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UNIP – UNIVERSIDADE PAULISTA

Instituto de Ciências Humanas


Curso de Psicologia

ANA CAROLINA PALMA FURLAN RA. C50292-8

ANDREIA CRISTIENE SALLES MONTEIRO RA. C38GHD-6

GABRIEL VITORINO DA SILVA RA. C594EG-7

KAROLINA TASQUIN MARTINS ELIZIARIO RA. B898EC-0

MARISA TEREZAN TOLEDO JUSTO RA. C460BI-5

PRICILLA KAREN BAZZO CARVALHO RA. C56AGG-3

A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO NO CREAS DA CIDADE DE TARUMÃ


EM SITUAÇÕES DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER.

Campus Assis – São Paulo


2019
UNIP – UNIVERSIDADE PAULISTA
Instituto de Ciências Humanas
Curso de Psicologia

ANA CAROLINA PALMA FURLAN RA. C50292-8

ANDREIA CRISTIENE SALLES MONTEIRO RA. C38GHD-6

GABRIEL VITORINO DA SILVA RA. C594EG-7

KAROLINA TASQUIN MARTINS ELIZIARIO RA. B898EC-0

MARISA TEREZAN TOLEDO JUSTO RA. C460BI-5

PRICILLA KAREN BAZZO CARVALHO RA. C56AGG-3

A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO NO CREAS DA CIDADE DE TARUMÃ


EM SITUAÇÕES DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER.

Projeto de Pesquisa apresentado para disciplina


Apresentação de Trabalho de Pesquisa, sob a
orientação da Prof essora Ms. Daniela Emilena
Santiago Dias de Oliveira.

Campus Assis – São Paulo


2019
Este trabalho é dedicado à todas as
mulheres vítimas de violência e a todos os
profissionais que se dedicam ao
enfrentamento desse fenômeno,
contribuindo para que essa luta tenha cada
vez mais visibilidade.
AGRADECIMENTOS

A Deus pela saúde е forças pаrа superar as dificuldades e momentos de


tensão ao longo do curso.
A esta universidade, sеυ corpo docente, direção е administração qυе nos
proporcionaram o desenvolvimento de nossos olhares críticos perante a sociedade e
nossa construção profissional.
À nossa orientadora Daniela Emilena Santiago Dias, pelo suporte, correções
e incentivos durante a pesquisa.
Agradecemos а todos оs professores pоr nos proporcionarem о conhecimento
não apenas racional, mas а manifestação dо caráter, afetividade e responsabilidade
dа educação durante nossa trajetória acadêmica.
A todos os integrantes desse grupo de pesquisa pelo ótimo diálogo e
companheirismo, sempre entendendo e respeitando as dificuldades de cada um,
proporcionando trocas de ideias muito valiosas e ampliando nossos olhares perante
uns aos outros.
Aos nossos familiares, pelo amor, incentivo е apoio incondicional.
À toda equipe do CREAS de Tarumã (SP) pela receptividade, contribuição e
prontidão em nos atender.
A todos qυе direta оυ indiretamente fizeram parte de nossa formação, nossos
sinceros agradecimentos.
Triste, Louca Ou Má

Francisco, El Hombre

[...]

Traçar de novo a estrada


Ver cores nas cinzas
E a vida reinventar

E um homem não me define


Minha casa não me define
Minha carne não me define
Eu sou meu próprio lar

Ela desatinou
Desatou nós
Vai viver só.
RESUMO

Na presente pesquisa nos propusemos a elucidar as práticas do profissional de


Psicologia atuante no Centro de Referência Especializado de Assistência Social
(CREAS) ligado aos casos de violência contra a mulher no âmbito doméstico e
familiar, na cidade de Tarumã (SP). Uma entrevista com a psicóloga inserida nesse
contexto foi realizada e a partir disso foram efetuadas reflexões sobre o tema, as quais
demonstram que este fenômeno tem raízes históricas e culturais. Tais fatores
contribuíram para uma melhor compreensão da atuação e intervenção da Psicóloga
do CREAS junto aos casos de violência contra a mulher.

Palavras-chave: Violência contra a mulher; Psicólogo; CREAS.


ABSTRACT

The present research project set out to clarify the practices of the Psychology
Professional that acts at CREAS (Centro de Referência Especializado de Assistência
Social), that is a Center of Specialized Reference for Social Assistance. This public
agency is related to cases of violence against women at domestic and familiar context,
in the city of Tarumã (SP). An interview was conducted with a Psychologist who works
in this context, for that the reflexion about this main subjects could be made. These
considerations desmonstrate the historical and cultural roots on the theme. Therefore,
the results made possible a better understading of the role intervention of CREAS
Psychologist in cases of violence against women.

Keywords: Violence against women; Psychologist; CREAS.


LISTA DE ABREVIAÇÕES OU SIGLAS

AIDS – Síndrome de Imunodeficiência Adquirida

CFP – Conselho Federal de Psicologia

CRAS – Centro de Referência de Assistência Social

CREAS – Centro de Referência Especializado de Assistência Social

CREPOP – Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas

DDM – Delegacia de Defesa da Mulher

DEAM – Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher

DST – Doenças Sexualmente Transmissíveis

LMP – Lei Maria da Penha

LOAS – Lei Orgânica da Assistência Social

SUAS – Sistema Único de Assistência Social

TCC – Trabalho de Conclusão de Curso


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 10

APRESENTAÇÃO........................................................... Erro! Indicador não definido.

LEVANTAMENTO BIBLIOGRÁFICO........................... Erro! Indicador não definido.

OBJETIVO GERAL ......................................................... Erro! Indicador não definido.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS ......................................... Erro! Indicador não definido.

HIPÓTESES....................................................................................................................... 22

JUSTIFICATIVA .................................................................. Erro! Indicador não definido.

MÉTODOS ............................................................................................................................. 25

RESULTADOS .................................................................... Erro! Indicador não definido.

DISCUSSÃO........................................................................ Erro! Indicador não definido.

CONCLUSÕES ................................................................... Erro! Indicador não definido.

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 41

ANEXOS................................................................................................................................. 43

Anexo 1 ............................................................................................................................... 43

Anexo 2 ............................................................................................................................... 54
INTRODUÇÃO
Apresentação

O presente projeto de pesquisa tem como proposta trazer à tona questões


relacionadas às práticas do profissional de Psicologia atuante no CREAS junto aos
casos de violência contra a mulher no âmbito doméstico e familiar na cidade de
Tarumã, interior de São Paulo. Sua importância se dá devido aos poucos estudos
sobre a atuação desses profissionais no CREAS, e também à necessidade de
realizarmos um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) com um tema de relevância
social e levantar dados pertinentes durante seu desenvolvimento. 1Definimos, no
entanto, por abordar o tema em questão com uma breve reflexão sobre a violência
contra a mulher, demonstrando que esse é um fenômeno que tem raízes na história e
cultura do nosso país. Na sequência, apresentaremos reflexões qu e nos permitem
compreender a atuação do Psicólogo junto à violência contra a mulher e também a
intervenção desse profissional juntamente ao CREAS.

Levantamento Bibliográfico

Diante da grande visibilidade com a qual a violência contra a mulher vem


sendo abordada na contemporaneidade, pretende-se com esse trabalho explorar os
instrumentos utilizados pelo profissional de Psicologia no atendimento dessa
demanda, com o intuito de ampliar as discussões referentes à complexidade desse
tema. Para isso, é necessário retomar, mesmo que brevemente, um pouco da história
de desenvolvimento da violência contra a mulher.
Importante assim frisar que a cultura em que a mulher é apresentada como
alguém inferior ao homem é algo antigo e remonta ao nosso passado como gênero
humano. Á exemplo disso, vemos como a mulher era retratada em algumas culturas
antigas, como a grega. Logo, a cultura sexista mantem-se desde a Grécia Antiga,
onde as mulheres não tinham direitos jurídicos, educacion ais e sociais, eram tidas
apenas como “procriadoras”.

1 Esse trabalho f oi elaborado por integrar o rol de conteúdos acadêmicos pelos quais o f uturo
prof issional de Psicologia precisa passar. Af inal, o presente trabalho também se constitui como uma
atividade curricular obrigatória.
[...] o homem era polígamo e o soberano inquestionável na sociedade
patriarcal, a qual pode ser descrita como o ‘clube masculino mais exclusivista
de todos os tempos’. Não apenas gozava de todos os direitos civis e políticos,
como também tinha poder absoluto sobre a mulher. (VRISSIMTZIS, 2002, p.
38)

Ou seja, a mulher grega ocupava um lugar subalterno se comparada ao


homem que poderia assumir cargos políticos, circular pela cidade, trabalhar e também
lutar. Mas, essa realidade da mulher grega esteve presente em outras sociedades e
períodos tal como indicaremos.
Durante o desenvolvimento da sociedade, a história salienta a discriminação
e as diferenças entre homem-mulher. Em meados do século XVII, os homens
herdaram da sociedade a condição de detentores do saber e às mulheres cabiam as
atividades domésticas e a procriação. Dessa forma, as mulheres eram marginalizadas
e tratadas como aberrações ou seres incompletos, sendo destinadas e educadas a
servir o homem, cuidar do lar e educar os filhos. As concepções desse período
reforçam a imagem da mulher como um ser sem vontade própria, conforme Gaspari
(2003, p.29):
Rousseau detinha um discurso de que a educação f eminina deveria ser
restrita ao doméstico, pois, segundo ele, elas não deveriam ir em busca do
saber, considerado contrário à sua natureza. Essa sociedade que lutava tanto
por liberdade, passou a exigir que as mulheres f izessem parte dela, mas
como mães, guardiãs dos costumes, e como seres dispostos a servir o
homem.

Rousseau era um pensador dessa época e representa não apenas o seu


modo de ver a sociedade, mas também a forma com que o mundo, no século em
questão percebia a mulher. Apesar de todo o contexto de inferioridade e preconceito
ao qual eram submetidas, algumas mulheres começam a aproveitar as idas
frequentes aos salões para se aproximarem de poetas, escritores e palestrantes,
buscando adquirir e aprimorar os conhecimentos através das leituras, e com isso
conseguem se firmar no terreno intelectual.

[...] a natureza f ez a mulher dif erente do homem, atribuindo -lhe características


inerentes. A sedução, por exemplo, é f onte de poder para a natureza f eminina
e a f alta de autodeterminação da mulher é também intrínseca à sua natureza
(GASPARI, 2003, p. 32).
Através dos relatos de filósofos da época, podemos evidenciar que o “período
das luzes” ficou marcado pela ideia de que a inferioridade feminina era baseada no
direito natural, sendo assim, não julgavam necessário conferir a mulher um estatuto
político, pois para a ideologia do século XVII, o homem era tido como causa final da
mulher.
Relevantes mudanças surgem após o fim da Revolução Industrial, a
sociedade passa por um processo de transformação e com isso a mulher consegue
lentamente se inserir no mercado de trabalho externo, porém sem se desligar dos
afazeres domésticos. Devido a essa nova realidade, a mulher passa a perceber a
grandeza do mundo, a qual vai além das paredes do lar.
Apesar da conquista por espaço no mercado de trabalho, mais precisamente
nas indústrias fabris, a questão de gênero ainda era considerada como um ponto de
impasse na classe trabalhadora. Em tempos de crise, as indústrias substituíam a mão
de obra masculina pela feminina com o intuito de redução de custos, devido ao seu
custo menor. Por conta deste cenário, as mulheres começaram a lutar por melhores
condições de trabalho, reivindicando direitos trabalhistas, igualdade de jornada de
trabalho e o direito de voto.

Enquanto os espaços tradicionais de expressão política se encontravam


f echados, elas se organizavam em f ormas alternativas de autuação muitas
vezes em torno de uma luta que as constituía enquanto sujeitos coletivos e
políticos (MATOS, 1996, p. 37).

