Você está na página 1de 25

07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

Acórdãos TRE Acórdão do Tribunal da Relação de


Évora
Processo: 39/19.2T8RMZ.E1
Relator: JOSÉ ANTÓNIO MOITA
Descritores: ACTIVIDADES PERIGOSAS
RESPONSABILIDADE DO UTILIZADOR
Data do Acordão: 16-12-2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: 1-É de rotular como “perigosa” no âmbito da previsão constante do
artigo 493.º, n.º 2, do Código Civil, não só pela própria natureza tóxica
dos produtos utilizados, como também pela natureza dos meios
empregues na aplicação dos mesmos, a actividade traduzida na
aplicação de fungicidas através de pulverizadores de tractor com
turbina;
2-O mencionado n.º 2 do artigo 493.º do Código Civil contempla ainda
uma presunção legal de culpa (presunção iuris tantum), que não foi
ilidida no caso vertente.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 39/19.2T8RMZ.E1
Comarca de Évora
Juízo de Competência Genérica de Reguengos de Monsaraz
Apelante: Sociedade Agrícola “(…), Lda.”
Apelada: “(…), Lda.”
***
Sumário do Acórdão
(Da exclusiva responsabilidade do relator – artigo 663.º, n.º 7, do CPC)
(…)

*
Acordam os Juízes na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora
no seguinte:
I – RELATÓRIO
(…), Lda., com sede em Reguengos de Monsaraz, intentou a presente
acção declarativa de condenação, com processo comum, contra a
Sociedade Agrícola (…), Lda., com sede em Montoito, Redondo,
peticionando a condenação da Ré no pagamento de uma quantia de €
49.211,76 acrescida de juros moratórios à taxa legal até efectivo e
integral pagamento.
Para tanto alegou, em síntese, que a Ré fez tratamentos fitossanitários
em 2018 numa vinha contígua a um terreno onde a Autora produzia
ervas aromáticas em Modo de Produção Biológico, facto que era do
conhecimento da Ré.
Acrescentou que os tratamentos consistiram na aplicação de produtos
fitofarmacêuticos através de um pulverizador acoplado ao tractor, sem
utilizar bicos de pulverização anti-deriva e sem que a Autora tivesse
sido avisada previamente das pulverizações, esclarecendo que estas
últimas ocorreram quando os ventos sopravam na direcção do seu
terreno, arrastando a nuvem de pulverização para as suas plantações de
tomilho-limão.
Mais adiantou terem sido detectados fungicidas num lote de 200 quilos
www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 1/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

de tomilho-limão colhido após as pulverizações e bem assim que o


cliente estrangeiro com quem tinha celebrado um contrato de compra e
venda de tomilho-limão biológico não quis receber as quantidades
acordadas por recear que as colheitas subsequentes também estivessem
contaminadas com fungicidas.
Disse, por fim, que do valor total do contrato – € 64.500,00 –, faturou
apenas € 25.191,03, significando um prejuízo de € 39.398,70 em lucros
cessantes, tendo ainda acrescido danos no valor de € 4.903,06 € a título
de danos emergentes e € 5.000,00 para compensação dos prejuízos
causados à sua imagem e bom nome.
A Ré contestou a acção, impugnando os factos alegados pela Autora e
defendendo ter cumprido todas as regras de segurança e de boas
práticas aplicáveis aos tratamentos fitossanitários que fez na vinha,
entendendo não estar obrigada a pagar qualquer indemnização à
Autora, cujos prejuízos alegados na petição inicial também impugnou,
terminando a pedir a sua absolvição dos pedidos.
Findos os articulados, elaborou-se despacho saneador com a
enunciação do objecto do litígio e dos temas da prova, e julgou-se a
instância válida e regular.
No mais, foram admitidos os requerimentos de prova e foi designada
data para a audiência final, a que se seguiu a prolação da sentença que
contêm o seguinte dispositivo:
“Pelo exposto, decide o Tribunal julgar a acção parcialmente
procedente e, em consequência:
A – Condenar a Ré Sociedade Agrícola (…), Lda. a pagar à Autora
(…), Lda. a quantia de € 39.308,97 (trinta e nove mil, trezentos e oito
euros e noventa e sete cêntimos) a título de danos patrimoniais,
acrescido de juros de mora à taxa de 4%, contados desde a data da
citação (26/02/2019) até efectivo e integral pagamento;
B – Absolver a Ré Sociedade Agrícola (…), Lda. dos demais pedidos;
C – Condenar a Autora (…), Lda. e a Ré Sociedade Agrícola (…), Lda.
nas custas do processo, na proporção de 20% pela Autora e 80% pela
Ré.
Notifique e registe.”
*
Inconformada, veio a Ré apresentar requerimento de recurso para este
Tribunal da Relação de Évora, alinhando as seguintes conclusões:
“VII- CONCLUSÕES
I. Factos há que o tribunal a quo deu como provados mas cuja prova
existente impõe sentido diverso, alterando a sua redação ou nalguns
casos eliminando-os, assim:
a) A redação do ponto 2 deverá ser alterada, sugerindo-se:
2. Desde 04.10.2018 a Autora está certificada como operador para a
produção biológica de azeitona, alecrim, equinácea, erva do caril, erva
cidreira, erva príncipe, hortelã vulgar, lúcia lima, manjericão,
manjerona, perpétua-roxa, rosmaninho, salvia, segurelha, tomilho bela
luz, tomilho limão, tomilho vulgar e plantas aromáticas e medicinais.
b) Deverá alterar-se a redação do ponto 5, sugerindo-se a seguinte
redação:

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 2/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

5. A Ré desenvolve a sua atividade de viticultura, entre outros, no


prédio rústico, denominado (…), composto por cultura arvense, sito em
Reguengos de Monsaraz, com a área matricial total de 1,625 hectares,
inscrita na matriz predial rústica da freguesia de Reguengos de
Monsaraz sob o artigo (…), Secção (…), e descrito na Conservatória do
Registo Predial de Reguengos de Monsaraz a favor de (…), sócio
gerente da Ré, sob a descrição número (…), apresentando as seguintes
confrontações: do norte com (…); do sul com (…); do nascente com
(…); do poente com Estrada Municipal.
c) Deverá ser alterado o ponto 6, sugerindo redação diversa:
6. O prédio referido no ponto 3 confina a sul com (…), (…) e (…).
d) O tribunal errou ao considerar o factualismo do ponto 7 provado,
impondo-se que o mesmo seja eliminado.
e) Deverá ser eliminada a referência a “modo de produção biológico”
que integra o ponto 8, passando o mesmo a ter a seguinte redação:
8. Em Junho de 2017 a Autora iniciou a plantação das ervas aromáticas.
f) Os pontos 11 e 12 deverão ser eliminados.
g) O ponto 13 deverá ter uma redação diversa, que se sugere:
13. A primeira tela plantada pela A. ficou a uma distância de cerca de 7
metros da primeira carreira de videiras do terreno da Ré.
h) Em consequência, deverá também ser outra a redacção do ponto 14,
que se sugere:
14. A única separação existente entre os dois terrenos em toda a sua
extensão é uma vedação composta por postes de madeira e rede
ovelheira que a Autora implantou no início da sua atividade para a
proteger impedindo a entrada de animais.
i) Os pontos 15 a 20 deverão ser eliminados.
j) Os pontos 22, 23, 25, 26, 29 e 30 deverão ser alterados, sugerindo-se
que tenham outra redação:
22. Em 24 de Abril de 2018, a Ré, por intermédio do aplicador (…), fez
o tratamento fitossanitário da sua vinha, aplicando produtos
fitofarmacêuticos para a prevenção do míldio carreira sim carreira não.
23. Nesse tratamento, a Ré aplicou 0,75 quilos por hectare do produto
com o nome comercial “Vitipec Gold WG”, diluídos num volume de
calda de 400 litros por hectare.
25. Em 22 de Maio de 2018 a Ré, por intermédio do aplicador (…), fez
o tratamento fitossanitário da sua vinha, aplicando produtos
fitofarmacêuticos para a prevenção do míldio e do oídio, carreira sim
carreira não.
26. Nesse tratamento, a Ré aplicou 0,33 quilos por hectare e 40
mililitros dos produtos com os nomes comerciais “Profilux
(BELCHIM)” e “Eminent 125 (ISAGRO)”, respetivamente, diluídos
num volume de calda de 600 litros por hectare”.
29. Em 8 de Junho de 2018 a Ré, por intermédio do aplicador (…), fez
o tratamento fitossanitário da sua vinha, aplicando produtos
fitofarmacêuticos para a prevenção do míldio e do oídio.
30. Nesse tratamento a Ré, por intermédio do aplicador (…), aplicou
0,33 quilos por hectare e 58 mililitros dos produtos com os nomes
comerciais “Sidecar F (ISAGRO)” e “Douro (SAPEC)”,

