo, doenças que acarretam, por sua vez, licenças
médicas e afastamentos (com suporte previdenciário por meio de auxílio-doença) e
até aposentadorias por invalidez. A sociedade e, por meio dela, o Estado acabam por
suportar os custos dos benefícios previdenciários e tratamentos de saúde necessários
à estabilização das vítimas.
Fato é que todos perdem frente a episódios de assédio moral.
A bem da verdade, o assédio moral constitui um risco invisível, mas
efetivo. Invisível porque não é propriamente material, palpável. Efetivo porque pode
ser concretamente realizável (SCHMIDT, 2013, p. 96).

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2.4 AS PRINCIPAIS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS


Como se destacou desde o início, a modernização das relações de
trabalho não pode, em hipótese alguma, ignorar que antes de qualquer outro aspecto
o trabalhador deve ser respeitado enquanto ser humano pelo simples fato de nesta
condição existir. Sendo assim, invoca-se o princípio da dignidade da pessoa humana
que a todos (incluindo o trabalhador) aproveita.
Sob este prisma, nota-se que o princípio da dignidade da pessoa humana
é o maior entre todos os princípios e, portanto, todos os direitos e liberdades
fundamentais ligam-se àquele. Logo, a exposição do trabalhador a condutas abusivas,
designadamente o assédio moral, constitui violação ao princípio da dignidade da
pessoa humana, o que fundamenta a necessidade de tutela jurídica a seu respeito
(SOARES; DUARTE, 2014, p. 21-47).
Tanto o agressor (pessoa física) quanto a própria empresa (pessoa jurídica)
que permite a prática de assédio moral devem ser responsabilizados pelos prejuízos
causados à vítima.
De antemão, tem-se que a ausência de dispositivo legal específico não
obstou o desenvolvimento de doutrina e jurisprudência acerca do assunto, nem
impede a penalização dos empregadores que agem ou permitem tal conduta por seus
prepostos, principalmente no âmbito da fixação de indenização ao trabalhador lesado.
Como já se apurou, a manutenção de um ambiente de trabalho saudável
ocupa lugar entre os deveres do empregador, tendo por fundamento não só os preceitos
constitucionais da proteção do meio ambiente, em que está inserido o meio ambiente
do trabalho, mas também a boa-fé objetiva própria das relações contratuais. Ao lado
disso está o dever acessório de proteção ao patrimônio físico, psíquico e emocional do
trabalhador (DALLEGRAVE NETO, 2013, p. 96).
Destarte, o assédio moral praticado pelo empregador (pessoa física), além
de configurar violação à obrigação contratual, afeta a honra e boa fama do trabalhador,
o que abre precedente para que este deixe o emprego e postule em juízo a rescisão
indireta do contrato de trabalho, nos termos das alíneas ‘d’ e ‘e’ do artigo 483 da
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) (BRASIL,1943).
Nestes casos, o empregador será o responsável (direto) por reparar os danos
ocasionados à vítima, enquadrando-se na regra da responsabilidade civil subjetiva,
pois presentes os elementos dano (falha na execução do contrato de trabalho), ato
ilícito e nexo causal com respaldo no disposto nos artigos 186, 187 e 927 do Código
Civil (BRASIL, 2002).
Porém, tratando-se o agressor de um empregado hierarquicamente superior

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ao agredido, a conduta ilícita do primeiro resultará na rescisão do seu contrato de


