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07/01/22, 00:13 Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães

Acórdãos TRG Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães


Processo: 48/21.1T8BGC.G1
Relator: ANTERO VEIGA
Descritores: ERRO NA FORMA DO PROCESSO
CONVOLAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 16-12-2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
- Pretendendo o trabalhador impugnar o seu despedimento, comunicado por escrito, com
alegação de extinção do posto de trabalho, terá, sob pena de erro na forma de processo,
de intentar a ação especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do
despedimento prevista nos artigos 98.º-C e seguintes do C.P.T.
-Verificando-se erro na forma de processo, deve proceder-se a convolação para a forma
adequada, se possível, nos termos do artigo 193.º do C.P.C.
- Tendo o trabalhador intentado uma ação declarativa com processo comum, incorrendo
em erro na forma de processo, se a petição apresentada contiver todos os elementos
previstos no formulário de declaração de oposição ao despedimento que dá inicio ao
processo especial previsto nos artigos 98.º-C e seguintes do C.P.T., deverá aquela
aproveitar-se nesses estritos termos.
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

A. R. intentou a presente ação declarativa de condenação com processo


comum contra F. M., pedindo que seja declarada a ilicitude do
despedimento e que a R. seja condenada a pagar-lhe diversos créditos
emergentes desse despedimento ilícito e da cessação de contrato de
trabalho.

Invoca, para tanto, ter celebrado com a R. um contrato de trabalho a


termo certo de seis meses e a tempo parcial, e ter sido por esta
despedida em 20/09/2020, mediante comunicação escrita, por meio da
qual a R. lhe comunicou o seu despedimento por extinção do posto de
trabalho.

Foi proferido despacho liminar decidindo-se:

“ Do exposto decorre que a forma processual escolhida pela A. é


inadequada à pretensão deduzida, pelo que se verifica erro na forma de
processo, nos termos do art. 193º do Cod. Proc. Civil. Porque a petição
inicial não pode ser aproveitada, já que o processo especial
suprarreferido tem início mediante a entrega pelo trabalhador de
requerimento em formulário próprio, de modelo aprovado por Portaria
conjunta dos membros do Governo responsáveis pelas áreas da justiça
e do trabalho (art. 98º-C), o erro na forma de processo implica a
nulidade de todo o processo, o que constitui uma exceção dilatória de
conhecimento oficioso que conduz ao indeferimento liminar (arts. 54º nº
1 do Código de Processo do Trabalho e 590º nº 1 do Cod. Proc. Civil).
Perante o exposto, indefiro liminarmente a presente petição inicial.
Custas pela A., sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia…”

Inconformado recorreu o autor apresentando as seguintes conclusões:



2. A forma de processo é legítima.
3. Resulta da primeira missiva, enviada pela Ré em 26 de agosto de
2020, a intenção de proceder ao despedimento da Autora, em
www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/dfac6bfd8bd8f74f802587b3003316fc?OpenDocument 1/5
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consequência da extinção do posto de trabalho, nos termos do artigo