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 3/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

respectivamente, diluídos num volume de calda de 600 litros por


hectare.
31. O produto “Sidecar F (ISAGRO)” é um fungicida para uso agrícola,
anti-míldio sistémico, composto por benalaxil-M e folpete,
homologado pela DGAV para a cultura da vinha.
32. O produto “Douro (SAPEC)” é um fungicida para uso agrícola,
anti-oídio sistémico à base de penconazol, homologado pela DGAV
para as culturas da vinha, macieira, marmeleiro, pessegueiro, nectarina,
damasqueiro, meloeiro, melancia, abóbora, pepino,
courgette, tomate.
k) Deverá ser diversa a redação dos pontos 33, 34 e 35, que se sugere
passe a ser a seguinte:
34. As aplicações de produtos fitofarmacêuticos foram feitas com um
pulverizador que a R. adquirira recentemente em estado de novo,
rebocado ao trator, com a turbina desligada, percorrendo carreira sim
carreira não da vinha, tendo na última carreira junto ao prédio descrito
em ponto 3 projetado a calda apenas para o interior da sua vinha.
35. Nesse pulverizador a Ré utilizou bicos de pulverização anti-deriva,
adequados a esses tratamentos fitossanitários.
l) Deverão os pontos 36 a 47 ser eliminados.
m) Os pontos 49 a 53 merecem censura devendo, consequentemente,
ser eliminados.
n) Não tendo ficado demonstrado o respetivo factualismo deve o ponto
54 ser eliminado.
o) Quanto ao ponto 55, terá o mesmo que ser devidamente retificado,
sugerindo-se redação que se mostra mais consentânea com a realidade:
55. Em final de 2019, a (…) Portugal, entidade de controlo e
certificação da actividade agrícola em Modo de Produção Biológico da
Autora, suspendeu a certificação da Autora durante um curto período
de tempo não concretamente apurado.
p) Deverá ser eliminado o ponto 56 ou, se assim não se entender, ser
alterada a sua redação, que se sugere:
56. A (…) emitiu desclassificação de produção de tomilho limão em
27.08.2020, estando, em 14.10.2020, apenas a cultura de tomilho limão
desclassificada.
II. Por outro lado, a prova produzida permite verificar que há
factualismo relevante que deverá ser julgado provado, requerendo-se o
seu aditamento:
1) Pelo menos desde 1988 que o prédio descrito no ponto 5 tem
plantada a cultura de vinha em área, localização e orientação idêntica à
que se verifica presentemente.
2) Após a aquisição do prédio descrito no ponto 3 por (…) e (…) foram
cortadas e arrancadas várias oliveiras adultas, de porte elevado e em
bom estado sanitário, espaçadas entre si cerca de 5 metros e que se
situavam na extrema com o prédio descrito em 5.
3) Além da vinha do prédio descrito em 5, existem na região e em
concreto no local muitas outras parcelas de vinha, em torno das largas
centenas.
4) Nas suas parcelas de vinha, incluindo a dos autos, a Ré adota uma

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 4/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

política de proteção fitossanitária preventiva direcionada para uma


prática baseada no modo de produção integrada, sobressaindo a
utilização cuidadosa dos produtos fitofarmacêuticos estritamente
necessários para o combate às doenças, em número e quantidade
reduzida.
5) Produtos fitofarmacêuticos aplicados de modo preventivo pela Ré,
com recurso a equipamento apropriado, calibrado, certificado e com
respeito pelas boas práticas agrícolas, nomeadamente: a aplicação em
conformidade com as condições meteorológicas existentes; a escolha
do produto mais adequado; o cumprimento das condições de aplicação,
nomeadamente doses, concentrações, época, número e intervalo de
tratamentos; preparação de um volume de calda adequado à dimensão
da área a tratar; de modo a impedir o escoamento, projeção e
arrastamento de calda para o solo e para os espaços vizinhos limítrofes.
6) As aplicações de produtos fitossanitários efetuadas pela Ré em 2018
foram realizadas por pessoa com título de autorização de aplicação,
emitido pela Direcção Regional de Agricultura e Pescas do Alentejo.
7) Para a cultura da vinha a R. tem-se apoiado na associação técnica
dos viticultores do Alentejo (ATEVA), de que é associada desde a sua
fundação, nomeadamente, desde 1991 no engenheiro agrónomo (…),
que lhe presta apoio técnico ao nível dos tratamentos fitossanitários,
determinando as datas, os produtos fitofarmacêuticos e as quantidades a
aplicar.
8) Tratamentos fitossanitários que a Ré fez por serem indispensáveis
para o combate às duas principais doenças que anualmente a atingem: o
míldio e o oídio.
9) Em 31.03.2016 a Autora declarou junto do Instituto de
Financiamento da Agricultura e Pescas IP aceitar a decisão de
aprovação e executar a operação referente ao apoio financeiro que lhe
foi concedido no âmbito da operação (…), do programa PDR 2020, na
medida ‘valorização da produção agrícola’, submedida/ação
‘investimento na exploração agrícola’, intervenção ‘investimento na
exploração agrícola’, no valor de € 344.24,56.
10) Do plano financeiro/investimento dessa operação consta, além do
mais, a rúbrica “cerca de arame”, no valor de € 10.525,42, não
reembolsável.
11) Essa “cerca de arame” foi implantada pela A. na estrema entre o
prédio identificado no ponto 3 e o prédio identificado no ponto 5.
12) O benefício económico alcançado pela Ré em 2018 na exploração
do prédio descrito em 5 cifrou-se entre os € 700,00 e os € 1.000,00.
13) As plantas aromáticas, como o tomilho limão, não são
comercializadas apenas se produzidas em modo de produção biológico.
III. Com a instalação da sua atividade no modo de produção biológico,
a Autora não considerou correta e adequadamente as regras específicas
desse modo de produção, nomeadamente quanto à necessidade de aferir
previamente os riscos de contaminação derivados da sua situação
geográfica.
IV. Só quando se verifique o cumprimento das regras aplicáveis ao
modo de produção, o produto, resultado do processo de produção, pode

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 5/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

ser comercializado como biológico, isto é ser “certificado” como


produto biológico.
V. Os produtos que a autora submeteu à apreciação do tribunal –
integrantes da sua causa de pedir – não podiam ter sido considerados
pelo tribunal recorrido como sendo produtos de origem biológica, isto
é, produzidos em modo biológico, nem como tal legitimadores da
pretensão da Autora.
VI. O Decreto-lei n.º 256/2009, de 24 de setembro, fixou o regime das
normas técnicas aplicáveis ao modo de produção biológico.
VII. Nos termos da alínea d) do seu artigo 2.º, designa-se modo de
produção biológico “a utilização do modo de produção conforme as
regras estabelecidas no Regulamento (CE) n.º 834/2007, do Conselho,
de 28 de junho, e sua regulamentação”.
VIII. Sendo competência da Direção-Geral de Agricultura e
Desenvolvimento Rural (DGADR) – em articulação com a Direção-
Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) – estabelecer as normas
técnicas necessárias a esse modo de produção biológico – cfr. artigo 3.º,
n.º 1.
IX. Nos termos do artigo 10.º, n.º 1, o modo de produção biológico
rege-se pelo disposto:
“a) no Regulamento (CE) n.º 834/2007, do Conselho, de 28 de junho;
b) no Regulamento (CE) n.º 889/2008, da Comissão, de 5 de setembro;
c) nas regras nacionais de execução complementares.
X. A Lei número 26/2013, de 11 de Abril regula a atividade de
aplicação de produtos fitofarmacêuticos para uso profissional, que a Ré
cumpriu.
XI. O Regulamento (CE) n.º 834/2007 do Conselho, de 28 de Junho de
2007, relativo à produção biológica e à rotulagem dos produtos
biológicos, estabelece os objetivos e princípios sobre os quais assenta a
agricultura praticada em modo de produção biológico.
XII. Se é certo que a Autora tomou uma medida de precaução para
impedir o acesso às suas culturas de pessoas estranhas e de animais, o
que fez implantando uma vedação composta por paus e arame na
extrema do prédio, nada fez quanto à adoção de medidas de precaução
para impedir contaminações por produtos fitofarmacêuticos, a que
estava legalmente adstrita – cfr. legislação aplicável ao modo de
produção biológico.
XIII. O Regulamento (CE) n.º 1107/2009 do Parlamento Europeu e do
Conselho, de 21 de Outubro de 2009, estabelece as regras aplicáveis à
autorização dos produtos fitofarmacêuticos sob forma comercial, bem
como à sua colocação no mercado, utilização e controlo, que a Ré
respeitou.
XIV. O laboratório independente que alegadamente efetuou as análises
dos autos não está habilitado pela DGADR.
XV. A pretensão indemnizatória da Autora situa-se no âmbito da
responsabilidade civil extra-contratual, tendo-a a douta sentença
recorrida enquadrado na cláusula geral do artigo 483.º do Código Civil,
fundamentando a procedência da ação na errada verificação dos
respetivos requisitos.