trabalho, fundada em justa causa, conforme conteúdo do artigo 482, alíneas ‘b’ e ‘j’
da CLT (BRASIL,1943).
Referido caso leva ainda à responsabilidade objetiva do empregador
perante terceiros por ato praticado por seu preposto – seja pela presunção absoluta de
culpa in elegendo e in vigilando (BRASIL. STF, 1964, p. 149), seja pelo conteúdo do
artigo 933, do Código Civil (CC) cumulado com o artigo 932, inciso III, do mesmo
Código, o que se justifica ao passo que o preposto é a longa manus do empregador
quando age no desempenho de suas atribuições.
Não obstante, nestes casos o preposto agressor tem responsabilidade civil
pessoal sobre o seu ato e, se já não figurar como corréu numa demanda judicial, pode
responder posteriormente em ação regressiva de quem despendeu o pagamento da
indenização (COLOMBO FILHO, 2016, p. 111).
Por isso, o empregado assediado poderá ingressar com ação trabalhista
pleiteando, para além da rescisão indireta, a reparação de eventuais danos daí
emergentes.
Nesta toada, uma vez constatado o dano a etapa seguinte é o arbitramento
do valor da indenização. Porquanto, identifica-se latente dificuldade na quantificação
do dano moral, afinal, a legislação não fixa critérios objetivos para tanto, mas tão
somente faz referência a termos como “proporcionalidade”, “razoabilidade”,
“extensão do dano” e “equitatividade” (FEIJÓ, 2012).
A quantificação do dano moral é uma das tarefas mais difíceis e complexas,
motivo pelo que se instituíram critérios norteadores para a fixação do valor pecuniário
que deve ser atribuído à indenização. As etapas se subdividem em: a) identificação do
dano; b) classificação da lesão – leve, grave ou gravíssima; c) dimensão da repercussão
do dano na esfera social e; d) consideração da capacidade econômica do ofensor.
Atribuir indenização aos casos de dano moral se justifica por três principais
aspectos de intenção: punir, compensar e prevenir novas ocorrências. Parece ainda
nebuloso o exercício do arbitramento de indenização por danos morais nos casos de
assédio moral pelo fato de que cada caso será submetido à análise de um juiz que,
ainda que siga referidos critérios norteadores, terá sua própria interpretação sobre o
assunto, ficando o valor suscetível à subjetividade do juiz.
Portanto, ainda que se prevejam as possíveis consequências de um episódio
de assédio moral, é impossível estimar o real impacto dos seus efeitos no âmbito
da empresa. Logo, adotar métodos preventivos – que visem preservar a saúde dos
trabalhadores, do próprio meio ambiente de trabalho e, consequentemente, reduzir

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ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE TRABALHO: COMPLIANCE COMO INSTRUMENTO DE MITIGAÇÃO DE OCORRÊNCIAS

as situações de contencioso judicial, apresentam-se como a melhor alternativa para


barrar as ocorrências de assédio moral, visto que menos desgastantes, mais eficazes
e econômicas.

3. COMPLIANCE COMO FERRAMENTA PARA PREVENÇÃO DO ASSÉDIO


MORAL NO ÂMBITO EMPRESARIAL
Restou demonstrado que os danos decorrentes de práticas de assédio moral
no ambiente de trabalho geram efeitos de grande impacto, tanto para o trabalhador na
condição de vítima, quanto para o empregador.
Por isso, limitar-se a remediar os problemas resultantes destas situações
parece insuficiente para reduzir de forma eficaz o número de episódios, bem como
continuaria a resultar em um alto custo para as organizações e para o Estado.
Isso porque os casos de assédio moral normalmente levam ao desligamento
da vítima dos quadros funcionais, seja por pedido dela própria, seja por despedimento,
com ou sem justa causa e até o afastamento acompanhado da percepção de auxílio
previdenciário ou, nos casos mais graves, a aposentadoria por invalidez.
Logo, deve-se contabilizar os custos do desligamento do trabalhador
assediado, bem como da nova contratação e treinamento do substituto. Por si só, este
já é um impacto negativo a ser considerado.
Não obstante, as situações de assédio moral criam o cenário ideal para que
haja um passivo contencioso judicial trabalhista que venha a discutir eventuais direitos
trabalhistas negligenciados durante a vigência do contrato de trabalho, incluindo a
prática do assédio moral, o que pode vir a representar uma condenação por danos
materiais e morais advindos da circunstância e, mais ainda, a publicidade da situação,
denegrindo a imagem da empresa perante o mercado e a sociedade.
Sendo assim, as condutas preventivas ganham força e evidenciam-se como
opções inteligentes e de maior eficácia frente ao risco comprovadamente ligado às
práticas de assédio moral no ambiente de trabalho.
A resposta para o combate ao assédio moral é: ética. Mas não a ética como
um ideal formal e impraticável, e sim uma ética ergonômica e aplicada.
Diante disso os programas de compliance ganham especial importância,
estendendo sua aplicabilidade à seara trabalhista.
Trata-se de um instrumento destinado a estabelecer medidas que assegurem
que as regras que lhe são impostas sejam, de fato, cumpridas (KUHLEN, 2013, p. 51).
Parece vago e redundante falar em cumprimento normativo através dos programas de
compliance, mas assevera-se: a implantação destes pretende a criação de uma cultura