369.º, n.º 1 do Código do Trabalho – Cfr. Doc. n.º 2 junto à Petição
Inicial.
4. Mais tarde, através de uma segunda missiva enviada em 06 de
setembro de 2020 já veio a aí Ré comunicar a aí Autora a caducidade
do contrato de trabalho a termo certo, nos termos do artigo 344.º, n.º 2
do Código do Trabalho – Cfr. Doc. n.º 3 junto com a Petição Inicial
5. A ação especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do
despedimento regulado no artigo 98.º - B e seguintes do Código de
Processo do Trabalho, aplica-se expressamente aos casos em que o
trabalhador vem impugnar uma decisão de despedimento que lhe tenha
sido comunicado por escrito e que seja fundada em despedimento
disciplinar, inadaptação ou extinção do posto de trabalho, conforme o
disposto no artigo 98.º - C, n.º 1 do Código de Processo do Trabalho.
6. Conforme tem sido entendido maioritariamente pela doutrina e pela
jurisprudência, a ação prevista no artigo 98.º - B e seguintes do já
referido código, apenas tem aplicação aos casos inequívocos de
despedimento, formalmente assumido como tal, pela entidade
empregadora – nesse sentido ver o Acórdão do Tribunal da Relação de
Coimbra de 17/01/2001 (Relator: Ramalho Pinto), e o Acórdão do
Tribunal da Relação do Porto de 30/05/2018 (Relator: Jerónimo Freitas),
disponível em dgsi.pt, assim como, ver também, Albino Mendes Batista,
in “ A nova ação de impugnação do despedimento e a revisão do código
de Processo do Trabalho”, páginas 73 e 74 da Coimbra Editora, Janeiro
de 2010.
7. No presente caso, da segunda missiva suprarreferida, não resulta
uma intenção clara e inequívoca de despedimento por extinção do posto
de trabalho, caso assim fosse a aí Ré não teria invocado, como fez, o
artigo 344.º, n.º 2 do Código do Trabalho, referente à caducidade do
contrato de trabalho.
8. Assim e em consequência dos motivos acima explanados, não é a
ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento
a adequada à pretensão da aí Autora, mas antes, a ação declarativa em
processo comum, prevista no artigo 51.º e seguintes do Código de
Processo do Trabalho.
9. Ao contrário do que entendeu o Tribunal a quo a forma processual
escolhida pela aí Autora é a adequada à pretensão deduzida, pelo que
não se verifica qualquer erro na forma de processo, nos termos do artigo
193 do Código de Processo Civil, a contrario, e em consequência não há
qualquer nulidade do processo nem se constituiu assim exceção
dilatória que conduziria ao indeferimento liminar da Petição Inicial, nos
termos do disposto nos artigos 54.º, n.º 1 do Código de Processo do
Trabalho e 590.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, ambos a contrario.
*
Sem contra-alegações.
O Exmº PGA deu parecer no sentido da improcedência.

Factualidade com interesse para a questão:


A autora invoca na petição:
1.º
Em 29 de Maio de 2020, foi celebrado e reciprocamente aceite, entre a
Autora e a Ré, contrato de trabalho a termo certo, a tempo parcial, pelo
prazo de 6 meses, tendo o seu início em 01 de junho de 2020 até 30 de
novembro de 2020, renovável por iguais períodos e com uma
remuneração mensal ilíquida de € 317,50 (trezentos e dezassete euros
e cinquenta cêntimos) – conforme Doc. n.º 1, que se junta e se dá por
reproduzido para todos os efeitos legais.
2.º
www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/dfac6bfd8bd8f74f802587b3003316fc?OpenDocument 2/5
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Contrato esse que teve o seu término em 20 de setembro de 2020, por


iniciativa da Ré – Conforme Doc.s n.º 2 e 3, que se juntam e se dão por
reproduzidos para todos os efeitos legais.
6.º
Ora resulta da primeira missiva, enviada pela Ré em 26 de agosto de
2020, a intenção de proceder ao despedimento da Autora, em
consequência da extinção do posto de trabalho - conforme Doc. n.º 2
que se junta e se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.
7.º
Porém, mais tarde, já veio a Ré comunicar a caducidade do contrato de
trabalho a termo certo – conforme Doc. n.º 3 que se junta e se dá por
reproduzido para todos os efeitos legais.
16.º
Ora, resulta das cartas enviadas pela Ré à Autora, que se dão por
inteiramente reproduzida, para todos os efeitos legais, que o seu posto
de trabalho se extinguia por motivos de mercado. - Conforme Doc.s n.ºs
2 e 3.
17.º
Porém e para que o despedimento por extinção de posto de trabalho se
verifique é necessário o preenchimento cumulativo dos requisitos
previstos no artigo 368.º, n.º 1 do Código do Trabalho
18.º
Mas, no caso dos autos e salvo melhor opinião, face à matéria factual
apurada, impõe-se concluir que os motivos de mercado que motivam a
decisão de despedir não se verificam.