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 6/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

XVI. Acrescendo que o n.º 2 do artigo 493.º do Código Civil estabelece


uma presunção legal de culpa (presunção iuris tantum) por parte de
quem causar danos a outrem no exercício de uma actividade perigosa,
assim tendo considerado a actividade da Ré, raciocínio de que se
discorda.
XVII. Dos autos decorre a falta de verificação desses requisitos,
nomeadamente do facto ilícito, da culpa, do dano e de um nexo de
causalidade.
XVIII. Ora, são pressupostos indispensáveis da obrigação de
indemnização, o facto ilícito ligado à conduta da Ré por nexo de
imputação subjectiva (a culpa) e a existência de danos causados
adequadamente por esse mesmo facto – artigo 483.º e seguintes do
Código Civil.
XIX. Como regra geral, incumbe ao lesado a prova da culpa do autor
da lesão, salvo havendo presunção legal de culpa – artigo 487.º, n.º 1,
do Código Civil.
XX. Havendo uma presunção legal, a prova do facto que serve de base
à presunção equivale a provar o facto presumido – artigo 344.º, n.º 1 e
350.º, n.º 1, do Código Civil –, pelo que, desde que o lesado alegue e
prove que os danos foram causados no exercício de uma actividade
perigosa, a lei presume, a partir desse facto, que o dano foi devido a
culpa do agente.
XXI. O n.º 2 do artigo 493.º determinar a inversão do ónus da prova
(artigo 344.º, n.º 1, do Código Civil).
XXII. Não define a lei conceitualmente em que consiste a atividade
perigosa, admitindo-se apenas genericamente que a perigosidade derive
da própria natureza da atividade ou da natureza dos meios utilizados, e
assim, só casuisticamente, em face das circunstâncias concretas, se
poderá aquilatar do carácter perigoso do facto lesivo.
XXIII. Por isso mesmo, a qualificação de uma atividade perigosa, para
efeitos do n.º 2 do
artigo 493.º do Código Civil, não se compadece com uma construção
apriorística, emergindo antes do facto concreto, como elemento da
própria compreensão do direito.
XXIV. Nesta perspetiva, as concretas aplicações efetuadas pela Ré de
produtos fitofarmacêuticos, de baixa toxicidade, através de
pulverizador com a turbina desligada e bicos de pulverização anti
deriva não consubstanciam uma atividade perigosa, sendo por isso
inaplicável a norma do artigo 493.º, n.º 2, do Código Civil.
XXV. Porém, uma coisa é a culpa, outra o nexo de causalidade
adequada entre o facto e o dano, como pressuposto autónomo do direito
da responsabilidade civil, situado a montante daquele.
XXVI. A lei civil – cfr. artigo 563.º do Código Civil – adotou a teoria
da causalidade adequada, ao estabelecer que a obrigação de
indemnização só existe em relação aos danos que o lesado
provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão.
XXVII. Assim, para que um facto seja causa de um dano é necessário,
antes de mais, que,
no plano naturalístico, ele seja condição sem o qual o dano não se teria

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 7/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

verificado e depois que, em abstrato ou em geral, seja causa adequada


do mesmo (nexo de adequação).
XXVIII. O nexo de causalidade entre o facto e o dano coloca, portanto,
uma questão que
constitui matéria de facto, a de estabelecer a realidade do evento
naturalístico que foi condição do dano, e uma questão de direito, a da
demonstração da adequação desse evento, em abstrato ou em geral, a
causar o dano.
XXIX. Sempre competiria à Autora a prova do facto, bem como do
dano e por último do nexo de causalidade, como elementos
constitutivos do seu direito – artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil –, não
lhe incumbido já a demonstração da culpabilidade, mas somente se se
entender que esta se mostrava presumida – n.º 2 do artigo 493.º do
Código Civil – o que não se concebe.
XXX. Assim, mesmo que porventura se considere que à situação é
aplicável a norma do artigo 493.º, n.º 2, do Código Civil, tal como
entendeu o MM Juiz, é incontestável que a imputação objetiva constitui
um facto constitutivo do direito à indemnização.
XXXI. Daí que, no que respeita à prova do requisito da imputação da
autoria dos factos
à Ré, tal ónus pertencia à Autora, como pressuposto autónomo do dever
de indemnizar e facto constitutivo do direito que se arroga, nos termos
do artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil.
XXXII. Pois bem, não logrou a Autora provar o facto ilícito ligado à
conduta da Ré, nem
a existência de danos causados adequadamente por esse mesmo facto,
já que não demonstrou que a Ré tivesse aplicado incorretamente
produtos fitofarmacêuticos, e por outro, que as suas culturas tivessem
sido contaminadas devido à aplicação de produtos fitofarmacêuticos
pela Ré.
XXXIII. Entendendo-se diversamente, sempre se dirá que, nos termos
do disposto no n.º
1 do artigo 570.º, “quando um facto culposo do lesado tiver concorrido
para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao tribunal
determinar, com base na gravidade das culpas
de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a
indemnização deve ser
totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída”.
XXXIV. Impendendo sobre a Autora um “dever de precaução”, que em
respeito pelas regras previstas para o modo de produção biológico a
levavam a ter que adotar um comportamento diferente do
comportamento que adotou, contribuiu decisiva e determinantemente
para a ocorrência do dano, que presumivelmente não ocorreria se a
Autora tivesse respeitado as normas fixadas para o concreto modo de
produção agrícola.
XXXV. Essa atuação da Autora seria bastante para, caso se sufragasse o
raciocínio do tribunal na parte em que entendeu basear a
responsabilidade da Ré numa simples presunção de culpa por aplicação
do artigo 493.º, excluir o dever de indemnizar da Ré – ex vi do artigo

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 8/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

570.º do Código Civil.


XXXVI. Sem condescender, mas por dever de patrocínio, mesmo que
se entenda que os
requisitos que integram a responsabilidade civil extracontratual se
mostram preenchidos, ainda assim, a responsabilidade da Ré funda-se
na mera culpa e não no dolo, pelo que a indemnização sempre terá que
ser fixada “equitativamente, em montante inferior ao que
corresponderia aos danos causados” – ex vi do artigo 494.º.
XXXVII. Porque a sentença recorrida violou as normas legais
indicadas nas conclusões do recurso, deverá ser julgado procedente o
recurso.”

*
A Autora apresentou resposta ao requerimento de recurso, concluindo
do seguinte modo:
“VI - CONCLUSÕES
A) Todas as alterações que a recorrente pretende que sejam feitas à
matéria de facto dada como provada pela sentença recorrida não têm
fundamento.
B) A sentença apelada fez correta e fundamentada apreciação da prova
produzida e deve ser quanto a essa matéria inteiramente confirmada.
C) Verificam-se no caso todos os requisitos da responsabilidade civil
exigidos pelo artigo 483.º do Código Civil: o facto ilícito, a culpa do
seu autor, o nexo de causalidade, a violação do direito do lesado, e os
danos resultantes dessa violação.
Com efeito,
D) A Ré fez, no seu terreno, pulverizações de produtos
fitofarmacêuticos sem tomar os cuidados necessários para impedir que
os produtos pulverizados, por arrastamento ou deriva, atingissem as
plantações existentes no terreno da A., danificando essas plantações.
E) Tal procedimento da Ré é ilícito, por violar as disposições legais do
Regulamento (CE) n.º 1107/2009 do Parlamento Europeu e do
Conselho, de 21 de Outubro de 2009, relativo à colocação dos produtos
fitofarmacêuticos no mercado, da Lei n.º 26/2013, de 11 de Abril, com
as alterações do Decreto-Lei n.º 35/2017, de 24 de Março, que regula as
atividades de distribuição, venda e aplicação de produtos
fitofarmacêuticos para uso profissional.
F) Esse procedimento é culposo porque a Ré podia e devia ter dado
cumprimento às referidas disposições legais.
G) Existe pois manifesto nexo de causalidade entre o procedimento da
Ré e a danificação das plantações da Autora.
H) Dessa danificação resultou que ao contrato de compra e venda de
produtos produzidos celebrado pela Autora, foi posto termo pela outra
parte contratante por motivo da contaminação desses produtos, pelas
pulverizações efectuadas pela Ré.
I) Está, pois, a Ré obrigada a indemnizar a Autora dos prejuízos
resultantes da cessação do contrato de fornecimento por motivo das
referidas pulverizações, conforme decidiu a douta sentença.
J) Acresce, que a pulverização de produtos fitofarmacêuticos é uma
atividade perigosa pela natureza dos meios utilizados, pelo que, nos
www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 9/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