No entanto, no século XIX, surge um novo discurso filosófico sobre a mulher,


marcado pelas manifestações contra a discriminação e a luta pelo voto, ampliando a
reflexão sobre as mulheres que eram permeadas pelo direito, a igualdade e busca
pela emancipação.
Surge então o movimento feminista organizado, que propagava a libertação
das mulheres e não apenas a emancipação, sendo que, enquanto a emancipação
buscava uma igualdade de direitos em relação ao homem, a libertação ia além, ela
realçava as condições de diversidades relacionadas aos gêneros onde a mulher
passava a ser vista como um ser humano independente.
Segundo Pinafi (2007), dentro da realidade brasileira, a década de 70 foi
marcada pelo surgimento dos primeiros movimentos feministas politicamente
engajados e organizados em defesa dos direitos da mulher contra o machismo. A
violência contra a mulher traz em seu seio, estreita relação com as categorias de
gênero, classe e raça/etnia e suas relações de poder. Devido a isso, por muito tempo
foi atribuído aos homens o direito de dominar e controlar suas mulheres, podendo em
certos casos, atingir os limites da violência.
O primeiro grupo organizado de feministas no Brasil surgiu em 1972, na
cidade de São Paulo. A partir de então, os temas do feminismo ganharam espaço em
fóruns nacionais de debates e surgiram novos encontros, movimentos e o lançamento
de jornais destinados ao público feminino. Nesse contexto, o movimento feminista no
Brasil surgiu inicialmente reivindicando o direito ao voto. Nesse sentido, essa fase
inicial do movimento feminista ficou conhecida com o termo: movimento sufragista.
Grande parte das colocações das mulheres vinculadas ao movimento feminista inicial,
também chamado feminismo de primeira onda, requeriam o direito de voto, o qual só
era destinado aos homens. Essa politização da mulher brasileira, esteve assentada
na discussão a respeito do fim da ditadura e a necessidade de democratização pela
qual passava o país.
Tendo o direito de voto contemplado, o feminismo passou então a requerer
outros direitos para a mulher, como por exemplo, a igualdade entre homens e
mulheres para além da escolha dos representantes. Com o intuito de romper o modelo
patriarcal, as mulheres travaram muitas lutas, na tentativa de superar as formas de
organização tradicionais e autoritárias. Segundo Bardwick (1981, p. 27): “O feminismo
quebrou as noções complacentes de que a tradição nos guia, acelerou mudanças e
alertou para as transformações que continuam sendo necessárias”. As mobilizações
inicialmente começaram por meio da organização de coletivos. Os coletivos eram
espaços de discussão que comportavam uma média de 20 mulheres que buscavam
a conscientização feminina de seu papel até então assumido na sociedade. Quando
o grupo extrapolava a 20 mulheres, era formado um novo coletivo.
Assim, entre meados dos anos 80, o movimento feminista por meio dos
coletivos, passou a rever a questão da maternidade. Nesse sentido, é necessário
reforçar que as mulheres passaram a repensar se desejariam, de fato, assumir o papel
de mãe e esposa, cuidadora do lar. Associado a isso, temos nesse período a
popularização dos anticoncepcionais, um avanço da medicina desde os anos 60, mas
que permitiria agora a mulher definir se queria e quando queria ter filhos. Nesse
período temos também a ampliação do acesso ao ensino por parte da mulher, e, sua
correspondente inserção no mercado de trabalho. Dessa maneira, a subjetividade
feminina acabou por ser alterada uma vez que são apresentadas à mulher novas
possibilidades, além da maternidade.
Apesar de nem todas as mulheres se vincularem ao movimento feminista e
apresentarem participação em manifestações e atividades dessa natureza, muitas
passaram a se beneficiar de suas conquistas. Nos anos 90, o movimento feminista
passou a requerer a igualdade na divisão das tarefas domésticas, uma vez que apesar
de muitas conquistas, como o trabalho e o estudo, as mulheres ainda precisavam
cumprir a chamada dupla jornada. A dupla jornada, corresponde ao fato de mulheres
exercerem atividade laboral externa e ainda serem responsabilizadas pelo cuidado da
casa, do marido e dos filhos. No entanto, dizer que esse direito foi plenamente
contemplado na sociedade brasileira ainda é incorreto, uma vez que nem todas as
mulheres que optam pelo casamento e pelos filhos tem tido essa divisão de tarefas
com os maridos, porém, hoje se admite que a vida cotidiana em comum deve ser
responsabilidade do casal.
Atualmente, sobretudo a partir dos anos 2000, vemos que a luta das mulheres
esteve orientada para a diminuição da violência, e, para o reconhecimento das uniões
homoafetivas e dos direitos análogos como adoção, casamento, dentre outros afins.
Estas requisições ainda estão em curso e não foram plenamente contempladas, á
medida que, ainda requerem muita luta para serem consolidadas. Outrossim, de
acordo com Avelar (2001, p. 17): “As mulheres são um ótimo exemplo para termos
uma ideia de quanto é longo o caminho da luta pela extensão real dos direitos de
cidadania aos muitos segmentos oprimidos de uma sociedade”. E mais, para entender
que os direitos conquistados não estão plenamente consolidados, e que podem ser
tirados das mulheres a qualquer tempo.
Importante também frisar na luta do movimento feminista, a
representatividade da construção e consolidação de serviços públicos de atenção e
defesa dos direitos das mulheres. Melhor dizendo, somente quando a cultura sobre o
que é ser mulher muda, é que temos a alteração e a criação de serviços destinados
especificamente a esse público. Pinafi (2007) aponta que a criação das Delegacias de
Defesa da Mulher foi uma iniciativa pioneira do Brasil que mais tarde foi adotada por
outros países da América Latina. Porém, no Brasil, a Delegacia de Defesa da Mulher
ainda não é muito valorizada den tro da Secretaria de Segurança Pública, e as varas
especiais criminais da violência contra a mulher, geralmente são submetidas á
segundo plano dentro do Poder Judiciário. Em 1985, criou -se a primeira Delegacia de
Defesa da Mulher (DDM), em São Paulo capital, órgão eminentemente voltado para
reprimir a violência contra a mulher, representando para as mulheres vítimas de
violência, um lugar onde agora poderiam recorrer e buscar a garantia de um direito
básico: o de não serem agredidas. Até 2003, as Casas-Abrigo e as Delegacias
Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs) constituíam as únicas instituições
voltadas especificamente à questão da violência contra as mulheres. A rede de
atendimento às mulheres em situação de violência foi redimensionada a partir de
2003, passando a compreender outros serviços que não somente os abrigos e as
DEAMs, tais como: centros de referência da mulher, defensorias da mulher,
promotorias da mulher ou núcleos de gênero nos Ministérios Públicos, juizados
especializados de violência doméstica e familiar contra a mulher, Central de
Atendimento à Mulher (Ligue 180), entre outros.
Via de regra, os serviços supracitados são consolidados para se atender
casos de violência contra a mulher. Em grande medida, não temos serviços
consolidados para ação preventiva, mas sim para atuar nos casos em que a violência
já aconteceu. No caso em pauta, somente o Centro de Referência da Assistência
Social (CRAS) atua de forma preventiva em relação à violência doméstica. A grande
expressão dessa violência advém da necessidade de haver em nosso país, uma
legislação para disciplinar pu nições mais severas em relação à mulher brasileira.
Desse processo, decorreu no final de 2006, a criação da Lei 11.340, conhecida como
Maria da Penha (LMP), que objetiva caracterizar a violência de gênero como uma
grave violação dos direitos humanos e garantir o enfrentamento desse problema por
meio de proteção e procedimentos humanizados para essas vítimas (FERREIRA,
2015).
A lei ficou conhecida por esse nome devido a uma vítima de um caso simbólico
de violência doméstica e familiar contra a mulher. Em 1983, por duas vezes, seu
marido tentou matá-la, na primeira vez através da arma de fogo e na segunda por
eletrocussão e afogamento. As tentativas de homicídio resu ltaram em lesões
irreversíveis a sua saúde, como paraplegia e outras sequelas. Maria da Penha
transformou sua dor em luta e sua tragédia em solidariedade. Seu caso ficou
conhecido e acabou dando nome à lei que hoje tem sido compreendida como símbolo
de luta das mulheres contra a violência.
Assim, os artigos iniciais da Lei Maria da Penha, de 1º. ao 4º. apresentam a
lei como um meio de prevenir e punir a violência doméstica e familiar que aconteça
contra a mulher, destacando que os direitos da lei em questão são devidos a todas as
mulheres independentemente de cor, raça, sexo, etc. Os artigos iniciais da lei em
questão reforçam que é responsabilidade da família, da sociedade e do Estado a
proteção e a preservação das mulheres brasileiras de toda e qualquer violência. Não
iremos reproduzir todo conteúdo da legislação em questão, mas é interessante
observar o que diz no primeiro artigo da lei. Assim, no artigo 1º da Lei Maria da Penha,
lemos:
Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e
f amiliar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição
Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência
contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e
Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais
ratif icados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos
Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece
medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência
doméstica e f amiliar. (BRASIL, 2006)

Visando melhor delimitar o que pode ser compreendido como violência


doméstica e familiar, o artigo 5º da lei 11.340, configura violência doméstica e
familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause
morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral. (BRASIL, 2006).
O caráter doméstico é assim descrito:

I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de


convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo f amiliar, inclusive as
esporadicamente agregadas;
II - no âmbito da f amília, compreendida como a comunidade f ormada por
indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais,
por af inidade ou por vontade expressa;
III - em qualquer relação íntima de af eto, na qual o agressor conviva ou tenha
convivido com a of endida, independentemente de coabitação.
Parágraf o único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem
de orientação sexual. (BRASIL, 2006).

Dessa maneira, vemos que a legislação se mostra muito clara com relação ao
que pode ser entendido como violência doméstica, ou seja, compreende o espaço da
unidade doméstica, mas caracteriza como doméstica também, casos ou situações em
que exista o vínculo de pertencimento (e não apenas de sangue) e também todos os
casos em que exista uma relação de afeto, seja ela de natureza homoafetiva ou
heterossexual.
Dentro deste contexto, através do artigo 7º da lei 11.340, temos definições
das formas de violência que afetam a integridade feminina:
Art. 7o São f ormas de violência doméstica e f amiliar contra a mulher, entre
outras:
I - a violência f ísica, entendida como qualquer conduta que of enda sua
integridade ou saúde corporal;
II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause
dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe
o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações,
comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento,
humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição
contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do
direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde
psicológica e à autodeterminação;
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a
presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada,
mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da f orça; que a induza a
comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a
impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a f orce ao matrimônio,
à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem,
suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos
sexuais e reprodutivos;
IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que conf igure
retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos
de trabalho, documentos pessoais, bens, valo res e direitos ou recursos
econômicos, incluindo os destinados a satisf azer suas necessidades;
V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que conf igure
calúnia, dif amação ou injúria. (BRASIL, 2006).

Nota-se no artigo acima, a complexidade das diversas formas de violência que


atingem as mulheres, ressaltando que essas categorias podem ocorrer de maneira
isolada ou multiforme. Essas definições especificadas contribuem para a
desmistificação do estereótipo de que a violência é somente física.
A partir da delimitação do que pode ser compreendido como violência
doméstica e familiar contra a mulher, a lei avança ao delimitar os serviços para intervir
junto às vítimas. De tal maneira, quanto ao papel da rede de serviços em prol da
violência contra a mulher, a lei disciplina o que segue:

Art. 9º A assistência à mulher em situação de violência doméstica e f amiliar


será prestada de f orma articulada e conf orme os princípios e as diretrizes
previstos na Lei Orgânica da Assistência Social, no Sistema Único de Saúde,
no Sistema Único de Segurança Pública, entre outras normas e políticas
públicas de proteção, e emergencialmente quando f or o caso.
§ 1º O juiz determinará, por prazo certo, a inclusão da mulher em situação de
violência doméstica e f amiliar no cadastro de programas assistenciais do
governo f ederal, estadual e municipal.
§ 2º O juiz assegurará à mulher em situação de violência doméstica e f amiliar,
para preservar sua integridade f ísica e psicológica:
I - acesso prioritário à remoção quando servidora pública, integrante da
administração direta ou indireta;
II - manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o af astamento do
local de trabalho, por até seis meses.
§ 3º A assistência à mulher em situação de violência doméstica e f amiliar
compreenderá o acesso aos benef ícios decorrentes do desenvolvimento
científ ico e tecnológico, incluindo os serviço s de contracepção de
emergência, a prof ilaxia das Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) e
da Síndrome da Imunodef iciência Adquirida (AIDS) e outros procedimentos
médicos necessários e cabíveis nos casos de violência sexual (BRASIL,
2006).