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corporativa voltada à reafirmação de preceitos e valores.


Em que pese ter o direcionamento principal dos programas de integridade
(que equivalem aos programas de compliance) no Brasil por foco medidas
anticorrupção, o conceito trazido pelo artigo 41, do Decreto 8.420/2015 menciona
que, no âmbito de uma pessoa jurídica, os programas de integridade consistem no
“conjunto de mecanismos e procedimentos internos de integridade (...) e na aplicação
efetiva de códigos de ética e de conduta”.
Ora, parece indissociável da figura dos programas de compliance ou de
integridade, a existência e cumprimento de normas internas que preceituem o exercício
da ética no próprio ambiente de trabalho, pois do contrário ficaria prontamente
rechaçada a credibilidade daquela organização quanto ao cumprimento de regras de
ética para atuação no mercado.
Assim, identifica-se a presença deste quesito entre os ditames do quarto
pilar dos programas de integridade, qual seja: estruturação das regras e instrumentos,
em que se prevê, em primeira linha, padrões de ética e de conduta (BRASIL, 2015,
p. 14).
Tais padrões consistem nos comportamentos esperados de todos os
funcionários e dirigentes da empresa, sendo conveniente que estas orientações
constem documentadas, através de um código de ética, destinado a tratar dos valores
e princípios da empresa e, de um código de conduta, que traga a previsão das condutas
a serem seguidas pelos membros daquela.
Seria desarrazoado, senão contraditório, falar num programa de compliance
destinado a fixar limites éticos para as condutas dos representantes da empresa perante
o mercado sem antes estabelecer normas internas para que estes mesmos princípios
fossem praticados nas dependências da própria organização.
Portanto, referidos códigos (de ética e conduta) devem elucidar não só as
diretrizes éticas de projeção externa (atuação da empresa no mercado), mas também
(e principalmente) os preceitos éticos de projeção interna, ou seja, direcionados a
balizar o próprio desenvolvimento das atividades internamente e, por conseguinte,
com reflexos diretos no meio ambiente de trabalho que ali se estabelece.
De tal sorte que a ética ergonômica deve ser pano de fundo destas
disposições. Neste sentido, para nortear o estabelecimento de regras que viabilizem
a ética ergonômica aplicada, especificamente no campo do Direito do Trabalho, há
a NR-17, especificamente o seu anexo II, que, apesar de ser inicialmente dirigido
a operadores de telemarketing, traz orientações sobre o modo de organização do
trabalho que podem ser interpretadas amplamente, aplicando-se à generalidade de
trabalhadores.

