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INSTITUTO SUPERIOR DE CIÊNCIAS POLICIAIS E SEGURANÇA INTERNA

CARLOS SERAFIM VENTURA NETO


Aspirante a Oficial de Polícia

Dissertação Final de Mestrado Integrado em Ciências Policiais


XXVII Curso de Formação de Oficiais de Polícia

DIREITO POLICIAL EM ANGOLA: BREVE REFLEXÃO

Orientador:
Professor Doutor Manuel Monteiro Guedes Valente

Lisboa, 24 de Abril de 2015


INSTITUTO SUPERIOR DE CIÊNCIAS POLICIAIS E SEGURANÇA INTERNA

CARLOS SERAFIM VENTURA NETO


Aspirante a Oficial de Polícia

Dissertação Final de Mestrado Integrado em Ciências Policias


XXVII Curso de Formação de Oficiais de Polícia

DIREITO POLICIAL EM ANGOLA: BREVE REFLEXÃO

Orientador:
Professor Doutor Manuel Monteiro Guedes Valente

Lisboa, 24 de Abril de 2015

ii
Estabelecimento de Ensino: Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna
Autor: Carlos Serafim Ventura Neto
Curso: XXVII – Mestrado Integrado em Ciências Policiais
Título da obra: Direito Policial em Angola: Breve Reflexão
Orientador: Professor Doutor Manuel Monteiro Guedes Valente
Local de Edição: Lisboa
Data de Edição: 24 de Abril de 2015

iii
“Os governos passam, as sociedades morrem mas, a Polícia é eterna”.
Honoré de Balzac

iv
Aos meus pais Jacinto Neto e Filomena Neto,
à minha Mulher Núria Morais e às nossas filhas
Áurea e Luna Neto, pois foram as mais
prejudicadas pela minha dedicação a esta causa.

v
AGRADECIMENTOS

Terminamos hoje um ciclo longo, de grande sacrifício e de uma aprendizagem


constante. As barreiras foram muitas, valeu a persistência, aliada ao esforço de todos
aqueles que me rodeiam.
Agradeço primeiramente a Deus, por na Corte Celestial me ter concedido a dádiva de
viver. Todo o meu percurso só foi possível graças à sua divindade.
Agradeço aos meus amados e inigualáveis pais pela excelente educação e pelo apoio
incondicional que desde sempre me proporcionaram. A vossa luta, esforço e dedicação
deram-me testemunho de que um árduo trabalho diário é o caminho para o sucesso. Sem
vocês, o sonho não se tornaria possível.
Agradeço á minha mulher, Núria, e às nossas amadas filhas, Áurea e Luna, pois
foram a lenha que manteve acesa esta chama durante esses quase seis anos de vida
académica no ISCPSI.
Agradeço aos meus irmãos, pelo apoio e incentivo nas horas de maior angústia e que
tudo fizeram para que esta jornada fosse concluída com sucesso.
Ao colectivo de alunos angolanos no ISCPSI pela irmandade, amizade e
cumplicidade.
Aos meus irmãos do XXVII CFOP, meus companheiros de armas. Sem a vossa
ajuda, não me teria sido possível chegar aqui.
Agradeço ao Professor Doutor Manuel Monteiro Guedes Valente, pela orientação
dispensada. Endereço-lhe a minha profunda gratidão pela integral disponibilidade e apoio,
indispensável para que esta Dissertação tivesse o máximo de qualidade.
A todos os que, directa ou indirectamente, contribuíram para a elaboração desta
Dissertação de Mestrado, um muito obrigado. Espero ter conseguido reflectir neste
trabalho toda a vossa aposta, esforço e dedicação.

A todos vós, o meu muito obrigado!

vi
RESUMO

Os Estados democráticos e de direito caracterizam-se sobretudo por ter uma Polícia


ao serviço do povo e para o povo, sendo impensável, hoje em dia, uma sociedade
democrática que não acompanha esta dinâmica. Angola procura, no pós guerra civil, não
ficar aquém desse desenvolvimento que já se verifica até nalguns países irmãos da
Comunidade dos Países de Língua Oficial Portuguesa.
Por este facto, e aliado à constante evolução socioeconómica, fruto do
desenvolvimento humano e tecnológico, que o país tem vindo a registar, é necessário que o
Estado esteja dotado de uma Polícia capaz de responder, preventiva e reactivamente, aos
níveis da criminalidade que têm vindo a crescer cada vez mais, em especial nas grandes
cidades.
A Constituição da República de 2010 é a primeira Constituição do país que faz
referência sobre a polícia em Angola. A presente Dissertação tem, como objectivos,
apresentar bases jurídico-policiais para auxiliar no desenvolvimento de uma possível
teorização do Direito Policial de Angola, dando maior ênfase na caracterização do direito
policial, no esclarecimento de quais as forças e serviços de segurança que contribuem para
a manutenção da segurança nacional, quais as atribuições e competências que lhes são
conferidas por lei; quais são as autoridades de polícia, como se distinguem das autoridades
administrativas com poderes de polícia, bem como questões relativas à actividade de
investigação criminal, nomeadamente uma análise do ponto de vista jurídico, no que
concerne à criação de um serviço de investigação criminal na dependência directa do
Ministério do Interior.

Palavras-chave: Polícia, direito policial, serviços da ordem interna, poder de


polícia e investigação criminal.

vii
ABSTRACT

The democratic and lawful States define themselves by having their Police on the
service of the people and for the people, being unthinkable nowadays, any democratic
society that does not follow this standards. Angola is working, on the aftermath of the civil
war, to not stay behind this development that is already noticeable in some countries of the
Community of the Official Portuguese Speaking Countries.
Because of this, and allied with the constant socioeconomic evolution, result of the
human and technologic development the country has been registering, it's necessary that
the State incorporates a Police force capable to respond, preventively and reactively, to the
crime levels that have been rising, specialy in the major cities.
The Republic Constitution of 2010 is the first Constitution of the country that makes
reference to the police in Angola. The present dissertation has in its objectives, to present
judicial support and police knowledge to help the development of a theorization in Police
Law in Angola, giving more emphasis in portraying police law; in explaining wich security
forces and services contribute for the maintenance of the nacional security; wich are their
powers and capacities conferred by law; wich are the police authorities; how to distinguish
administrative authorities with police powers; as well as questions regarding the criminal
investigation activity, namely a judicial analysis concerning the creation of a criminal
investigation service in the direct jurisdiction of the Interior Ministry.

Key words: Police, police law, intern order services, police power and criminal
investigation.

viii
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

Al. – Alínea
AN – Assembleia Nacional
Art.º – Artigo
CPP – Código de Processo Penal
Cfr. – Confrontar
CGPN – Comando Geral da Polícia Nacional
CRA – Constituição da República de Angola
CGPPA – Comando Geral da Polícia Popular de Angola
CPPA - Corpo de Polícia da Província de Angola
CPL – Corpo de Polícia de Luanda
CSP – Companhia de Segurança Pública
CPSPA – Corpo de Polícia de Segurança Pública de Angola
CPPA – Corpo de Polícia Popular de Angola
FAA – Forças Armadas Angolanas
ISCPSI – Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna
LSN – Lei de Segurança Nacional
MININT – Ministério do Interior/Ministro do Interior
N.º – Número
PNA – Polícia Nacional de Angola
PN – Polícia Nacional
PIR – Polícia de Intervenção Rápida
PR- Presidente da República
P – Pergunta
PSPA – Polícia de Segurança Pública de Angola
PSP – Polícia de Segurança Pública
SB – Serviço de Bombeiros
Séc. – Século
SP – Serviço Penitenciário
SIC – Serviço de Investigação Criminal
SME – Serviço de Estrangeiros e Fronteiras

ix
ÍNDICE

AGRADECIMENTOS ....................................................................................................... vi

RESUMO............................................................................................................................ vii

ABSTRACT ...................................................................................................................... viii

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS ....................................................................... ix

ÍNDICE ................................................................................................................................. x

INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 1

CAPÍTULO I. CONCEITO, OBJECTO E FONTES DO DIREITO POLICIAL


ANGOLANO ........................................................................................................................ 5

1. Direito Policial e Direito da Polícia ............................................................................ 5

2. Direito Policial como Direito Público ...................................................................... 10

3. O Objecto do Direito Policial ................................................................................... 14

4. As Fontes do Direito Policial Angolano ................................................................... 15

CAPÍTULO II. DOS VÁRIOS SENTIDOS JURÍDICOS DE POLÍCIA .................... 20

1. Origem e Conceito do Vocábulo Polícia .................................................................. 20

2. Polícia em Sentido Orgânico ou Institucional .......................................................... 22

3. Polícia em Sentido Material ou Funcional ............................................................... 24

4. Polícia em Sentido Formal ....................................................................................... 26

5. A Polícia como Força de Segurança ......................................................................... 27

6. Serviços de Segurança .............................................................................................. 29

7. Autoridades e Órgãos de Polícia Criminal em Angola............................................. 30

CAPÍTULO III. A POLÍCIA COMO GARANTE DA SEGURANÇA NO DIREITO


ANGOLANO ...................................................................................................................... 34

1. Breve Referência da Evolução da Polícia em Angola .............................................. 34

2. A Polícia na Constituição da República de Angola .................................................. 37

3. Os Órgãos e Serviços da Ordem Interna .................................................................. 39

3.1 A Polícia Nacional de Angola .............................................................................. 40

x
3.1.1 Conceito ................................................................................................................ 40

3.1.2 Atribuições e Competências ................................................................................. 40

3.2 Serviço de Migração e Estrangeiros ..................................................................... 42

3.2.1 Conceito ......................................................................................................... 42

3.2.2 Atribuições e Competências .......................................................................... 42

3.3 Serviços Prisionais ................................................................................................ 44

3.3.1 Conceito ......................................................................................................... 44

3.3.2 Atribuições e Competências .......................................................................... 44

3.4 Serviço de Bombeiros ........................................................................................... 45

3.4.1 Conceito ......................................................................................................... 45

3.4.2 Atribuições e Competências .......................................................................... 45

CAPÍTULO IV. O PODER DE POLÍCIA NO ORDENAMENTO JURÍDICO


ANGOLANO E O DIREITO POLICIAL ....................................................................... 47

1. Do Poder de Polícia em Angola (as origens do termo) ............................................ 47

2. Particularidades do Poder de Polícia ........................................................................ 51

3. Limites Impostos ao Poder de Polícia em Angola .................................................... 54

4. Dos Quadrantes dos Poderes de Polícia no Âmbito do Direito Policial................... 55

4.1 Das Licenças e Autorizações como Exteriorização dos Poderes de Polícia


Administrativa ................................................................................................................. 56

4.2 Dos Poderes de Polícia de Ordem e Segurança Pública e de Polícia


Judiciária/Criminal .......................................................................................................... 58

5. A Problemática da Desintegração da Actividade de Investigação Criminal na Polícia


Nacional de Angola – e o Direito Policial ....................................................................... 59

6. As Implicações Jurídicas da Desintegração da Actividade de Investigação Criminal


na Polícia Nacional de Angola à Luz do Direito Positivo Vigente ................................. 62

CONCLUSÃO.................................................................................................................... 65

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................ 68

Bibliografia ...................................................................................................................... 68

xi
Legislação ........................................................................................................................ 71

xii
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

INTRODUÇÃO

No âmbito da Dissertação Final do curso de Mestrado Integrado em Ciências


Policiais e Segurança Interna, o objecto do nosso estudo centra-se na temática do Direito
Policial em Angola.
Depois de um largo período de guerra civil, Angola enquanto Estado Democrático e
de Direito vem acompanhando a dinâmica de desenvolvimento socioecónomico e jurídico-
político dos demais países, fruto da grande globalização que se assiste nos tempos que
correm. Um exemplo vivo do avanço jurídico-político é a aprovação da primeira
Constituição da República aprovada em 2010, que contempla uma referência à Polícia
Nacional de Angola no título da Administração Pública, dedicando-lhe capítulo próprio.
Pretendemos com este estudo trazer à tona todas aquelas temáticas com maior
relevância para o conhecimento do direito policial angolano, e que podem auxiliar na
teorização do Direito Policial de Angola. Esperamos, desta forma, contribuir no
desenvolvimento científico do nosso objecto de estudo.
Para MANUEL VALENTE a polícia é “a actividade de natureza executiva – ordem e
tranquilidade públicas e administrativa –, dotada de natureza judiciária no quadro de
coadjuvação e de prossecução de actos próprios no âmbito da legislação processual penal –
cuja função jurídico-constitucional se manifesta na concreção da defesa da legalidade
democrática, da garantia da segurança interna e da defesa e garantia dos direitos do
cidadão e da prevenção criminal quer por vigilância quer por prevenção stricto sensu,
podendo para cumprimento daquelas funções fazer uso da força – coacção – dentro dos
limites do estritamente necessário e no respeito pelo Direito e pela pessoa humana”1.
Partindo da definição deste Autor, entendemos que onde há Polícia deve haver
também o direito de polícia ou direito policial2, tão-somente, porque sentimos que há

1
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 4.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 106.
2
Para MANUEL VALENTE, o direito policial (…) compreende os princípios gerais, as normas regulares da
actuação e da conduta policial na prossecução das suas atribuições e competências na defesa da legalidade
democrática, na garantia da segurança interna e dos direitos dos cidadãos, cujos destinatários se encontram
indeterminados e indefinidos no espaço do território nacional ou da União Europeia e, até mesmo,
internacional. Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, … p. 31. Numa
perspectiva mais ampla, mas fixando-se no quadro do Direito Administrativo, JOÃO RAPOSO, considera que o
direito policial… é o ramo do Direito Administrativo geral ou comum que regula a organização policial e a
actividade dos corpos de polícia, com vista à satisfação do interesse público da segurança interna, à garantia
do pleno exercício dos direitos, liberdades e ao cumprimento da lei. Cfr. JOÃO RAPOSO, Direito Policial – I,
ICPOL – Colecção do Centro de Investigação do ISCPSI, Coimbra: Almedina, 2006, p. 17.

1
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

necessidade de um estudo académico e científico que reflicta na legalidade da actividade


policial em Angola, pois é uma matéria que não mereceu a atenção que lhe é devida. O
direito policial de Angola, deve ter como objecto de estudo “toda a actividade de polícia de
modo à criação de uma doutrina fundante de uma ciência juspolicial que se encontre e
manifeste em toda e qualquer polícia considerada material, orgânica e formalmente”3.
Estamos certos de que não dominamos esta área do conhecimento, mas, com estudo e
dedicação necessária, pretendemos através da elaboração deste trabalho, dar a conhecer as
linhas orientadoras do nosso objecto de estudo de uma maneira coerente e eficaz. É nosso
objectivo primordial, com a realização deste estudo, caracterizar o direito policial em
Angola; determinar quais as polícias que podem integrar uma teorização do direito policial
angolano (descrever qual o seu conceito legal, bem como as suas atribuições e
competências); a problemática do poder de polícia em Angola, bem como determinar quais
as consequências jurídicas que podem advir da desintegração da actividade de investigação
criminal na PNA à luz do direito positivo vigente.
A nossa Dissertação contempla em si quatro capítulos. O primeiro capítulo é
introdutório e de enquadramento temático: faz referência ao conceito, ao objecto e às
fontes do Direito Policial Angolano. Aqui procede-se à descrição dedutiva do tema,
explorando no máximo o seu conteúdo, com o objectivo de atingirmos o ponto essencial do
objecto de estudo, o Direito Policial em Angola. Com recurso à bibliografia que reflecte o
estado da arte e que foi por nós consultada, abordaremos as questões do Direito Policial e o
Direito da Polícia, dissecando e diferenciando os conceitos, à luz da perspectiva de vários
autores, procurando encontrar as suas divergências e pontos de convergência.
No segundo capítulo, optamos por abordar os vários sentidos jurídicos do vocábulo
Polícia. Partimos da consideração das raízes etimológicas do termo e do exame dos seus
significados gramaticais para explorarmos o conceito de polícia nos sentidos orgânico ou
institucional, material ou funcional e formal, não esquecendo a polícia como força de
segurança nem os serviços de segurança que se orientam para a manutenção da segurança
em Angola. Por este facto, socorremo-nos de exemplos práticos de forma a ilustrar quais as
forças e serviços de segurança que se enquadram nos órgãos e serviços da ordem interna
do Estado, qual a diferença entre força e serviço de segurança, bem como quais os
requisitos que uma força de segurança deve conter para lhe ser atribuída essa natureza.

3
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 3.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 23.