Além disso, na sequência a lei disciplina os passos para os casos de processo


em que a mulher foi vítima e destaca ainda quais seriam as medidas de emergência
em casos de violência doméstica, além de dispor ainda acerca de questões legais
quando há ocorrência do crime. Apesar de haver dispositivos legais a serem
observados e considerando ainda a popularização da lei, vemos que os casos de
homicídios femininos não diminuíam no Brasil e por conta disso foi aprovada a
chamada Lei do Feminicídio.
Entre a Lei Maria da Penha e o Feminicídio existe uma relação bastante nítida:
caso a Lei Maria da Penha tivesse efetividade plena e as medidas protetivas fossem
cumpridas, os feminicídios seriam evitados. Desse modo, entende-se que é
necessário certo reforço das ações previstas pela Lei Maria da Penha, bem como a
instituição de políticas públicas que combatam a violência contra a mulher.
A lei do Feminicídio 13.104, altera o Código Penal (art.121 do Decreto Lei nº
2.848/40), incluindo o assassinato de mulher como uma modalidade de homicídio
qualificado. Através do inciso VI, o feminicídio é caracterizado pela violência contra a
mulher por razões da condição de sexo feminino, sendo essas quando o crime envolve
violência doméstica e familiar, menosprezo ou discriminação à condição de mulher.
Prevista no código penal desde 2015, a legislação define uma pena maior do
que nos casos de homicídio, enquanto um homicídio simples tem pena de 6 a 20 anos,
o qualificado, onde o feminicídio se encaixa, a punição é de 12 a 30 anos de prisão,
sendo considerado um crime hediondo. Em relação a punição lemos ainda:
§ 7o A pena do f eminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o
crime f or praticado:
I - durante a gestação ou nos 3 (três) meses posteriores ao parto;
II - contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos
ou com def iciência;
III - na presença de descendente ou de ascendente da vítima.” (NR) (BRASIL,
2015)

Ambas as leis buscam, como indicamos, preservar a mulher, especialmente


aquelas vítimas de violência. Nesse sentido, é necessário destacar que alguns
equipamentos foram sendo criados para atender a esse segmento, dentre esses, o
Centro de Referência Especializado da Assistência Social, o CREAS.
O CREAS foi idealizado a partir de diretrizes contidas no Sistema Único de
Assistência Social (SUAS) no ano de 2005, no entanto, sua caracterização mais
definida foi dada na Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), de 2011. O serviço
foi implantado na cidade de Tarumã em março de 2015.
O CREAS é uma unidade pública da política de Assistência Social onde são
atendidas famílias e pessoas que estão em situação de risco social ou tiveram seus
direitos violados, como: violência física, psicológica e sexual; situação de rua;
abandono; trabalho infantil; e derivados. A equipe mínima de um CREAS dever ser
composta por: um Coordenador, um Assistente Social, um Psicólogo, um Advogado,
dois Profissionais de nível superior ou médio (abordagem dos usuários) e um Auxiliar
administrativo.
De acordo com as diretrizes que provêm o CREAS, esse serviço deve
propiciar um acolhimento e uma escuta qualificada, tendo em vista que esses
profissionais irão trabalhar com questões ligadas ao fortalecimento da função protetiva
da família, interrupção de padrões de relacionamentos familiares e comunitários com
violação de direitos, potencialização dos recursos para a superação da situação
vivenciada e reconstrução dos relacionamentos familiares, comunitários e com o
contexto social, como também a prevenção para que a situação vivenciada não se
conduza com mais agravantes (BRASIL, 2011, p.51).

As situações acompanhadas pelo CREAS são complexas, envolvem


violações de direitos, e são permeadas por tensões f amiliares e comunitárias,
podendo acarretar f ragilização ou até mesmo rupturas de vinculações. O
desempenho do papel do CREAS exige, portanto, o desenvolvimento de
intervenções mais complexas, as quais demandam conhecimentos e
habilidades técnicas mais específ icas por parte da equipe, além de ações
integradas com a rede.
As situações vivenciadas pelas f amílias e indivíduos atendidos no CREAS
podem ter repercussões dif erenciadas, que podem ser agravadas ou não em
f unção de diversos aspectos (contexto de vida, acesso à rede e direitos, ciclo
de vida, def iciência, rede social de apoio, gênero, orientação sexual,
def iciência, uso, abuso ou dependência de álcool ou outras drogas, condições
materiais, etc). Isso implica reconhecer que, diante das situações
vivenciadas, cada f amília/indivíduo atendido no CREAS demandará um
conjunto de atenções específ icas, de acordo com suas singularidades, o que
deverá orientar a construção do Plano de Acompanhamento Individual e/ou
Familiar.
As singularidades de cada situação deverão, inclusive, orientar a decisão
conjunta, com cada f amília/indivíduo, das metodologias a serem utilizadas no
trabalho social especializado, para a adoção das estratégias mais adequadas
em cada caso, tendo em vista a construção de novas possibilidades de
interação, projetos de vida e superação das situações vivenciadas. Nessa
direção, algumas situações poderão requerer atendimentos mais
individualizados, enquanto outras demandarão intervenções mais coletivas,
com a participação de todos os f amiliares implicados na situação ou até
mesmo a inclusão em atendimentos em grupo (BRASIL, 2011, p. 27).

Quanto à atuação dos profissionais no CREAS, pode-se notar que ocorre a


primordialidade de que seja realizado um trabalho interdisciplinar da equipe, e que a
mesma deve propiciar práticas congruentes para que as demandas sejam atendidas
de maneira adequada e com êxito.
No que diz respeito ao papel do profissional de psicologia no CREAS:

A psicologia, ao compor as equipes de ref erência dos CREAS, contribui para


um olhar na perspectiva do sujeito em sua relação na f amília e na sociedade.
Ao ref letir sobre a dimensão subjetiva dos f enômenos sociais tenta superar a
dicotomia existente em que historicamente apenas aspectos individuais eram
considerados. Mudanças na qualidade d e vida, superação de f ragilidades e
situações de violência e outras violações de direitos e são possíveis ao se
considerar o enf rentamento cotidiano da realidade vivida, construindo
soluções que podem ser individuais e/ou coletivas.
Ao prof issional de psicologia cabe revisitar seu f azer, traduzir e transmitir seu
compromisso, apontar para um posicionamento ético -político. Cabe ainda
romper com pressupostos teóricos que servem à manutenção da
desigualdade posta, partindo para novas concepções no campo dos
conceitos, metodologias e intervenções, abrindo espaço para ação
contextualizada na vivência de pessoas e grupos. Faz-se importante também
agregar um olhar crítico e de posicionamento f rente à realidade social. Isso
implica em romper com intervenções superf iciais e f ragmentadas, que sem
aprof undar nos contextos em que se aplicam atribuem aos sujeitos a
responsabilidade pelo que lhe ocorre e pela solução dos problemas. Algumas
práticas, que por vezes são apresentadas como inovadoras, podem ser na
verdade perpetuadoras de uma realidade social de segregação e violação de
direitos, e nada contribuírem para transf ormação social e inserção dos
sujeitos (BRASIL, 2011, p. 61).

A demanda que chega ao atendimento especializado no CREAS são pessoas


cheias de marcas e com histórias de vida com grande sofrimento. São indivíduos
históricos, determinados por fatores sociais, econômicos, biológicos e psicológicos
que extrapolam muito seu universo particular. Para atender a essa diversidade, temos
que nos questionar sobre a própria constituição do saber psicológico, e nos aliar aos
demais saberes para que ocorra um entendimento preciso de toda essa
complexidade.
As principais ações descritas para o trabalho social essencial a ser
desenvolvido junto aos Serviços de Proteção Soc ial Especial – Média
Complexidade é: acolhida; escuta; estudo social, diagnostico
socioeconômico, monitoramento e avaliação do serviço; orientação e
encaminhamentos para a rede de serviços locais; construção do plano
individual e/ou f amiliar de atendimento ; orientação sócio f amiliar; atendimento
psicossocial; orientação jurídico -social; ref erência e contra ref erência;
inf ormação, comunicação e def esa de direitos; apoio à f amília na sua f unção
protetiva; acesso a documentação pessoal; mobilização, identif icação da
f amília extensa ou ampliada; articulação da rede de serviços
socioassistenciais; articulação com serviços de outras políticas setoriais;
articulação interinstitucional com demais órgãos do Sistema de Garantia de
Direitos; elaboração de relatórios e/ou prontuários; estimulo ao convívio
f amiliar, grupal e social; mobilização e f ortalecimento do convívio e de redes
sociais de apoio (BRASIL, 2009, p. 20).

No âmbito da violência contra a mulher no contexto doméstico e familiar, o


profissional de psicologia terá possibilidades como: trabalhar com a proteção das
vítimas; ampliar sua capacidade para enfrentar com autonomia os revezes da vida
pessoal e social; monitorar e reduzir a ocorrência de riscos, seu agravamento ou sua
reincidência; desenvolver ações para eliminação/redução da infringência aos direitos
humanos e sociais dessas pessoas.
Os diversos tipos de atuação do Psicólogo nesse contexto são de suma
importância de estudo, pois existe a carência de pesquisas que nos demonstrem como
esses profissionais que atuam na Assistência Social lidam com essas demandas
específicas que chegam aos CREAS e de que maneira intervêm junto a essas
mulheres que tiveram seus diretos violados e estão em situação de risco. O
conhecimento e exploração das técnicas e equipamentos para a atuação do
Profissional de Psicologia tornam-se de extrema relevância para que haja
conhecimento de possibilidades quanto a atuação perante as diversas situações que
podem surgir dentro deste contexto.

Objetivos
Objetivo Geral

Explorar e analisar as práticas do profissional de Psicologia atuante no Centro


de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) na cidade de Tarumã –
São Paulo, em situações que estejam vinculadas à violência contra a mulher.
Objetivos Específicos

Trazer à tona a descrição e discussão das possibilidades de atuação do


Psicólogo no atendimento as mulheres vítimas de violência em um equipamento
assistencial público.
Aprofundar o conhecimento sobre as práticas do Psicólogo no CREAS através
de uma reflexão crítica sobre eficiência e adequabilidade dos recursos e instrumentos
utilizados por esse profissional no atendimento as mulheres vítimas de violência.
Identificar se as práticas do Psicólogo atuante no CREAS tem a
potencialidade de atuar no combate e na prevenção da violência de gênero.
Constatar e analisar como a interdisciplinaridade é benéfica na assistência em
casos em que a violência contra a mulher ocorre.

Hipóteses

Existe eficácia das políticas públicas implementadas para combater a


violência contra a mulher no CREAS? Podemos caracteriza-las como eficientes ou
ineficientes para o atendimento das demandas encontradas? Consideramos que o
CREAS é um equipamento basal para atender as demandas relacionadas à violência
contra a mulher, e, portanto, como uma ação eficiente nesse sentido.
Pressupomos que nas situações de risco já instaladas, o CREAS atua com
uma prevenção modesta, porém, necessária. Partindo da intervenção no CREAS,
ainda compreendemos que os tipos de vínculos que existem entre os profissionais da
rede e as vítimas são importantes mediadores no desenvolvimento de uma ação
psicológica eficiente.
As metodologias utilizadas pela equipe interdisciplinar do CREAS dão amparo
às solicitações realizadas pelas mulheres vítimas de violên cia, incluindo, nesse
sentido, as metodologias de ação usadas pelo Psicólogo que integra a equipe em
questão.
Muitas mulheres não se identificam como vítimas de violência e naturalizam
as relações prejudiciais que vivenciam, devido a isso, a demanda que chega a
instituição acaba sendo reduzida. A ausência de demais políticas públicas de
conscientização e de proteção também colabora para a diminuição dos casos que
chegam ao CREAS.
O Psicólogo, no CREAS, atua com base nos princípios e valores
apresentados pela Psicologia Social, e, desenvolve uma ação interdisciplinar vital para
a qualificação das ações que desenvolve em prol de mulheres vítimas de violência.