termos do n.º 2 do artigo 493.º do Código Civil, a Ré sempre seria


obrigada a reparar os danos resultantes das pulverizações que efectuou,
dado que não provou ter tomado todas as providencias exigidas pelas
circunstâncias para os prevenir.
K) Improcedem todas as conclusões das alegações da Ré, pelo que deve
ser negado provimento ao recurso, como se espera e é de Justiça.
Julgando de harmonia com estas conclusões e, consequentemente,
negando provimento ao recurso, Vossas Excelências farão JUSTIÇA.”
*
O recurso foi admitido na 1ª Instância como apelação, a subir de
imediato, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
*
O recurso é o próprio e foi adequadamente recebido quanto ao modo de
subida e ao efeito fixado.
*
Colheram-se os Vistos pelo que cumpre, agora, decidir.
*
II – OBJECTO DO RECURSO
Nos termos do disposto no artigo 635.º, n.º 4, conjugado com o artigo
639.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil, o objecto do recurso é
delimitado pelas conclusões do recurso, salvo no que respeita à
indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas ao caso
concreto e quando se trate de matérias de conhecimento oficioso que,
no âmbito de recurso interposto pela parte vencida, possam ser
decididas com base em elementos constantes do processo, pelo que as
questões a apreciar e decidir traduzem-se objectivamente no seguinte:
1- Impugnação da decisão relativa à matéria de facto;
2 - Reapreciação de mérito, centrada na verificação dos pressupostos
legais da responsabilidade civil extracontratual e cômputo do dano
patrimonial verificado.
*
III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Decorre da sentença recorrida a seguinte matéria de facto:
A) Factos Provados:
1. A Autora “(…), Lda.” dedica-se à actividade de produção e
comercialização de plantas aromáticas e medicinais, bem como de
produtos hortícolas e frutícolas; cultura e comercialização de azeitona,
entre outras.
2. Desde 2018 que a Autora está classificada pela Direcção Geral de
Agricultura e Desenvolvimento Rural como operador em modo de
produção biológico.
3. A Autora desenvolve a sua actividade no prédio misto, denominado
(…), composto por olival, cultura arvense, armazém destinado a
actividade industrial e edifício destinado a habitação, sito em
Reguengos de Monsaraz, com a área matricial total de 11,1037
hectares, encontrando-se a parte rústica inscrita na matriz predial da
freguesia de Reguengos de Monsaraz sob o artigo (…), Secção (…), e a
parte urbana inscrita na matriz predial da freguesia de Reguengos de
Monsaraz sob o artigo (…), e descrito na Conservatória do Registo

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 10/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

Predial de Reguengos de Monsaraz a favor de (…), sócio gerente da


Autora, sob a descrição n.º (…), apresentando as seguintes
confrontações: do norte com (…), (…) e (…); do sul com (…), (…) e
(…); do nascente com Herdade da (…); do poente com Ribeira da (…).
4. A Ré “Sociedade Agrícola (…), Lda.” dedica-se à actividade de
olivicultura, viticultura, criação de gado, prestação de serviços
agrícolas, cerealicultura, cinegética, turismo rural, venda de pastagens.
5. A Ré desenvolve a sua actividade no prédio rústico, denominado
(...), composto por cultura arvense, sito em Reguengos de Monsaraz,
com a área matricial total de 1,625 hectares, inscrita na matriz predial
rústica da freguesia de Reguengos de Monsaraz sob o artigo (…),
Secção (…), e descrito na Conservatória do Registo Predial de
Reguengos de Monsaraz a favor de (…), sócio gerente da Ré, sob a
descrição número (…), apresentando as seguintes confrontações: do
norte com (…); do sul com (…); do nascente com (…) da (…); do
poente com Estrada Municipal.
6. O prédio referido no ponto 3 confina a Sul com o prédio referido no
ponto 5, em toda a sua extensão.
7. Em data não concretamente apurada do ano de 2015, os legais
representantes da Autora, (…) e (…), comunicaram ao legal
representante da Ré, (…), e ao seu filho (…), que estavam a
desenvolver um projecto de exploração agrícola no terreno identificado
no ponto 3, dirigido para a produção e comercialização de ervas
aromáticas e exploração de olival em Modo de Produção Biológico.
8. Em Junho de 2017 a Autora iniciou a plantação das ervas aromáticas
em Modo de Produção Biológico.
9. Nessa altura, o terreno explorado pela Ré era composto por vinha.
10. As carreiras de videiras estão alinhadas na horizontal,
paralelamente à estrema com o terreno da Autora.
11. A Autora plantou as ervas aromáticas por sectores: os sectores 1, 2,
5, 6, e 7 eram de tomilho-limão; o sector 3 era de equinácea; o sector 4
estava destinado para tomilho bela-luz (plantado após o primeiro
semestre de 2018); e o sector 8 estava destinado a tomilho-limão
(plantado após o primeiro semestre de 2018).
12. Os sectores 1 e 2 de tomilho-limão são contíguos à vinha da Ré.
13. A primeira tela de tomilho-limão plantada nos sectores 1 e 2 ficou a
uma distância de cerca de 7 metros da primeira carreira de videiras do
terreno da Ré.
14. A única separação existente entre os dois terrenos em toda a sua
extensão é uma vedação composta por postes de madeira e rede
ovelheira destinada a impedir a entrada de animais.
15. Em data não concretamente apurada do primeiro semestre do ano
de 2018, a Autora celebrou um contrato de compra e venda com uma
empresa alemã obrigando-se a produzir e a entregar as seguintes
quantidades de ervas aromáticas:
- 2000 quilos de tomilho-limão biológico pelo preço de 13,00 €/quilo;
- 2000 quilos de tomilho-limão biológico pelo preço de 11,00 €/quilo;
- 1500 quilos de tomilho-limão biológico pelo preço de 11,00 €/quilo.
16. O preço total acordado foi de € 64.500,00.

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 11/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

17. Mais acordaram que a entrega das ervas seria feita de forma faseada
ao longo do período de um ano.
18. Os custos com a expedição das ervas ficavam a cargo do
comprador.
19. O preço seria pago no valor correspondente à quantidade de ervas
recebida pelo comprador em cada expedição.
20. O pagamento do preço ficava dependente do resultado de análises
laboratoriais a amostras recolhidas de cada lote de ervas enviado,
comprovando a ausência de resíduos de produtos fitofarmacêuticos na
sua composição química.
21. A Autora tinha certificado válido para o exercício da actividade em
Modo de Produção Biológico para o período de 04/10/2018 a
30/06/2019.
22. Em 24 de Abril de 2018, a Ré fez o tratamento fitossanitário da sua
vinha, aplicando produtos fitofarmacêuticos para a prevenção do
míldio.
23. Neste tratamento, a Ré aplicou o produto com o nome comercial
“Vitipec Gold WG”.
24. O produto “Vitipec Gold WG” é um fungicida anti-míldio
sistémico, composto por folpete (grupo das ftalimidas), cimoxanil, e
fosetil-alumínio. 25. Em 22 de Maio de 2018, a Ré fez o tratamento
fitossanitário da sua vinha, aplicando produtos fitofarmacêuticos para a
prevenção do míldio e do oídio.
26. Neste tratamento, a Ré aplicou os produtos com os nomes
comerciais “Profilux (BELCHIM)” e “Eminent F (ISAGRO)”.
27. O produto “Profilux (BELCHIM)” é um fungicida anti-míldio,
composto por cimoxanil e mancozebe.
28. O produto “Eminent F (ISAGRO)” é um fungicida anti-oídio
sistémico, composto por tetraconazol.
29. Em 8 de Junho de 2018, a Ré fez o tratamento fitossanitário da sua
vinha, aplicando produtos fitofarmacêuticos para a prevenção do míldio
e do oídio.
30. Neste tratamento, a Ré aplicou os produtos com os nomes
comerciais “Sidecar F (ISAGRO)” e “Douro (SAPEC)”.
31. O produto “Sidecar F (ISAGRO)” é um fungicida anti-míldio
sistémico, do grupo das fenilamidas, composto por benalaxil-M e
folpete.
32. O produto “Douro (SAPEC)” é um fungicida anti-oídio sistémico à
base de penconazol.
33. A Ré aplicou os produtos fitofarmacêuticos acima referidos através
de pulverizadores de tractor com turbina.
34. A pulverização foi feita com a turbina ligada.
35. Os bicos de pulverização utilizados não eram adequados a evitar a
deriva da nuvem de pulverização que se formava com os jactos da
calda. 36. A Ré iniciava a pulverização pela primeira carreira de
videiras situada mais a norte da vinha (a mais próxima do terreno da
Autora) até terminar na carreira mais a sul (a mais afastada do terreno
da Autora).
37. Os ventos que sopravam de sul, sudeste, e sudoeste arrastavam a