2
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

Vamos, ainda, abordar a questão das autoridades e órgãos de polícia criminal em


Angola, quem são, quais as suas competências e atribuições e que leis os qualificam como
tal.
No terceiro capítulo, abordamos a Polícia como garante da liberdade e da segurança
no Direito Angolano. Desta feita, vamos tratar temáticas como a evolução da Polícia em
Angola, desde o CPPA, que herdamos da PSP até à PNA dos nossos dias. A Polícia na
Constituição da República de Angola, onde vamos de maneira clara interpretar o capítulo
da Polícia segundo uma perspectiva crítica. Vamos, também falar sobre os Órgãos e
Serviços da Ordem Interna do MININT, órgãos que têm a incumbência legal do garante da
ordem e da Segurança Nacional do país. Desta feita, iremos percorrer por todos eles, desde
a PNA, SME, SP e SB, especificando e descrevendo com detalhe a sua caracterização à luz
dos seus regulamentos orgânicos.
Neste estudo, encontram-se esclarecimentos sobre o conceito legal, as atribuições e
as competências destes órgãos.
No mesmo capítulo indicamos as polícias que podem integrar uma teorização do
Direito Policial de Angola, identificamos os serviços de segurança que a lei não qualifica
como polícias, mas que desenvolvem actividades de polícia e contribuem para a
manutenção da segurança nacional.
No último capítulo, percorreremos a temática dos poderes de polícia no ordenamento
jurídico angolano. Traçámos um périplo desde o poder de polícia em Angola (as origens do
termo), as particularidades do poder de polícia, os limites impostos por lei ao poder de
polícia em Angola, os poderes de polícia de segurança pública, as licenças e autorizações
como exteriorização dos poderes de polícia administrativa (explicitando os seus conceitos
e dando exemplos práticos ligados à nossa realidade) e, os poderes de polícia
judiciária/criminal.
É questão fundamental neste capítulo, e constitui um dos objectivos do nosso estudo,
a problemática da desintegração da actividade de investigação criminal na PNA, bem como
as implicações jurídicas da sua desintegração à luz do direito positivo vigente. Quanto a
este assunto percorremos o caminho da Constituição e procurámos perceber tanto as
questões de fundo que estiveram na origem da criação do Serviço de Investigação Criminal
como saber se é legal/constitucional, tendo em conta que foi criado por Decreto
Presidencial, diploma que alterou a orgânica do MININT.

3
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

O método é comummente definido como o caminho para atingir determinado fim.


Ensina MANUELA SARMENTO, “o método científico é um conjunto de procedimentos e
normas que permitem produzir conhecimento”4.
Nesta Dissertação, por força do nosso tema e da área de estudo, será predominante a
pesquisa e a análise crítica da doutrina jurídico-constitucional e jurídico-administrativa,
bem como da legislação em vigor na República de Angola.
Para a realização do nosso trabalho, socorremo-nos do método teórico descritivo5,
apoiado no método dialéctico, que consiste numa definição adequada do pensamento
científico, ou seja, à investigação racional dos conceitos abordados. Analisámos a
bibliografia existente na área do nosso estudo, bem como documentos e regulamentos das
polícias que fazem parte dos Serviços da Ordem Interna do MININT. Servimo-nos do
método exegético para procurar soluções resultantes da interpretação das normas jurídicas.
A nossa revisão bibliográfica estender-se-á além da bibliografia angolana, ir-nos-
emos socorrer principalmente da bibliografia estrangeira, tendo em consideração que são
escassas as obras angolanas que abordam a temática a que nos propusemos estudar.

4
Cfr. MANUELA SARMENTO, Guia Prático sobre a Metodologia Científica para a Elaboração, Escrita e
apresentação de Teses de Doutoramento, Dissertação de Mestrado e Trabalhos de Investigação Aplicada. 3ª
Edição, Lisboa: Lusíada Editora, 2013, p. 7.
5
O método descritivo descreve fenómenos, identifica variáveis e inventaria factos. Cfr. MANUELA
SARMENTO, Guia Prático sobre a Metodologia Científica para a Elaboração,… p. 8.

4
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

CAPÍTULO I. CONCEITO, OBJECTO E FONTES DO


DIREITO POLICIAL ANGOLANO

1. Direito Policial e Direito da Polícia


O Estado6 é entendido como uma entidade com poderes de soberania com a
finalidade de governar um povo dentro de uma área territorial delimitada. Para SOUSA
LARA Estado significa “nação politicamente organizada por leis próprias; terras ou países,
sujeitos à mesma autoridade ou jurisdição; conjunto de poderes políticos de uma nação”7.
Nesta ordem de ideia, o Estado tem fins8 específicos, que o legitimam e sustentam a sua
existência, sendo uma das suas principais funções garantir a segurança9, sendo esta
desenvolvida por corpos de polícia, integrados na Administração Pública do mesmo.
Hodiernamente o Estado caracteriza-se pelos seus ideais de Direito e Democracia,
em que todas as suas instituições, órgãos, agentes e cidadãos devem subordinação à
Constituição e às Leis, podendo rejeitar o cumprimento de ordens que emanam de qualquer
poder e autoridade exercidas por forma ilegal, absoluta, ilógica, desconforme ou
incontrolável.
Ao falarmos em Administração Pública pensamos logo na ideia de um conjunto de
necessidades da colectividade que se pretendem ver satisfeitas por serviços próprios com
essa finalidade.
A Administração Pública pode ser definida em duplo sentido, segundo JOÃO
CAUPERS, em sentido orgânico é “o conjunto de órgãos, serviços e agentes do Estado e
demais organizações públicas que asseguram, em nome da colectividade, a satisfação
6
A denominação de Estado tem origem no latim “status”, que significa modo de estar, situação, condição
etc., aparece pela primeira vez em “O Príncipe”, livro escrito pelo célebre diplomata e militar Nicolau
MAQUIAVEL em 1513, cuja primeira edição foi publicada postumamente, em 1532.
7
Crf. ANTÓNIO DE SOUSA LARA, Ciência Política - Estudo da Ordem e da Subversão, 5.ª Edição, Lisboa:
Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, 2009, p. 307.
8
Ensina ANTÓNIO DE SOUSA LARA que o Estado nasce em função dos fins que a doutrina classicamente lhe
atribui, a saber: a segurança, a justiça e o bem-estar económico e social. Crf. ANTÓNIO DE SOUSA LARA,
Ciência Política - Estudo da Ordem e da Subversão, … p. 355.
9
Na perspectiva de ARMANDO CARLOS ALVES a Segurança “é condição adquirida quando determinadas
notícias, material, pessoal, actividades e instalações estão a ser protegidas contra espionagem, subversão,
sabotagem e terrorismo, bem como contra o seu extravio ou divulgação não autorizada”. A segurança é um
bem social e é uma questão de Estado. Sem ela não há desenvolvimento nem liberdade. Dado o facto de a
segurança ser um factor da liberdade, a segurança é uma condição da democracia.
Um conceito moderno de segurança deve implicar a ultrapassagem de visões limitadas ou apenas sectoriais,
apresenta-se numa perspectiva de serviço público; e caracteriza-se por ser largamente abrangente e tratado
em termos multidisciplinares. Cfr. ARMANDO CARLOS ALVES, Introdução à Segurança, Lisboa: Edição da
Revista da Guarda Nacional Republicana, 2010, pp. 31-137. Sobre o assunto ver ainda as novas perspectivas
de segurança de MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Segurança – Um Tópico Jurídico em Construção, I.ª
Edição, Lisboa: Âncora Editora, Maio, 2013.

5
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

disciplinada, regular e contínua das necessidades colectivas de segurança, cultura e bem-


estar”10; num outro sentido, o material ou funcional, a administração pública é entendida
como o “conjunto de acções e operações desenvolvidas pelos órgãos, serviços e agentes do
Estado e demais organizações públicas ocupados em assegurar, em nome da colectividade,
a satisfação disciplinada, regular e contínua das necessidades colectivas de segurança,
cultura e bem-estar”11. Assim sendo, é na Administração Pública que podemos englobar os
corpos de polícia.
Sendo os corpos de Polícia parte da Administração Pública do Estado, podemos
depreender que o Direito Policial e Direito da Polícia são parte integrante do Direito
Administrativo12, ficando ao nosso critério analisar num próximo estudo se estamos diante
de um Direito Administrativo Geral, Militar, ou, até mesmo, Especial.
Essas funções de garante da segurança e defesa dos direitos e liberdades
fundamentais dos cidadãos, dependem fortemente da actividade da polícia que consiste,
principalmente, em garantir “(…) a convivência pacífica de todos as cidadãos de tal modo
que o exercício dos direitos de cada um não se transforme em abuso e não ofenda, não
impeça, não perturbe o exercício de direitos alheios”13.
Espelhada a ideia geral sobre a actividade da polícia, cabe-nos defini-la enquanto
instituição. Ensina MARCELLO CAETANO que a Polícia “é o modo de actuar da autoridade
administrativa que consiste em intervir no exercício das actividades individuais
susceptíveis de fazer perigar interesses gerais, tendo por objecto evitar que se produzam,
ampliem ou generalizem os danos sociais que as leis procuram prevenir14”. É perceptível
que esta definição é desactualizada e não se adequa às actividades desenvolvidas por uma
polícia sediada num Estado Democrático e de Direito, pois, a actividade da polícia hoje vai
mais além da prevenção de perigos gerais que afectam interesses gerais da colectividade15.
Esta definição foi idealizada e posta em prática num passado não muito longínquo em que

10
Crf. JOÃO PEDRO BARROSA CAUPERS, Introdução ao Direito Administrativo, 11.ª Edição, Lisboa: Âncora,
2013, p. 28.
11
Crf. JOÃO PEDRO BARROSA CAUPERS, Introdução ao Direito Administrativo, … p. 28.
12
Ensina JOÃO PEDRO BARROSA CAUPERS que o Direito Administrativo é o ramo do direito público
constituído pelo sistema de normas jurídicas que regulam a organização, o funcionamento e o controlo da
Administração Pública e as relações que esta, no exercício da actividade administrativa de gestão pública,
estabelece com outros sujeitos de direito. Crf. JOÃO PEDRO BARROSA CAUPERS, Introdução ao Direito
Administrativo, 11.ª Edição, Lisboa: Âncora, 2013, p. 47.
13
Crf. MARCELLO CAETANO, Princípios Fundamentais do Direito Administrativo, 1.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 1996, p. 267.
14
Crf. MARCELLO CAETANO, Manual de direito Administrativo, Volume II, 10.ª Edição, 7.ª Reimpressão,
Coimbra, 2004, p. 1150.
15
Cfr. Seguimos a posição de MANUEL VALENTE, que faz uma adequação do conceito de polícia à
modernidade. Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 4.ª Edição,
Coimbra: Almedina, 2014, pp. 53-54.

6
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

vigorava um regime ditatorial, contudo não nos queremos demarcar da história e, ao falar
de polícia sentimos a necessidade de trazer à ribalta os ensinamentos de MARCELLO
CAETANO, que na altura foram de uma grande evolução cientifico-jurídica.
Nos Estados modernos as funções e actividades da polícia vão muito além das
previstas na definição supra citada. Segundo MANUEL VALENTE “a actividade jurídico-
administrativa e jurídico-criminal de uma polícia pós-moderna se deve basear em primeira
linha na prevenção do perigo – que antecede a prevenção do risco e do dano. À polícia
hodierna cabe-lhe evitar que o perigo possa surgir e gerar o risco e o posterior dano
social”16.
Ainda de acordo com este Autor, a polícia “é a actividade de natureza executiva –
ordem e tranquilidade públicas e administrativa –, dotada de natureza judiciária no quadro
de coadjuvação e de prossecução de actos próprios no âmbito da legislação processual
penal – cuja função jurídico-constitucional se manifesta na concreção da defesa da
legalidade democrática, da garantia da segurança interna e da defesa e garantia dos direitos
do cidadão e da prevenção criminal quer por vigilância quer por prevenção stricto sensu,
podendo para cumprimento daquelas funções fazer uso da força – coacção – dentro dos
limites do estritamente necessário e no respeito pelo Direito e pela pessoa humana”17.
A actuação da polícia nos Estados modernos, os democráticos e de direito, deve ser o
rosto dos princípios constitucionais em vigor. Ela “encontra-se desta forma, subordinada
aos pilares do Estado democrático e de direito: deve ser a promotora e defensora da
dignidade da pessoa humana e deve agir como o rosto da vontade do povo para que seja
construtora de um Estado de direitos humanos, assente na liberdade, na justiça e na
solidariedade”18.
Definido que está o conceito de Polícia, é entendimento comum, que esta polícia
(corpos e serviços de polícia), enquanto organismos integrantes da Administração Pública
do Estado, que cumprem o seu fim de segurança têm de ter legitimidade legal, bem como
normas e regulamentos que legitimam a sua organização interna e respectiva actividade
policial. É aqui que surge o Direito Policial ou Direito de Polícia, que segundo MANUEL
VALENTE tem os elementos policiais como destinatários na qualidade de cidadãos, em que
compreende “os princípios gerais, as normas regulares da actuação e da conduta policial na

16
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial,… p. 53.
17
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, …p. 106.
18
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE. Os Desafios Emergentes de uma Polícia de Um Estado de
Direito Democrático, In Politeia - Revista do Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna,
Lisboa, ISCPSI, coord. Manuel Valente. 2012, p. 257.

7
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

prossecução das suas atribuições e competências na defesa da legalidade democrática, na


garantia da segurança interna e dos direitos dos cidadãos, cujos destinatários se encontram
indeterminados e indefinidos no espaço do território nacional ou da União Europeia e, até
mesmo, internacional”19.
Da definição de MANUEL VALENTE entende-se que os destinatários do Direito
Policial são todos os membros da comunidade, incluindo os elementos policiais na
qualidade de cidadãos, além de que, aborda o conceito numa perspectiva abrangente, não
cingindo-se apenas no campo nacional, mas virado para a comunidade europeia e
internacional, assim como não se esgota no direito administrativo, mas abrange todas as
ordens jurídicas.
O Autor entende que o Direito da Polícia “compreende os princípios, as normas
positivas, as decisões judiciais, as decisões administrativas e a doutrina aplicáveis
internamente aos elementos pertencentes à organização Polícia”20. Estas podem ser
diferentes de acordo com a natureza da polícia em questão, Polícia Nacional de Angola
(PNA); Serviço de Migração e Estrangeiros (SME) ou Serviços Prisionais (SP).
Para JOÃO RAPOSO “(…) a função policial é por lei, posta a cargo de diferentes
serviços ou corpos, com competência especializada em razão da matéria e do espaço
territorial onde exercem a sua actividade (…)”21. Todas a normas que organizam esses
serviços, elencam as suas tarefas, definem os seus órgãos e lhes atribuem poderes fazem
parte do Direito Policial.
Segundo este Autor o Direito Policial “é o ramo do Direito Administrativo geral ou
comum que regula a organização policial e a actividade dos corpos de polícia, com vista à
satisfação do interesse público da segurança interna, à garantia do pleno exercício dos
direitos e liberdades e ao cumprimento da lei”22.
Segundo MARCO DI RAIMONDO, citado por JOÃO RAPOSO, o Direito Policial pode ser
entendido como “o conjunto dos princípios e das normas que no âmbito do direito público
definem a organização e a actividade dos organismos destinados à tutela da ordem e da
segurança pública, nas suas relações com cidadãos e a liberdade destes, naqueles
particulares sectores da vida económica social que exigem intervenções pontuais, a fim de

19
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 3.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 29.
20
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, …, 3.ª Edição, p. 28.
21
Cfr. JOÃO RAPOSO, Direito Policial – I, ICPOL – Colecção do Centro de Investigação do ISCPSI,
Coimbra: Almedina, 2006, p. 17.
22
Cfr. JOÃO RAPOSO, Direito Policial – I, … p. 17.

8
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

prevenir os perigos que ameaçam a segurança pública e eliminar as perturbações que


prejudicam a ordem pública”23.
Na perspectiva de JOÃO RAPOSO e MARCO DI RAIMONDO, o Direito Policial é um
ramo do Direito Administrativo; que regula a organização e a actividade dos corpos e
serviços de Polícia; e, tem como finalidade a prossecução do interesse público. Conquanto,
Manuel VALENTE considera que o Direito Policial não se esgota na esfera do Direito
Administrativo, pois defende, como se pode aferir dos seus conceitos de polícia e de direito
policial, que abarca toda a ordem jurídica como um todo fundante de actividade de polícia:
defesa da legalidade democrática, defesa e garantia da segurança interna e defesa da
garantia de todos os direitos do cidadão24.
Encontradas as linhas orientadoras que definem Direito Policial na perspectiva dos
três autores vamos defini-lo, adequado à realidade vigente na legislação angolana.
Entendemos que o Direito policial é o conjunto de normas jurídicas com funções de
regulação e organização de toda a actividade e procedimento policial, tendo em conta a
prossecução do interesse da colectividade, garantindo a segurança nacional, a tranquilidade
pública e o respeito pelo regular exercício dos direitos, liberdades e garantias fundamentais
dos cidadãos.
MANUEL VALENTE25 versa sobre o Direito Policial de forma autónoma ao Direito da
Polícia, ao contrário, JOÃO RAPOSO entende que o Direito Policial aglutina em si mesmo
não só o Direito de Polícia, como também o Direito da Polícia, ou seja, entende o Direito
Policial numa perspectiva orgânico-funcional.
Para JOÃO RAPOSO o “Direito Policial não se esgota ao regime da actividade policial:
nele cabem também as normas que regulam a organização e o funcionamento dos corpos
policiais existentes – ou seja, o Direito Policial ocupa-se ainda da polícia enquanto
instituição”26.
Analisados tanto o conceito de Direito de Polícia ou Direito Policial como o de
Direito da Polícia, bebemos da opinião de MANUEL VALENTE, que faz uma clara distinção
das matérias a abordar tanto por um, como por outro. Entendemos que o Direito de Polícia
ou Direito Policial não é Direito da Polícia. Ambos abordam matérias específicas e

23
Cfr. JOÃO RAPOSO, Direito Policial – I, … p. 20.
24
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Do Ministério Público e da Polícia: Prevenção Criminal e
Acção Penal Como Execução de uma Política Criminal do ser Humano, Lisboa: UCP, 2013, pp. 276-281.
25
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 4.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 33.
26
Cfr. JOÃO RAPOSO, Direito Policial – I, ICPOL – Colecção do Centro de Investigação do ISCPSI,
Coimbra: Almedina, 2006, p. 17.