Justificativa

A violência psicológica, moral, sexual e física contra a mulher é um tema


atualmente em evidência na mídia. Nos dez primeiros meses de 2015, o Brasil
registrou 63.090 denúncias de violência contra a mulher – o que corresponde a um
relato a cada sete minutos no País, segundo dados da Secretaria de Políticas para as
Mulheres da Presidência da República, a partir de balanço dos relatos recebidos pelo
Ligue 180. Com toda essa visibilidade, tornou -se extremamente clara a presença
dessa tirania no cotidiano de todas as classes sociais. Por isso, é importante realizar
esse estudo, pois é relevante que se saiba como lidar com essas vítimas e quais
dispositivos estão disponíveis para atender essas mulheres que tiveram seus direitos
maculados.
Devido à violação de direitos e sua situação de risco, essas mulheres são
encaminhadas para o Centro de Referência Especializado de Assistência Social
(CREAS). Portanto, este estudo pretende explorar, analisar e identificar as limitações
e possibilidades na atuação do profission al de Psicologia atuante no CREAS na
cidade de Tarumã – São Paulo, em situações que estejam vinculadas à violência
contra a mulher no âmbito doméstico e familiar. É necessário destacar que realizamos
pesquisa junto ao site Scielo (www.scielo.br) em 10 de setembro de 2018 usando o
indicador: “Atuação do Psicólogo no CREAS” em pesquisa por assunto. Essa
pesquisa apresentou apenas um trabalho, porém, no caso em pauta temos a
representação de uma intervenção realizada no âmbito escolar. Assim, sabendo que
o site em questão é representativo da produção acadêmica contemporânea, supomos
que as produções sobre atuação do Psicólogo no CREAS ainda são poucas. Dessa
forma, consideramos que nosso trabalho é essencialmente necessário uma vez que,
aborda conceitos que ainda não foram plenamente discutidos pela academia.
Obviamente que a pesquisa em questão é bastante pontual, posto que, considerou
apenas uma amostra ao realizar o estudo no Scielo, porém, essa “amostra” é deveras
representativa do cenário da pesquisa nacional.
A importância do estudo em questão se dá devido à inserção do profissional
de psicologia frente as questões de violência contra a mulher. Na contemporaneidade
tem se exigido que esse profissional esteja amparado de diversos conhecimentos para
sua atuação diante desse fenômeno que tem atravessado décadas na cultura de
nosso país. Com o advento das tecnologias de informação, a temática tem se
mostrado em grande evidência na atualidade e na realidade desses profissionais
atuante no CREAS.
MÉTODOS

A pesquisa em questão está voltada a produção de conhecimento qualitativa,


uma vez que, foi realizada com intuito de abordar informações não quantificáveis que
expressem conceitos e conteúdos representativos de uma dada realidade. Minayo
(1999) nos coloca que quando realizamos esse tipo de pesquisa desenvolvemos
estudos qualitativos, os quais podem até se apoiar em números, dados, mas que não
podem ser reduzidos a quantidades. As pesquisas dessa natureza apresentam
conceitos. Nessa perspectiva, ao concluirmos a pesquisa tivemos como resultado um
saber sobre a prática do Psicólogo no CREAS e n ão foi um dado exato, mas um
conceito que foi compreendido e analisado. A presente pesquisa teve como proposta
entrevistar a psicóloga atuante no CREAS da cidade de Tarumã, através de uma
entrevista semiestruturada, com a finalidade de obter informações qu anto a sua
atuação em casos de violência contra a mulher no âmbito doméstico e familiar. Nesse
seguimento, utilizamos a seleção de uma amostra, um profissional, uma vez que nos
termos de Minayo (1999) uma amostra pode representar um extrato da realidade
investigada. No caso, a Psicóloga atuante no CREAS da cidade de Tarumã, interior
de São Paulo, foi o nosso sujeito participante da pesquisa.
As perguntas variaram desde a existência da demanda no município, como é
a atuação desse profissional no CREAS, quais os dispositivos existentes para atuação
junto a violência doméstica contra a mulher, de que maneira esse profissional tem se
preparado diante dessas demandas que chegam até o CREAS e quais os possíveis
encaminhamentos e ações junto a essas demandas. Além disso, fez-se necessária
uma caracterização inicial do entrevistado com questões como: tempo de formação,
vínculo empregatício, frequentou ou frequenta cursos de pós-graduação e outras
informações afins que o entrevistado desejou destacar.
Para a entrevista foram utilizados: papel, caneta, gravador de áudio e um
roteiro. Para a realização da pesquisa como um todo também foram usados outros
aparatos, por exemplo: computador com acesso a internet, impressora, além de livros,
cartilhas e artigos que abordem o tema de estudo, e itens como: caderno, canetas
esferográficas e canetas marca texto para realizarmos anotações.
Para a ocorrência da entrevista, o projeto foi enviado ao Comitê de Ética em
Pesquisas da Universidade Paulista — UNIP, para que fosse avaliada e
posteriormente autorizada sua realização. Para a preservação do profissional
entrevistado utilizamos um nome fictício, visando sigilo quanto a sua identidade. Ao
estabelecermos contato com a profissional a ser entrevistada, a mesma já assentiu
com a pesquisa. Após a aprovação do Comitê, realizamos a entrevista junto à
Psicóloga, e, na sequência foi transcrita (Anexo 1) e analisada.
O nosso instrumento para a coleta de dados foi o questionário com eixos de
perguntas, conforme enunciamos acima. A análise aconteceu com base na entrevista
realizada, e, consideramos os seguintes aspectos: 1. Caracterizações iniciais sobre o
profissional entrevistado; 2. Principais demandas apresentadas ao profissional
atuante no CREAS e 3. Intervenções, metodologias de ação e demais aspectos que
deflagram a atuação do Psicólogo no CREAS.
Resultados

A proposta inicial da presente pesquisa tinha como objetivo entrevistar um


profissional de Psicologia atuante no CREAS em situações de Violência contra a
Mulher na cidade de Assis. No entanto, não foi possível a realização de tal, pois não
havia um técnico atuante na unidade em questão.
Por esta razão, foi considerada a possibilidade da realização da entrevista
com o profissional atuante na região. Após pesquisas, observou -se que a unidade do
município de Tarumã possuía uma atuação junto a casos de Violência Contra a
Mulher. Partindo desse pressuposto, foi estabelecido contato com a unidade junto á
pretensão da pesquisa. Posteriormente, houve a apresentação do Termo de Intenção
de Pesquisa para o consentimento e realização da entrevista com a profissional.
Diante do exposto, obteve-se o objetivo da pesquisa, a realização da
entrevista com um técnico atuante no CREAS em casos de Violência Contra a Mulher.
Discussão

A profissional entrevistada é a técnica de proteção especial no CREAS da


cidade de Tarumã, interior paulista, atuando com medidas sócio educativas, crianças,
adolescentes e mulheres vítimas de violência. Trata-se de uma profissional psicóloga
graduada em 2017 e que atualmente cursa uma pós-graduação em gestão de políticas
públicas e atendimento à família, ambas as graduações pela Universidade Paulista.
O ingresso para o cargo se deu através de um concurso público Municipal.
De acordo com a técnica, o público atendido na unidade é diversificado:
adultos, adolescentes, crianças e jovens. As queixas trazidas inicialmente para o
atendimento são igualmente variadas e incluem medida socioeducativa por ato
infracional, situação de violência ou violação associada ao uso abusivo de substâncias
psicoativas, vítimas de violência intrafamiliar e/ou psicológica, vítimas de suposto
abuso sexual e vítimas de abandono. Há também um fluxo numeroso de atendimentos
na unidade e de visitas domiciliares realizadas pela equipe de profissionais atuantes
neste serviço, com atendimentos agendados por visita domiciliar ou por convocação,
sendo o último para casos onde há dificuldade e/ou impossibilidade de realização da
visita domiciliar.
O maior número de atendimentos no CREAS de Taru mã atualmente abrange
crianças e adolescentes encaminhados pelo Conselho Tutelar. Os casos chegam
tanto para a psicóloga quanto para a assistente social, porém a maior demanda
corresponde aos atendimentos com a psicóloga. As demandas que chegam até os
profissionais são encaminhadas pelo Poder Judiciário, pelo Conselho Tutelar, por
denúncias e pela Polícia Militar. Em relação à atuação da Polícia Militar, vale ressaltar
o Sistema de Boletim de Ocorrência Órion. O sistema Órion é uma plataforma digital,
que entrou em funcionamento em 2016 e foi criada na cidade de Presidente Prudente
- SP, visando maximizar o atendimento da Polícia Militar em benefício da população.
É um software de gestão regional completo que integra várias ferramentas e
instituições sociais, com o foco na solução das demandas de risco para a sociedade.
Com essa ferramenta os boletins de ocorrência que chegam ao CREAS são bem mais
detalhados, permitindo maior acesso dos profissionais á quantidade de informações
sobre o caso a ser trabalhado.
Concernente à atuação da profissional psicóloga neste contexto, é possível
encontrar na cartilha do CREPOP de Referências Técnicas para a Prática de
Psicólogos no Centro de Referência Especializado da Assistência Social – CREAS
(2013) os seguintes apontamentos sobre as ações mais frequentes dentro da atuação
do profissional dessa área:

[...] as ações realizadas por Psicólogos(as) com maior f requência f oram:


Acolhimento, Entrevistas Iniciais e Triagem; Atendimentos individuais,
Plantões; Grupos; Elaboração de Plano de Acompanhamento Individual e/ou
Familiar; Visitas Domiciliares, Acompanhamento dos usuários nos diversos
serviços do sistema judiciário; Relatórios Técnicos, Laudos e Avaliações;
Ações integradas com a rede; Atuação em equipes multidisciplinares;
Atividades educativas e de esclarecimentos para a população em geral e
Coordenação de serviços. (CFP/CREPOP, 2013, p.38)

Posto isso, nota-se que as ações citadas conferem com as descrições da


entrevistada a respeito de sua atuação perante os casos que atende:

[...] Tem os atendimentos individuais, eu acompanho algumas mulheres


semanalmente [...], quando percebo que elas não estão vindo no dia que é
marcado para elas, eu envio uma convocação para elas virem em um outro
dia e se elas não vierem eu vou até a casa delas f azer uma visita domiciliar.
Eu f aço as visitas domiciliares toda semana [...], e um grupo, eu f aço um
grupo de mulheres só com as mulheres que sof rem algum tipo de violência,
ele acontece uma vez por mês [...]

Percebe-se que a profissional incorpora as referências técnicas do Conselho


Federal de Psicologia junto às suas práticas no CREAS de Tarumã, adequando as
demandas aos instrumentos necessários para atendimentos no presente contexto. O
contato com a psicóloga também evidenciou um fator positivo, seu interesse pela área
de atuação onde está inserida, visto que a mesma se propôs a ampliar seus estudos
e conhecimentos através de uma pós-graduação, comentada anteriormente.
A primeira hipótese levantada para a execução deste trabalho partiu do
interesse em conhecer a eficácia, ou não, das políticas públicas implementadas no
combate a violência contra a mulher. A entrevistada destacou que enfrenta
dificuldades para se realizar um serviço eficiente de fato, pois o trabalho em rede na
cidade de Tarumã funciona parcialmente. Contudo, o trabalho não deixa de ser
realizado dentro das possibilidades e possui alguma eficiência.
Em Tarumã, a atuação da unidade frente à violência contra a mulher é
caracterizada pela oferta do atendimento individual e grupal. Os atendimentos
individuais acontecem toda semana e o grupo uma vez ao mês. Na proposta de
atendimento individual, segundo a entrevistada, as vítimas apresentam uma maior
dificuldade em verbalizar a violação de direito e/ou violência, já o atendimento em
grupo, por sua vez, demonstra que as vítimas conseguem exteriorizar com maior
facilidade suas vivências de forma mais efetiva. As técnicas utilizadas no grupo de
mulheres são lúdicas, acreditando que este recurso sirva como um facilitador para
suas expressões naquele momento. A psicóloga acrescenta que, a princípio, é
necessário esclarecer para a pessoa em aten dimento (seja individual ou em grupo)
que o propósito deste é proporcionar um ambiente de escuta e acolhimento.
O plano de ação em situação de violência contra a mulher deve pautar-se, de
fato, na escuta, no acolhimento e em ações que possam auxiliar a tomada de medidas
modificadoras da realidade da vítima. Ao iniciar o atendimento faz-se necessário
esclarecer o que é o CREAS e buscar que a vítima compreenda o porquê de seu
atendimento naquele momento. Não se trata de uma conversa invasiva, pelo contrário,
o que se faz é um caminho através do diálogo para que a vítima possa entender e
reconhecer sua situação de direito violado e dessa maneira aderir ao atendimento e
estabelecer o vínculo, conforme afirma a entrevistada. A abordagem não invasiva
também permeia nos atendimentos em grupos. Os atendimentos são agendados
semanalmente de acordo com a disponibilidade da pessoa e do profissional,
salientando que essas ações demandam tempo e energia.
De acordo com Monteiro (2012), um atendimento qualificado consiste na
atuação do psicólogo que, independentemente de sua abordagem ou método, realiza
o atendimento a vítima de violência doméstica utilizando-se do “rapport” e do vínculo
terapêutico como recurso que possibilite segurança suficiente para que a mesma
consiga compartilhar suas experiências de sofrimento. Segundo a psicóloga
entrevistada, o atendimento psicológico no CREAS de Tarumã compreende a
importância do vínculo nos primeiros contatos com a mulher vítima de violência, uma
vez que antes de iniciar o trabalho em grupo é realizado o acolhimento individual até
que a mesma tenha condições suficientes para ingressar no grupo de apoio. Oferecer
um ambiente seguro, que não seja ameaçador, é fundamental para o esclarecimento
da vítima a respeito dos seus diretos violados, contribuindo para o estabelecimento
do vínculo de confiança, conforme afirma a técnica:

Eu explico o que é o CREAS e quais são os atendimentos que eu f aço e eu


f alo que o atendimento no CREAS é quando acontece alguma violação de
direitos, e aí eu explico o que é violação de direitos. Eu explico qual é o
público que atendo e pergunto para ela: “dentro disso, você acredita que você
já tem algum direito violado?