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ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE TRABALHO: COMPLIANCE COMO INSTRUMENTO DE MITIGAÇÃO DE OCORRÊNCIAS

Ser ergonomicamente ético pode ter como ponto de partida a observância


de treze aspectos essenciais para criar um ambiente de trabalho harmônico, que
seriam os mandamentos da ética ergonômica (COLOMBO FILHO, 2016, p. 149-
150), quais sejam: i) incentivar o convívio familiar por meio da correta concessão
dos períodos de descanso e prévia comunicação das escalas; ii) exigir trabalho em
horário extraordinário apenas excepcionalmente; iii) evitar sobrecarga de trabalho,
aumentando os postos de trabalho proporcionalmente ao crescimento do volume de
trabalho (novas contratações, contratações temporárias são, inclusive, alternativas
mais econômicas em relação ao pagamento de horas extras); iv) zelar pela fruição
das pausas e intervalos, impedindo a fadiga psíquica e física do trabalhador; v)
viabilizar e incentivar o aprimoramento profissional, por meio do investimento
em formação técnica; vi) não exigir atividades físicas dos trabalhadores, seja para
fins motivacionais ou para treinamento, afastando a possibilidade de ocorrência de
situações que exponham os trabalhadores; vii) não restringir idas ao banheiro e saber
tratar os casos de abuso; viii) saber organizar a sistemática de trabalho sem impor
metas abusivas; ix) organizar métodos de trabalho que visem otimizar a produtividade
sem, contudo, exercer pressão desmedida sobre o trabalhador; x) emitir ordens e
instruções claras, objetivas e precisas, afastando a possibilidade de equívocos sobre a
interpretação destas; xi) possuir qualificação, promover a troca de conhecimentos e
sempre transmitir o máximo de informações para a prevenção de acidentes; xii) contar
com um corpo especializado em organização, sistemas e métodos, e segurança do
trabalho para o planejamento, treinamento e fiscalização de atividade relacionadas ao
meio ambiente do trabalho e; xiii) cumprir a Constituição e proporcionar um ambiente
de trabalho aberto, inclusivo e acessível, em atenção principalmente aos princípios da
dignidade da pessoa humana e meio ambiente de trabalho saudável.
A observação atenta dos aspectos anteriormente elucidados permite que a
forma de gerir o desenvolvimento das atividades no ambiente interno da organização
ocorra em conformidade com o que se entende por ética ergonômica.
Note-se que as condutas acima descritas não são verdadeiramente inéditas
em termos de gestão ética de uma organização, mas a maneira como foram dispostas
cumpre o papel indispensável de aproximar os preceitos éticos, que geralmente compõe
mera formalidade nas empresas, do contato direto com a realidade dos trabalhadores
em seu meio ambiente de trabalho.
Sendo os programas de compliance instrumentos aptos justamente a
reforçar o cumprimento das regras impostas àquela determinada organização e a fixar
formas de efetivação dessas visando o estabelecimento de uma cultura ética e de
cumprimento normativo, o uso do compliance para dar efetividade à ética ergonômica
no ambiente de trabalho é a melhor alternativa.

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Consequentemente, ter-se-ia a mitigação gradual até que definitiva fosse,