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 12/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

nuvem de pulverização para as plantações de tomilho-limão nos


sectores 1 e 2 do terreno da Autora.
38. A Ré nunca avisou previamente a Autora de quando ia fazer as
pulverizações.
39. Após as primeiras pulverizações, os legais representantes da Autora
alertaram o legal representante da Ré e o seu filho para o risco de
contaminação das suas plantações em modo biológico causada pela
deriva da pulverização da vinha, exortando-os a observarem certos
cuidados para reduzir o risco de deriva, tais como a velocidade e a
direcção do vento, a utilização de bicos de pulverização anti-deriva, e
porventura a utilização de fitofármacos com menor toxicidade.
40. Nesse sentido, também requereram uma reunião com o técnico da
ATEVA – Associação Técnica dos Viticultores do Alentejo que
prestava assistência técnica à Ré na utilização, preparação, e aplicação
dos produtos fitofarmacêuticos.
41. Na pulverização do dia 08 de Junho de 2018 (v. pontos 29 a 32), a
Ré começou a pulverizar a vinha pelas 15:40 horas, a partir da carreira
de videiras mais próxima do terreno da Autora.
42. Pelas 15:42 horas, o tractor encontrava-se a pulverizar as videiras
próximas das plantações de tomilho-limão dos sectores 1 e 2 do terreno
da Autora.
43. A turbina estava ligada e os jactos da calda que saíam dos bicos
pulverizadores formavam uma nuvem de pulverização que se elevava
acima da altura das videiras.
44. A essa hora o vento soprava de sudoeste a uma velocidade de 16
km/hora.
45. O vento empurrou a nuvem de pulverização na direcção das
plantações de tomilho-limão da Autora nos sectores 1 e 2.
46. O tomilho-limão plantado nesses sectores 1 e 2 foi colhido no
Verão de 2018.
47. E foi expedido para o cliente alemão em Outubro de 2018 no
âmbito da execução do contrato referido nos pontos 15 a 20.
48. O cliente não aceitou um lote de 200 quilos de tomilho-limão por
conter resíduos de pesticidas em medida superior ao legalmente
permitido em agricultura biológica.
49. Com efeito, nas análises laboratoriais efectuadas em Novembro de
2018 a uma amostra desse lote detectaram-se os seguintes fungicidas:
- Tetrahidroftalimidas (THPI): 0,012 mg/kg;
- Captana/THPI, total: 0,023 mg/kg;
- Folpete: 0,017 mg/kg;
- Ftalimidas: 0,055 mg/kg;
- Folpete/Ftalimidas, total: 0,13 mg/kg;
- Metalaxil/Metalaxil-M: 0,062 mg/kg.
50. O lote de 200 quilos de tomilho-limão com resíduos de fungicidas
não foi facturado nem pago à Autora.
51. O lote em causa foi colhido nos sectores 1 e 2 da plantação da
Autora.
52. A Autora explicou ao seu cliente alemão que a contaminação do
tomilho-limão com pesticidas tinha sido causada pelo tratamento

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 13/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

fitossanitário que o vizinho tinha feito na vinha sem acautelar os


perigos de deriva da pulverização.
53. Até ao termo da duração do contrato, o comprador não quis mais
receber tomilho-limão da Autora por recear que as colheitas
subsequentes também estariam contaminadas com fungicidas.
54. Do valor total do contrato celebrado em 2018 com a empresa
alemã, a Autora só facturou o valor de € 25.191,03.
55. Devido à contaminação verificada, a (…) Portugal, entidade
certificadora da actividade agrícola em Modo de Produção Biológico,
suspendeu a certificação da Autora durante os meses de Novembro e
Dezembro de 2019.
56. Em Agosto de 2020 foi retirada a certificação à Autora de produtor
em modo biológico.
*
B) Factos Não Provados
Com interesse para a presente causa, não se provou que:
1. Que o preço do lote de tomilho-limão não aceite pelo cliente alemão
por resíduos de fungicidas fosse de € 2.451,08.
2. Que a colheita de Outono de tomilho-limão não tivesse sido
comercializada.
3. Que a conduta da Ré tivesse atentado contra a imagem e o bom
nome da Autora.
*
IV- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Iniciemos este segmento com a análise da primeira questão definida no
objecto do recurso em 1.
A Apelante pretende que se proceda a alterações à matéria de facto
considerada como provada na sentença recorrida, entendendo a
Apelada que nenhuma delas tem fundamento.
Resulta do artigo 640.º do CPC, que se debruça sobre o ónus a cargo do
recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, o
seguinte:
“1-Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o
recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente
julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de
registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os
pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões
de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b), do número anterior, observa-se o
seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro
na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao
recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva
parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se
funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos
excertos que considere relevantes;

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 14/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal,


incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as
conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados,
indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda e
proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere
importantes.
[…]”.
A este propósito sustenta o Conselheiro António Abrantes Geraldes
(“Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª ed., a
páginas 168-169), que a rejeição total ou parcial respeitante à
impugnação da decisão da matéria de facto deve ser feita nas seguintes
situações:
“a) Falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de
facto (artigos 635.º, n.º 4 e 641.º, n.º 2, alínea b));
b) Falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto
que o recorrente considera incorretamente julgados (artigo 640.º, n.º 1,
alínea a));
c) Falta de especificação, na motivação, dos concretos meios
probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g.
documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.);
d) Falta de indicação exata, na motivação, das passagens da gravação
em que o recorrente se funda;
e) Falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado
pretendido relativamente a cada segmento da impugnação,
“esclarecendo, ainda, que a apreciação do cumprimento de qualquer
uma das exigências legais quanto ao ónus de prova prevenidas no
mencionado n.º 1 e 2, alínea a), do artigo 640.º do CPC, deve ser feita
“à luz de um critério de rigor”.
A Apelante ataca a quase totalidade da matéria de facto descriminada
na sentença recorrida sendo que, como veremos infra, não o logrou
fazer em cumprimento dos requisitos legais constantes do artigo 640.º
do CPC, acima transcritos.
Com efeito, do exposto na motivação e conclusões recursivas, verifica-
se que relativamente aos factos que integram o subsegmento dos factos
provados constante do segmento dedicado à “Fundamentação de Facto”
da sentença recorrida, vertidos sob os pontos 2, 5, 6, 8, 13, 14, 22, 23,
25, 26, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 55 e 56, a Apelante limita-se a sugerir
alterações na redacção dos ditos factos, não colocando expressamente
em causa, como teria que ter feito, a incorrecção do julgamento feito
quanto a eles pelo Tribunal a quo.
Por outras palavras, percebendo-se que a Apelante entende
relativamente aos censurados pontos de facto da sentença recorrida
acima identificados, cuja redacção apenas sugere seja alterada, que o
Tribunal a quo considerou como provados factos que de acordo com a
prova produzida impunham “sentido diverso” e bem assim que não
incluiu noutros pontos factos que teriam resultado provados de acordo
com a prova produzida, impunha-se-lhe que na decisão indicada ao
Tribunal de recurso sobre tais questões não se limitasse apenas a
apresentar uma sugestão de alteração quanto à redacção de cada ponto

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 15/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

de facto censurado considerado como provado na sentença recorrida,


mas antes que especificasse relativamente a cada um daqueles pontos
de factos impugnados acima identificados quer a decisão respeitante ao
facto considerado por si como provado, quer a decisão atinente ao facto
considerado por si como não provado, a ser incluído, este último, no
subsegmento dos factos considerados como não provados da sentença
recorrida.
Ao não ter procedido desse modo a Apelante não cumpriu devidamente
e com o necessário rigor o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 640.º
do CPC, impondo-se a rejeição da impugnação no tocante aos pontos
de facto identificados.
Na motivação e conclusões recursivas verifica-se que a Apelante pugna
pela eliminação dos pontos de facto considerados como provados na
sentença recorrida vertidos sob os n.ºs 7, 11, 12, 15 a 20, 36 a 47 e 49 a
54.
Embora o diga expressamente nas conclusões recursivas apenas
quantos aos pontos de facto n.ºs 7 e 54, certo é que se percebe do
segmento motivatório que a Apelante pugna pela dita eliminação de
todos os pontos mencionados no parágrafo anterior por em seu entender
não terem os factos constantes dos identificados pontos resultado
demonstrados.
Ora também aqui se verifica que a Apelante não cumpriu devidamente
o ónus de impugnação especificada previsto na alínea c) do n.º 1 do
artigo 640.º do CPC, na medida em que estando em causa factos
considerados como provados na sentença recorrida a eventual
incorrecção de julgamento feito pelo Tribunal recorrido quanto a eles
exigia não a pura e simples eliminação dos mesmos do subsegmento
dos factos considerados como provados, mas também a especificação
da decisão atinente a eles a reconduzir ao subsegmento dos factos
considerados como não provados da sentença recorrida.
Não tendo essa especificação sido apresentada impõe-se rejeitar,
também quanto aos pontos de facto em apreço, a impugnação da
decisão relativa à matéria de facto.
Nas conclusões recursivas da Apelante verifica-se ainda que a mesma
entende existirem factos que deveriam ter sido considerados como
provados, que especifica nos seguintes 13 pontos de facto (!), que ora
passamos a transcrever:
“1 – Pelo menos desde 1988 que o prédio descrito no ponto 5 tem
plantada a cultura de vinha em área, localização e orientação idêntica à
que se verifica presentemente.
2 – Após a aquisição do prédio descrito no ponto 3 por (…) e (…),
foram cortadas e arrancadas várias oliveiras adultas, de porte elevado e
em bom estado sanitário, espaçadas entre si cerca de 5 metros e que se
situavam na extrema com o prédio descrito em 5.
3 – Em 2017-08-04 a Autora efectuou a “notificação n.º 1” das
“notificações (…) – Produtores” junto da Direção-Geral de Agricultura
e Desenvolvimento Rural, tendo declarado que o seu organismo de
controlo é a “(…) Portugal”, de acordo com o contrato que assinou em
6/07/2017 e que esta entidade lhe efetuou o “1º controlo” em