Igualmente é destacada a relevância do vínculo com a família da vítima para o


entendimento da realidade do caso como um todo.
Conforme citado anteriormente, o trabalho da (o) profissional psicóloga (o) no
CREAS, abarca uma demanda que envolve indivíduos em situação de direitos
violados. Mesmo tratando-se de um público diversificado, as queixas trazidas
caracterizam-se por aspectos familiares e do meio social do indivíduo. Pelo CREPOP
observamos conteúdos norteadores dessa realidade concernente às transformações
no conceito “família”, destacando a necessidade da compreensão dessa instituição
em suas singularidades e potencialidades que requer dos profissionais uma revisão
do seu trabalho e construção de novas formas de abordagem e apreensão desse
espaço nas relações sociais. O trabalho do psicólogo necessita de práticas
contextualizadas a vivência dos sujeitos e seus meios, e para tanto, faz-se necessário
neste cenário, a interdisciplinaridade.
É esperado que dentro do CREAS o profissional Psicólogo consiga viabilizar
um espaço gerador de alternativas individuais e coletivas na perspectiva da superação
das situações de violação, com ações intersetoriais. De acordo com a tipificação
nacional de serviços socioassistenciais, observa-se que os serviços ofertados pelo
CREAS não podem ter suporte apenas de assistentes sociais e psicólogos, mas sim
demanda um trabalho em rede para que tais objetivos assistenciais possam ser
efetivados. As principais ações descritas para um trabalho social essencial de ser
desenvolvido junto aos Serviços de Proteção Social Especial – Média Complexidade,
revelam um ideal de interdisciplinaridade que não corresponde à realidade analisada
neste projeto de pesquisa quanto a articulação dos serviços de outras políticas
setoriais e interinstitucional com os demais órgãos do Sistema de Garantia de Direitos.
A fala da entrevistada corrobora com a necessidade e importância da
articulação entre os serviços. Todavia, ao se tratar da violação de direitos, afirma que
há certa insuficiência no trabalho em rede, principalmente das políticas sociais no
âmbito do combate a violência contra a mulher. Para ela, o fator mais relevante dessa
realidade é que as políticas sociais teriam que funcionar melhor em rede, de forma
mais articulada, com profissionais capacitados para tais ações, pois na prática tem
funcionado parcialmente em rede com outros órgãos.
Ainda segundo o CREPOP, a articulação em rede é importante para a
completude dos objetivos estabelecidos para o atendimento e o acompanhamento,
por viabilizar o acesso do destinatário aos seus direitos e sua inserção em diferentes
serviços e programas que incluem outras políticas, não apenas os serviços
socioassistenciais.
De acordo com a entrevista, os “olhares” diferenciados que o atendimento em
rede pode oferecer favorecem a compreensão da vítima de uma maneira mais
completa (ou ao menos mais complexa), considerando as carências e potencialidades
que possui para o enfrentamento da situação. Sendo assim, permite uma visão mais
integrada, articulada e intersetorial, bem como a construção de respostas conjuntas
diante do quadro de violência, permitindo o acesso a direitos socioassistenciais
integrado às políticas sociais e que busquem romper com a fragmentação no
acompanhamento e atenção às famílias. O apoio ofertado às mulheres nem sempre
é suficiente pela necessidade de integrar outros órgãos que podem assistir a vítima
em suas necessidades pertinentes ao momento. A interdisciplinaridade, mesmo sendo
uma proposta no atendimento do CREAS em Tarumã, ainda não é plenamente
satisfatória, apontando mais uma vez para problemáticas na rede de serviços e suas
conexões. Seria ideal que todos os envolvidos na queixa trazida fossem
acompanhados, incluindo os indivíduos do meio intrafamiliar, bem como o agressor
ou aquele que violou o direito/s, porém ainda não é a realidade.
O estabelecimento do vínculo é necessário também entre os profissionais da
rede e as vítimas, o qual pode ser construído no contato prévio antes mesmo da
demanda chegar até o CREAS.
Entretanto, vale ressaltar que não se trata apenas de obter setores ou serviços
para os quais destinar os encaminhamentos, é necessário a definição das
responsabilidades no processo de intervenção junto aos indivíduos e/ou famílias,
promovendo uma abordagem e acolhimento mais completa e articulada que permita a
reflexão conjunta da responsabilização de todos os envolvidos.
A técnica reconhece que a caracterização das novas demandas aponta para
uma reorganização no processo de desenvolvimento das políticas públicas e sociais,
argumentando que nenhuma política se encerra em si. As respostas às demandas
sociais exigem a complementariedade de diferentes políticas, a saber: saúde,
educação, assistência social, habitação, esporte, lazer e cultura, demonstrando que
somente a partir dessa compreensão os resultados podem ser alcançados. Aqui vale
ressaltar o que o CREPOP orienta acerca do órgão gestor de assistência social, sendo
missão deste órgão gestor, o papel preponderante na interlocução com outras políticas
e órgãos de defesa de direitos e na institucionalização da articulação do CREAS com
a rede, inclusive, por meio da construção e pactuação de fluxos dos protocolos
intersetoriais de atendimento.
Toda a noção detalhada pela Norma Operacional Básica do SUAS, descreve
as ações recomendadas para a efetivação do direito ao acesso as outras políticas
públicas e sociais e a integração com órgãos que compõem o Sistema de Garantia dos
Direitos. Ao revisar a literatura, podemos concluir que tais ações e estratégias
envolvem as articulações interinstitucional e intersetorial, que vem de encontro com
necessidade de alcance de um atendimento em rede mais eficiente no CREAS e em
especial nas políticas públicas implementadas no que diz respeito ao combate da
violência contra a mulher.
A violência doméstica, nosso tema de interesse, caracteriza-se pela violação
dos direitos da mulher garantidos por lei dentro de um ambiente familiar, causado por
membros com laços de sangue ou civil. A maioria dos casos assume um ciclo de
violência em três dimensões: tensão, explosão e reconciliação entre agressor e vítima.
Pela recorrência destes fatos, há o risco de que tais experiências de certa forma sejam
naturalizadas, cabendo aos profissionais que atuam frente a este fenômeno
compreender cada caso sem qualquer normatização das experiências psicológicas,
mantendo um olhar livre da pré-classificações das situações de violência em ciclos
rígidos (CREPOP, 2013). A naturalização destas experiências muitas vezes vem da
própria vítima, o que impede que a mesma se perceba em situação de violação de
direitos e consequentemente deixe de procurar por ajuda. De acordo com a entrevista
realizada, a naturalização nestes casos acaba reduzindo a quantidade da demanda
que chega até a unidade.
Além da naturalização da violência, muitas vezes a vítima nutre um
sentimento de culpa que dificulta a denúncia do agressor. Algumas acabam por
considerar suas atitudes em busca de defesa e garantia de direitos como uma má
atitude com o agressor, ou nutrem o medo de parecerem incoerentes para a
sociedade. É possível articular estes comportamentos como reflexo da violência
psicológica que acompanha as agressões físicas. Há casos em que a violência é
praticada durante anos e pode causar na vítima certa conformidade com o padrão de
relacionamento vivenciado constantemente, quando na verdade trata-se de uma
violação de direitos; as sequelas são comuns nesses casos, principalmente com
manifestações neurológicas como crises de ausência, entre outras manifestações,
destaca a psicóloga do CREAS.
De acordo com o caderno disponibilizado pelo CREPOP em 2013
“Referências Técnicas para a Prática de Psicólogas (os) no Centro de Referência
Especializado da Assistência Social – CREAS” vários conflitos domésticos estão
relacionados á subalternidade da mulher na sua situação de violência. A culpa e a
vergonha da situação em que se encontra e o medo de que o companheiro seja preso
ou a perda do provimento financeiro faz com que a mulher nessa condição procure
justificar a agressão com argumentos como ciúme, proteção, estresse, consumo de
bebidas alcóolicas, entre outros. Em casos assim, a denúncia só acontece quando a
situação se torna extremamente insuportável e oferece riscos às pessoas que
convivem na casa. A falta de procura por ajuda muitas vezes culmina na morte da
mulher, como revelam os dados coletados na entrevista.
A resistência das vítimas, principalmente no contexto intrafamiliar, pode estar
relacionada ao cultivo do vín culo com o agressor sem o objetivo de rompimento.
Muitas vezes o querer da vítima em situação de dependência se restringe apenas ao
afastamento deste agressor ou ao desejo de que a situação de violência cesse. Esse
tipo de dependência se dá principalmente de forma emocional e financeira.
Uma das ofertas às vítimas encontra-se na medida protetiva que, por sua vez,
funciona como prevenção nos casos de risco já instalados. Mesmo assim, a realidade
é que a maioria das mulheres não optam pela medida protetiva pela questão da
responsabilização do agressor que poderia acarretar em penas legais, não sendo
esse o objetivo da vítima. A partir disso, mais uma vez, vale ressaltar a necessidade
de se trabalhar com o “todo” da situação, incluindo o agressor, pois na maioria dos
casos o vínculo entre vítima e agressor não vai ser rompido. A psicóloga entrevistada
relata que ainda não há um trabalho devidamente consolidado para ser desenvolvido
pontualmente com o agressor, no entanto a mesma declara a necessidade deste tipo
de intervenção e da busca por capacitação e maiores conhecimentos a respeito das
medidas que poderiam ser tomadas neste caso.
Diante das resistências para a procura de ajuda, há ocasiões em que as
mulheres se justificam nos compromissos com os filhos, com a casa, etc. nesses
casos, o CREAS de Tarumã propõe a realização da visita domiciliar á vítima como
plano de ação.
O estabelecimento do vínculo entre a(o) psicóloga(o) e a vítima no
atendimento dos casos também objetiva resgatar a condição de sujeito da mulher,
assim como sua autoestima que se anula pela relação marcada por violência. A
anulação da identidade acontece devido à desqualificação que a mulher sofre através
da violência psicológica e moral. Esse tipo de violência muitas vezes reflete até em
casos onde a relação pessoal com o agressor já teve um ponto final (MONTEIRO,
2012). Partindo da realidade do CREAS em Tarumã, de fato existe este movimento
onde a violência psicológica e moral reflete diretamente a dificuldade da vítima em
manter a denúncia. Antigamente era possível retirar o boletim, no entanto hoje não
existe mais esta possibilidade. Lidar com o sentimento de que a mulher está fazendo
mal para o parceiro é um desafio que busca ser superado através do vínculo no
atendimento.
Como já relatado anteriormente, a violência doméstica é caracterizada por sua
complexidade que transita desde a violência com marcas emocionais até as marcas
visíveis no físico da vítima. Dos casos atendidos até o momento da entrevista, pode-
se observar certo padrão de violência que acompanha as vítimas, com início na
agressão verbal até culminar em uma conduta de agressão física. Tal fato se sustenta
pelos boletins de ocorrência recebidos no CREAS, que sempre apontam para mais de
um tipo de violência, sendo a mais frequente a agressão física acompanhada de
agressão verbal.
Schraiber et al (2002), em pesquisas sobre o assunto, já evidenciava este
padrão nos casos de violência doméstica. Um estudo de atendimentos em uma
unidade de atenção primária revelou a ocorrência de agressão física sofrida durante
a vida adulta (acima de 15 anos), onde 143 usuárias (44,4%) responderam já ter
sofrido ao menos um episódio na vida; Garbin, Isper e Doser (2006), também
confirmam a gravidade dos índices de agressão física no contexto da violência
doméstica. Seu trabalho referente aos inquéritos policiais registrados por lesão
corporal e maus-tratos em mulheres no ano de 2002 (total de 204 inquéritos) na cidade
de Araçatuba/SP, confirmou que a maioria dos inquéritos relatava violência física,
sendo que as contusões mostraram-se como as lesões corporais mais frequentes nas
relações violentas contra as mulheres com cerca de 60% dos casos e que tais lesões
apresentam-se mais frequentemente na cabeça e no pescoço.
Vale destacar que a violência psicológica também é evidenciada pelas
vítimas, principalmente no atendimento psicológico. Ainda que não haja a
verbalização desse tipo de violência por parte da mulher, subentende-se que são
inerentes a realidade apresentada nas sequelas emocionais de quem vivencia este
tipo de violência. Quanto ao desenrolar da violência psicológica, a entrevistada
ressalta:
Até quando eu entrei aqui, um dos primeiros casos que eu atendi, ela tinha
retirado o boletim. Porque a violência psicológica que era sof rida, f ez com que
ela entendesse que f azer o boletim de ocorrência contra o ex companheiro,
era ser má com ele. Ela f alou “eu não gosto de ser má, por isso eu retirei o
“boletim”.