dos episódios de assédio moral nas dependências da empresa, visto que a postura
seria de intolerância total a tais comportamentos de forma homogênea entre o corpo
funcional da empresa.
Um bom artifício é o canal de denúncia, também chamado whistleblowing,
que permite o conhecimento sobre práticas contrárias aos interesses da empresa, além
de fomentar a supervisão e sanção de comportamentos contrários às regras internas
(BLUMENBER; MORENO, 2014, p. 288).
Pode-se dizer que a implementação de um canal de denúncia possui
verdadeira importância para o sucesso do programa de compliance, uma vez que a
sua correta aplicação traz para a empresa a possibilidade de saber em primeira mão
sobre a ocorrência de práticas que infrinjam as regras internas, permitindo que sejam
tomadas as medidas de repreensão cabíveis com maior brevidade e, por conseguinte,
impede (com maior eficácia) que este comportamento se instale e passe a ser sistêmico
no âmbito da empresa.
Nesta toada, existe o desfaio de estabelecer como será realizada a denúncia
para que se garanta a eficácia do canal de denúncia sem, contudo, expor o denunciante.
O anonimato garante maior segurança ao denunciante e contribui para a
eficácia do canal, mas pode fomentar a existência de denúncias falaciosas, com a
intenção de provocar investigações em face de outros trabalhadores, nestes casos com
intuito de retaliação.
Já as denúncias efetuadas por meio da confidencialidade asseguram a
proteção dos dados pessoais do denunciante (inclusive com previsão de sanção para
o descumprimento deste quesito), mas consegue-se estimular que a denúncia seja
consciente, o que parece mais adequado para atender à pretensão do canal.
Nota-se que a preocupação dos programas de compliance é dar eficácia a
instrumentos preventivos e não meramente prevê-los, fugindo da superficialidade da
“criação de políticas” para criar e implementar um verdadeiro método de operação
que estabeleça entre os trabalhadores a consciência (e não a pressão) de que fugir ao
método significa a impossibilidade de permanecer naquela organização por destoar do
perfil da própria empresa e não das exigências atribuídas somente à sua figura.
Essa tem sido a postura adotada pelas empresas eleitas como “os melhores
lugares para trabalhar” pelo Great Place to Work (GPTW, 2017), que realiza pesquisas
por todo o mundo com o intuito de aferir a qualidade do ambiente de trabalho e a
cultura organizacional da empresa.
Ora, é inconteste que quanto mais forte e coerente for a cultura

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ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE TRABALHO: COMPLIANCE COMO INSTRUMENTO DE MITIGAÇÃO DE OCORRÊNCIAS

organizacional da empresa, melhor será a qualidade do ambiente de trabalho e, sem


dúvidas, os resultados da organização.
Por isso, ter um programa de compliance tende a ser um diferencial entre
as organizações, pois representa a materialização do método de operação da empresa
que, por sua vez, nasce destinado a tratar, sobretudo, do ambiente interno, de forma
que o que se tem no íntimo da organização seja compatível com a proposta que projeta
no mercado, havendo coerência na atuação da organização, a qual certamente colherá
tal êxito em forma de resultados e otimização dos lucros.
Aproximando tais constatações das situações de assédio moral, tem-se
que diante da relação de proporcionalidade inversa entre número de episódios de
assédio moral e do nível de qualidade do ambiente de trabalho, pode-se concluir que
um bom método de operação (consubstanciado num programa de compliance) tem
efeitos diretos na mitigação de ocorrências de assédio moral, porquanto, a prevenção
por meio do compliance é a alternativa que comprovadamente traz menor desgaste à
relação, tem maior eficácia e representa menor custo para a empresa.

CONCLUSÃO
Tendo em conta que o assédio moral é talvez tão antigo quanto o trabalho,
mas que cada vez mais ganha contornos desarrazoados, de alta gravidade e impacto
no ambiente de trabalho, a mera remediação dos episódios é insuficiente para conter
as suas consequências.
Isso porque, os episódios de assédio moral atingem, em primeira
linha, a saúde do trabalhador agredido, ocasionando a manifestação de sintomas
psicopatológicos, psicossomáticos e até comportamentais. Mas não só, as próprias
organizações sofrem as consequências disto, haja vista que o ambiente de trabalho
é globalmente atingido, tornando-se desestimulante aos trabalhadores e inadequado
para a alavancagem empresarial, os custos com o desligamento do trabalhador vítima
do assédio moral e a contratação de alguém que o substitua, o aumento de demandas
judiciais trabalhistas e eventuais condenações e, por fim, o risco de que tais fatos se
tornem públicos e manche a imagem da empresa no mercado.
Tais motivos já seriam suficientes para motivar uma reação das organizações
no sentido de não mais apenas remediar, mas prevenir as ocorrências de assédio moral
em suas dependências. Contudo, ao lado de todos esses fatores, há ainda o custo
social decorrente desta situação, que se consubstancia na necessidade de tratamentos
médicos e afastamentos acompanhados da percepção de auxílios previdenciários, por
exemplo.