9
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

diferentes, tendo cada um o seu campo de acção, pese embora se vão cruzando, tendo em
conta que há interesses que se vão verificando, independentemente daquele que se lhe
destina a norma jurídica em questão27.
Expostos os argumentos, vamos centrar o nosso estudo no âmbito do Direito Policial,
e não Direito da Polícia, na medida em que nos propusemos abordar a temática do Direito
Policial numa perspectiva informadora e mediatizada pela jurisprudência e pela doutrina,
que como dissemos já anteriormente, não são fontes imediatas de Direito nem de Direito
Policial, mas sim, são fontes de hermenêutica, logo são fontes mediatas de Direito e,
consubstancialmente, fonte de Direito Policial.
Neste nosso trabalho de investigação científica em que pretendemos reflectir sobre o
Direito Policial em Angola, vamos fazê-lo maioritariamente num “(…) sentido estrito, ou
seja, aquele que confere legalidade e legitimidade às suas acções desenvolvidas para a
materialização da sua tarefa, e não sobre o Direito da Polícia”28.

2. Direito Policial como Direito Público


O Direito Policial, como um conjunto de normas jurídicas com funções de regulação
e organização de toda a actividade e procedimento policial, tendo em conta a prossecução
do interesse da colectividade, garantindo a segurança nacional, a tranquilidade pública e o
respeito pelo regular exercício dos direitos, liberdades e garantias fundamentais dos
cidadãos, impõe que se determine o seu verdadeiro domínio, delimitando-o dos outros
ramos do Direito.
É entendimento doutrinário que a ordem jurídica é única, porém o seu estudo implica
que se faça uma divisão clara dos sectores. Esses sectores são chamados tradicionalmente
de ramos do Direito, onde o conteúdo de cada um desses ramos é estruturado tendo em
conta os seus princípios, o que decerto permite um estudo profundo e coerente de todas as
matérias que abarca.
Em Roma, surgiu a necessidade de distinguir os ramos do Direito, sendo necessário
para isso fazer-se uma divisão de todo o direito em público e privado, que é ainda hoje
fundamental. Essa afirmação, segundo JOSÉ ASCENSÃO, tem por base um trecho de

27
Sobre este assunto MANUEL VALENTE considera que “Direito de Polícia ou Direito Policial tem uma maior
amplitude, tem o seu objecto próprio e, não obstante ser subsidiário em certas situações, tem natureza
originária”. Tendo em atenção ao exposto não nos afiguram dúvidas da independência do Direito Policial em
relação ao Direito da Polícia. Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial,
4.ª Edição, Coimbra: Almedina, 2014, p. 33.
28
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 3.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, pp. 29-30.

10
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

ULPIANO contido em D. 1. 1. 1. 2. “Publicum ius est quod and statum rei romanae spectat,
privatum quod ad singulorum utilitatem”29. Hodiernamente existem inúmeros critérios que
ajudam a distinguir quando estamos diante de uma norma de direito público ou privado: o
critério do interesse; o critério da natureza dos sujeitos e o da posição dos sujeitos.
Da afirmação de ULPIANO entende-se que estamos diante de uma norma do direito
público, quando tivesse como fim a tutela de um interesse público da colectividade; e
estaríamos diante de uma norma do direito privado quando, o seu fim visasse satisfazer
interesses individuais dos particulares. Esse critério de interesses é criticado por CARLOS
DA MOTA PINTO, afirmando mesmo que esse não devia ser o critério perfilhado e justifica
acentuando primeiramente que “todo o direito – público e privado – visa proteger
simultaneamente interesses públicos e interesses particulares”30.
As normas do direito privado não são apenas aplicadas na resolução de situações de
interesse dos particulares, mas, também, em situações inerentes a interesses públicos da
colectividade.
Em seu entender, o critério supra citado só se poderá “manter, portanto, se procurar
exprimir apenas uma nota tendencial: o direito público tutelaria predominantemente (não
exclusivamente) interesses da colectividade e o direito privado protegeria
predominantemente (não exclusivamente) interesses dos particulares”31.
JOSÉ ASCENSÃO afirma que este critério é insustentável e que “não há nenhuma linha
radical de fractura entre o interesse público e o interesse privado, ao contrário do que
pretendem sectores liberais”32. É notório que o interesse público corresponde, ainda que de
maneira indirecta, interesses dos particulares, e, o faz, na medida em que há um interesse
público em resolver os interesses dos particulares.
Tendo em conta esse critério, o Direito Policial seria tanto Direito Público como
Direito Privado, na medida em que assumia-se como o primeiro se as suas normas
tutelassem interesses essencialmente colectivos e como o segundo se as suas normas
tutelassem interesses essencialmente dos particulares. Portanto, não podemos colocar o
Direito Policial como ramo do direito público à luz do critério do interesse, pois não é o
mais adequado para o efeito.

29
Crf. JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO, O Direito – Introdução e Teoria Geral, 13.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2005, p. 333.
30
CARLOS ALBERTO DA MOTA PINTO, Teoria Geral do Direito Civil, 4.ª Edição, Coimbra: Coimbra Editora,
2005, p. 36.
31
Idem, p. 37.
32
Crf. JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO, O Direito – Introdução e Teoria Geral, 13.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2005, p. 334.

11
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

Para MANUEL VALENTE “todo o Direito é hoje e simultaneamente, direito público e


direito privado, porque quer um quer outro protegem interesses públicos e privados. (…)
Existem normas de direito privado que tutelam interesses públicos, cuja garantia e defesa
também cabem à Polícia, e fazem parte da actividade jurídico-administrativa e jurídico-
criminal policial”33.
Ensina CARLOS DA MOTA PINTO “que – pode dizer-se – todas as normas, por cima
dos interesses específicos e determinados que visam, miram um fundamental interesse
público: o da realização do Direito ou, se quisermos, da segurança e da rectidão”34.
Outro critério que também não se mostra profícuo para nos levar a enquadrar o
Direito Policial como ramo do Direito Público é o da natureza dos sujeitos da relação
jurídica em questão, seja de supremacia ou de subordinação, levando em consideração que
“a equivalência ou posição de igualdade dos sujeitos das relações jurídicas é normalmente
característica da relação disciplinada pelo direito privado e a supremacia e subordinação
característica normal de direito público”35.
Este critério inspira-se na ideia de ULPIANO, que seria “público o direito que
regulasse situações em que interviesse o Estado, ou em geral qualquer ente público;
privado, o direito que regulasse as situações dos particulares”36.
A actividade policial não deve ser vista como uma personificação das funções do
Estado em seu nome, mas também, em nome do povo, pois, não é apenas receptora de
normas do direito público, é também de normas do direito privado. Inúmeras são as
situações que a polícia não actua em posição de supremacia em relação aos cidadãos e
estes numa posição de subordinação à polícia. A polícia fica despida do seu ius imperii
numa situação de contrato de prestação de serviços com particulares, em que é regida por
normas do direito privado. Nestes casos em particular, a Polícia fica em pé de igualdade
com o ente privado. Como ensina MANUEL VALENTE as “normas jurídicas a que a polícia
está sujeita e por que se rege nem sempre lhe dão supremacia sobre o cidadão e respectiva
subordinação por parte deste”37. Podemos notar que não é pelo facto dos entes públicos
celebrarem contrato com entes privados [v. g., compra e venda], que as normas a serem

33
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 3.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, pp. 29-30.
34
Cfr. CARLOS ALBERTO DA MOTA PINTO, Teoria Geral do Direito Civil, 4.ª Edição, Coimbra: Editora, 2005,
p. 36.
35
Cfr. CARLOS ALBERTO DA MOTA PINTO, Teoria Geral do Direito Civil,… p. 39.
36
Crf. JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO, O Direito – Introdução e Teoria Geral, 13.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2005, p. 334.
37
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 3.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 35.

12
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

aplicadas deixam de ser normas de Direito Privado e passam a ser normas de Direito
Público.
Neste critério é notório que a natureza dos sujeitos envolvidos na relação jurídica
não é suficiente para aferirmos se estamos diante de uma norma de Direito Público ou
Privado, o que “não delimita correctamente a integração do Direito Policial no Direito
Público38”.
O critério da posição dos sujeitos da relação jurídica é o que reúne hoje o consenso
da maioria da doutrina, pois assenta na qualidade dos sujeitos intervenientes nas relações
jurídicas tuteladas quer pelas normas do direito público ou pelas normas do direito privado,
dependentemente da posição em que estiverem os sujeitos intervenientes na relação
jurídica em causa.
Este é também o critério que melhor nos permite distinguir Direito Público do
Direito Privado com elevada precisão e segurança.
Este critério vem determinar que Direito Público é aquele que segundo o sentido da
definição de ULPIANO “(…) constitui e organiza o Estado e outros entes públicos e regula a
sua actividade como entidade dotada de ius imperii; Direito Privado é o que regula as
situações em que os sujeitos estão em posição de paridade”39.
Nesse critério o direito privado vai regular apenas as relações jurídicas estabelecidas
entre entes particulares ou entre entes particulares e o Estado ou outros entes públicos, em
que os últimos actuam despidos dos seus poderes de soberania (ius imperii): v.g., a polícia
arrenda um imóvel para instalar uma esquadra de polícia; para tal compra materiais de
construção a um particular etc.; nesses casos em concreto, a polícia enquanto departamento
do Estado está a actuar em pé de igualdade com o particular, não tem poderes nenhuns e
como está despida de qualquer poder se soberania essa relação jurídica ocorre no âmbito
do direito privado40. Por conseguinte, se a relação não for realizada dentro das
características supra citadas estamos diante de uma norma do direito público, sendo este
ramo integrado pelas normas que “estruturam o Estado e outras pessoas colectivas dotadas
de qualidades ou prerrogativas do poder estadual (…)”41.

38
Idem, p. 35.
39
Crf. JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO, O Direito – Introdução e Teoria Geral, 13.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2005, p. 335.
40
Quanto a esta matéria, ver MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 4.ª
Edição, Coimbra: Almedina, 2014, pp. 35-40.
41
Cfr. CARLOS ALBERTO DA MOTA PINTO, Teoria Geral do Direito Civil, 4.ª Edição, Coimbra: Editora, 2005,
p. 40.

13
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

A Polícia em toda a sua actividade, quer jurídico-administrativa quer jurídico-


criminal, está, regra geral, vestida do seu poder de ius imperii, na medida em que actua na
defesa dos direitos liberdades e garantias fundamentais e da legalidade democrática,
garantindo a segurança nacional, através de normas que grosso modo constituem todo o
Direito Policial. Assim sendo, “as normas que lhe conferem esta qualidade ou posição na
relação jurídica estabelecida com o cidadão, que lhe legitimam a restrição limitada
constitucional e legalmente dos direitos e liberdades do cidadão, são de Direito Público e
não de Direito Privado”42.
Acresce MANUEL VALENTE que, no “âmbito do Direito Policial e estudadas na nossa
Teoria Geral do Direito Policial são as designadas relações jurídico-administrativas ou
jurídico-criminais de momento, que se prendem com a necessidade de intervenção por
iniciativa própria ou por solicitação de outrem (…)”43.
Para o Autor, a Polícia, na sua actividade jurídico-administrativa e jurídico-criminal,
está, em regra, dotada de atribuições e investida desses poderes especiais – de ius – imperii
– como defensora da legalidade democrática, como defensora e garante da segurança
interna e dos direitos dos cidadãos.
Para MANUEL VALENTE as “normas que lhe conferem esta qualidade ou posição na
relação jurídica estabelecida com o cidadão, que lhe legitimam a restrição limitada
constitucional e legalmente de direitos e liberdades do cidadão, são de Direito Público e
não de Direito Privado. Essas normas compõem o grosso se não todo o Direito Policial ou
do Direito de Polícia. Neste sentido, o Direito Policial é Direito Público”44.

3. O Objecto do Direito Policial


O Direito Policial é uma disciplina que, nos dias de hoje, devia merecer maior estudo
e aprofundamento pelas Instituições de ensino superior, mormente as de ensino das
ciências jurídicas e policiais. Esse estudo, além de incentivar cada vez mais a investigação
dessas matérias deve ser também um contributo à melhoria da ordem jurídica angolana. O
estudo do Direito Policial nas Instituições de ensino policial vem proporcionar um aumento
de competências indispensáveis para a actividade da polícia em Estados Democráticos e de
Direito, como é o caso de Angola.

42
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 3.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 37.
43
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 4.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, pp. 39-40.
44
Idem, pp. 39-40.

14
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

Manter a defesa da legalidade democrática, a manutenção da ordem e da


tranquilidade públicas, o respeito pelo regular exercício dos direitos e liberdades
fundamentais dos cidadãos, bem como a prevenção à delinquência e ao combate à
criminalidade são funções da Polícia Nacional de Angola. Essas funções transmitem-nos
desde logo a ideia de que a Polícia é um pilar fundamental na consolidação de Angola
como um Estado democrático e de direito.
Em Angola, não se verificam muitos estudos relevantes sobre a Polícia em si,
enquanto objecto do Direito Policial. Vão surgindo alguns estudos embrionários, mas
raros. É importante que caminhemos para a concretização de estudos da Polícia como
objecto de um ramo do Direito Público.
Não se afiguram dúvidas acerca do objecto de estudo do Direito Policial. Afirma
MANUEL VALENTE que a “Teoria Geral do Direito Policial deve ter por objecto de estudo
toda a actividade jusinternacional, jusconstitucional e jusordinária (segurança,
administrativa e criminal) de polícia de modo à criação de uma doutrina fundante de uma
ciência juspolicial que se encontre e manifeste em toda e qualquer polícia considerada
material, orgânica e formalmente”45.
Como notamos, o Autor tem uma visão jus naturalista e material do Direito que
assenta na ratio iuris.
Para JOÃO RAPOSO, o objecto do Direito Policial não se esgota na actividade policial,
enquadra-se ainda no objecto deste direito, as normas que regulam a organização e o
funcionamento dos corpos policiais existentes46.
Em suma, o objecto do Direito policial em Angola é a Polícia enquanto instituição de
regulação e manutenção da ordem e tranquilidade públicas, investigação criminal e, “(…)
garante da liberdade do cidadão face às ofensas ilícitas concretizadas e/ou produzidas quer
por outrem quer pelo próprio Estado”47.

4. As Fontes do Direito Policial Angolano


As normas do Direito são provenientes das suas fontes. Para se designar um conjunto
de normas que lhe interessam como objecto, o saber jurídico tem usado a expressão “fontes

45
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 3.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 25.
46
Cfr. JOÃO RAPOSO, Direito Policial – I, ICPOL – Colecção do Centro de Investigação do ISCPSI,
Coimbra: Almedina, 2006, p. 17.
47
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 4.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 49.

15
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

de direito, querendo com ela significar – pelo menos num dos seus sentidos – as vias de
manifestação ou de formação do direito num certo ordenamento jurídico”48.
Em sentido teórico jurídico “as fontes do direito são modos de formação e revelação
de regras jurídicas”49.
Numa perspectiva histórica, as fontes do Direito podem ser definidas como as
origens históricas de um determinado sistema jurídico, bem como as influências que sofreu
ao longo dos tempos e que determinaram o seu modo de ser e a sua estrutura face ao
ordenamento jurídico inserido50.
Tendo em conta a ordem jurídica como uma realidade histórica é imprescindível que
a regra jurídica que a exprime corresponda a uma génese, historicamente ocorrida. O que
pretendemos referir quando falamos sobre fontes de direito é o modo como se formam e se
manifestam as normas e regras jurídicas em questão; tendo ainda por vezes que nos ocupar
com o entendimento como modo de formação51.
JOSÉ ASCENSÃO entende que a fonte representa uma imagem, tão vasta que é capaz
de se adaptar às várias realidades jurídicas. Fala-se em “fontes do Direito” e, estas podem
ser nos seguintes sentidos: “histórico; instrumental; fonte sociológico ou material; orgânico
e técnico jurídico ou dogmático”52.
Sendo o Direito Policial um ramo do Direito Público, as suas fontes não diferem das
outras disciplinas do direito. MANUEL VALENTE considera que constituem fontes imediatas
ou directas do Direito Policial “a lei – direito escrito – e o costume – direito
consuetudinário -, sendo que são fontes mediatas ou indirectas a jurisprudência e a
doutrina”53.
DIOGO FREITAS DO AMARAL elenca quatro fontes do Direito e o faz numa perspectiva
hierárquica, enumerando da seguinte maneira: costume; lei; jurisprudência e a doutrina54.

48
Quanto a esta temática das fontes de direito, afirma ainda que neste sentido, a expressão fontes de direito
aponta para uma certa pré-compreensão do direito. Cfr. ANTÓNIO MANUEL HESPANHA, O Caleidoscópio do
Direito – O Direito e a Justiça nos Dias e no Mundo de Hoje, 2.ª Edição, Coimbra: Almedina, 2009, p. 530.
49
Crf. JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO, O Direito – Introdução e Teoria Geral, 13.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2005, p. 256.
50
Cfr. ANTÓNIO MANUEL HESPANHA, O Caleidoscópio do Direito – O Direito e a Justiça nos Dias e no
Mundo de Hoje, 2.ª Edição, Coimbra: Almedina, 2009, p. 530.
51
Crf. JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO, O Direito – Introdução e Teoria Geral, 13.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2005, p. 51.
52
Crf. JOSÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO, O Direito – Introdução e Teoria Geral,…p. 51-53.
53
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 3.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 39.
54
Cfr. DIOGO FREITAS DO AMARAL, Sumário de Introdução ao Direito, 1.ª Edição, Lisboa: Faculdade de
Direito da Universidade de Lisboa, 1997, p. 30.