Conforme Lucena et al (2017), a qualidade de vida das vítimas é afetada,


incluindo o surgimento de transtornos psicológicos. Esses autores apontam que
72,0% das vítimas desenvolve um grau de depressão clínica significativa, assim como
também a grande maioria das mulheres que vivenciam a violência (78,0%) também
apresentam sintomas como ansiedade e insônia; aquelas que sofreram agressões
(24,0%) iniciaram o uso de remédios ansiolíticos após o começo dos episódios. Tal
fato, também é uma realidade na cidade de Tarumã, visto que a entrevistada descreve
a existência de casos de mulheres que carregam sequelas por conta da violência física
sofrida, resultando em um tratamento medicamen toso.
A violência também pode acontecer no âmbito financeiro e sexual, requerendo
que a profissional psicóloga neste contexto seja capaz de acolher a diversidade de
demandas que configuram um mesmo fenômeno que é a violência contra a mulher.
Assim, caminhamos para a desmitificação do estereótipo de que a violência doméstica
é exclusivamente manifesta em caráter físico.
Outrossim, a entrevista discorreu sobre as dificuldades que as mulheres
encontram no período pós-violência e no momento da denúncia, desde a tomada de
decisão até a efetuação de um boletim de ocorrência. De acordo com as pesquisas
bibliográficas, tais dificuldades ocorrem devido à relação de poder estabelecida dentro
da instituição delegacia, denominada como relação de micropoder, termo muito
utilizado por Foucault na compreensão desse poder como uma mecânica que se
estende pela sociedade considerando formas concretas que acometem instituições e
tomando corpo em forma de dominação. Para a psicóloga, essa dificuldade pode se
tornar uma barreira entre mulher violentada e o poder Judiciário e, portanto, as
medidas necessárias precisam ser tomadas assim que a denúncia chega até a
unidade do CREAS: “No pós-denúncia, a gente procura ir na mesma semana ou na
semana seguinte fazer o contato com o ocorrido, a gente recebe a denúncia e já
procura fazer o que a gente chama de busca ativa da família”.
A necessidade de compreender a violência contra a mulher como um problema
macro de saúde pública é outro fator importante levantado na fala da técnica: “A
agressão contra mulher é um problema de saúde pública, ela sofre violência, outros
tipos de violência. Para fazer um boletim de ocorrência, ela sofre uma violência, uma
violência institucional.”
Para melhor caracterizar a violência institucional citada, os autores Chai,
Santos e Chaves (2018), afirmam que a desigualdade de gênero não se dá de maneira
aleatória, ela se faz a partir de uma organização social que privilegia o masculino em
função do feminino, nos âmbitos público e privado. Assim, nasce a violência
institucional. Os autores destacam que essa possui muitas perspectivas, como:
negligência e falta de atenção ao atender mulheres nesse tipo de situação,
banalização das necessidades e direitos, entre outras. A partir disso, ressalvam:

É uma espécie de coerção que contribui na consolidação de uma ordem


social injusta que precisa ser superada, pois é naturalizada dentro da
sociedade e muita das vezes possui certa invisibilidade, não sendo
compreendida como uma violação de direitos. Essa violência é praticada nas
instituições prestadoras de serviços públic os ou privados, e é cometida por
prof issionais que tem como f unção prestar um bom atendimento aos
assistidos que procuram os serviços dessas instituições. [...] A violência
institucional nem sempre se revela como violência, passando muitas vezes
despercebida, não pelo f ato de ser menos cruel, mas pela f orma sutil com
que se expõe. Estes processos de dominação e de relação social podem
estar tão arraigados na cultura que parecem até “naturais”. É um f enômeno
decorrente das relações de poder assimétricas e geradoras de
desigualdades, presentes nas sociedades contemporâneas e integrados à
cultura das relações sociais estabelecidas em algumas instituições, sejam
elas públicas ou privadas. (CHAI, SANTOS e CHAVES, 2018, p.21).

Ainda nesse contexto, os autores afirmam que apesar da progressão em


relação aos direitos das mulheres, a violência institucional não só existe como
acontece principalmente e frequentemente em instituições públicas.

A violência institucional contra a mulher é aquela praticada, por ação ou


omissão, nas instituições públicas ou privadas prestadoras de serviços, como
por exemplo, o Judiciário. Essa espécie de violência é consumada por
agentes que deveriam prestar uma atenção humanizada, preventiva e
reparadora de danos. (CHAI, SANTOS E CHAVES, 2018, p.23).

No momento da denúncia, muitas das mulheres estão ainda muito fragilizadas


e aflitas com a situação e torna-se um agravante a conduta de exigências e rispidez
por parte dos funcionários das instituições que teoricamente existem para o
acolhimento e escuta empática. As dificuldades nesse sentido caracterizam-se pela
peregrinação por diversos serviços até receber o devido atendimento, falha na escuta
por parte dos profissionais supostamente qualificados, falta de privacidade para os
usuários, frieza no trato das vítimas, negligência, entre outros maus tratos. A postura
de discriminação e desqualificação da identidade pessoal, a supervalorização do
saber científico em detrimento do saber prático e da experiência de vida, a banalização
dos direitos, assim como as críticas diante da necessidade da vítima, impedem a
aproximação atenciosa e esclarecedora que é necessária para o conhecimento de
causa. (CHAI, SANTOS E CHAVES, 2018).
Muitas mulheres não têm conhecimento da existência desse tipo de violência
institucional devido a sua existência sutil e naturalizada dentro das instituições. Há
casos em que pode até ser percebida, mas rapidamente é desconsiderada, uma vez
que partem de órgãos com maior autoridade social. Para Chai, Santos e Chaves
(2018), este fenômeno é decorrente das relações de poder geradoras de
desigualdades que estão enraizadas na sociedade contemporânea e suas relações
sociais estabelecidas nos serviços públicos e privado. Posto a problemática, os
autores igualmente propõem uma resolução por intermédio de um atendimento mais
humanizado, que compreenda quem é essa mulher e a sua história, sem negligenciar
a demanda trazida pela vítima, visto que a “Humanização, portanto, expecta conexão
do conhecimento técnico com a capacidade de perceber o ser humano nas suas
diferentes condições”.
As dificuldades encontradas ao longo do percurso para a atuação com as
vítimas de violência doméstica são diversas. Neste projeto, destacamos que existe
atendimento qualificado para essa demanda, com ofertas e serviços que funcionam
dentro dos limites e desafios do trabalho no CREAS e na rede interdisciplinar. No
entanto ainda há obstáculos a serem superados, como, por exemplo, as dificuldades
para a construção do vínculo entre o serviço e as vítimas, a falta de empoderamento
feminino para a superação da vergonha por dependência do agressor, a naturalização
diante da situação de violência, a falta de acesso ao conhecimento da lei, entre outros.
Percebe-se que tanto os dados encontrados na literatura, quanto os dados
levantados através da entrevista, sustentam a necessidade de desenvolver
discussões e ações voltadas além da psicologia e assistência social para o
aperfeiçoamento das ações em rede, das políticas públicas e, em especial, das
políticas sociais sobre este fenômeno. De igual modo, a interdisciplinaridade precisa
ser desenvolvida de forma mais organizada, efetiva e humanizada para o atendimento
a vítima, a família e ao agressor. É relatado na entrevista que no tocante a recursos
financeiros, não há problemas para o desenvolvimento das ações; os impasses e
interferências que ocorrem nas práticas profissionais dentro do CREAS de Tarumã
refletem a insuficiência das políticas sociais, principalmente com adolescentes e
mulheres vítimas de violência intrafamiliar.
Considerações Finais

Em virtude dos fatos mencionados nota-se a ineficácia das políticas públicas


acerca deste fenômeno á medida que as redes deveriam trabalhar de forma
articulada, promovendo diversos e diferentes olhares sobre a vítima a fim de assisti-
la como um todo, incluindo os membros da família e principalmente o agressor, já que
dificilmente esse vínculo é rompido totalmente. Há necessidade de atenção à
capacitação dos profissionais para este tipo de ação frente ao agressor, visto que esta
ainda não é uma realidade presente no exercício do CREAS onde as redes de trabalho
funcionam parcialmente, sendo essa, uma das maiores falhas dentro das políticas
públicas. Desta forma, um trabalho desenvolvido por uma equipe multidisciplinar
agindo de forma estruturada possibilitaria uma atuação mais exitosa.
Por todos esses aspectos, ainda que a mulher tenha conquistado seu espaço
na sociedade após tanto se submeter á inferioridade diante da figura masculina via
discriminação de gêneros, atividades domésticas e procriação, observa-se que na
atual sociedade ainda é possível encontrar resquícios deste período remoto, ao passo
que muitas mulheres em situação de violência doméstica ainda dependem do seu
agressor, seja uma dependência financeira, afetiva e até mesmo por opressão social.
Por outro lado, há vítimas que alegam não comparecer aos atendimentos propostos
pelo CREAS pelo simples fato de não poderem abandonar os trabalhos domésticos e
filhos, fazendo alusão à cultura patriarcal, que interfere diretamente na estruturação
deste fenômeno.
Referente à denúncia, a falta de conhecimento da Lei Maria da Penha que
tanto as mulheres quanto a sociedade em geral ainda apresentam, sinaliza uma
possível limitação quanto à aplicabilidade da mesma, onde os indivíduos deixam de
denunciar o agressor pelo fato de não conhecerem a legislação que os regem e de
que forma isso ocorre, dificultando o acesso ao código.
O código, por sua vez, possui uma boa proposta, porém com limitações
quanto a sua aplicabilidade. Uma vez que, há falha no cumprimento efetivo da mesma,
entende-se que o acesso às informações acerca da legislação não chegam ao
conhecimento da população e, consequentemente, acabam interferindo na busca das
mulheres por seus direitos.
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ANEXOS
Anexo 1 – Entrevista