Das missivas enviadas consta:


Missiva de 26/8/2020.
Venho pelo presente, comunicar a intenção de proceder ao seu
despedimento, em consequência da necessidade de extinguir o seu
posto de trabalho, nos termos do nº 1 do artº 369º do Código do
trabalho.
A extinção do posto de trabalho é justificada por motivos de mercado,
nomeadamente, a redução das vendas, decorrente da crise económica
e financeira quer afeta a atividade comercial da empresa.
Mais informamos que poderá emitir o seu parecer fundamentado no
prazo de 10 dias a contar …”
Missiva de 6/9/2020:
Nos termos do nº 2 do art. 344º da Lei nº 7/2009, de 12 de fevereiro no
caso de contratos a termo, venho pelo presente, comunicar a intenção
de proceder ao seu despedimento com efeitos a partir de 20 de
setembro do corrente ano, em consequência da necessidade de
extinguir o seu posto de trabalho, nos termos do nº 1 do art. 369º do
Código do Trabalho.
Sendo assim, e uma vez que existem 8 dias de férias para gozar,
deixará de exercer funções, a partir do dia 12de setembro do corrente
ano, inclusive…”
***
Nos termos dos artigos 635º, 4 e 639º do CPC, o âmbito do recurso
encontra-se balizado pelas conclusões do recorrente.
Importa saber se ocorre erro na forma de processo, e, oficiosamente, se
o tribunal apreciando o erro na forma de processo deveria ter procedido
à convolação para a forma adequada, com aproveitamento de todos os
atos praticados, ou de alguns deles.
“A forma de processo escolhida pelo autor deve ser adequada à
pretensão que deduz e deve determinar-se pelo pedido que é formulado
e, adjuvantemente, pela causa de pedir. É em face da pretensão de
tutela jurisdicional deduzida pelo autor que deve apreciar-se a
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propriedade da forma de processo, a qual não é afetada pelas razões


que se ligam ao fundo da causa” - Abrantes Geraldes, Temas da
Reforma do Processo Civil - 1 - Princípios Fundamentais. 2 - Fase Inicial
do Processo Declarativo.”, Volume I, 2.ª Edição Revista e Atualizada,
janeiro de 2003, páginas 280 e 281. Deve ocorrer uma adequação entre
o pedido formulado e as razões pelas quais a lei criou determinada
forma de processo.
Do artigo 387º do CT resulta que ao trabalhador não é dada a faculdade
de optar, tratando-se de despedimento individual com comunicação de
despedimento na forma escrita, (modalidades do artigo 340º, als. c) e) e
f)), a ação apropriada é esta (especial). O erro na forma de processo é
de conhecimento oficioso, como resulta claro dos artigos 196º, 198º e
200º, nº 2 do C.P.C., que, a não ser possível a convolação importa
absolvição da instância nos termos do artigo 278º, 576º, e 577º do CPC.
Na decisão considerou-se que “a impugnação de um despedimento
promovido pelo empregador e comunicado ao trabalhador por escrito
está adstrita a um processo especial previsto no capítulo I do Título VI
do Código de Processo do Trabalho revisto pelo D.L. 295/2009 de 13/10.
Com efeito resulta do art. 98º-C do Código de Processo do Trabalho que
tal forma de processo tem aplicação exclusiva nas situações de
impugnação do despedimento previstas no art. 387º do Código do
Trabalho na revisto pela Lei 7/2009 de 12/2.”
Trata-se dos casos em que, como se refere na decisão recorrida, o
despedimento é indiscutível, resultando de uma declaração de vontade
escrita por parte da empregadora.
A recorrente não contesta este entendimento, referindo apenas que não
estamos em face de um claro e inequívoco despedimento por extinção
do posto de trabalho, invocando que na segunda missiva enviada a
empregadora alude a caducidade”.