16
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

Autores há, que o fazem de maneira diferente, colocando a lei no topo da hierarquia
das fontes, pois, muitas das vezes as fontes legislativas têm predomínio em relação a
outras. É sabido que “o direito é constituído, essencialmente, pelas normas jurídicas
expressas, formalmente apresentadas como tais (v. g., as leis)”55. Devendo por este facto as
demais fontes do direito subordinarem-se à lei, num sentido que só são aceites e vigoram
no ordenamento jurídico angolano mediante submissão à lei e nos casos e circunstâncias
por ela prevista.
GERMANO MARQUES DA SILVA vai mais além e entende que existem outras fontes de
direito, caso dos princípios fundamentais de Direito, alertando que a sua admissibilidade
tem sido causa de discussão na doutrina. Estes princípios “enformam o direito positivo,
dando-lhe uma direcção, um sentido, e são o fundamento da sua validade e também que,
chame-se o que lhe chamar (direito natural, princípios da justiça ou simplesmente
princípios fundamentais do Direito) esses princípios fazem parte do direito, são Direito”56.
MANUEL VALENTE segue a mesma linha de pensamento e enquadra também os
princípios fundamentais do direito no elenco das fontes do Direito Policial e a razão de ser
prende-se com o facto de os princípios “não obstante serem apenas direito objectivo e não
direito positivo até consagração em fonte formal, como fontes do Direito Policial, porque
não só o legitimam, como o enformam e o validam na materialização da actuação jurídico-
administrativa e jurídico-criminal da Polícia”57.
De realçar, que as fontes do Direito Policial no entender de MANUEL VALENTE
podem ser “internas – lei, costume, jurisprudência e doutrina – e externas – tratado,
costume de organismos internacionais e doutrina”58.
Sufragando esta posição, consideramos que, quanto à lei, ou seja, todo o direito
positivo em vigor na República de Angola, seja supraconstitucional, constitucional ou
infraconstitucional é fonte de Direito Policial e não se afiguram dúvidas quanto a isto. A
constitucionalização ou legitimidade da actividade policial em Angola encontra
fundamento de ser no art.º 210.º da Constituição da República de Angola que vem atribuir
as seguintes competências:

55
Cfr. JOSÉ JOÃO GONÇALVES DE PROENÇA, Introdução ao Estudo do Direito, Lisboa: Universidade Lusíada,
1995, p. 29.
56
Cfr. GERMANO MARQUES DA SILVA, Introdução ao Estudo do Direito, 4.ª Edição, Lisboa: Universidade
Católica, 2012, pp. 93-95.
57
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 3.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 39.
58
Idem, p. 39.

17
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

«1. A Polícia Nacional é a instituição nacional policial, permanente, regular e


apartidária, organizada na base da hierarquia e da disciplina, incumbida da protecção e
asseguramento policial do País, no estrito respeito pela Constituição e pelas leis, bem como
pelas convenções internacionais de que Angola seja parte.
2. A Polícia Nacional compõe-se exclusivamente de cidadãos angolanos, sendo a
sua organização única para todo o território nacional.
3. A lei regula a organização e o funcionamento da Polícia Nacional»59.
O costume é, também, fonte de direito e, costuma ser definido “como uma prática
social constante, acompanhada de sentimento ou convicção da obrigatoriedade desse
comportamento por corresponder a uma norma jurídica”60. O costume só deve ser
entendido como fonte de direito mediante norma jurídica vigente que o impõe determinado
comportamento.
O costume, enquanto fonte do Direito Consuetudinário tem duas razões de ser, como
afirma GERMANO MARQUES DA SILVA:
O corpus e o animus, sendo que o corpus “traduz-se na observância generalizada e
uniforme, com certa duração de determinado padrão de conduta e, o animus, é a convicção
de se estar a obedecer a uma regra geral e abstracta obrigatória, a uma norma preexistente
(opinio iuris vel necessitis)”61.
O costume como fonte de direito, é, como tal, desde logo fonte do Direito Policial
“sob pena de enrijecermos a legalidade em detrimento da justiça justa e de uma aplicação
do direito de acordo com o tempo e o espaço a que o mesmo diz respeito”62.
A jurisprudência é entendida como a decisão dos tribunais na resolução de
determinados casos concretos, tendo em conta que são os tribunais os órgãos responsáveis
pela aplicação do direito. “E quando se refere a jurisprudência como fonte do Direito
referimo-nos predominantemente à actividade dos tribunais”63.

59
A respeito desse assunto ver art.º 210.º da lei n.º 6/05, de 10 de Agosto, que aprovou a Constituição da
República de Angola.
60
Cfr. GERMANO MARQUES DA SILVA, Introdução ao Estudo do Direito, 4.ª Edição, Lisboa: Universidade
Católica, 2012, p. 126.
61
Idem, p. 126.
62
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 3.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 40.
63
Cfr. GERMANO MARQUES DA SILVA, Introdução ao Estudo do Direito, 4.ª Edição, Lisboa: Universidade
Católica, 2012, p. 130.

18
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

A doutrina é uma forma de revelação do direito. Ela é constituída sobretudo pelos


pareceres e opiniões de juristas renomados. Ela “consta de estudos jurídicos de diversa
espécie (tratados, manuais, artigos, anotações, pareceres, etc.)”64.
Ambas constituem as chamadas fontes mediatas ou indirectas do Direito Policial.
Elas, enquanto fontes do Direito Policial “revelam o sentido, o alcance e o conteúdo das
normas jurídicas, sendo que a jurisprudência procura integrar lacunas, porque a lei não
prevê tudo”65. Estas fazem parte das chamadas fontes reveladoras do Direito66.

64
Idem, p. 135.
65
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 3.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 41.
66
Quanto a este assunto GERMANO MARQUES DA SILVA entende que há fontes que criam Direito, criam
normas jurídicas, enquanto outras apenas o revelam, clarificam as normas existentes, constituindo por isso
apenas fontes indirectas, mediatas das normas jurídicas, ou seja fontes júris cognoscendi, como lhe
chamavam os romanos. Cfr. GERMANO MARQUES DA SILVA, Introdução ao Estudo do Direito, 4.ª Edição,
Lisboa: Universidade Católica, 2012, p. 92.

19
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

CAPÍTULO II. DOS VÁRIOS SENTIDOS JURÍDICOS


DE POLÍCIA

1. Origem e Conceito do Vocábulo Polícia


O surgimento da Polícia esteve sempre aliado ao Estado e ao cumprimento de um
dos seus principais fins: o de garante da segurança. Os homens vivem em sociedade
enquanto comunidade organizada e, como tal, surgiu a necessidade de existência de uma
entidade do Estado que garanta a protecção e segurança da população contra eventuais
ameaças que possam surgir.
Até ao séc. XIX a Polícia era entendida como é a Administração Pública hoje. A
Polícia não era mais do que “toda a acção do príncipe dirigida a promover o bem-estar e a
comodidade dos vassalos”67. Mais tarde este vocábulo passou a ter um significado mais
restrito, quando passou a ser identificado como toda a actividade tendente a assegurar a
defesa da comunidade dos perigos internos que advinham de situações contrárias à ordem e
a segurança públicas68.
Ensina JOÃO RAPOSO que “tanto na linguagem corrente como na linguagem científica
a expressão polícia surge utilizado com vários sentidos”69. Etimologicamente o vocábulo
polícia, na visão deste Autor, encontra raízes na palavra grega politeia como na expressão
latina politia70, associado à ideia de polis que servia para “designar a constituição, o
ordenamento, o regime ou a forma de governo da cidade-estado, incluindo o estatuto dos
cidadãos, que são, dentre os membros desta, aqueles que participam na vida política”71.
Na linguagem corrente, o vocábulo “polícia”, no género masculino é entendido como
agente da autoridade/ – o polícia –, ou seja, é o indivíduo que exerce a actividade de
polícia em benefício da colectividade visando o garante da segurança, ostentando sinais

67
Cfr. Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura. 15.ª Edição. Lisboa: Editorial Verbo, S.A.R.L., 1973, p. 399.
68
Cfr. NORBERTO BOBBIO… GIANFRANCO PASQUINO, Dicionário de Política. 13.ª Edição. Editora: UnB.,
2010, p. 944.
69
Cfr. JOÃO RAPOSO, Direito Policial – I, ICPOL – Colecção do Centro de Investigação do ISCPSI,
Coimbra: Almedina, 2006, p. 21.
70
Cfr. JOÃO RAPOSO, Direito Policial – I, … 2006, p. 21.
71
Relativamente ao assunto Aristóteles escreveu que existem três tipos fundamentais de constituições: a
monarquia ou governo de um só; a autocracia ou governo dos melhores; a democracia ou governo da
multidão. Esta última chama-se politia, isto é, constituição por antonomásia, quando a multidão governa para
o bem de todos. A estes três tipos correspondem outras tantas degenerações quando o governo descuida o
bem comum em favor do bem próprio. Cfr. NICOLA ABBAGNANO, História da Filosofia, Volume I, Lisboa:
Editorial Presença, 1969, p. 292.

20
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

exteriores que o tornam facilmente identificáveis, como o uniforme de serviço, distintivos,


platinas e o porte de uma arma de fogo e demais materiais inerentes à sua actividade72.
Por outro lado, quando utilizamos a palavra polícia no feminino, pensa-se nas
corporações que desenvolvem as actividades de segurança nacional a (PNA), trata-se do
serviço da Administração Pública com funções de natureza policial.
Por conseguinte, o vocábulo polícia, é muitas vezes utilizado para “designar, não os
agentes da autoridade nem os serviços de polícia, mas a actividade desenvolvida por uns e
outros, com o fim de garantir a tranquilidade e a segurança públicas, condições necessárias
ao pleno exercício dos direitos, liberdades e garantias”73.
A polícia tem a missão de intervir em situações que se verificam actividades
individuais susceptíveis de colocar em perigo interesses gerais da colectividade. Apenas
situações que possam colocar em perigo os interesses gerais da colectividade interessam à
polícia, pois, ela não se imiscui em situações da vida privada das pessoas. “Tudo que é
particular escapa do domínio policial enquanto não crie o risco de uma perturbação da
ordem, da segurança, da moralidade, da saúde públicas”74.
Para MARCELO CAETANO, a normatização da actividade da polícia, bem como o seu
objecto75 e finalidade foi consagrada no “código dos Delitos e das Penas, em frança,
promulgado aos 3 do Brumário do ano iv, prescreve: «A polícia é instituída para manter a
ordem pública, a liberdade, a propriedade, a segurança individual. O seu carácter principal
é a vigilância. A sociedade considerada em massa é o seu objecto»”76.
O vocábulo polícia é muita das vezes utilizado para qualificar determinadas
ocorrências e condutas, bem como para caracterizar determinado modelo de organização
do Estado. Serve, ainda, para qualificar certo modelo de organização do poder político.
Como ensina JOÃO RAPOSO, por “contraposição ao Estado de direito – que, historicamente,
lhe sucedeu –, no chamado Estado de polícia o poder político não estava submetido as
regras jurídicas, dependendo a governação, em exclusivo, da vontade absoluta mais ou

72
Cfr. JOÃO RAPOSO, Direito Policial – I, ICPOL – Colecção do Centro de Investigação do ISCPSI,
Coimbra: Almedina, 2006, p. 22.
73
Idem, p. 23.
74
Crf. MARCELLO CAETANO, Manual de direito Administrativo, Volume II, 10.ª Edição, 7.ª Reimpressão,
Coimbra, 2004, p. 1152.
75
Ensina MARCELLO CAETANO que o objecto próprio da polícia é a prevenção dos danos sociais, segundo o
velho princípio de que mais vale prevenir que remediar. Crf. MARCELLO CAETANO, Manual de direito
Administrativo, … p. 1152.
76
Crf. MARCELLO CAETANO, Manual de direito Administrativo, … p. 1148.

21
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

menos esclarecidas, do príncipe, que, com total liberdade, tomava as medidas que muito
bem entendesse com vista a assegurar o bem comum (…)”77.
Com a Revolução Francesa surge o Estado de Direito (moderno) que vem pôr fim à
arbitrariedade, passando os Estados a subordinarem-se às leis que criam e traz, em si, um
novo conceito de Polícia, enquadrando-a como uma actividade do Estado. No direito
contemporâneo, a Polícia é definida como “o modo de actuar da autoridade administrativa
que consiste em intervir no exercício das actividades individuais susceptíveis de fazer
perigar interesses gerais, tendo por objecto evitar que se produzam, ampliem ou
generalizem os danos sociais que as leis procuram prevenir”78.
Nos dias que correm, a actividade da polícia não está, única e exclusivamente,
adstrita à ideia de prevenção de perigos que afectam interesses gerais da colectividade,
pelo facto de não serem só as actividades individuais susceptíveis de colocar em perigo de
lesão bens jurídicos protegidos da colectividade, podem ser também as pessoas colectivas.
Ensina MANUEL VALENTE que “uma polícia contemporânea ou pós-moderna procura
evitar que condutas de pessoas singulares e/ou colectivas possam afectar interesses gerais
ou colectivos e interesses singulares e individuais”79.
De referir que o cerne da actividade policial não se esgota na prevenção dos danos
sociais com interesses relevantes à colectividade, estende-se igualmente na prevenção de
danos sociais de interesses individuais e de lesões a bens jurídicos individuais.
É evidente que o vocábulo polícia assume significados diversos, neste sentido vamos
apenas nos fixar naqueles que são de interesse para o nosso estudo, nomeadamente: a
polícia em sentido orgânico ou institucional, material ou funcional e em sentido formal.

2. Polícia em Sentido Orgânico ou Institucional


A polícia em sentido orgânico é um conjunto de serviços da Administração Pública
do Estado com funções específicas de natureza policial.
Neste sentido, segundo CATARINA SARMENTO E CASTRO, citada por MANUEL
VALENTE, a polícia é definida como “o conjunto de órgãos e agentes pertencentes a
serviços administrativos cuja função essencial consiste no desempenho de tarefas materiais

77
Cfr. JOÃO RAPOSO, Direito Policial – I, ICPOL – Colecção do Centro de Investigação do ISCPSI,
Coimbra: Almedina, 2006, p. 22.
78
Crf. MARCELLO CAETANO, Manual de direito Administrativo, Volume II, 10.ª Edição, 7.ª Reimpressão,
Coimbra, 2004, p. 1150.
79
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 3.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 49.

22
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

de polícia”80. Por conseguinte SÉRVULO CORREIA define polícia neste sentido como “todo
o serviço administrativo que, nos termos da lei, tenha como tarefa exclusiva ou
predominante o exercício de uma actividade de polícia”81.
A propósito da definição apresentada por SÉRVULO CORREIA, é necessário que se
faça uma clara distinção entre autoridades e serviços de polícia.
Na perspectiva de SÉRVULO CORREIA, as autoridades de polícia “são em geral os
órgãos das pessoas colectivas públicas com competência para emanar regulamentos
independentes em matéria de polícia administrativa geral e (ou) para determinar a
aplicação de medidas de polícia”82. Para JOÃO RAPOSO “(…) as autoridades de polícia são
as chefias dos diversos corpos de polícia, dispondo, nomeadamente, de competência para
aplicar as determinadas medidas de polícia (…)83. Já os serviços de polícia são
departamentos do Estado que tutelam exclusiva e predominantemente tarefas de carácter
policial e, dependem sempre de uma autoridade de polícia que para os devidos efeitos
determina as medidas de polícia a ter em conta numa situação concreta.
Em Angola existem serviços administrativos do Estado com funções preventivas de
situações de perigosidade social, denominados serviços de polícia, cuja missão genérica é a
de garantir os direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos e a defesa da
legalidade democrática, a manutenção da ordem e tranquilidade públicas, bem como a
prevenção da delinquência e o combate à criminalidade. Esta actividade é desenvolvida por
uma componente humana, podendo ser autoridades de polícia e agentes de execução, por
conseguinte, são ambos agentes de autoridade.
De acordo a Lei de Segurança Nacional84 (LSN) angolana, são autoridades de
polícia85 as chefias dos diversos corpos de polícia, bem como de determinados órgãos com
competências de polícia, mas que não o são efectivamente em sentido orgânico. De realçar

80
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, …, 3.ª Edição, p. 61.
81
Cfr. SÉRVULO CORREIA, “Polícia”, in Dicionário Jurídico da Administração Pública, Vol. VI, Lisboa,
1994, p. 393.
82
Cfr. SÉRVULO CORREIA, “Polícia”, in Dicionário Jurídico da Administração Pública, … p. 393.
83
Cfr. JOÃO RAPOSO, Direito Policial – I, ICPOL – Colecção do Centro de Investigação do ISCPSI,
Coimbra: Almedina, 2006, p. 35.
84
Lei n.º 12/02, de 16 de Agosto de 2002.
85
De acordo com a LSN consideram-se autoridades de polícia as seguintes entidades:
«a) O Comandante Geral, os segundos Comandantes Gerais, os Comandantes Provinciais, e os
Comandantes Municipais da Polícia;
b) Os Funcionários superiores da Polícia Nacional referidos nos respectivos diplomas orgânicos;
c) Os funcionários superiores dos Serviços de Migração e Estrangeiros referidos no respectivo
estatuto;
d) Os chefes dos Departamentos Marítimos e os capitães dos portos, enquanto órgãos do sistema
de Autoridade Marítima e correspondentes entidades do sistema de Autoridade Aeronáutica».
Cfr. Art.º 19.º da Lei n.º 12/02, de 16 de Agosto de 2002, Lei de Segurança Nacional.