Entrevistador: Quanto tempo você tem de graduação? Possui pós-


graduação? Como ingressou ao cargo?
Psicóloga: Eu me formei em 2017 e atualmente faço uma pós-graduação em
gestão de políticas públicas e atendimento a família na UNIP, sou formada pela UNIP
também. Ingressei no cargo através de concurso público, no ano de 2018.
Entrevistador: Quais demandas de atendimento tem na unidade em
questão?
Psicóloga: Eu peguei para vocês a referência do mês de março do nosso
RMA, aqui vão ter os números, a quantidade de atendimento e quais foram os
atendidos.
Eu sou a psicóloga técnica de proteção especial e atendo a medida sócio
educativa, crianças, adolescentes e mulheres vítimas de violência psicológica. No
RMA tem o total de famílias ou indivíduos acompanhados, no meu caso geralmente
eu não acompanho só um indivíduo da família e sim a família toda. Então, em março
tinham 129 famílias acompanhadas, mas, essas 129 foram acompanhadas por mim e
a assistente social. A demanda maior é minha porque, criança e a adolescente é a
maior demanda, mais da metade desse número é só de crianças e adolescentes.
No mês de março foram incluídas para acompanhamento familiar outras 13
famílias. Quando se fala em acompanhamento familiar, é pelo PAEF. Esse
acompanhamento pode acontecer semanalmente ou quinzenalmente e a gente usa
como instrumento a visita domiciliar. Aqui também tem o número de visitas, eu fiz
umas 50 visitas, tem também as famílias que recebem bolsa família e que foram
incluídas: são 4, famílias que recebem o benefício BPC: são 2; esse BPC eu não sei
muita coisa sobre ele, porque é a assistente social quem faz esse atendimento. No
caso de família cuja situação de violência ou violação esteja associada ao uso abusivo
de substancia psicoativas: das 13, são 4; famílias com adolescente em medida
socioeducativa em meio aberto: 1. Aqui temos as referências, de 0 a 12 anos: 2
pessoas do sexo masculino e 1 pessoa do sexo feminino; dos 13 aos 17: 3 pessoas
do sexo masculino e 2 do sexo feminino; dos 18 aos 59 anos: 1 pessoa do sexo
masculino e 4 pessoas do sexo feminino.
Como podem ver, o público de mulheres vai até os 59 anos, a partir dos 60 é
só a assistente social e não esteve presente ninguém com 60 anos ou mais. Crianças
ou adolescentes vítimas de violência intrafamiliar ou psicológica: foram 4; crianças ou
adolescentes vítimas de suposto abuso sexual: total de 2; crianças vítimas de
exploração sexual: 0; crianças ou adolescentes vítimas de abandono: 1; crianças ou
adolescentes em situação de trabalho infantil: nenhuma; o que não significa que não
tenha, estes dados são dos que foram incluídos este mês; pessoas com deficiências
vítimas de violência intrafamiliar: 2; mulheres adultas dos 18 aos 59 anos vítimas de
violência intrafamiliar: nenhuma que foi incluída; pode ser que a gente tenha feito
algum atendimento, mas, que ela não tenha sido incluída para acompanhamento;
pessoas vítimas de tráfico de seres humanos: 0; pessoas vítimas de discriminação
por orientação sexual: 0; pessoas em situação de rua: 0; total de atendimentos
individualizados realizados no mês de referência foram estes, 138 atendimentos no
mês e o total de atendimentos realizados no mês de referência em grupo, 31 pessoas
foram alcançadas; famílias encaminhadas para o CRAS: 0; visitas domiciliares do mês
de referência: 40; total de adolescentes em medidas socioeducativas: 8; liberdade
assistida: 1; prestação de serviço à comunidade: 7 (esse número já aumentou esse
mês, quase o dobro); liberdade assistida em prestação de serviço (são as duas
medidas): 1; pessoas em abordagem social: 12; migrantes: 12. Então, essa é a
resposta da demanda de atendimento, de uma forma bem geral. Vocês querem que
eu fale mais sobre essa demanda agora de uma forma qualitativa?
Entrevistador: Na verdade, era mais qualitativa mesmo...
Psicóloga: O fluxo maior é de criança e adolescente aqui porque existe um
órgão que respalda a gente, que é o Conselho Tutelar. Então, a maioria dos nossos
encaminhamentos são via Conselho Tutelar, inclusive quando acontece alguma
situação de violência contra a mulher ou violência doméstica na família, ela vem pelo
Conselho Tutelar também, vem do Conselho porque a família vai ser acompanhada,
mas, já vem especificado que supostamente aconteceu uma violência doméstica. Eu
tenho casos de adolescentes que já cometeram violência contra a mulher,
adolescente que cumpre a medida socioeducativa por conta da violência, esse
adolescente chega pelo judiciário quando comete um ato infracional. Nesse caso, a
violência doméstica não aconteceu na cidade, então eu não tive contato com a mulher.
Quando acontece a suposta violência doméstica e ela é encaminhada pelo Conselho,
é feita uma visita domiciliar para um agendamento na unidade, porque, por ser aqui
no CREAS existe um ambiente proporcionado para a pessoa; o sigilo, a ética. Não
sabemos se o agressor vai estar na casa no momento da visita e como isso vai ser
entendido. Porque eu percebo o seguinte, quando a gente vai até a casa fazer o
agendamento, você já estabelece uma proximidade diferente com a mulher. A
convocação é outro instrumento que utilizamos, ou seja, o agente administrativo
entrega uma convocação para a pessoa e ela deve comparecer no dia e horário
marcado, mas isso distância um pouco o nosso atendimento.
As demandas chegam por denúncia também, no caso das mulheres têm um
sistema da Polícia Militar que se chama Orion e o CREAS tem acesso. As medidas
socioeducativas chegam pelo judiciário, casos de mulheres violentadas chegam pelo
boletim de ocorrência e casos de crianças e adolescentes pelo Concelho Tutelar ou
denúncias também.
Entrevistador: Você já respondeu como os casos de violência contra mulher
chegam até o CREAS, você falou do Conselho, da denúncia e o sistema da polícia
militar, certo?
Psicóloga: Isso, chama Órion (o sistema). Neste ano de 2019 foram
encaminhadas 12 mulheres para o CREAS, no ano passado a gente tinha uma meta
de ofertar 100% de atendimento pelo CREAS, mesmo não sendo uma meta agora,
continuamos fazendo isso no caso dessas 12 mulheres. Destas, duas vieram por uma
denúncia de outro serviço e seis vieram do boletim de ocorrência - que é o sistema
Orion - nesse boletim de ocorrência vem detalhado o que aconteceu e qual foi o tipo
de violência. Então, quando eu chego para fazer a visita domiciliar eu já sei o que
aconteceu, já que na maioria das vezes não é dito pela mulher. Isso é muito
interessante, porque possivelmente ela já sabe que eu também já sei como foi a
violência e que não foi apenas uma vez e aí a maioria das falas é pontual “não
aconteceu mais”, “foi a primeira vez” e “já está tudo resolvido”. E aí eu explico todo o
serviço do CREAS, que a gente oferece um atendimento de escuta para mulher para
que se possa ser compreendido o que realmente aconteceu. Então, o serviço é
oferecido para todas as mulheres, mas, nesse momento, temos 8 mulheres
acompanhadas e se eu não estiver enganada nenhuma dessas 12 aqui (do registro),
estou em acompanhamento esse ano. Porque existe uma resistência muito grande
pelo fato de que a maioria delas não consegue se desvincular do possível agressor.
Entrevistador: Há uma dependência por parte dela em relação a ele né?
Psicóloga: Na maioria das vezes, existe uma dependência emocional ou
financeira e então essa resistência é muito grande. Recebemos duas denúncias
anônimas de violência contra mulher. Tem algum tipo de pergunta referente aos tipos
de violência?
Entrevistador: Esta seria a próxima pergunta. Só complementando: como é
desenvolvido o trabalho no CREAS em relação a violência contra a mulher?
Psicóloga: Certo. Tem os atendimentos individuais, acompanho algumas
mulheres semanalmente, elas apresentam uma dificuldade em comparecer
justamente pelos outros fatores da vida de cada uma, algumas já são mães e os filhos
são desse suposto agressor. Então, existe uma dificuldade, não sei se realmente é
essa dificuldade, mas é o que é dito: “eu tenho um filho com ele” e em muitos casos
não é apenas a mulher quem sofre a violência, a criança e o adolescente também
sofre dentro da casa, por isso temos o atendimento individual.
Eu, quando percebo que elas não estão vindo no dia que é marcado, eu envio
uma convocação para virem em um outro dia e se não vierem eu vou até a casa fazer
uma visita. Eu faço as visitas domiciliares toda semana - não para as mesmas pessoas
- porque eu não daria conta, mas eu faço a visita domiciliar toda semana, e também
um grupo, grupo só com as mulheres que sofrem algum tipo de violência, ele acontece
uma vez por mês, existem algumas mulheres (a maioria das mulheres que vem do
grupo), elas não vêm para acompanhamento individual, elas conseguem ir para o
grupo, falar no grupo.... Eu trabalho de uma forma bem lúdica com elas neste grupo,
elas se expressam projetando, através de desenhos e trabalhos que não sejam
entendidos que estou forçando a barra com elas, porque elas têm uma preocupação
sobre o que vai ser dito e quando elas vêm para o atendimento eu explico que eu não
sou um órgão de responsabilização e sim de escuta e acolhimento, para que ela
entenda que eu não estou ouvindo para te acusar ou acusar seu marido ou
companheiro. Então, tem essa dificuldade de entendimento sobre o que o CREAS
oferece, então eu deixo bem claro já no primeiro atendimento.
Existe reincidência de mulheres que continuam sofrendo violência e que já
não fazem mais boletim de ocorrência. Existe uma dificuldade para fazer o boletim de
ocorrência, não sei se vocês fizeram alguma leitura sobre isso...
Entrevistador: Sabemos que é bem complicado...
Psicóloga: Existe uma dificuldade muito grande em abrir um boletim de
ocorrência, porque existem critérios que ameaçam e existe a necessidade de ser
direta e diversas outras coisas. A medida protetiva, eu atendo algumas mulheres com
a medida protetiva, mas não acontece o suporte e segurança necessária.
Entrevistador: Quais são os tipos de violência mais relatados pelas mulheres
atendidas no CREAS?
Psicóloga: Geralmente começa com uma violência verbal e a violência
psicológica, sutilmente ela acontece, ela é a mais vista. Em termos de números a
violência física e ameaça ainda são as que mais aparecem dentro dessas 12 mulheres
desse ano. No boletim de ocorrência que a gente recebe aparece mais de uma
violência, mas a maioria das vezes começa dessa forma. Tem a violência financeira
que eu também atendo. Dentro dessas 12, uma suposta violência sexual (não foi do
companheiro). As ameaças geralmente são dos próprios companheiros, a agressão
física, a psicológica e a verbal também. Em números, a física e a ameaça é maior: 4
casos; psicológica: 3; verbal: 1; violência financeira: 1 e a suposta violência sexual: 1.
Isso são números que vem do boletim de ocorrência, e dentro dos atendimentos a
violência verbal e a física persistem muito dentro do que eu atendo hoje. A violência
psicológica, ela é incrivelmente usada; e em alguns atendimentos com as mulheres,
vejo que a violência é mútua (da mulher e do homem, do companheiro).
Entrevistador: Quais são os recursos utilizados pelo CREAS para o
desenvolvimento das atividades pós denúncia?
Psicóloga: No pós denúncia, a gente procura ir na mesma semana ou na
semana seguinte fazer o contato com o ocorrido, a gente recebe a denúncia e já
procura fazer o que a gente chama de busca ativa da família. Dos trabalhos
desenvolvidos, são os que eu falei: tem o grupo, os atendimentos individuais e a visita
domiciliar.
Entrevistador: Existe alguma contrapartida do governo?
Psicóloga: Aham, existe a fonte cinco que é do governo federal, ele envia
para o município 100 mil reais anualmente (acredito que esses 100 mil reais sejam
desse ano, pode ter alteração no valor). Esses 100 mil, não é especificamente para
demanda de mulher que sofre violência; é para uma demanda de proteção de média
complexidade, ou seja, não é nem só para o CREAS. Aqui no município quem vai usar
esses 100 mil reais é o CREAS e o Vida Ativa (tem um prédio aqui perto que é o Vida
Ativa), que trabalha com portadores de necessidades especiais que também é de
média complexidade. Então, essa é a contrapartida em termos financeiros do governo.
Entrevistador: Há eficácia das Políticas públicas implementadas para
combater a violência contra mulher no CREAS?
Psicóloga: Ao meu ver, não. Esse trabalho poderia funcionar em rede, dentro
de uma articulação maior, com uma maior capacitação dos profissionais. Deixa eu ver
o que mais...
Entrevistador: Esse trabalho não funciona muito em rede, então?
Psicóloga: Não, é ruim falar isso..., mas é assim, tudo que é funciona em
rede, funciona parcialmente. É uma luta muito grande fazer com que funcione uma
rede intersetorial. Eu tenho mulheres que são atendidas por conta da violência aqui e
que são atendidas pelo CAPS. Tenho alguns casos que funcionam dentro de uma
rede, depende. A visão do técnico precisa ir além do atendimento da violência contra
mulher, ela tem que ser vista como um todo e não só como uma mulher que sofre
violência doméstica, se for olhar só para isso, o atendimento fica bem mais rápido,
bem mais simples, não é o necessário, não é eficiente. Nos atendimentos então, eu
como técnica pelo menos, procuro enxergar além dessa violência, na maioria das
vezes essa violência é só a ponta do iceberg, e aí precisa ser trabalhado com o
restante da família. Eu já tenho acompanhado isso em caso onde eu atendo a família.
Possuo casos de mulheres que sofreram violência onde atendo até o marido ou ex
companheiro, mas não atendo como agressor. Imagino que vocês possuem uma
pergunta sobre isso, se existe um trabalho com o agressor...
Entrevistador: É isso, esta seria a segunda parte da pergunta. Podemos
caracterizar as Políticas públicas como eficiente ou ineficientes para o atendimento
dessas demandas?
Psicóloga: Existe sim Políticas públicas. As mulheres são atravessadas de
alguma forma pelo atendimento, mas não da forma qu e seria necessária, ao meu ver.
É, pra funcionar direitinho, num ideal, teria que envolver outros órgãos. Na medida do
possível, aqui no município isso acontece e quando isso acontece é muito melhor o
atendimento, quando o CREAS funciona com outros órgãos, de outras secretarias.
Entrevistador: As metodologias utilizadas pela equipe interdisciplinar do
CREAS dão amparo as solicitações realizadas pelas mulheres vítimas de violência?
Psicóloga: Interdisciplinarmente falando, dentro daquilo que a gente pode
oferecer, sim. Mas isso, dentro daquilo que a gente pode oferecer, já não é o esperado
e o necessário.
Entrevistador: Nas situações de risco já instaladas, o que ocasiona uma
prevenção modesta?
Psicóloga: A orientação que eu dou para as mulheres que estão correndo o
risco, é a medida protetiva, porque essa é minha função: orientar elas a respeito disso,
não que isso seja eficiente, mas a maioria das mulheres não fazem a medida protetiva,
porque eu entendo que a mulher, ela não quer responsabilizar o agressor por isso, ela
quer simplesmente deixar de ser agredida e não necessariamente qu e ele (o agressor)
seja preso, nem quer romper o vínculo com ele, só quer que aquilo acabe. Por isso, a
importância do atendimento com agressor, porque a maioria da das mulheres que
sofrem violência não vão romper o vínculo, então o atendimento tem que ser com o
agressor e ela.
Entrevistador: Que tipos de vínculos existem entre os profissionais da rede
e as vítimas?
Psicóloga: Como eu falei numa pergunta anterior, tem até outros órgãos que
denunciam para gente a respeito de mulheres que sofrem violência, que vai fazer um
atendimento, uma orientação e isso acaba surgindo e pode ser que nesse outro
serviço ela já tenha um vínculo estabelecido, por isso ela consegue contar. Dessa
forma, acontece o que eu posso falar fora daqui. Aqui, eu estabeleço um vínculo
primeiramente individual para depois inserir no grupo. Em alguns momentos, você tem
que prestar atenção; em alguns momentos não, mas em todos os momentos eu tenho
que prestar atenção em quem eu estou inserindo no grupo... porque a cidade, é uma
cidade pequena e todo mundo se conhece. Só que é assim, o grupo não chama
“mulheres que sofrem violência” eu não falo “olha... boa tarde, estão aqui todas as
mulheres que sofrem violência”. Eu nem falo sobre isso de uma forma “como foi
quando você sofreu violência? ” Eu não trabalho dessa forma, por que é
constrangedor. Mas por a cidade ser pequena e a maioria das pessoas conhecerem,
eu tenho esse cuidado: de não inserir quem já teve um conflito antes, acontece das
mulheres, às vezes, o motivo da agressão, ser uma outra mulher que já está no grupo.
Então, eu tenho esse cuidado também para inserir no grupo e isso só acontece
quando eu tenho o vínculo. Eu só sei da família, quando eu tenho um vínculo com a
família.
A gente tem o prontuário do SUAS, ele tem que ser preenchido por partes. Eu
só consigo preencher esse prontuário da mulher se eu tiver um víncu lo, se eu
conhecer a família como um todo, além da violência que ela sofre.
Entrevistador: Quais as dificuldades para que esses vínculos sejam
estabelecidos?
Psicóloga: A vergonha por continuar com agressor é uma das dificuldades
maiores. Muitas mulheres não se identificam como vítimas de violência e naturalizam
as relações prejudiciais que vivenciam, devido a isso, a instrução acaba sendo
reduzida. Acaba sendo reduzida e existe uma naturalização muito grande da violência,
algumas vezes ela não é nem vista como uma violência pontual, como eu falei, quando
eu chego para conversar com algumas mulheres, elas dizem que foi pontual. Não,
algumas nem entendem como violência, nem como agressão e elas estão marcadas
visualmente, dá para ver que aconteceu uma coisa, não foi psicológica que a gente
não consegue ver com os olhos naturais. Aí tem essa naturalização sim, e agora não
pode mais ser retirado o boletim, mas antes podia. Até quando eu entrei aqui, um dos
primeiros casos que eu atendi, ela tinha retirado o boletim, porque a violência
psicológica que era sofrida, fez com que ela entendesse que fazer o boletim de
ocorrência contra o ex companheiro, era ser má com ele. Ela falou “eu não gosto de
ser má, por isso eu retirei o “boletim”.
Enquanto profissional, ouvindo as histórias das mulheres que sofrem
violência, elas sofrem por anos, tem caso aqui de mulher que sofreu mais de 20 anos
e ficou com sequela, porque apanhava muito na cabeça e deu problema neurológico,
hoje tem crises de ausência... E ainda tem contato com agressor. Porque algumas
vezes tem o filho, se separam, mas ele vem buscar o filho.
Entrevistador: E muitas delas não entendem, não veem como violência
psicológica. “Ah, ele me xingou lá, mas é normal”
Psicóloga: “É brincadeira, é o jeito dele”, “Ele só me deu um tapa, é ciúmes”
Naturalizam né...
Existem níveis de agressão, por exemplo: uma facada por ciúmes. “Eu sou
culpada”, na maioria das vezes existe um sentimento de culpa muito grande; se não
em todas, mas na maioria, 99% das vezes, e eles acabam naturalizando mesmo.
Entrevistador: Como é o campo de ação do psicólogo no contexto da
violência contra mulher?
Psicóloga: No contexto da violência contra mulher, eu faço a escuta e o
acolhimento, geralmente no primeiro atendimento, quando eu não consigo fazer a
visita domiciliar e eu envio a convocação, eu pergunto “você sabe o que você veio
fazer aqui?” “não, eu não sei” “mas você imagina?” “não”. Aí eu explico que é o CREAS
e quais são os atendimentos que eu faço e eu falo que o CREAS é quando acontece
alguma violação de direitos, e aí eu explico o que é violação de direitos, qual é o
público que eu atendo e pergunto para ela “dentro disso, você acredita que você já
tem algum direito violado?”.
Algumas vezes ela não identifica como direito violado e aí eu falo “olha... você
está aqui porque você sofre uma violência”, primeiro eu faço um caminho com ela para
ver se ela entende aquilo como violência, se ela sabe o que é direito violado, até
chegar lá. É importante que os atendimentos sejam semanais com elas, deixo em
aberto, “tem um dia pra você vir nesse horário, mas se você precisar vir em outro
horário e eu estiver disponível eu te atendo”. O fluxo de atendimento aqui é grande,
talvez não em quantidade... se você olhar, você atende seis atendimentos no dia, mas
são seis atendimentos de direitos humanos. E demanda tempo e energia.
Entrevistador: Quais são as abordagens mais utilizadas? Há ações junto ao
agressor?
Psicóloga: Com a mulher eu faço essa abordagem que eu já falei, com o
agressor eu tenho experiência, mas não como agressor, seria como parceiro. Tem
alguns casos que eu sei que acontece violência contra a mulher, ela sabe que eu sei,
mas ela não me diz. É muito invasivo eu falar, então eu tenho um cuidado muito
grande com isso. Algumas vezes eu acabo atendendo agressor, o que eu faço é o
acompanhamento familiar, dá para entender a diferença de atender o agressor e fazer
o acompanhamento da família? Então eu não faço o acompanhamento com o
agressor que deveria ser feito, naquele formato que a gente já conversou, isso não
acontece. Mas é um plano nosso, a gente está estudando há três meses, a gente está
buscando a capacitação de como atender esse agressor; porque o atendimento com
agressor é apaixonante, não tem como dizer que não. Quem trabalha com a violência
contra mulher entende ele como um dos pilares importantes, então a gente tem feitos
estudos da equipe técnica para isso, mas não somos capacitados ainda.
Entrevistador: Você comentou agora, numa pergunta que sobre o
atendimento individual, que você não faz uma abordagem invasiva. Esse caminho
também permeia nos grupos?
Psicóloga: Nos grupos também, mas essa é minha forma de abordagem, não
é um padrão.
Entrevistador: Qual a importância da interdisciplinaridade para essa
atuação?
Psicóloga: A visão do serviço social, do assistente social e do psicólogo por
muitas vezes ela é diferente e ela é importante. Em todas as minhas visitas, eu vou
interdisciplinar, eu vou com a minh a coordenadora e ela vai como a assistente social,
então tem as duas visões. Então nas visitas com as mulheres que sofrem com a
violência, nós vamos nós duas e o atendimento com a mulher é feito só por mim. A
educadora social também faz serviço social, mas ela não atua aqui como assistente
social, atua como educadora social. Ela me ajuda a montar as oficinas, então de certa
forma existe uma interdisciplinaridade em todas as ações que eu faço. Quando o
atendimento é individual, não. Porque é individual, só eu e ela (vítima).
Entrevistador: O que interfere na prática do psicólogo atuando no CREAS?
(recursos, políticas sociais, demais fatores afins)
Psicóloga: Com recursos eu não tenho problema nenhum, é bem organizado.
Com políticas sociais eu tenho dificuldades sim, falta políticas públicas, políticas
sociais, principalmente para os adolescentes, para os adolescentes da medida sócio
educativa que fazem uso abusivo de drogas ilícitas, uso abusivo de álcool, enrosca
na rede. Em políticas sociais, eu tenho essa visão. Sobre o serviço da mulher, também
precisaria ter muitas políticas públicas voltadas só para ela, em rede, não só na
assistência social... Porque se a gente for olhar para o atendimento da mulher que
sofre violência, ela é vista só pela assistência.
Eu não sei se vocês encontraram algum serviço da saúde...
Entrevistador: Só tem projetos, não tem nada muito regulamentado, nem
consolidado. Nada muito pontual.
Psicóloga: Sim, por isso eu acredito que não estou falando bobagem. Que
ela é só assistida pela assistência social. A agressão contra mulher é um problema de
saúde pública, ela sofre violência, outros tipos de violência. Para fazer um boletim de
ocorrência, ela sofre uma violência, uma violência institucional.
Entrevistador: Aqui tem delegacia?
Psicóloga: Tem delegacia, mas não tem delegado. Não tem delegacia da
mulher, apenas delegacia civil.
Entrevistador: Aqui então não tem nem delegado?
Psicóloga: Não, fica em trânsito, se eu não estiver enganada. Mas a mulher sofre
outras violências... Ela pode sofrer, né, não posso nunca dizer que ela sofre.
Anexo 2