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 16/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

04/08/2017”.
4 – Além de na vinha do prédio descrito supra em 5, existem na região
e em concreto no local muitas outras parcelas de vinha, em torno das
largas centenas.
5 – Nas suas parcelas de vinha, incluindo a dos autos, a Ré adota uma
política de proteção fitossanitária preventiva direcionada para uma
prática baseada no modo de produção integrada, sobressaindo a
utilização cuidadosa de produtos fitofarmacêuticos estritamente
necessários para o combate às doenças, em número e quantidade
reduzida.
6 – Produtos fitofarmacêuticos aplicados de modo preventivo pela Ré,
com recurso a equipamento apropriado, calibrado, certificado e com
respeito pelas boas práticas agrícolas nomeadamente: a aplicação em
conformidade com as condições meteorológicas existentes; a escolha
do produto mais adequado; o cumprimento das condições de aplicação-
doses, concentrações, época, número e intervalo de tratamentos;
preparação de um volume de calda adequado à dimensão da área a
tratar; de modo a impedir o escoamento, projeção e arrastamento de
calda para o solo e para os espaços vizinhos limítrofes.
7 – As aplicações de produtos fitossanitários efetuadas pela Ré em
2018 foram realizadas por pessoa com título de autorização de
aplicação, emitido pela Direção-Regional de Agricultura e Pescas do
Alentejo.
8 – Para a cultura da vinha a Ré tem-se apoiado na associação técnica
dos viticultores do Alentejo (ATEVA), de que é associada desde a sua
fundação, nomeadamente desde 1991 no engenheiro agrónomo (…),
que lhe presta apoio técnico ao nível dos tratamentos fitossanitários,
determinando as datas, produtos fitofarmacêuticos e quantidades a
aplicar.
9 – Tratamentos fitossanitários que a Ré fez por serem indispensáveis
para o combate às duas principais doenças que anualmente a atingem: o
míldio e o oídio.
10 – Em 31.03.2016 a Autora declarou junto do Instituto de
Financiamento da Agricultura e Pescas, IP, aceitar a decisão de
aprovação e executar a operação referente ao apoio financeiro que lhe
foi concedido no âmbito da operação (…), do programa PDR 2020, na
medida da ‘valorização da produção agrícola’, submedida/ação
‘investimento na exploração agrícola’, intervenção “investimento na
exploração agrícola”, no valor de € 344,824.56.
11 – Do plano financeiro/investimento dessa operação consta, além do
mais a rubrica “cerca de arame”, no valor de € 10.525,42, não
reembolsável.
12 – Essa “cerca de arame” foi implantada pela A. na estrema entre o
prédio identificado supra no ponto 3 e o prédio identificado supra no
ponto 5.
13 – O benefício económico alcançado pela Ré em 2018 na exploração
do prédio descrito supra em 5, cifrou-se entre os € 700,00 e os €
1.000,00”.
Desde já impõe-se dizer que não tendo o conteúdo de qualquer um dos

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 17/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

pontos de facto ora pretendidos alterar sido julgado pelo Tribunal


recorrido como não provado não pode considerar-se tal matéria ao
abrigo da impugnação da decisão relativa à matéria de facto, visto que,
como já sabemos, o artigo 640.º do Código de Processo Civil, atinente
ao ónus a cargo do Recorrente, exige a especificação dos concretos
pontos de facto “incorretamente julgados”.
Como tal, o pretendido aditamento da matéria só poderá ser
equacionado no âmbito da ampliação da matéria de facto, nos termos
previstos no artigo 662.º, n.º 2, alínea c), parte final, do Código de
Processo Civil.
Sem embargo, diga-se, todavia, que o conteúdo dos pontos 4, 6 e 8 se
traduz eminentemente em juízos valorativos e conclusivos sobre factos
concretos e naturalísticos, não revelando propriamente, na sua essência,
factos deste último jaez, razão pela qual carece de fundamento o
pretendido aditamento no tocante a eles.
Com efeito, no ponto 4 deparamos com expressões patentemente
conclusivas tais como “política de proteção fitossanitária preventiva”,
“produção integrada”, “utilização cuidadosa”, “estritamente
necessários” e “quantidade reduzida”.
No ponto 6 a Apelante utiliza outra expressão valorativa/conclusiva
como “pessoa com título de autorização de aplicação”.
Já no ponto 8 menciona-se mais uma expressão conclusiva, qual seja
“serem indispensáveis”, sendo certo ainda que da leitura dos factos
considerados como provados vertidos sob os pontos 22, 25 e 29, resulta
assente o tratamento fitossanitário por parte da Apelante da sua vinha
para prevenção do míldio e do oídio em três datas distintas.
Por sua vez, da análise dos articulados endereçados aos autos
percebemos que os factos pretendidos aditar ao subsegmento dos factos
considerados como provados na sentença recorrida identificados sob os
pontos 9, 10, 11, 12 e 13 não foram expressamente alegados por
qualquer das partes pelo que também quanto a eles carece de
fundamento o pretendido.
Já quanto à matéria factual vertida nos pontos 1, 2, 3 e 7, alegada pela
Ré, ora Apelante, nos artigos 8º, 10º, 12º e 28º, respectivamente, da sua
contestação, resulta manifesto em face do objecto da causa de pedir e
do peticionado na acção não revestir interesse para a boa decisão da
causa não tendo, como tal, sido (e bem), encaminhada para o
subsegmento dos factos provados, ou dos não provados, da sentença
recorrida.
Por fim, no tocante à matéria vertida no ponto 5, alegada pela Apelante
no artigo 25º da sua contestação, impõe-se dizer que para além de ser
invocada num contexto generalista, ou seja sem qualquer concretização
temporal mormente no tocante às datas trazidas à colação na presente
causa, acaba por ser, no essencial, contrariada pela matéria que foi dada
como provada vertida designadamente nos pontos 22 a 37, 41 a 45 e 49
do subsegmento da sentença recorrida destinado aos factos provados.
Pelo exposto, é de considerar improcedente na totalidade o pretendido
aditamento de matéria de facto ao acervo dos factos considerados como
provados na sentença recorrida.

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 18/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

Destarte, mantém-se inalterada a matéria de facto considerada como


provada e como não provada na sentença recorrida.

