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ISADORA ISSN
GOMES 1981–3872
MAZUCATTO
RESUMO
A modernização das relações de trabalho e as novas exigências do mercado acerca do
perfil do trabalhador contribuíram para o estabelecimento de relações humanas que
partem de uma lógica utilitária, favorecendo a rivalidade e hostilidade, o que permite a
configuração de um cenário propício a situações de violência psicológica no trabalho,
com especial grau de ocorrência de assédio moral. Partindo dessas premissas, o artigo
analisa as características e alcance do assédio moral no ambiente de trabalho, a fim
de demonstrar que a prevenção por meio de programas de compliance é mais eficaz
na promoção da ética ergonômica e, consequentemente, na mitigação dos episódios
de assédio moral.
PALAVRAS-CHAVE
Meio ambiente de trabalho. Assédio moral. Prevenção. Programas de compliance.
ABSTRACT
The modernization of work relationships and the new demands of the market about
the worker profile contributed for establishment of human relations from a utilitarian
logic, which favors the competition and hostility, and allows the configuration of a
scenario conducive to psychological violence situations at work, especially to moral
harassment occurrence. Based on these premises, the paper analyzes the characteristics
and reach of the moral harassment in the workplace to show that prevention through
compliance programs is more effective to promote ergonomic ethics and, consequently,
to mitigate moral harassment cases.
KEYWORDS
Work environment. Moral harassment. Prevention. Compliance programs.
INTRODUÇÃO
A luta por melhores condições de trabalho definitivamente não é assunto do
século passado. Pelo contrário, ganha cada vez mais vivacidade e adeptos.
Fato é que as intensas exigências sobre o perfil de trabalhador que o mercado
tem procurado tiveram por consequência o estabelecimento de relações humanas que
se pautam numa lógica utilitária do outro, de severa competitividade, com efeitos que
refletem e prejudicam a manutenção de um ambiente de trabalho sadio.
Por isso, é insuficiente pensar no ambiente de trabalho restritivamente como
um espaço físico. É preciso assimilar que tudo o que está posto neste ambiente se
relaciona, porquanto, fala-se em meio ambiente de trabalho, que deve ser ergonômico
e sadio para o trabalhador, razão pela qual é tutelado constitucionalmente e ocupa
lugar entre as obrigações do empregador.
No entanto, eventualmente ocorrem conflitos na gestão das atividades
desenvolvidas e dos recursos humanos de determinada organização, visto que todo
e qualquer trabalho possui certo grau de exigência, o que gera atritos esporádicos. O
detalhe está em como estes atos de gestão se desenvolvem, ao passo que se ocorridos
repetidamente os conflitos e se hostis os comportamentos, corre-se sério risco de estar
diante de uma situação de assédio moral.
Sendo assim, é imprescindível que se saibam os limites dos atos de gestão e
os contornos do assédio moral. Isso porque, hodiernamente, as ocorrências de assédio
moral representam, para além do desgaste do ambiente de organizacional, um custo
significativo para a empresa.
A fim de atingir esses objetivos, num primeiro momento, buscou-se traçar
breve panorama sobre a modernização das relações de trabalho e a intensificação de
episódios de assédio moral, seguido pelos critérios de análise para caracterização do
assédio moral no ambiente de trabalho e suas consequências práticas e jurídicas. Por
fim, tendo sido demonstrada a necessidade de implementação de condutas preventivas
realmente eficazes com relação ao assédio moral, aproxima-se a figura dos programas
de compliance como alternativa para mitigar as ocorrências desses episódios no
ambiente de trabalho.
O presente estudo não se pretende exaustivo, considerando a amplitude
dos assuntos relacionados ante a modesta pretensão de demonstrar que a prevenção
do assédio moral nas empresas através da criação e implementação de um método
de operação coeso (consubstanciado em programas de compliance), que viabilize a
prática da ética ergonômica, é o meio menos desgastante e custoso e mais eficaz para
obstar as ocorrências de assédio moral no ambiente de trabalho.
menos adequadas ou eficazes num ou outro contexto, não havendo fórmula exata para
lograr êxito neste ponto.
Hodiernamente as composições hierárquicas têm sido mais flexíveis, com
foco em projetos e contratos temporários para responder com rapidez às exigências do
mercado e manter os padrões de competitividade. Contudo, esta configuração que não
permite perpetuidade atinge (e corrói) as relações sociais, havendo uma segmentação
dos coletivos de trabalhadores e um estímulo a relações temporárias, marcadas por
uma “superficialidade degradante” (SENNET, 2005, p. 106).
Referidas condições resultam no desenvolvimento de meio ambientes
de trabalho orientados por uma lógica de “instrumentalização do outro” e de
competitividade severa entre os colegas de trabalho (HELOANI, 2004, p. 03).
Somando a isso está o fato de haver uma distância maior entre os dirigentes
e os trabalhadores, restando impraticável a comunicação e o diálogo franco e aberto
nas organizações, o que contribui para o agravamento e intensificação de episódios
de assédio moral.