23
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

que essas autoridades dispõem de competências para mandar aplicar as medidas de polícia
dispostas no art.º 23.º da LSN.
Os agentes de execução “são o restante pessoal com funções policiais, a quem cabe
coadjuvar as autoridades de polícia no exercício da sua actividade, auxiliando-as na
preparação das suas decisões e dando cumprimento às determinações delas emanadas”86.
Seguindo ainda a linha do referido Autor, ao lado das autoridades policiais, existem
certas autoridades administrativas que, cumulativamente com as funções de outra natureza,
desempenham, também, pontualmente e em situações excepcionais determinadas funções
de polícia. São casos concretos acerca desse assunto o Governador Provincial, o Ministro
do Interior, as chefias das Forças Armadas, quando em situações pontuais colaboram com
a polícia e desempenham funções de cariz predominantemente policial. A essas
autoridades chamam-se autoridades administrativas com funções policiais, pois, não
devem ser confundidas com polícia porque não o são em sentido orgânico.
Portanto, “à polícia em sentido institucional ou orgânico pertencem, e apenas, as
autoridades do primeiro grupo – isto é, aquelas que desempenham as funções policiais a
titulo exclusivo ou principal”87.

3. Polícia em Sentido Material ou Funcional


No que concerne ao sentido funcional de polícia, ensina MARCELLO CAETANO que a
polícia é “o modo de actuar da autoridade administrativa que consiste em intervir no
exercício das actividades individuais susceptíveis de fazer perigar interesses gerais, tendo
por objecto evitar que se produzam, ampliem ou generalizem os danos sociais que as leis
procuram prevenir”88. Já SÉRVULO CORREIA numa perspectiva moderna, mais actual e de
vigência num Estado democrático e de direito definiu-a como “a actividade da
administração pública que consiste na emissão de regulamentos e na prática de actos
administrativos e materiais que controlam condutas perigosas dos particulares com o fim
de evitar que estas venham ou continuem a lesar bens sociais cuja defesa preventiva
através de actos de autoridade seja consentida pela ordem jurídica”89.

86
Cfr. JOÃO RAPOSO, Direito Policial – I, ICPOL – Colecção do Centro de Investigação do ISCPSI,
Coimbra: Almedina, 2006, pp. 35-36.
87
Cfr. JOÃO RAPOSO, Direito Policial – I, …p. 39.
88
Crf. MARCELLO CAETANO, Manual de direito Administrativo, Volume II, 10.ª Edição, 3.ª Reimpressão,
Coimbra, 1990, p. 1150.
89
Cfr. SÉRVULO CORREIA, “Polícia”, in Dicionário Jurídico da Administração Pública, Vol. VI, Lisboa,
1994, p. 393.

24
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

JOÃO RAPOSO, numa perspectiva jurídico-operativa, define a polícia em sentido


funcional como “os actos jurídicos e as operações materiais desenvolvidas por certas
autoridades administrativas – as autoridades policiais – e respectivos agentes de execução,
com vista a prevenir a ocorrência de situações socialmente danosas, em resultado de
condutas humanas imprevidentes ou ilícitas”90.
Na senda destas definições, é comummente apresentado dois ramos da actividade
policial, sendo um designado por polícia administrativa propriamente dita e o outro,
conhecido como polícia judiciária. Apesar de ambas terem em si a ideia de intervenção
preventiva da criminalidade ou a eliminação de perigos sociais, em geral cabe à Polícia
Judiciária a investigação dos crimes, a reunião das provas e a apresentação dos suspeitos
aos órgãos judiciais encarregues de os punir, e à polícia administrativa cabe a manutenção
da ordem pública em todos os sectores.
Para VALENTE DIAS, no que tange à polícia administrativa, é usual diferenciar-se
“uma polícia administrativa geral, de uma polícia administrativa especial. A primeira, visa
predominantemente, fins de segurança pública de carácter geral, como a ordem, a
segurança e a tranquilidade públicas; a segunda, baseia-se no exercício de competências
especializadas em razão da matéria (…)”91.
Na sociedade actual, o sentido material da Polícia não se esgota somente num plano
jurídico-administrativo, o seu campo de actuação se prolonga noutros campos jurídicos.
Como ensina MANUEL VALENTE, a polícia neste sentido engloba, hoje, “o quadro-jurídico-
administrativo, jurídico-criminal, jurídico-civil, jurídico-tributário, todos eles conformes o
quadro jurídico-constitucional”92.
A materialidade de função de polícia, para MANUEL VALENTE “revela em maior
quantidade de relações jurídico-administrativas de momento e relações jurídico-criminais
de momento, mas não se esgota nestes dois quadros jurídicos, pelo que o conceito material
de polícia tem de ser mais abrangente e capaz de aglutinar um lato sentido funcional de
polícia”93.

90
Cfr. JOÃO RAPOSO, Direito Policial – I, ICPOL – Colecção do Centro de Investigação do ISCPSI,
Coimbra: Almedina, 2006, pp. 26-27.
91
Cfr. HÉLDER VALENTE DIAS, Metamorfoses da Polícia – Novos Paradigmas da Segurança e Liberdade,
ICPOL – Colecção do Centro de Investigação do ISCPSI, Coimbra: Almedina, 2012, p. 70.
92
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 4.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 67.
93
Idem, p. 68.

25
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

4. Polícia em Sentido Formal


A polícia em sentido formal, para VALENTE DIAS, compreende “os poderes
desenvolvidos pela polícia em sentido funcional e orgânico, não apenas no exercício de
polícia administrativa geral, mas também quando exerce a actividade de polícia
administrativa especial e polícia judiciária”94.
Ainda na linha de pensamento do Autor, modernamente tem-se defendido que as
formas de exercício dos poderes de polícia tanto podem ser as de regulamento
administrativo como a de actos concretos. No que concerne aos actos concretos, esses tanto
podem ser actos jurídicos como actos materiais. Os primeiros assumem, por norma, a
natureza de actos administrativos, enquanto os segundos, envolvem com frequência, o
emprego da coerção. Como ensina SÉRVULO CORREIA, a “todos esses actos – genéricos ou
concretos – quando pertençam exclusivamente ao desempenho de funções policiais e
possuam um conteúdo ou objecto padronizado, dá-se habitualmente a designação de
medidas de polícia”95.
MARCELLO CAETANO considera “medidas de polícia ou medidas de segurança
administrativa as providências limitativas da liberdade de certa pessoa ou do direito de
propriedade de determinada entidade, aplicadas pelas autoridades administrativas
independentemente da verificação e julgamento de transgressão ou contravenção ou da
produção de outro acto concretamente delituoso, com o fim de evitar a produção de danos
sociais cuja prevenção caiba no âmbito das atribuições de polícia”96.
Os actos de polícia têm dois objectivos primordiais, o de prevenir, que consiste em
aplicar medidas de polícia, bem como: comandos, ordens, proibições (tanto relativas como
absolutas), autorizações e licenças. Já os actos repressivos têm a ver com a aplicação de
sanções administrativas, como o uso de meios de coacção “com a autotutela executiva e
com a aplicação de medidas cautelares e de polícia, no processo criminal ou no processo
contra-ordenacional, em que o fim em vista é auxiliar os tribunais ou as autoridades
administrativas a reprimir ilícitos daquelas duas categorias”97.

94
Cfr. HÉLDER VALENTE DIAS, Metamorfoses da Polícia – Novos Paradigmas da Segurança e Liberdade,
ICPOL – Colecção do Centro de Investigação do ISCPSI, Coimbra: Almedina, 2012, p. 76.
95
Cfr. SÉRVULO CORREIA, “Polícia”, In Dicionário Jurídico da Administração Pública, Vol. VI, Lisboa,
1994, P. 395.
96
Crf. MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, Volume II, 10.ª Edição, 3.ª Reimpressão,
Coimbra, 1990, p. 1170.
97
Cfr. HÉLDER VALENTE DIAS, Metamorfoses da Polícia – Novos Paradigmas da Segurança e Liberdade,
ICPOL – Colecção do Centro de Investigação do ISCPSI, Coimbra: Almedina, 2012, p. 77.

26
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

5. A Polícia como Força de Segurança


O Estado angolano contempla em si determinados órgãos que têm como missão a
definição da política de segurança nacional, e como executores temos os serviços que
levam a cabo a concretização dessas políticas, isto é, as forças e os serviços de segurança.
Desta feita, é de nosso interesse para este estudo saber, precisamente, quais os organismos
ou serviços da ordem interna do Estado angolano devem ser integrados ao conceito de
forças de segurança.
A LSN não utiliza a terminologia forças de segurança, faz referência apenas em
órgãos da ordem interna, pelo que, vamos fazer uma analogia. A LSN, no seu art.º 18.º,
define os órgãos e serviços da ordem interna como “aqueles que constituem o sistema
policial da República de Angola e concorrem para a garantia da ordem e tranquilidade
públicas, e na prossecução dos objectivos definidos na presente lei, e actuam no respeito da
legalidade e dos direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos
constitucionalmente garantidos”98.
Como podemos analisar do exposto no supra citado art.º 18.º da LSN, não há
nenhuma distinção clara entre forças e serviços de segurança. Contudo, seguindo os
ensinamentos de JOÃO RAPOSO, entendemos que estamos diante de uma força de segurança
se se tratar de “corporações policiais que têm por missão assegurar a manutenção da ordem
e segurança públicas e o exercício dos direitos fundamentais dos cidadãos, dispondo para
efeito de uma estrutura organizativa fortemente hierarquizada, especialmente habilitada
para o uso colectivo de meios coercivos – e daí a expressão forças de segurança, à
semelhança das forças armadas”99.
LUÍS PIMENTEL define força de segurança como “ a organização como tal designada
na lei, que tem por função principal exercer as actividades de polícia administrativa que a
Constituição e a lei orientam para a segurança interna (garantir a ordem e tranquilidade
públicas, o regular funcionamento das instituições, a defesa dos direitos dos cidadãos e o
respeito pela legalidade democrática), estando para tal dotada de estrutura e meios
apropriados ao emprego de coerção em volume e intensidade já consideráveis, possuindo
capacidade para montar dispositivos anti violência onde necessário e por períodos de

98
Cfr. Art.º 18.º da Lei n.º 12/02, de 16 de Agosto de 2002, que aprova a Lei de Segurança Nacional.
99
Cfr. JOÃO RAPOSO, Direito Policial – I, ICPOL – Colecção do Centro de Investigação do ISCPSI,
Coimbra: Almedina, 2006, p. 49.

27
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

tempo dilatados, e em que os elementos com funções policiais estão sujeitos à hierarquia
do comando e não na normal hierarquia administrativa”100.
Só as polícias que integram à concepção do art.º 210.º da CRA em conjugação com o
18.º da LSN – aquelas que desempenham, de forma originária, funções de manutenção e
reposição da ordem ou tranquilidade públicas, a nível nacional podem ser tidas como
forças de segurança. E na perspectiva de MANUEL VALENTE não basta os últimos atributos,
devem ainda “se encontrar dentro do princípio da territorialidade, do princípio da reserva
da lei e do princípio da unidade de organização para todo o território nacional”101.
Caso concreto é o da PNA (polícia militarizada) e inspirada no modelo castrense, que
desempenha na sua actividade tarefas de segurança pública conciliando em si uma
estrutura organizativa fortemente militarizada à semelhança das Forças Armadas
Angolanas (FAA). O Estatuto Orgânico102 da Polícia Nacional de Angola, no seu art.º 1.º,
define a PNA como uma força militarizada, conferindo-lhe um leque alargado de
atribuições como: a defesa da legalidade democrática; a manutenção da ordem e da
tranquilidade públicas; o respeito pelo regular exercício dos direitos e liberdades
fundamentais dos cidadãos; a defesa e protecção da propriedade estatal colectiva, privada e
pessoal; a prevenção à delinquência e o combate à criminalidade; colaborar na execução da
Política de Defesa Nacional, nos termos que forem estabelecidos por lei.
Tendo em conta que a competência territorial da actuação da polícia em todo o
território nacional reforça e sustenta a ideia de que determinada polícia é ou não força de
segurança, o n.º 2 do art.º 2.º do Estatuto Orgânico supra citado determina que a
organização da PNA é única e as suas missões serão exercidas em todo o território
nacional, obedecendo à hierarquia de Comando a todos os níveis da sua estrutura. Como
tem defendido MANUEL VALENTE, a “prossecução das competências a nível do território
nacional, a obediência ao princípio da territorialidade, é fundamental para que uma Polícia
seja constitucionalmente considerada força de segurança”103. Quanto aos critérios da
territorialidade e unidade enquanto princípios defendidos por MANUEL VALENTE, não nos
afiguram dúvidas de que a PNA é uma força de segurança à Luz da CRA.
O n.º 1 do art.º 210.º da CRA define apenas a Polícia Nacional de Angola como uma
instituição nacional policial, permanente, regular e apartidária, organizada na base da

100
Cfr. LUÍS MANUEL DE OLIVEIRA PIMENTEL, O Regime Estatutário das Forças de Segurança, In Estudos de
Direito de Polícia, 2. º Volume, coord. de Jorge Miranda, Lisboa, AAFDL, 2003, p. 180.
101
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 3.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 51.
102
Cfr. Decreto-lei n.º 20/93, de 11 de Junho.
103
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial,… 3.ª Edição, p. 51.

28
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

hierarquia e da disciplina, incumbida da protecção e asseguramento policial do país, no


estrito respeito pela Constituição e pelas leis, bem como pelas convenções internacionais
de que Angola seja parte. Quem a vem determinar como uma força militarizada é o art.º 1.º
do seu Estatuto Orgânico.
Quanto ao princípio da reserva da lei, o n.º 3 do art.º 210.º da CRA dispõe que cabe
à lei regular a organização e funcionamento da PNA. Este desiderato surge em função da
entrada em vigor da nova CRA de 2010, tendo em conta a pretensão do Estado angolano
em garantir aos seus cidadãos o respeito pela legalidade democrática em matérias que
envolvem a PNA enquanto força de segurança.
Da actividade desenvolvida pela PNA, como de qualquer Polícia e em qualquer parte
do mundo104, pode resultar lesão de direitos, liberdades e garantias fundamentais dos
cidadãos, pelo que, só a Assembleia Nacional (AN) composta por deputados que
representam democraticamente os desejos da plebe devem legislar tais matérias. Na linha
de pensamento de MANUEL VALENTE105, consideramos que só se deve admitir como fonte
de Direito as leis emanadas pela AN, e nunca, outra fonte de direito de nível hierárquico
inferior deve legislar matérias relativas ao regime das forças de segurança. Contudo, em
Angola não se consubstancia ainda a prática das exigências do estatuído no já referido n.º 3
do art.º 210.º da CRA. A PNA enquanto força de segurança não tem ainda uma Lei
Orgânica debatida e aprovada pela AN, estando ainda em vigor o Estatuto Orgânico da
PNA aprovado pelo Primeiro-ministro, o que não vai ao encontro das espectativas
impostas ao novo regime democrático que aprovou a recente CRA. É urgente que esta
matéria passe a ser legislada pela AN, enquanto órgão de criação das leis e com
legitimidade normativa, sociológica e, principalmente democrática, sob pena de estarmos a
incumprir o preceituado na CRA e perante uma inconstitucionalidade superveniente106.

6. Serviços de Segurança
Em Angola, temos ainda outros órgãos cuja organização e funcionamento
assemelham-se a da PNA, o que podem causar certas dúvidas se devem ser tidos ou não
como forças de segurança. São os casos concretos do Serviço de Migração e Estrangeiros

104
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial,… 3.ª Edição, pp. 53-61.
105
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial,… 3.ª Edição, pp. 53-61.
106
A inconstitucionalidade superveniente de que procede o Estatuto actual da PNA, como nos disse MANUEL
VALENTE em conversa e debate de ideias sobre o tema em concreto, é uma consequência natural do processo
de democratização constitucional em curso em Angola, que, em dia próprio, será afastado pela aprovação de
uma Lei Orgânica da PNA pela AN.

29
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

(SME), legislado pelo Decreto Executivo n.º 010/2000; o Serviço Penitenciário (SP),
legislado pelo Decreto Executivo n.º 013/2000 e o Serviço de Bombeiros (SB), legislado
pelo Decreto Executivo n.º 07/2000. Mas esses órgãos não congregam em si as
particularidades anteriormente elencadas e que caracterizam uma força de segurança.
Esses serviços são os chamados serviços de segurança, sendo os outros serviços, não
necessariamente policiais, que concorrem para garantir a segurança interna, prescindindo,
para o efeito, de uma organização de cariz preponderantemente militar107.
Na perspectiva de JOÃO RAPOSO, os serviços são entendidos como “as organizações
humanas criadas no seio de cada pessoa colectiva pública com o fim de desempenhar as
atribuições desta, sob a direcção dos respectivos órgãos”108. Trata-se de serviços
integrados no aparelho do Estado, pois a sua criação está inerente à prossecução dos fins
deste. Aqueles serviços estão acoplados à categoria dos serviços principais de carácter
operacional, pois desempenham uma actividade material inerentes a determinada
atribuição do Estado, nomeadamente o garante da segurança nacional, que o mesmo
procura preservar.
Os serviços de segurança, tal como as forças de segurança têm uma natureza jurídica
de “(…) serviços da administração estadual directa, como tal desprovidos de personalidade
jurídica e, sem prejuízo da sua autonomia financeira, administrativa, técnica e operacional,
dependentes hierarquicamente de um membro do Governo (…)”109.