2 – Reapreciação de mérito
Segue-se a abordagem da segunda e última questão objecto do recurso
atinente à reapreciação de mérito.
Do acervo das conclusões recursivas delineadas pela Apelante decorre
que a mesma entende que não se provaram factos suficientes para
considerar verificados os pressupostos legais da responsabilidade civil
extracontratual por factos ilícitos, sustentando, ainda, não ter incorrido
no exercício de uma actividade perigosa não sendo, como tal, correcto
presumir que os danos sofridos pela Apelada foram causados por tal
actividade, mais argumentando que sempre seria de considerar in casu
uma situação de concorrência de culpas, por virtude de a Apelada ter
desrespeitado o “dever de precaução” que sobre si impendia decorrente
das regras previstas para o modo de produção biológico, terminando a
sustentar que ainda que se mostrem preenchidos os requisitos
integrantes da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos
sempre será de fundar a sua responsabilidade na mera culpa e não no
dolo fixando-se a indemnização à Apelada equitativamente em
montante inferior ao correspondente aos danos causados.
Por seu turno, entende a Apelada, na sua resposta ao recurso, que se
mostram preenchidos todos os requisitos atinentes à responsabilidade
civil extracontratual por facto ilícito decorrente do exercício de
actividade perigosa pela natureza dos meios utilizados, devendo
improceder todas as conclusões recursivas da Apelante.
O argumentário apresentado pela Apelante assenta em boa medida nas
alterações por si pretendidas à matéria de facto considerada como
provada na sentença recorrida, as quais, a procederem, conduziriam, no
seu entendimento, a uma solução jurídica da questão atinente à sua
responsabilização por danos causados à Apelada, pela prática
censurável de factos ilícitos, diversa da adoptada na sentença recorrida.
É o que se verifica designadamente quanto ao modo de aplicação pela
Apelante dos produtos fitofarmacêuticos no seu prédio misto, que
confina com o prédio misto da Apelada, bem como no tocante aos
danos sofridos por esta, traduzidos na contaminação das respectivas
culturas e ausência de recebimento do preço de venda a cliente de parte
do cultivo contaminado (200 quilos de tomilho-limão), bem como da
relação entre a superveniência dos ditos danos e o modus operandi
adoptado pela Apelante nos tratamentos fitossanitários que levou a
cabo no seu prédio.
Sucede que tendo sido rejeitadas tais alterações (como todas as outras
pretendidas) à matéria de facto provada na sentença recorrida, tornou-
se definitivo o elenco de factos provados e não provados da mesma,
não tendo a Apelante apresentado uma solução jurídica diversa da
tomada na dita sentença para a hipótese de se manter, como se
manteve, demonstrada a factualidade descrita designadamente sob os
pontos de facto com os números 33 a 38 e 41 a 51, constantes do
subsegmento dos factos considerados como provados.
Por outro lado, o argumento, igualmente apresentado no seu recurso
www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 19/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

pela Apelante, de que a erva aromática tomilho-limão não poderia ter


sido considerada como produto de origem biológica, ou concebido em
modo biológico, também falece uma vez que do cotejo dos factos
vertidos sob os pontos de facto nºs 2, 8, 11 e 21 do subsegmento
atinente aos factos considerados como provados na sentença recorrida
resulta que a Apelada podia operar, como operou, a plantação de tal
erva aromática, a par de outras, em modo de produção biológico,
estando certificada para tal desde 2018.
Dito isto, impõe-se, porém, saber se a actividade prosseguida pela
Apelante no seu prédio em 24/04/2018, 22/05/2018 e 08/06/2018, de
aplicação de produtos fitofarmacêuticos para a prevenção do míldio e
do oídio, em vista do tratamento fitossanitário da vinha plantada no seu
prédio misto, consubstancia, ou não, uma actividade perigosa e bem
assim se no caso concreto seria, ou não, de considerar um cenário de
concorrência de culpas entre Apelante e Apelada, por esta não ter
observado um “dever de precaução”.
Debrucemo-nos, então, sobre a primeira das apontadas questões.
Prevê o artigo 487.º do Código Civil, epigrafado “Culpa”, o seguinte:
“1-É ao lesado que incumbe provar a culpa do autor da lesão, salvo
havendo presunção legal de culpa. […]”
Dispõe, por seu turno, o artigo 493.º do mesmo Código, epigrafado
“Danos causados por coisas, animais ou actividades”, que:
“[…] 2-Quem causar danos a outrem no exercício de uma atividade,
perigosa por sua própria natureza ou pela natureza dos meios
utilizados, é obrigado a repará-los, exceto se mostrar que empregou
todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de os
prevenir.”
Refere a propósito desta norma Mário Júlio de Almeida Costa (“Direito
da Obrigações”, Almedina, 12ª edição revista e actualizada, 2018,
páginas 587-588), o seguinte:
“A estatuição alarga-se aos danos decorrentes do exercício de uma
actividade perigosa, «por sua própria natureza ou pela natureza dos
meios utilizados» (ex: fabrico de explosivos, navegação aérea,
transporte de matérias inflamáveis, aplicação médica de raios X, ondas
curtas). Deve tratar-se, pois, de actividade que, mercê de qualquer
dessas razões, tenha ínsita ou envolva uma probabilidade maior de
causar danos do que a verificada nas restantes actividades em geral.
Apenas é excluída a responsabilidade derivada de tais danos, se o
agente «mostrar que empregou todas as providências exigidas pelas
circunstâncias com o fim de os prevenir».
Como se apura, o legislador limitou-se a fornecer ao intérprete uma
directriz genérica para identificação das actividades perigosas”.
A presunção de culpa reconhecida no transcrito n.º 2 do artigo 493.º do
Código Civil, implica necessariamente uma inversão do ónus da prova
(artigo 350.º, n.º 1, do CC), sendo aquela ilidível mediante prova em
contrário (artigo 350.º, n.º 2, do CC), ou seja, exige-se fazer prova da
falta de culpa, ou de que os danos se teriam igualmente verificado, o
que tem que resultar do acervo da factualidade considerada como
demonstrada.

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 20/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

Na sentença recorrida considerou-se que a actividade levada a cabo


pela Apelante traduzida na aplicação de fungicidas através de
pulverizadores de tractor com turbina deve ser rotulada de actividade
perigosa, sujeita, como tal, ao regime do artigo 493.º, n.º 2, do Código
Civil.
Tal actividade ficou, como sabemos, demonstrada nos autos através dos
factos considerados como provados na sentença recorrida vertidos nos
pontos de facto 22 a 33.
No acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, acessível para
consulta in www.dgsi.pt, proferido em 21/09/2004, no âmbito do
processo n.º 620/04JTRC, referenciado na douta sentença recorrida,
decidiu-se, conforme expresso no respectivo sumário, que:
A aplicação de herbicida pelo Réu, através de aspersão, consubstancia
uma “actividade perigosa” dada a natureza tóxica do produto, sendo,
por isso, aplicável a norma do artigo 493.º, n.º 2, do Código Civil, que
estabelece uma presunção legal de culpa (presunção juris tantum).
Vejamos como argumentou o Tribunal a quo na sentença recorrida a
propósito da questão que vimos abordando:
“[…]
Ora, se a aplicação de herbicidas por aspersão constitui uma actividade
perigosa, a aplicação de fungicidas através de pulverizadores de tractor
com turbina constitui, em si mesma, uma fonte de perigo muito
superior à que resulta da aplicação de herbicidas por aspersores. Com
efeito, ao passo que a aplicação de herbicidas visa prevenir o
crescimento de ervas daninhas, sendo o jacto da calda projectado para o
solo para ser por ele absorvida e devendo ser utilizada uma pala para
impedir a subida das gotículas que saem dos bicos pulverizadores, já a
aplicação de pesticidas e fungicidas visa prevenir o aparecimento de
doenças e fungos nas folhas e frutos pelo que o jacto da calda é
projectado para toda a cobertura vegetal da planta, o que só por si já faz
aumentar o perigo de deriva da pulverização para os terrenos contíguos,
exponenciando-se ainda mais esse perigo se não forem usados bicos
pulverizadores anti-deriva, se não se ajustar correctamente a saída do
fluxo de ar de acordo com a densidade da cobertura vegetal das
videiras, e se não forem observadas as condições atmosféricas e do
vento recomendadas. Não só pela própria natureza tóxica dos produtos
utilizados (pesticidas e fungicidas), como também pela natureza dos
meios adoptados na aplicação desses produtos (pulverização dos
produtos para a cobertura vegetal), a aplicação de fungicidas através de
pulverizadores de tractor com turbina deve ser considerada uma
actividade perigosa.
O legislador europeu e nacional reconheceu a especial perigosidade da
actividade de aplicação de produtos fitofarmacêuticos ao estabelecer a
obrigação de os utilizadores profissionais de produtos fitofarmacêuticos
tomarem as providências necessárias à prevenção de consumação de
perigos para terceiros.
O Regulamento (CE) n.º 1107/2009 do Parlamento Europeu e do
Conselho, de 21 de Outubro de 2009, relativo à colocação dos produtos
fitofarmacêuticos no mercado, tem por objectivo garantir um elevado