Vejamos.
A autora na sua petição invoca o seu despedimento ilícito por extinção
do posto de trabalho. Resulta claro do seu articulado que assim é,
designadamente dos artigos 16 a 18, bem como do pedido formulado,
aludindo a ilicitude do despedimento. Esgrime agora a recorrente com o
teor da segunda missiva, falando na caducidade, mas sem razão.
Note-se que na segunda missiva a empregadora não refere o termo
“caducidade”, limitando-se a referir o artigo a esta respeitante, o 344º do
CT. Contudo resulta desta, não obstante esta indicação, que a vontade
declarada é no sentido do despedimento por extinção do posto de
trabalho. A empregadora refere em termos genéricos, aquele normativo,
adiantando, “no caso de contratos a termo”. Não refere que o contrato
da autora é a termo, pois pode bem ser que a empregadora entenda que
tal contrato, por qualquer razão, até de forma, não é contrato a termo.
Logo de seguida a mesma refere que “comunica a intenção de proceder
ao seu despedimento… em consequência da necessidade de extinguir o
seu posto de trabalho nos termos do nº 1 do artigo 369º do Código do
Trabalho”. Conjugada com a anterior missiva, no sentido de dar ao
trabalhador prazo para se pronunciar quanto à intenção de
despedimento por extinção do posto de trabalho, não pode senão
concordar-se com a decisão recorrida no que a este particular respeita.
A autora foi despedida por extinção do posto de trabalho, e ela assim o
entendeu e nesses termos introduziu a ação.
Já quanto ao não aproveitamento do articulado como requerimento a
que alude o artigo 98-C do CPT a questão não é tão liquida. Vejamos da
possibilidade de convolação.
Importa referir que as normas processuais têm uma função instrumental.
Da sua aplicação não pode resultar uma diminuição ou impedimento ao
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acesso aos tribunais, quer na vertente ativa como passiva, quer


enquanto direito de demanda quer enquanto direito de defesa. A CRP
consagra o direito de acesos à justiça e aos tribunais no artigo 20º,
como um garante da dignidade da pessoa humana, base da república, e
dos seus direitos como resulta dos artigos 2º e 3º.
Nos termos do artigo 193º do CPC, em caso de erro na forma de
processo deve verificar-se qual a forma adequada, e se podem ser
aproveitados atos praticados.

Consta do normativo:
Erro na forma do processo ou no meio processual
1 - O erro na forma do processo importa unicamente a anulação dos
atos que não possam ser aproveitados, devendo praticar-se os que
forem estritamente necessários para que o processo se aproxime,
quanto possível, da forma estabelecida pela lei.
2 - Não devem, porém, aproveitar-se os atos já praticados, se do facto
resultar uma diminuição de garantias do réu.
3 - O erro na qualificação do meio processual utilizado pela parte é
corrigido oficiosamente pelo juiz, determinando que se sigam os termos
processuais adequados.
Assim, o erro só determina a absolvição da instância nos casos em que
a petição inicial não possa ser aproveitada para a forma de processo
adequada (artºs. 193º; 278º, nº 1, al. b); 576º, nº 2, e 577º, al. b), do
CPC).
No caso estamos no início do processo, tendo apenas sido apresentada
a petição.
Resulta do artigo 98.º-C nº 1 que o processo especial se inicia com a
entrega, pelo trabalhador ou por mandatário judicial por este constituído,
junto do juízo do trabalho competente, de requerimento em formulário
eletrónico ou em suporte de papel, do qual consta declaração do
trabalhador de oposição ao despedimento, sem prejuízo do disposto no
número seguinte.
Desde que a petição inicial apresentada contenha todos os elementos
que deve conter o formulário a que alude o artigo 98º – C nº 1 do CPT
(portaria 1460-C/2009 de 31/12), não há obstáculo à convolação.
Nenhum prejuízo advém para a ré, desde que o aproveitamento se
atenha a esses termos. Vd. Ac. RP de 27/2/2012, www.dgsi.pt, processo
nº 884/11.7TTMTS.P1; RL de 26/3/2014, www.dgsi.pt, processo nº
28303/12.4T2SNT.L1-4, e RG de 12.3.2015, processo nº
1107/13.0TTGMR.G1.
Consequentemente, embora por razão diversa, procede a apelação,
devendo a ação prosseguir na forma adequada, por convolação.

DECISÃO:

Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar


procedente a apelação, determinando-se oficiosamente a sua
convolação, devendo os autos prosseguir na forma adequada, nos
termos atrás referenciados.
Custas pelo vencido a final.
16/12/2021

Antero Veiga
Alda Martins
Vera Sottomayor

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