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Campus Indianópolis
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Clementino
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e-mail: cep@unip.br
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TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Caro Participante:

Gostaríamos de convidá-lo a participar como voluntário da pesquisa intitulada


“A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO NO CREAS DA CIDADE DE TARUMÃ EM
SITUAÇÕES DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER”, que se refere a um projeto de
pesquisa do(s) participante(s), ANA CAROLINA PALMA FURLAN, ANDREIA
CRISTINA SALLES, GABRIEL VITORINO DA SILVA, KAROLINA TASQUIN
MARTINS ELIZIARIO, LETÍCIA CORREA SEABRA, MARISA TEREZAN TOLEDO
JUSTO e PRISCILA KAREN BAZZO DE CARVALHO, os quais pertencem ao Curso
de Psicologia da UNIP.

O(s) objetivo(s) deste estudo é conhecer a prática do Psicólogo que atua junto
a violência doméstica contra a mulher no CREAS de Tarumã. Os resultados
contribuirão para produção de conhecimento sobre a prática do Psicólogo no CREAS
e intervenções do profissional junto à violência doméstica contra a mulher.

Sua forma de participação consiste em participar de uma entrevista, com


questões previamente estruturadas e que poderá ser gravada, caso concorde com
essa possibilidade.

Seu nome não será utilizado em qualquer fase da pesquisa, o que garante seu
anonimato, e a divulgação dos resultados será feita de forma a não identificar os
voluntários.
Não será cobrado nada e não haverá gastos, decorrentes de sua participação,
se houver algum dano decorrente da pesquisa, o participante será indenizado nos
termos da Lei.

Considerando que toda pesquisa oferece algum tipo de risco, nesta pesquisa o
risco pode ser avaliado como: mínimo, uma vez que precisará discorrer sobre
aspectos do seu cotidiano profissional. No entanto, você poderá cancelar a sua
participação na pesquisa se assim o desejar.

São esperados os seguintes benefícios imediatos da sua participação nesta


pesquisa: produção de conhecimento sobre a intervenção do Psicólogo no CREAS,
junto a violência doméstica contra a mulher. Reflexão sobre a sua prática profissi onal
desenvolvida junto ao CREAS e junto à violência doméstica contra a mulher.

Gostaríamos de deixar claro que sua participação é voluntária e que poderá


recusar-se a participar ou retirar o seu consentimento, ou ainda descontinuar sua
participação se assim o preferir, sem penalização alguma ou sem prejuízo ao seu
cuidado.

Desde já, agradecemos sua atenção e participação e colocamo-nos à


disposição para maiores informações.

Esse termo terá suas páginas rubricadas pelo pesquisador principal e será assinado
em duas vias, das quais uma ficará com o participante e a outra com o pesquisador
principal. Daniela Emilena Santiago Dias de Oliveira, Rua das Azaleias, 29, Jd
Primavera, Quatá, SP, Cep. 19780-000.

Eu ____________________________________________________________
(nome do participante e número de documento de identidade) confirmo que Insira
neste campo o(s) nome(s) do(s) Pesquisador(es) explicou-me os objetivos desta
pesquisa, bem como, a forma de participação. As alternativas para minha participação
também foram discutidas. Eu li e compreendi este Termo de Consentimento, portanto,
eu concordo em dar meu consentimento para participar como voluntário desta
pesquisa.

Assis, 06 de fevereiro de 2019.

_____________________________

(Assinatura do participante da pesquisa)


Eu,_____________________________________________________________

(nome do membro da equipe que apresentar o TCLE)

obtive de forma apropriada e voluntária o Consentimento Livre e Esclarecido do


participante da pesquisa ou representante legal para a participação na pesquisa.

______________________________________________

(Assinatura do membro da equipe que apresentar o TCLE)

____________________________________________

(Identificação e assinatura do pesquisador responsável)

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