7. Autoridades e Órgãos de Polícia Criminal em Angola


Ao olharmos atentamente às definições supra citadas relativas aos conceitos
institucional e funcional de polícia, apercebemo-nos da real importância que se revestem as
autoridades policiais, de polícia e de polícia criminal no que tange à actividade policial.
Para MANUEL VALENTE “a qualidade de autoridade de polícia está adstrita na
natureza de polícia de ordem e tranquilidade públicas, cuja acção operativa se estende em
todo o quadro funcional jurídico-constitucional: defesa da legalidade democrática e defesa
e garantia da segurança interna e dos direitos dos cidadãos”110.

107
Cfr. JOÃO RAPOSO, Direito Policial – I, ICPOL – Colecção do Centro de Investigação do ISCPSI,
Coimbra: Almedina, 2006, p. 49.
108
Cfr. JOÃO RAPOSO, Direito Policial – I,… p. 50.
109
Cfr. JOÃO RAPOSO, Direito Policial – I,… pp. 49-50.
110
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 4.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 73.

30
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

Para o Autor, “a qualidade jurídica de autoridade de polícia criminal está adstrita à


natureza de polícia judiciária que se afere da função de prevenção criminal, (…)”111
conforme o art.º 209.º da CRA, conjugado com o art.º 1.º do Estatuto Orgânico da PNA.
Na perspectiva de MANUEL VALENTE, a qualidade jurídica de autoridade policial se
desenvolve no plano administrativo e, “não exige reserva e precedência de lei que
especifique «quem» ou «quais as categorias» detêm essa qualidade, bastando tão-só que
ocupe a função de hierarquia superior aos demais elementos policiais no enquadramento da
actividade de polícia em concreto”112. Esta qualidade está intimamente ligada à natureza de
polícia administrativa, pelo que não se enquadra apenas no aspecto de forças ou serviços
de segurança, estende-se até às autoridades administrativas com poderes de polícia.
De acordo com o estipulado no art.º 19.º da Lei n.º 12/02, de 16 de Agosto de 2002,
LSN de Angola, são consideradas autoridades de polícia, para os devidos efeitos da
referida lei, tendo em conta as competências previamente definidas em regulamentos
orgânicos das instituições em questão:
«- O Comandante Geral, os segundos Comandantes Gerais, os Comandantes
Provinciais, e os Comandantes Municipais da Polícia;
- Os Funcionários superiores da Polícia Nacional referidos nos respectivos diplomas
orgânicos;
- Os funcionários superiores dos Serviços de Migração e Estrangeiros referidos no
respectivo estatuto;
- Os chefes dos Departamentos Marítimos e os capitães dos portos, enquanto órgãos
do sistema de Autoridade Marítima e correspondentes entidades do sistema de Autoridade
Aeronáutica»113.
As qualidades jurídicas que detêm cada uma dessas autoridades de polícia têm razão
de ser nas atribuições (finalidades) e interesses que as leis orgânicas de cada instituição
determinam, incumbindo às polícias a que pertencem tais autoridades de prosseguir e
desenvolver as atribuições.
Como podemos ver, o nosso legislador elencou no já referido art.º 19.º da LSN
critérios de competência relativos às autoridades de polícia, socorrendo-se de um critério
de hierarquia, ou seja, enumerou-as “segundo um critério hierárquico superior com reflexo
interno e externo à própria instituição policial – e da matéria – a lei confere a determinadas

111
Idem, p. 73.
112
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 4.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 72.
113
Cfr. Art.º 19.º da Lei n.º 12/02, de 16 de Agosto de 2002, LSN de Angola.

31
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

categorias dispostas hierarquicamente o exercício de poderes necessários para a


prossecução da instituição policial”114.
Clarificado que está os conceitos de autoridade de polícia; autoridade de polícia
criminal e autoridade de polícia administrativa ou autoridades policiais, bem como a
identificação de quem são as autoridades de polícia em Angola, vamos abordar a questão
do conceito de órgãos de polícia criminal.
O Código de Processo Penal, angolano de 1929, adiante CPP, altura em que Angola
era ainda colónia portuguesa encontra-se desactualizado e não faz referência sobre a
questão dos órgãos de polícia criminal, todavia iremos nos socorrer do Decreto-lei n.º
35:007, de 13 de Outubro de 1945 e da doutrina estrangeira de forma a encontrar uma
aproximação à nossa realidade.
O art.º 18.º do Decreto-lei n.º 35:007, de 13 de Outubro de 1945 define as
autoridades de polícia como aquelas a quem compete a instrução preparatória em todas as
causas que lhe sejam afectas, nos termos da respectiva legislação.
Na perspectiva de MANUEL VALENTE, “cabe ao OPC coadjuvar as autoridades
judiciarias, colher a notícia do crime, impedir as suas consequências, descobrir os seus
agentes e promover actos necessários e urgentes idóneos a assegurar os meios de prova,
deter os agentes dos crimes em flagrante delito, elaborar os autos de notícia, comunicar o
crime à PJ, proceder à identificação dos suspeitos da prática de crime e de testemunhas,
proceder à recolha de informações sobre os crimes, proceder a exames no local do crime,
proceder a apreensões cautelares, à revista de suspeitos, à busca não domiciliárias e
domiciliárias por ordem ou autorização da autoridade judiciária competente, proceder à
suspensão da correspondência e à sua apreensão por ordem ou autorização do juiz,
proceder à realização de intercepção e gravação e transcrição de conversas e comunicações
por ordem ou autorização do juiz, proceder à intercepção celular, proceder ao registo de
voz (off) e imagens (…)”115.
O art.º 55.º do CPP português faz referência aos órgãos de polícia criminal como
sendo aqueles a quem caiba «coadjuvar as autoridades judiciárias com vista à realização
das finalidades do processo; compete-lhes ainda mesmo por iniciativa própria, colher
notícia dos crimes e impedir quanto possível as suas consequências, descobrir os seus

114
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 4.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 73.
115
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 4.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, pp. 70-71.

32
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

agentes e levar a cabo actos necessários e urgentes destinados a assegurar os meios de


prova».
Da análise deste art.º 55.º do CPP de Portugal depreende-se que são órgãos de polícia
criminal em Angola os Agentes da polícia a quem caibam à realização das tarefas de
coadjuvação às autoridades judiciárias de forma a realizar o fim do processo, ou seja, são
todos os Agentes da Polícia com funções operacionais.

33
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

CAPÍTULO III. A POLÍCIA COMO GARANTE DA


SEGURANÇA NO DIREITO ANGOLANO

1. Breve Referência da Evolução da Polícia em Angola


A análise da PNA impõe uma abordagem a três períodos que ajudar-nos-ão a
caracterizar a história da polícia, nomeadamente: o período da ocupação portuguesa; o de
transição relativamente ao domínio português para independência e o período relativo ao
período pós- independência116.
Na época colonial vigorava em Angola a Companhia de Segurança Pública (CSP),
criada em 1837 e tinha como principais missões a defesa da cidade de Luanda e a execução
do policiamento da cidade117.
Posteriormente, com base na CSP foi criado o Corpo de Polícia de Luanda (CPL). O
chefe do CPL não tinha formação policial nem militar, era o administrador do Concelho.
Mais tarde, em 1887 mudou-se a designação, passando a chamar-se Companhia de
Polícia de Luanda, extinguindo assim o então CPL. Essa nova força passa a ser
considerada uma força auxiliar da actividade administrativa, sujeita a regime e a disciplina
militar, como podemos ver na portaria n.º 14 do 2.º suplemento ao n.º 11 do Boletim
Oficial118. Contando já com uma estrutura de comando militar, a Companhia de Polícia de
Luanda continuou a desempenhar as mesmas funções que o CPL e tinha na sua estrutura
um Comandante, Oficiais Subalternos e praças.
Passados alguns anos, voltou a adoptar-se a anterior designação – CPL, devido a
situação militar na colónia, mas desta vez com uma estrutura e organização adaptada do
modelo militar.
Nas regiões de menor conflito, o regime de Portugal criou companhias de polícia
compostas por indígenas e chefiados pela autoridade administrativa local, designados de
Corpos de Cipaes.
Em 1 de Março de 1923, foi criado por Decreto do Alto Comissário de Angola o
Corpo de Polícia da Província de Angola (CPPA), que se subordinava ao Governador-geral

116
Cfr. DIVALDO JÚLIO MARTINS, O Trabalho Policial nas Sociedades Democráticas: O Caso de Angola, In
Estudos sobre Acção Policial e Direitos Humanos em Angola, coord. de Lúcia da Silveira & Sandra Furtado,
Luanda, 2010, p. 47.
117
Cfr. JOÃO MANUEL DE ALMEIDA DE SÁ, Origem e Evolução Cronológica da Polícia em Angola, Luanda:
Norprint, 2013, p. 11.
118
Cfr. JOÃO MANUEL DE ALMEIDA DE SÁ, Origem e Evolução Cronológica da Polícia... Anexo, p. 72.

34
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

por intermédio da Secretaria do Interior. De realçar que o Comandante deste Corpo de


Polícia absorveu competências disciplinares fixadas no regulamento disciplinar do
exército119.
Mais tarde, é extinto o supra citado CPPA e, com a sua extinção deu-se a criação do
Corpo de Polícia de Segurança Pública de Angola (CPSPA), através do Diploma
Legislativo n.º 126. Este Corpo de Polícia era constituído pelo Corpo de Polícia de
Segurança Pública de Luanda e pelos diversos Corpos de Polícia das 18 regiões que fazem
ainda parte de Angola.
O Diploma Legislativo n.º 1030, de 8 de Novembro de 1938, aprova e coloca em
vigor uma nova organização para o CPSPA. A Secção de Investigação Criminal foi
desintegrada, sendo um corpo independente, na dependência do Comandante do CPSPA.
Desta nova organização da Investigação Criminal resultou o alargamento das suas
competências de investigação a todo o território da então Província de Angola.
O Diploma Legislativo 3003, de 19 de Agosto de 1959, referia que a Polícia de
Segurança Pública (PSP) é um organismo militarizado. Neste regulamento é notável ainda
uma melhor organização da Polícia, quer em Luanda, quer nas demais regiões do país.
Mais tarde, por intermédio do Diploma Ministerial n.º 91, de 28 de Outubro de 1961, é
criado um Comando Geral da Polícia, tendo ainda sido criado nos concelhos a figura dos
Comissariados de Polícia, chefiados pelo Administrador do Concelho.
Nesta altura é aumentado substancialmente o quadro efectivo da Polícia, com pelo
menos mais três companhias móveis, compostas por Oficiais, Comandantes de Secção,
Comissários – Chefes de Esquadra, Subchefes, ajudantes, Guardas de 1.ª e 2.ª classe e
pessoal civil contratado.
No período de transição para a independência, o Governo de transição chefiado pelo
Dr. ANTÓNIO AGOSTINHO NETO, através da publicação do Decreto 24/75, de 1 de Abril de
1975, determinou que a Polícia de Segurança Pública de Angola (PSPA) passasse a ser
designada por Corpo de Polícia de Angola. Foi extinto o Comando Geral da PSPA, e em
sua substituição, foi criado o Comando Unificado do Corpo de Polícia de Angola (CPA),
do Estado-maior e a Inspecção dos Serviços Administrativos. A “direcção desse Comando
Unificado funcionava de forma rotativa, isto é, entre os responsáveis dos movimentos de
libertação de Angola”120.

119
Cfr. JOÃO MANUEL DE ALMEIDA DE SÁ, Origem e Evolução Cronológica da Polícia... Anexo, p. 82.
120
Cfr. JOÃO MANUEL DE ALMEIDA DE SÁ, Origem e Evolução Cronológica da Polícia..., p. 21.

35
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

Neste período enquadraram-se na Polícia um vasto leque de Oficiais, vindos dos


Movimentos de Libertação de Angola. Muitos são hoje os quadros superiores e
Comandantes de Polícia na actual PNA.
No período pós independência, a polícia Angolana ficou marcada pela aprovação da
legislação que permitia o ingresso de mulheres nos seus quadros e, em 28 de Fevereiro de
1976, realizou-se a cerimónia de juramento dos elementos femininos. Neste mesmo dia,
por proposta do Comandante do CPA ao general IKO CARREIRA, então Ministro da Defesa,
a Polícia passava a designar-se Corpo de Polícia Popular de Angola (CPPA), tendo em
conta Angola ser na altura uma República Popular, desde então, passou a ser comemorado
neste dia o aniversário da Polícia.
Mais tarde, tendo-se realizado estudos que apontavam para a necessidade de se
retirar da alçada do Ministério da Defesa o CPPA, foi criada a Secretaria de Estado da
Ordem Interna, através da Lei n.º 12/78, de 26 de Maio, que elencava, no seu preâmbulo, a
necessidade de se restruturar o aparelho do Estado herdado do colonialismo, fazendo uma
integração de diversos organismos na Secretaria de Estado, o que permitiu uma atribuição
a todo o pessoal um carácter militarizado.
Em Maio de 1979, fruto da criação da Secretaria de Estado da Ordem Interna, a
Polícia muda de organização e designação, passando a chamar-se Direcção Nacional da
Polícia Popular. Como podemos constatar no disposto no Despacho n.º 2/79, de 2 de
Maio121.
Em 1986, com a aprovação do novo Regulamento para a Polícia Popular, deixa de
existir a designação de Direcção Nacional e passa a ser Comando Geral da Polícia Popular
de Angola (CGPPA).
Este regulamento ora criado vem integrar no CGPPA a Polícia de Investigação
Criminal; a Polícia de Inspecção e Investigação das Actividades Económicas e por fim a
Polícia de Instrução Processual. Com a integração desses órgãos pensamos que é a partir
dessa altura que a actual PNA ganhou o estatuto de Polícia Integral.
Posteriormente, fruto de inúmeros e gravíssimos problemas no Ministério do Interior
e na Polícia Popular, o Presidente da República ordenou uma urgente restruturação do
CPPA, vindo a chamar-se PNA, conforme podemos constatar no Decreto n.º 27/89 de 4 de
Março, que suspende a aplicação imediata do Regulamento Orgânico da Polícia que havia

121
Cfr. JOÃO MANUEL DE ALMEIDA DE SÁ, Origem e Evolução Cronológica da Polícia... Anexo, p. 129.

36
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

sido aprovado a pouco tempo. Neste período, foi também aprovada a Lei n.º 28/91, de 27
de Setembro, que equipara os postos e distintivos da PNA aos das FAA.
Em 1991, a corporação passa a ser comandada por ANDRÉ PITRA PETROFF e adoptou
mudanças significativas na Polícia. Com a aprovação do Decreto n.º 20/93, de 11 de Junho,
a Polícia Nacional passou a ter três áreas a saber: Área Administrativa; Área Operativa e
Área de Apoio. Neste período, foi ainda aprovado o Regulamento de Disciplina da
Corporação e mais tarde foi criada a Polícia de Emergência, actualmente designada Polícia
de Intervenção Rápida (PIR).
Em 2002, no cumprimento de uma orientação do Presidente da República, foi
elaborado um plano de Modernização e Desenvolvimento para a PNA. Da elaboração e
realização efectiva do disposto nesse plano resultou um maior esforço na formação de
quadros, na reparação e reconstrução de infra-estruturas, bem como a melhoria das
condições sociais dos efectivos; uma melhoria gradual na prevenção e repressão da
criminalidade; da sinistralidade rodoviária e da imigração ilegal, que muito assola as
fronteiras angolanas, tanto terrestes como marítimas.
Ao longo dos quase 35 anos de existência, a PNA, sempre procurou dignificar o
nome do Estado angolano e o cumprindo da melhor maneira possível dos lemas que
norteiam a sua actividade: Pela Ordem e Pela Paz ao Serviço da Nação e Pela Ordem e
Pela Paz ao Serviço do Povo.

2. A Polícia na Constituição da República de Angola


Foi com a aprovação da CRA de 2010 que a Polícia, em Angola, ganhou
legitimidade e fundamento constitucional para a sua actuação. Tendo em conta que esta, no
decorrer da sua actividade, desenvolve medidas de polícia que, em determinadas situações,
põem em causa os direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos, é
imprescindível que seja regida dentro dos princípios e limites impostos pela CRA.
Esta opção constitucional é claramente uma forma de consolidação de um Estado
democrático e de direito. É a CRA que consagra os princípios jurídicos inerentes à
prossecução do interesse da colectividade, que deve ser tido em conta nas decisões
tomadas pela Administração Pública.
A CRA integra a polícia dentro do Título V, o da Administração Pública, no Capítulo
IV da Garantia da Ordem e Polícia Nacional.