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Assim, é inconteste que as ocorrências de assédio moral no ambiente de


trabalho representam fator de risco e alto impacto na realidade empresarial, motivo
pelo qual posturas preventivas ganham destaque, visto que menos desgastantes, mais
eficazes e de menor custo.
Neste diapasão, os programas de compliance apresentam-se como uma
interessante ferramenta para mitigar as ocorrências de assédio moral no ambiente de
trabalho e promover a ética ergonômica.
A mera documentação dos preceitos éticos adotados pela empresa (através
de códigos de ética e conduta) não traz propriamente efetividade prática que resulte na
mudança de postura consciente do corpo funcional da organização.
Por outro lado, os programas de compliance surgem justamente para
garantir o cumprimento dos códigos de ética e de conduta da empresa, trazendo a
implementação de mecanismos de controle sobre a sua aplicabilidade prática, dentre
eles os canais de denúncia que, nos casos de assédio moral, podem ter particular
importância visto que viabilizam a denúncia segura das ocorrências, estimulando que
estas aconteçam.
O que se pretende, em sentido macro, com um programa de compliance
é a criação e implementação de um verdadeiro método de operação que promova no
corpo funcional da organização a consciência de que se comportar de forma estranha
ao método significa a sua incompatibilidade com os preceitos da empresa e, num
segundo plano, com o modo como esta se apresenta e atua no mercado, o que resulta,
por conseguinte, na impossibilidade de continuar integrando o corpo funcional
daquela determinada empresa.
Tendenciosamente, quando se pensa numa empresa remete-se logo à sua
atuação e posição no mercado. Contudo, a projeção externa que aquela empresa
tem no mercado está estreitamente relacionada a forma como ela é internamente
gerida, sendo o primeiro reflexo direto do segundo. Porquanto, é descabido falar num
programa de compliance que trate apenas de limites éticos à atuação dos representantes
da organização perante o mercado sem antes instituir normas internas que prevejam
uma rigorosa postura ética de seus colaboradores, uns com os outros.
Portanto, sendo certo que no âmbito empresarial os recursos humanos
têm imenso peso para a alavancagem (ou declínio) da organização é preciso que
as organizações se munam de instrumentos que salvaguardem o meio ambiente de
trabalho em que estarão inseridos os seus colaboradores. Para além de proporcionar
um local de trabalho seguro, é necessário viabilizar um meio ambiente de trabalho
sadio, no que resta incluída a saúde psicológica do trabalhador.

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ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE TRABALHO: COMPLIANCE COMO INSTRUMENTO DE MITIGAÇÃO DE OCORRÊNCIAS

Neste sentido, a ética ergonômica encontra nos programas de compliance


um meio para a efetivação de suas diretrizes, sendo este um instrumento preventivo
que se for bem criado e implementado, tendo em conta as peculiaridades de cada
organização, é capaz de mitigar as ocorrências de assédio moral no ambiente de trabalho
a partir da manutenção de um método de operação coeso que seja conscientemente
aplicado pelos colaboradores nas dependências da organização.

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MORAL HARASSMENT IN WORK ENVIRONMENT: COMPLIANCE AS AN


INSTRUMENT FOR MITIGATING OCCURRENCES

ABSTRACT
The modernization of work relationships and the new demands of the market about
the worker profile contributed for establishment of human relations from a utilitarian
logic, which favors the competition and hostility, and allows the configuration of a
scenario conducive to psychological violence situations at work, especially to moral
harassment occurrence. Based on these premises, the paper analyzes the characteristics
and reach of the moral harassment in the workplace to show that prevention through
compliance programs is more effective to promote ergonomic ethics and, consequently,
to mitigate moral harassment cases.

KEYWORDS
Work environment. Moral harassment. Prevention. Compliance programs.

Recebido: 17 de março de 2017.


Aprovado: 03 de maio de 2017.

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