Por um lado, exige-se um trabalhador competitivo, qualificado, criativo e
polivalente. Por outro, paira sobre esse trabalhador (o tempo todo) a crença de que não
estar apto a estas novas condições pode significar a perda do emprego, gerando tensão
constante (SCHMIDT, 2013, p. 91).
Ora, notadamente os processos de globalização e modernização das
relações de trabalho contribuíram para uma realidade de relações humanas centradas
numa lógica utilitária, permeada de rivalidade e hostilidade, cenário que favorece as
situações de violência psicológica no trabalho, tendo especial grau de ocorrência o
assédio moral (EBERLE, 2009, p. 105-135).
Contudo, imprescindível lembrar que antes de tudo, a modernização das
relações de trabalho deve levar em conta os direitos da pessoa humana de maneira
irrestrita, o que, muitas vezes, é derradeiramente negligenciado nos contextos
organizacionais.
França) no contexto das relações de trabalho deve ser entendido como toda e qualquer
conduta abusiva, que se manifeste sobretudo por comportamentos, palavras (orais
ou escritas), atos e gestos que possam ocasionar dano à personalidade, dignidade ou
integridade física ou psíquica de uma pessoa, pôr em perigo seu emprego ou degradar
o ambiente de trabalho (HIRIGOYEN, 2011, p. 65).
Juridicamente, pode ser encarado como um abuso emocional ocorrido
no ambiente de trabalho, de forma intencional, sem cunho sexual ou racial, com a
intenção de afastar o trabalhador das relações profissionais (SCHMIDT, 2013, p. 90).
Prova de que o assédio moral é o mal, talvez mais devastador, que atinge o
ambiente do trabalho está no fato de o Senado Federal (BRASIL, 2011) e o Ministério
da Saúde (BRASIL, 2015) terem tomado a iniciativa de criar e disponibilizar materiais
informativos, em forma de cartilhas, destinados a tratar do assunto.
Ambas as cartilhas chamam atenção para a diferenciação entre o assédio
moral e atos de gestão ou conflito, o que é imprescindível neste cenário, tendo em
vista que toda relação de trabalho requer certo grau de exigências que são próprias da
execução do contrato de trabalho, o que está longe de ser assédio moral.
A diferença está substancialmente em como as cobranças são realizadas.
2.2 MODALIDADES
O assédio moral pode ocorrer em qualquer relação tipo havida na
organização, razão pela qual diz-se que ele pode manifestar-se sob três modalidades
distintas: vertical – relações de trabalho marcadas pela diferença de posição hierárquica,
abrigando tanto a forma descendente quanto ascendente; horizontal – relações de
trabalho sem distinção hierárquica, ou seja, entre colegas de trabalho sem relação de
subordinação; e mista – cumulação dos assédios morais vertical e horizontal.
Ainda assim, a maior parte dos casos ocorre entre superior e subordinado
(assédio moral vertical descendente). Sob tal perspectiva, nota-se estreita relação
entre o assédio moral e o medo e a sua instrumentalização, que se difunde de diversas
CONCLUSÃO
Tendo em conta que o assédio moral é talvez tão antigo quanto o trabalho,
mas que cada vez mais ganha contornos desarrazoados, de alta gravidade e impacto
no ambiente de trabalho, a mera remediação dos episódios é insuficiente para conter
as suas consequências.
Isso porque, os episódios de assédio moral atingem, em primeira
linha, a saúde do trabalhador agredido, ocasionando a manifestação de sintomas
psicopatológicos, psicossomáticos e até comportamentais. Mas não só, as próprias
organizações sofrem as consequências disto, haja vista que o ambiente de trabalho
é globalmente atingido, tornando-se desestimulante aos trabalhadores e inadequado
para a alavancagem empresarial, os custos com o desligamento do trabalhador vítima
do assédio moral e a contratação de alguém que o substitua, o aumento de demandas
judiciais trabalhistas e eventuais condenações e, por fim, o risco de que tais fatos se
tornem públicos e manche a imagem da empresa no mercado.
Tais motivos já seriam suficientes para motivar uma reação das organizações
no sentido de não mais apenas remediar, mas prevenir as ocorrências de assédio moral
em suas dependências. Contudo, ao lado de todos esses fatores, há ainda o custo
social decorrente desta situação, que se consubstancia na necessidade de tratamentos
médicos e afastamentos acompanhados da percepção de auxílios previdenciários, por
exemplo.
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ABSTRACT
The modernization of work relationships and the new demands of the market about
the worker profile contributed for establishment of human relations from a utilitarian
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harassment occurrence. Based on these premises, the paper analyzes the characteristics
and reach of the moral harassment in the workplace to show that prevention through
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to mitigate moral harassment cases.
KEYWORDS
Work environment. Moral harassment. Prevention. Compliance programs.