37
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

O art.º 210.º da CRA define as funções da PN num sentido muito amplo. Quem
estabelece de forma clara a natureza das suas funções é o art.º 209.º da CRA, cujo título é
garantia da ordem. Este dispõe que a PN tem por objectivo a defesa da segurança e
tranquilidade públicas, o asseguramento e protecção das instituições, dos cidadãos e
respectivos bens e dos seus direitos e liberdades fundamentais, contra a criminalidade
violenta ou organizada e outro tipo de ameaças e riscos, no estrito respeito pela
Constituição, pelas leis e pelas convenções internacionais de que Angola seja parte.
Da leitura minuciosa do n.º 1 do art.º 209.º da CRA destacamos três grandes funções
a serem desenvolvidas pela PN, nomeadamente: a defesa da segurança e da tranquilidade
pública; a protecção das instituições democráticas e a garantia dos direitos e liberdades
fundamentais dos cidadãos.
Defender a segurança e a tranquilidade públicas é garantir a segurança interna da
nação122. É neste âmbito que a PNA tem competências e desenvolve a actividade de
prevenção e investigação criminal, bem como a manutenção e reposição da ordem pública,
como podemos ver no disposto nos art.º 1.º e 5.º do Decreto-Lei n.º 20/93, de 11 de
Junho123.
Ao protegermos as instituições democráticas, estamos a garantir a legalidade
democrática, definida por JORGE MIRANDA como “a legalidade própria de um Estado
democrático”124, defendendo assim que é imperioso a existência de um paralelismo entre
os actos do poder público, em relação às restantes leis e à Constituição, tendo sempre por
base o princípio da legalidade democrática, o que pressupõe que as demais leis busquem as
suas bases na Constituição.
Para CANOTILHO e MOREIRA a ideia de legalidade democrática estará, “porventura,
ligada à ideia de garantia de respeito e cumprimento das leis em geral, naquilo que
concerne à vida da colectividade”125.
Comutativamente compete ainda à PNA garantir os direitos e liberdades
fundamentais dos cidadãos. Como ensina MANUEL VALENTE126, esta é sem sombra de

122
Quanto ao assunto, acompanhamos MANUEL VALENTE, Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE,
Teoria Geral do Direito Policial, 4.ª Edição, Coimbra: Almedina, 2014, pp. 116-117 e CANOTILHO, J. J. G. &
MOREIRA, Constituição Portuguesa Anotada, 3.ª Ed. Coimbra. 1993, p. 955.
123
Estatuto Orgânico da PNA.
124
Cfr. JORGE MIRANDA, A Ordem Pública e os Direitos Fundamentais: Perspectiva Constitucional, In
Revista da Polícia Portuguesa, n.º 88.
125
Cfr. GOMES CANOTILHO & VITAL MOREIRA, Constituição Portuguesa Anotada, 3.ª Ed. Coimbra. 1993, p.
955.
126
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Os Desafios Emergentes de uma Polícia de Um Estado de
Direito Democrático, In Politeia - Revista do Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna,
Lisboa, ISCPSI, coord. Manuel Valente. 2012, pp. 258-262.

38
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

dúvidas uma das principais razões da existência dos corpos de polícia, ou seja, deve ser
função fundamental da PNA enquanto força de segurança defender e proteger os direitos
dos cidadãos, para que não sejam violados. E nessa tarefa de protecção do cidadão, a
polícia não o faz só se a ameaça porventura vier de outro cidadão ou pessoa colectiva, mas
também, do próprio Estado, pois em Estado Democrático e de Direito o mesmo deve
subordinação à Constituição e às, leis que cria.
É função da polícia garantir os direitos dos cidadãos, tratando-se de um acto de
obrigatoriedade pública que consiste na protecção dos direitos dos cidadãos. Esta função
deve ser articulada com o direito à segurança. É obrigação do Estado garantir a protecção
dos cidadãos contra a agressão de terceiros aos seus direitos. Deste modo, “os direitos dos
cidadãos não são apenas um limite da actividade de polícia; constituem também um dos
próprios fins dessa função”127.

3. Os Órgãos e Serviços da Ordem Interna


A par dos órgãos que intervêm na definição da política de segurança nacional,
existem os órgãos e serviços da ordem interna do Ministério do Interior (MININT) aos
quais compete executar a política anteriormente traçada. Estas forças e serviços de
segurança “constituem o sistema policial da República de Angola e concorrem para a
garantia da ordem e tranquilidade públicas, e na prossecução dos objectivos definidos na
LSN, e actuam no respeito da legalidade e dos direitos, liberdades e garantias fundamentais
dos cidadãos constitucionalmente garantidos”128.
Para BACELAR GOUVEIA, a ordem interna em Angola representa o segundo pilar da
Segurança Nacional, “o qual tem que ver com a preservação da ordem pública no território
nacional, assim o defendendo tanto preventiva como repressivamente, aqui assumindo o
respectivo protagonismo à polícia e forças de segurança”129.
De seguida, tendo em conta os respectivos diplomas que regulam a sua organização e
funcionamento, vamos descrever as características fundamentais das forças e serviços de
segurança em Angola, ou seja, os órgãos e serviços da ordem interna do MININT, como
dispõe a LSN. Vamos estudar estes órgãos do MININT tendo em conta a disposição que

127
Cfr. GOMES CANOTILHO & VITAL MOREIRA, Constituição Portuguesa …, Anotada., p. 956.
128
Cfr. Art.º 18.º, n.º 1, da Lei n.º 12/02, de 16 de Agosto de 2002, que aprovou a Lei de Segurança Nacional.
129
Cfr. JORGE BACELAR GOUVEIA, Direito Constitucional de Angola, Lisboa: Norprint, 2014, p. 555.

39
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

encontramos no n.º 3 do art.º 4.º do Capítulo II, do Decreto Presidencial n.º 209/14 de 18
de Agosto, que aprova o novo Estatuto Orgânico do MININT.

3.1 A Polícia Nacional de Angola


3.1.1 Conceito
Nos termos do disposto no art.º n.º 1 do Estatuto da PNA, ela é definida como uma
força militarizada que lhe compete fundamentalmente garantir a legalidade democrática; a
manutenção da ordem e tranquilidade públicas; o respeito pelo regular exercício dos
direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos; a defesa e protecção da propriedade
estatal colectiva, privada e pessoal; a prevenção da delinquência e combate à criminalidade
e colabora na execução da Política de Defesa Nacional, nos termos que foram
estabelecidos por lei.
A PNA depende organicamente do MININT, cabendo à Inspecção Geral do
Ministério determinar inspecções, inquéritos e actividades de controlo da actividade
policial aos serviços por ela desenvolvidos, bem como instaurar determinados processos
disciplinares quando haja necessidade de o fazer.
Quanto a sua organização é única e as suas missões serão exercidas em todo o
território nacional, obedecendo a hierarquia de comando a todos os níveis da sua estrutura.

3.1.2 Atribuições e Competências


A PNA tem um leque de três grandes atribuições:
a) Polícia de ordem e segurança pública;
b) Polícia administrativa; e
c) Polícia judiciária.
No âmbito da polícia de ordem e segurança pública, bem como de polícia
administrativa compete especialmente à PNA:
«1. Garantir o normal funcionamento das instituições democráticas, e o regular
exercício dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos;
2. Assegurar o respeito pela legalidade democrática, mantendo ou restabelecendo a
ordem e a tranquilidade públicas e a segurança das pessoas e a protecção dos seus bens;
3. Proteger os diversos tipos de propriedades em que assenta o sistema sociopolítico
e económico consignado na Lei Constitucional;

40
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

4. Auxiliar e proteger os cidadãos, defender e preservar os bens que se encontram


em situações de perigo por causas resultantes da acção humana ou da natureza;
5. Garantir, sem prejuízo da competência das demais forças de segurança, a
segurança pessoal dos membros dos órgãos de soberania, de altas entidades
nacionais ou estrangeiras e de outros cidadãos sujeitos a situação de ameaça
relevante;
6. Garantir a protecção e segurança dos representantes Diplomáticos acreditados no
país;
7. Organizar, dirigir, controlar e fiscalizar as actividades de Viação e Trânsito,
proceder a sua regularização e ao licenciamento administrativo deste sector, sem
prejuízo das competências específicas atribuídas por lei a outros organismos;
8. Exercer o controlo da existência, propriedade, detenção e utilização de armas de
fogo e de substâncias ou engenhos inflamáveis, explosivos, asfixiantes e tóxicos,
não pertencentes as Forças Armadas e na posse de qualquer pessoa, entidade
singular ou colectiva;
9. Exercer o policiamento, a fiscalização, o controlo e a protecção das fronteiras
nacionais promovendo e executando as medidas policiais relacionadas com a
entrada, saída e permanência de estrangeiros no país;
10. Garantir a segurança e protecção das áreas portuárias, aeródromos, caminhos-de-
ferro e a vigilância das zonas aduaneiras e fiscais;
11. Controlar e fiscalizar a actividade das empresas privadas de segurança privada;
12. Vigiar e proteger os locais públicos, casas ou recintos onde se efectuem festas,
feiras, manifestações ou espectáculos, hotéis e estabelecimentos similares e de
um modo geral em todos os locais onde se realizem reuniões públicas
devidamente autorizadas;
13. Exercer e desenvolver as demais competências que lhe são atribuídas por lei, em
regulamento ou directivas genéricas do Ministério do Interior».
Conforme alíneas a), b), c), e), g), h), i), j), k), l), m), p) e q), ambas do art.º 5.º do
Decreto-Lei n.º 20/93, de 11 de Junho, que aprova o Estatuto Orgânico da PNA.
No âmbito de polícia judiciária, compete especialmente à PNA:
«1. Prevenir a delinquência e combater a criminalidade e proceder à investigação
dos crimes e dos seus autores, realizando a instrução preparatória dos respectivos
processos.

41
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

2. Exercer acções especializadas de Polícia Científica para o apoio da actividade da


investigação criminal e da instrução preparatória dos respectivos processos.
3. Organizar o serviço centralizado de informações relativas aos arguidos de
processo-crime, dos suspeitos da prática de delitos, vadios, dos réus condenados
pelos tribunais, dos indivíduos objectos de actividade policial, dos instrumentos e
objectos dos crimes e do “modus operandi” dos delinquentes ou criminosos».
Conforme alíneas d), n) e o), ambas do art.º 5.º do Decreto-Lei n.º 20/93, de 11 de
Junho, que aprova o Estatuto Orgânico da PNA.

3.2 Serviço de Migração e Estrangeiros


3.2.1 Conceito
De acordo com o disposto no art.º 1.º do Decreto Executivo n.º 010/2000 o Serviço
de Migração e Estrangeiros, abreviadamente designado SME, é o órgão do Ministério do
Interior ao qual incumbe, promover e coordenar a execução das medidas e acções inerentes
ao trânsito, entrada, permanência, residência e saída de pessoas nos postos de fronteira
terrestre, marítima, aérea e fluvial em todo o território nacional.
Este órgão tem natureza de serviço de segurança e depende hierarquicamente do
Ministro do Interior, conforme art.º supra citado.

3.2.2 Atribuições e Competências


Quanto as suas atribuições, o SME tem como principal finalidade a promoção,
coordenação e a execução das medidas e acções inerentes ao trânsito, entrada,
permanência, residência e saída de pessoas nos postos de fronteira terrestre, marítima,
aérea e fluvial em todo o território nacional. Conforme consagra o art.º 1.º do Decreto
Executivo n.º 010/2000.
O SME, nos termos do disposto no art.º 2.º do já referido Decreto Executivo tem as
seguintes competências:
«1. Proceder a recolha, pesquisa e tratamento das informações úteis a política
migratória nacional;
2. Assegurar os serviços relativos a entrada, permanência, residência e saída de
cidadãos estrangeiros em todo o território nacional;

42
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

3. Proceder ao controlo e fiscalização da entrada de visitantes e passageiros em


embarcações, aeronaves e outras entidades de acordo com as disposições
constantes no regulamento sanitário internacional e da legislação migratória;
4. Fiscalizar as operações de embarque e desembarque de passageiros, impedindo a
entrada dos que se apresentarem em situação migratória irregular nos postos de fronteira
terrestre, marítima, fluvial e aérea;
5. Proceder a instrução preparatória dos processos referentes as infracções ao regime
jurídico-legal de cidadãos estrangeiros no território nacional;
6.Controlar a permanência dos estrangeiros e fiscalizar as suas actividades no
território nacional;
7.Garantir a emissão do passaporte nacional nos termos da legislação em vigor;
8. Manter a necessária coordenação com as entidades a quem compete assegurar o
cumprimento da legislação reguladora do emprego de estrangeiros;
9. Manter relações de cooperação com os órgãos judiciais;
10. Colaborar com as instituições congéneres de países estrangeiros;
11. Garantir o cumprimento escrupuloso dos princípios de compartimentação,
preservação e sigilo em relação aos assuntos do Estado;
12. Executar quaisquer outras tarefas que lhe forem superiormente determinadas».
Conforme alíneas a), b), c) d), e), g), j), k), l) e m), ambas do art.º 2.º do Decreto
Executivo n.º 010/2000.
Do exposto no art.º 2.º do Decreto Executivo n.º 010/2000, concluímos que o SME,
enquanto Serviço de Segurança, é uma Polícia, apesar de a legislação não a definir como
tal, mas, tem funções de polícia administrativa especial no que concerne a matéria de
estrangeiros em Angola e, desenvolve ainda actividades de polícia judiciária, conforme
disposto na alínea g) do respectivo art.º 2.º.
São autoridades de polícia no SME os funcionários superiores mencionados no seu
Estatuto Orgânico130.

130
Cfr. Art.º 19.º, alínea c), da LSN.

43
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

3.3 Serviços Prisionais


3.3.1 Conceito
De acordo com o disposto no art.º 1.º do Decreto Executivo n.º 013/2000 os
Serviços Prisionais, são o órgão especializado do Ministério do Interior encarregue do
controlo da execução de penas e medidas de segurança impostas pelos tribunais, aos
indivíduos sujeitos à privação da liberdade, sua redução, bem como do acompanhamento
dos casos de prisão preventiva.
Este órgão tem natureza de serviço de segurança e depende hierarquicamente do
Ministro do Interior, conforme artigo supra citado.

3.3.2 Atribuições e Competências


Quanto as suas atribuições, os SP tem como principal finalidade o controlo da
execução das penas e medidas de segurança impostas pelos tribunais, aos indivíduos
sujeitos à privação da liberdade, sua reeducação, bem como do acompanhamento dos casos
de prisão preventiva. Conforme consagra o art.º 1.º e 2.º do Decreto Executivo n.º
013/2000.
Os SP, nos termos do disposto no art.º 2.º do já referido Decreto Executivo tem as
seguintes competências:
«1. Garantir a aplicação das leis, normas e regulamentos na execução das penas e
demais medidas privativas de liberdade;
2. Aplicar as políticas de reeducação, formação e reinserção dos cidadãos
condenados pelos tribunais em medidas privativas de liberdade;
3. Promover o controlo da população penal;
4. Orientar e dirigir o internamento de reclusos de difícil correcção em
estabelecimentos adequados;
5. Orientar metodologicamente as unidades prisionais, sobre a aplicação das
normas e regulamentos atinentes ao tratamento dos reclusos;
6. Cooperar com as Organizações Internacionais e Instituições congéneres
visando o intercâmbio e a cooperação, no quadro da política superiormente definida;
7. Promover a formação e a superação técnico profissional dos quadros e;
8. Estabelecer protocolos de intercâmbio e cooperação com organismos do sector
produtivo, público e privado, visando a obtenção de apoio e experiências tecnológicas,

44
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

sempre que tal se mostre necessário à formação da população penal e ao funcionamento do


órgão».
Conforme alíneas a), b), c) d), e), f), g) e h), ambas do art.º 2.º do Decreto Executivo
n.º 013/2000.
Face as suas atribuições e competências, os SP, enquanto Serviço de Segurança, é
uma Polícia, apesar de a legislação não o definir como tal, mas, tem funções de polícia
administrativa especial no que concerne à garantia da segurança e ordem nos
estabelecimentos prisionais, bem como a observância das leis e de todos os regulamentos
penitenciários em vigor.

3.4 Serviço de Bombeiros


3.4.1 Conceito
De acordo com o disposto no art.º 1.º do Decreto Executivo n.º 07/2000 o Serviço de
Bombeiros, é o órgão coordenador das actividades desenvolvidas no País pelo Corpo de
Bombeiros em matéria de protecção e socorro dos cidadãos em todas as situações de risco
nomeadamente incêndios, inundações, acidentes rodoviários e outros, catástrofes,
calamidades e prestação de socorro a náufragos.

3.4.2 Atribuições e Competências


O Serviço de Bombeiros, de acordo com o disposto no art.º 2.º do seu Regulamento
Orgânico tem as seguintes atribuições:
«1. Orientar, coordenar, fiscalizar e apoiar metodologicamente todos os seus
órgãos, exercer a tutela técnica e operacional de todo o serviço de Bombeiros existente no
País;
2. Incentivar o voluntariado com vista a participação das populações nas tarefas
de prevenção e extinção de incêndios e em outras missões confiadas ao Serviço de
Bombeiros;
3. Orientar metodologicamente os Corpos de Bombeiros Voluntários e
privativos».
Conforme alíneas a), f) e g), ambas do art.º 2.º do Decreto Executivo n.º 07/2000.
Face as suas atribuições e competências, os SB, enquanto Serviços de Segurança, não
integram numa possível teorização do Direito Policial de Angola, primeiramente, porque o
Decreto Executivo que o criou não o define como polícia e, por outro lado, podemos notar

45
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

que tanto nas suas finalidades, como nos seus poderes materiais não constam nenhuma
actividade de polícia, seja administrativa ou judiciária. As suas competências estão
intimamente ligadas a questões de natureza de protecção civil e socorro dos cidadãos em
perigo quando haja situações de risco.
Partindo do pressuposto de que o objecto do Direito Policial em Angola é a
actividade de Polícia, enquanto instituição do Estado que detém o dever da regulação e
manutenção da ordem e tranquilidade públicas, prevenção e investigação criminal e, “(…)
garante da liberdade do cidadão face às ofensas ilícitas concretizadas e/ou produzidas quer
por outrem quer pelo próprio Estado”131, propusemo-nos estudar os serviços da ordem
interna do MININT.
Almejando uma melhor caracterização do Direito Policial em Angola, entendemos
necessário fazer uma caracterização (estudo da definição, bem como das atribuições e
competências) da PNA, SME e SP, enquanto forças e serviços de segurança que
contribuem na manutenção e salvaguarda da integridade e segurança nacional do Estado e
dos cidadãos que nele habitam.