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 21/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

nível de protecção da saúde humana e animal e do ambiente,


preservando simultaneamente a competitividade da agricultura da
Comunidade (Considerando 8).
A Lei n.º 26/2013, de 11 de Abril, com as alterações do Decreto-Lei n.º
35/2017, de 24 de Março, regula as atividades de distribuição, venda e
aplicação de produtos fitofarmacêuticos para uso profissional e de
adjuvantes de produtos fitofarmacêuticos e define os procedimentos de
monitorização da utilização dos produtos fitofarmacêuticos, transpondo
para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2009/128/CE, do
Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de outubro, que estabelece
um quadro de ação a nível comunitário para uma utilização sustentável
dos pesticidas, através da redução dos riscos e efeitos da sua utilização
na saúde humana e no ambiente, promovendo o recurso à proteção
integrada e a abordagens ou técnicas alternativas, tais como as
alternativas não químicas aos produtos fitofarmacêuticos (artigo 1.º, n.º
1).
Damos, assim, por assente que a aplicação de fungicidas através de
pulverizadores de tractor com turbina é uma actividade perigosa, sujeita
ao regime do artigo 493.º, n.º 2, do Código Civil. […]”
Concordamos com a apreciação feita pelo Tribunal recorrido pelo que
também no nosso entendimento é de catalogar a actividade
desenvolvida pela Apelante como actividade perigosa para efeitos do
n.º 2 do artigo 493.º do Código Civil.
Porém, impõe-se saber se a Apelante logrou empregar todas as
providências exigidas pelas circunstâncias do caso concreto com o fim
de prevenir a produção de danos para a Apelada.
Uma resposta positiva para tal, sublinha-se, apenas pode decorrer da
matéria de facto dada como assente na sentença recorrida.
Sucede que, do cotejo dos factos elencados no subsegmento dos factos
considerados como provados na sentença recorrida vertidos sob os
pontos 34, 35, 37, 41, 42, 43, 44 e 45, percebemos, com relativa
clareza, que a Apelante não empregou todos os procedimentos que lhe
eram exigidos no contexto factual concreto dos autos por forma a
prevenir a ocorrência de danos para a Apelada, designadamente na
plantação de tomilho-limão desta última.
Na verdade, a expressão legal “todas as providências” não só não afasta
o critério geral da diligência de um bom pai de família como aponta no
sentido de o adaptar ao caso das actividades perigosas que exigem
particulares cautelas, que não foram tomadas pela Apelante, violando a
mesma, desse modo, deveres de prevenção do perigo inerente à
actividade prosseguida.
Por outro lado, dúvidas não temos quanto ao carácter ilícito da
actividade prosseguida pela Apelante, bastando-nos, no tocante a este
pressuposto, remeter para a correcta exposição de motivos reproduzida
pelo Mmº Juiz a quo na sentença recorrida, mormente no subsegmento
intitulado “B) Ilicitude”, enquadrado no segmento dedicado à
“Fundamentação Jurídica”.
E quanto ao pressuposto atinente ao nexo de causalidade a estabelecer
entre a actividade prosseguida pela Apelante e a produção de danos na

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 22/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

esfera da lesada, ora Apelada, assente no critério da adequação


decorrente do artigo 563.º do CC, é nosso entendimento que a matéria
de facto descrita no subsegmento dos factos considerados como
provados sob os pontos 33 a 38 e 41 a 51 permite, sem margem para
rebuços, considerar que a descuidada pulverização efectuada pela
Apelante aquando dos tratamentos fitossanitários da sua vinha com
fungicidas para combater o míldio e o oídio realizados, pelo menos, em
24/04/2018, 22/05/208 e 08/06/2018 foi causa adequada da
contaminação da cultura de tomilho-limão desenvolvida pela Apelada
no seu prédio nos sectores 1 e 2 levando um cliente alemão desta
última a recusar receber e pagar uma parte da encomenda que fizera
daquela erva aromática (num total de 4500 quilos a entregar
faseadamente durante o período de um ano), traduzida num lote de 200
quilos, por virtude deste último conter comprovadamente resíduos de
pesticidas (usados pela Apelante nos ditos tratamentos da sua vinha)
em medida superior ao permitido por lei na agricultura biológica,
negando-se até ao termo do contrato outorgado com a Apelada a
receber dela mais tomilho-limão por recear que as colheitas posteriores
estivessem igualmente contaminadas com fungicidas.
Sustentou ainda a Apelante nas suas conclusões recursivas um eventual
concurso de culpas envolvendo a sua pessoa e a Apelada, por esta
última não ter observado um “dever de precaução” que se lhe impunha
em virtude de estar a plantar/cultivar em modo de produção biológico,
sujeito a regras especificas.
Estatui o artigo 570.º do Código Civil, epigrafado “Culpa do lesado”, o
seguinte:
“1-Quando um facto culposo do lesado tiver concorrido para a
produção ou agravamento dos danos, cabe ao tribunal determinar, com
base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências
que delas resultaram, se a indemnização deve ser totalmente
concedida, reduzida ou mesmo excluída.
2-Se a responsabilidade se basear numa simples presunção de culpa, a
culpa do lesado, na falta de disposição em contrário, exclui o dever de
indemnizar.”
Ora, a nosso ver, também não assiste razão à Apelante quanto a este
aspecto.
Na verdade, do acervo da matéria de facto constante do subsegmento
dos factos considerados como provados na sentença recorrida não
vislumbramos qualquer conduta prosseguida pela Apelada que tenha
concorrido para a produção ou agravamento da contaminação sofrida
na plantação de tomilho-limão com pesticida em medida superior ao
legalmente admissível em agricultura biológica e consequente recusa
do cliente alemão em aceitar e pagar o preço acordado para a aquisição
à Apelada de certa quantidade de tal erva aromática (200 quilos).
Nem sequer por omissão, pois considerando, designadamente, os factos
descritos no subsegmento dos factos provados vertidos sob os pontos
34, 35, 37, 43, 44 e 45, é caso para questionar que procedimento com
intuito cautelar e com um mínimo de eficácia poderia a Apelada ter
tomado em vista a evitar a contaminação sofrida na sua plantação

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 23/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

prosseguida em modo de produção biológico?


Salvo melhor opinião não o vislumbramos!
Resta aludir, por fim, à questão levantada pela Apelante na parte
derradeira das suas conclusões recursivas atinente à aplicabilidade no
caso concreto do disposto no artigo 494.º do Código Civil.
Prevê-se no artigo em apreço, epigrafado “Limitação da indemnização
no caso de mera culpa”, o seguinte:
“Quando a responsabilidade se fundar na mera culpa, poderá a
indemnização ser fixada, equitativamente, em montante inferior ao que
corresponderia aos danos causados, desde que o grau de culpabilidade
do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais
circunstâncias do caso o justifique.”
Ora, bastará uma simples leitura do articulado da contestação
apresentado pela ora Apelante para percebermos que antes de o ter feito
na peça recursiva dirigida contra a sentença recorrida a Apelante não
invocou, para a eventualidade de vir a ser condenada em indemnização
à Apelada, como veio a suceder, a redução do montante indemnizatório
baseado na mera culpa, pois limitou-se a peticionar a sua absolvição
dos pedidos contra si dirigidos pela ora Apelada, o que equivale a dizer
que a Apelante suscitou em sede de recurso perante este Tribunal ad
quem, ou seja em primeira mão, uma questão não debatida
anteriormente no Tribunal a quo, por nem sequer suscitada perante o
mesmo.
Sucede que, como sabemos, exceptuando questões de conhecimento
oficioso o Tribunal de recurso limita-se a conhecer, reapreciando, de
questões anteriormente apreciadas pelo Tribunal recorrido.
É o que se extrai com relativa clareza dos normativos plasmados nos
n.ºs 2 e 3 do artigo 635.º do Código de Processo Civil.
No entanto, mesmo que se entendesse que a questão em apreço
entroncava no domínio da mera indagação, interpretação e aplicação do
direito o certo é que não resultaram provados factos na sentença
recorrida que permitissem uma correcta aplicação do artigo 494.º do
Código Civil ao caso vertente, por duas razões:
Em primeiro lugar porque o facto vertido sob o ponto 40 do
subsegmento dos factos considerados como provados na sentença
recorrida apresenta-se, em nosso entendimento, como apto a afastar a
hipótese de simples descuido, desleixo e inaptidão (que caracteriza o
conceito jurídico-civil da “mera culpa”), na pulverização realizada pela
Apelante, pelo menos no tocante àquela que efectuou em 08/06/2018,
apontando para acto cometido, pelo menos, com dolo eventual.
Em segundo lugar porque, mesmo descartando a possibilidade de
actuação dolosa, não decorre do acervo dos factos considerados como
provados na sentença recorrida factualidade ilustrativa da situação
económica de Apelante e Apelada, que se traduz num dos requisitos a
considerar cumulativamente para a aplicação do artigo 494.º do CC.
Conclui-se, assim, pela improcedência das conclusões recursivas
igualmente quanto a esta última questão abordada, de que resulta
improceder na totalidade o presente recurso.
*

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 24/25
07/01/22, 00:11 Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

V- Decisão
Termos em que, face a todo o exposto, acordam os Juízes desta Relação
em negar provimento ao presente recurso de Apelação interposto por
Sociedade Agrícola “(…), Lda.” e, em consequência, decidir o
seguinte:
1-Confirmar a sentença recorrida;
2-Fixar as custas a cargo da Apelante (artigo 527.º, nºs 1 e 2, do CPC).
Notifique.
Évora, 16 de Dezembro de 2021
José António Moita (Relator)
Silva Rato (1º Adjunto)
Mata Ribeiro (2º Adjunto)

www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/c5f2dc0b3c73b10a802587ba00444951?OpenDocument 25/25

Você também pode gostar