131
Cfr. Cap. I, p. 15.

46
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

CAPÍTULO IV. O PODER DE POLÍCIA NO


ORDENAMENTO JURÍDICO ANGOLANO E O DIREITO
POLICIAL

1. Do Poder de Polícia em Angola (as origens do termo)


Em Angola, fruto da aprovação da CRA de 2010, deu-se a uma mudança na
compreensão do poder132 de polícia, em que as funções a serem desenvolvidas pela polícia
passaram a estar juridicamente reguladas no texto constitucional e o seu conteúdo material
prende-se no objectivo de garante da defesa, da segurança e tranquilidade públicas, bem
como evitar o perigo iminente.
No caso de Angola, o cidadão é contemplado pela Constituição, de forma expressa
ou implícita, com a garantia de inúmeros direitos que constituem a natureza de um Estado
Democrático e de Direito133. Como podemos ver no texto constitucional, art.º 30.º e
seguintes, em que se focalizam principalmente direitos como o direito à vida; à integridade
física; à integridade pessoal; à identidade; à família, casamento e filiação; à inviolabilidade
do domicílio; à liberdade física e à segurança pessoal; à propriedade; direito à livre
iniciativa económica; à liberdade de expressão de consciência, de religião e de culto; e
outros direitos fundamentais pessoais, sociais, culturais, económicos e políticos.
Desses direitos interessam-nos os direitos relativos à liberdade e à propriedade,
ambos nos seus múltiplos aspectos e facetas, “(…) cujo exercício, não obstante, não pode
se dar de forma ilimitada, que se constitua em barreira à realização dos interesses
públicos”134, ou mesmo em questões de intranquilidade aos demais cidadãos que fazem
parte da mesma colectividade.

132
Segundo o Dicionário de Política a palavra Poder designa a capacidade ou a possibilidade de agir, de
produzir efeitos. Ainda nesta senda de ideias Hobbes escreveu que o poder consiste nos meios de alcançar
alguma aparente vantagem futura; já para Gumplowicz a essência do poder consiste na posse dos meios de
satisfazer as necessidades humanas e na possibilidade de dispor livremente de tais meios. Cfr. NORBERTO
BOBBIO… GIANFRANCO PASQUINO, Dicionário de Política. 13.ª Edição. Editora: UnB, 2010.
133
Para MEIRELLES nos Estados de direito, o caso de Angola, a “Administração Pública deve obediência à lei
em todas as suas manifestações”. Cfr. HELY LOPES MEIRELLES, Direito Administrativo Brasileiro, 35.ª Edição
Actualizada, Malheiros, 2009, p. 112. Sobre este assunto, ver ainda: JORGE BACELAR GOUVEIA, Direito
Constitucional de Angola, Lisboa: Norprint, 2014.
134
Cfr. CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, citado por EDMIR NETTO DE ARAÚJO, Curso de Direito
Administrativo, 4.ª Edição, Saraiva, 2009, p. 1012.

47
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

Por este motivo, “o Estado, em nome da supremacia do interesse público sobre o


particular, é investido no poder de delimitar e restringir o exercício desses direitos,
circunscrevendo-os, prevenindo as desordens, assegurando a coexistência entre os
cidadãos, sem prejuízo, ou se não possível, com um mínimo de prejuízo ou sacrifício para
o cidadão nessa mesma colectividade, desenvolvendo acções, tomando providências,
restringindo, vedando ou impondo comportamentos com esses objectivos”135.
A polícia, no desempenho das suas actividades reveste-se de poderes de autoridade
que lhe dão supremacia sobre os cidadãos. Estes poderes de autoridade, são os chamados
poderes de polícia136, que segundo MEIRELLES, é a “faculdade de que dispõe a
Administração pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e
direitos individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado”137. É ainda no
entendimento do Autor um mecanismo de frenagem de que dispõe a Administração pública
para conter os abusos do direito individual.
Segundo JOÃO RAPOSO, poderes de polícia são os “poderes especiais de que certas
autoridades administrativas dispõem, com vista a assegurar um Estado de ordem e
tranquilidade públicas e o normal exercício dos direitos fundamentais dos cidadãos
(…)”138. De realçar que estes poderes, em determinadas circunstâncias, permitem que haja
coacção directa e, ou, emprego da força física sobre aqueles que infringirem o legalmente
estabelecido.
Na concepção de ODETE MEDAUAR, o poder de polícia é entendido como a
“actividade da Administração que impõe limites ao exercício de direitos e liberdades” 139. É
nessa actividade em que o Estado mais expressa o seu poder de autoridade e a sua face
imperativa. Num Estado onde existe um ordenamento jurídico é imprescindível a adopção
de medidas que visam disciplinar o exercício dos direitos, liberdades e garantias
fundamentais dos cidadãos.
Contudo, num sentido amplo o poder de polícia é entendido como “a actividade
estatal de condicionar a liberdade e a propriedade, ajustando-as aos interesses

135
Cfr. EDMIR NETTO DE ARAÚJO, Curso de Direito Administrativo, … p. 1012.
136
Estes poderes de polícia já vêem contidos na própria definição jurídica da polícia, sendo estes dois
institutos indissociáveis, de forma que a compreensão de ambos é essencial para que se apreenda sobre o
conjunto que formam. Cfr. JÚLIO CÉSAR LUCIANO, O A Polícia e o Poder de Polícia no Direito Brasileiro, In
Estudos de Direito de Polícia, 1º. Volume, coord. de Jorge Miranda, Lisboa, AAFDL, 2003, p. 31.
137
Cfr. HELY LOPES MEIRELLES, Direito Administrativo Brasileiro, 35.ª Edição Actualizada, Malheiros, 2009,
p. 133.
138
Cfr. JOÃO RAPOSO, Direito Policial – I, ICPOL – Colecção do Centro de Investigação do ISCPSI,
Coimbra: Almedina, 2006, p. 23.
139
Cfr. ODETE MEDAUAR, Direito Administrativo Moderno. 18.ª Ed. Revista dos Tribunais, 2004, p. 391.

48
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

colectivos”140. Já numa perspectiva restrita a expressão poder de polícia pode ser tida
como relacionando-se unicamente com as intervenções, quer gerais e abstractas, quer
concretas e específicas do poder executivo, destinadas a alcançar o mesmo fim de prevenir
e obstar ao desenvolvimento de actividades particulares contratantes com os interesses
sociais141.
No entender de JOÃO CAUPERS, para além do carácter limitativo da liberdade que os
poderes de polícia assumem, pode-se apontar-lhe três outros traços a saber: a
universalidade; a não sujeição às regras procedimentais; e a insusceptibilidade de
concessão dos poderes de polícia142.
Para este Autor, em primeiro lugar, os poderes de polícia são por natureza
unilaterais, insusceptíveis de negociação ou compromisso. Trata-se de um exercício de
autoridade e esta não se transacciona, nem se compromete. Não impedindo, de forma
óbvia, a audiência prévia dos interessados sempre que esta for compatível com os poderes
de polícia.
Em segundo lugar, o exercício dos poderes de polícia não está sujeito, ou pode não
estar sujeito a regras procedimentais. Em determinadas situações, fruto da urgência da
actividade policial não é susceptível assegurar a exigência prévia dos interessados ou, até,
exigências constitucionais e legais de fundamento das decisões administrativas.
Em terceiro e último, aponta-se a insusceptibilidade de concessão dos poderes de
polícia, o que quer dizer que os poderes de polícia não podem ver o seu exercício
concedido a particulares, é exclusivo da autoridade do Estado.
Segundo CATARINA SARMENTO E CASTRO, “é essencialmente a partir do Estado
Moderno que o poder de “polícia”, “governamental” ou “graça”, residual na idade media,
aparece como “marca caracterizadora” de um novo Estado, enquanto promoção do bem-
estar social, “conformando e recriando equilíbrios sociais”143.
Na Idade Média já se exercia o poder de polícia tal como é hoje entendido, no âmbito
das comunas e municípios europeus, pelos seus administradores, contribuindo para manter
a ordem e a tranquilidade nas modernas cidades. Em várias comunas havia licenças de

140
Cfr. EDMIR NETTO DE ARAÚJO, Curso de Direito Administrativo, 4.ª Edição, Saraiva, 2009, p. 1015.
141
Cfr. EDMIR NETTO DE ARAÚJO, Curso de Direito Administrativo, … p. 1015.
142
Cfr. JOÃO PEDRO BARROSA CAUPERS, Introdução ao Direito Administrativo, 11.ª Edição, Lisboa: Âncora,
2013, p. 206.
143
Cfr., CATARINA SARMENTO E CASTRO, A questão das Policias Municipais, Coimbra: Editora, 2003, p. 23.

49
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

construção, alinhamento nas construções, fiscalização das profissões como protecção dos
consumidores e polícia sanitária144.
A expressão poder de polícia, bem como a sua noção tem origem no direito
americano145, onde o referido vocábulo police power146 teria sido pela primeira vez
utilizado, significando sistema de regulamentação interna para preservar a ordem pública e
garantir de forma individual o gozo ininterrupto do seu próprio direito147. De salientar que
a sua origem está fortemente associada à jurisprudência, pelos mediáticos casos como
Brown e Maryland (1827), que depois de árduos trabalhos de conceituação, estenderam-se
para outros países, mas, com o mesmo sentido148.
Como podemos notar, das definições supracitadas, tanto portuguesas como
estrangeiras, há um ponto comum entre elas, o facto de o poder de polícia consistir na
actividade discricionária e não arbitraria do Estado (Administração Pública), ainda que
vinculada (por vezes), de ditar e executar determinadas medidas limitadoras do direito
individual do cidadão, com a finalidade de garante do interesse público da colectividade e
sobretudo a preservação do Estado.
Para MEIRELLES, o poder de polícia administrativa tem como objecto “todo o bem,
direito ou actividade individual que possa afetar a colectividade ou pôr em risco a
segurança nacional, exigindo, por isso mesmo, regulamentação, controle e contenção do
Poder Público”149.
Por outro lado, tem como finalidade “a protecção ao interesse público no seu sentido
mais amplo”150.
Contudo, “a razão do poder de polícia é o interesse social”151, e o seu fundamento
consiste no princípio da supremacia do interesse público da colectividade sobre o
particular, em que se atribui à Administração Pública uma posição de preponderância sobre
os Administrados, e “se lhe atribui a faculdade (poder discricionário) e mais que isso, o

144
Cfr. ODETE MEDAUAR, Direito Administrativo Moderno. 18.ª Ed. Revista dos Tribunais, 2004, p. 392.
145
Sobre este assunto, muitos autores fazem referência à origem e evolução do vocábulo. Pode ver-se, v.g.,
JÚLIO CÉSAR LUCIANO, A Polícia e o Poder de Polícia no Direito Brasileiro, In Estudos de Direito de Polícia,
1º. Volume, coord. de Jorge Miranda, Lisboa, AAFDL, 2003 e ODETE MEDAUAR, Direito Administrativo
Moderno. 18.ª Ed. Revista dos Tribunais, 2004.
146
De acordo com ODETE MEDAUAR esta expressão deu origem ao poder de polícia e se referia ao poder dos
Estados Membros (Americanos) de editar leis limitadoras de direito, em benefício do interesse público. Cfr.
ODETE MEDAUAR, Direito Administrativo Moderno. 18.ª Ed. Revista dos Tribunais, 2004, p. 392.
147
Cfr. EDMIR NETTO DE ARAÚJO, Curso de Direito Administrativo, 4.ª Edição, Saraiva, 2009, p. 1013.
148
Cfr. EDMIR NETTO DE ARAÚJO, Curso de Direito Administrativo, … p. 1013.
149
Cfr. HELY LOPES MEIRELLES, Direito Administrativo Brasileiro, 35.ª Edição Actualizada, Malheiros, 2009,
p. 136.
150
Cfr. HELY LOPES MEIRELLES, Direito Administrativo Brasileiro, … p. 136.
151
Cfr. HELY LOPES MEIRELLES, Direito Administrativo Brasileiro, … p. 135.

50
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

dever, quando aflora interesse público concretamente existente, de elaborar normas


concretas e tomar medidas ou decisões para prover às exigências de oportunidade e/ou
conveniência na realização desse interesse público, dentro dos quadros da legalidade”152.

2. Particularidades do Poder de Polícia


Diferente dos demais actos administrativos levados a cabo pela Administração
Pública, o poder de polícia, enquanto poder conferido à Administração, reúne em si
determinadas particularidades ao seu exercício, que o diferenciam dos outros,
nomeadamente, “a discricionariedade, a auto-executoriedade, a coercibilidade e o devido
processo legal”153.
A discricionariedade não é mais do que a liberdade conferida por lei à Administração
Pública para escolher dentre várias situações juridicamente admissíveis, aquela que melhor
satisfaz o interesse da colectividade154.
Esta particularidade do poder de polícia “representa a livre escolha pela
Administração Pública da oportunidade e conveniência de exercer seu poder de polícia,
aplicando e graduando sanções, empregando os meios necessários para atingir os fins
pretendidos, que deverão ser em prol do interesse público, sempre dentro dos limites
estabelecidos pela lei, pois fora desta estará caracterizada a arbitrariedade”155.
A existência de discricionariedade está associada normalmente na utilização “no
texto da estatuição das normas jurídicas, de expressões linguísticas com significado
permissivo (paradigmaticamente, no caso da discricionariedade de acção, o verbo «poder»,
o substantivo «faculdade»; no caso da discricionariedade de escolha, a conjugação «ou»;
no caso da discricionariedade criativa, a utilização de conceitos indeterminados ou
cláusulas gerais como «medidas adequadas»)”156.
Segundo JÚLIO CÉSAR LUCIANO a discricionariedade “encontra limites na
competência, forma (caso haja norma que a regulamente) e finalidade (que sempre deve ser

152
Cfr. EDMIR NETTO DE ARAÚJO, Curso de Direito Administrativo, 4.ª Edição, Saraiva, 2009, p. 1013.
153
Cfr. JÚLIO CÉSAR LUCIANO, A Polícia e o Poder de Polícia no Direito Brasileiro, In Estudos de Direito de
Polícia, 1º. Volume, coord. de Jorge Miranda, Lisboa, AAFDL, 2003, p. 36-37. Sobre este assunto, muitos
autores fazem ainda referência. Pode ver-se, v.g., ÂNGELA MARIA CAVALIERE LORENTZ, Limites ao Poder de
Polícia, In Estudos de Direito de Polícia, 1º. Volume, coord. de Jorge Miranda, Lisboa, AAFDL, 2003; HELY
LOPES MEIRELLES, Direito Administrativo Brasileiro. 35.ª Ed. Malheiros Editores, 2009.
154
Cfr. JÚLIO CÉSAR LUCIANO, A Polícia e o Poder de Polícia no Direito Brasileiro, In Estudos de Direito de
Polícia, 1º. Volume, coord. de Jorge Miranda, Lisboa, AAFDL, 2003, p. 37.
155
Idem, p. 36-37.
156
Cfr. MARCELLO REBELO DE SOUSA e ANDRÉ SALGADO DE MATOS, Direito Administrativo Geral, Tomo I,
3.ª Edição, Reimpressão, Lisboa: Dom Quixote, 2013, p. 187.

51
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

o interesse público), pois, quanto a estes elementos, o poder de polícia é sempre


vinculado”157.
Contudo, todos os actos de polícia, que a princípio são discricionários passam a ser
vinculados na possibilidade de existência de normas jurídicas que regulam a forma e o
modo da sua execução.
Esta discricionariedade não deve de maneira alguma ser confundida com
arbitrariedade, pois enquanto aquela representa a faculdade da Administração Pública agir
dentro dos limites estabelecidos por lei, esta se caracteriza pela acção fora ou, além dos
limites legalmente estabelecidos, denotando um autêntico desvio ao poder158.
Da mesma forma, a utilização da discricionariedade na execução de poderes de
polícia pela Administração Pública deve ser na estreita medida da justificação dos seus
fins, sempre em harmonia com a proporcionalidade entre os limites impostos pela
Administração e o fim a que se pretende. A ausência da proporcionalidade representa
abuso de poder, “(…) pois as prerrogativas inerentes à Administração Pública,
notadamente o seu poder de coercibilidade, tem como único escopo o interesse colectivo,
não sendo lícito que esta se utilize deste poder em detrimento de outrem, sob pretexto de
buscar interesse público inexistente”159.
A auto-executoriedade é, também, uma particularidade do poder de polícia, ela
representa a capacidade conferida à Administração Pública de, por si só, decidir e
directamente executar as suas decisões socorrendo-se dos seus próprios meios, sem haver
necessidade de uma intervenção previa do poder judicial, pois nega-la significaria negar o
próprio poder de polícia da Administração pública, tendo em conta que este necessita de
ser executado por intermédio de acto administrativo sumário, directo e imediato.
A auto-executoriedade é a faculdade da Administração Pública decidir e executar
directamente a sua decisão pelos seus próprios meios, sem intervenção do poder judicial160.
No uso desse poder, “a Administração impõe directamente as medidas ou sanções de

157
Cfr. JÚLIO CÉSAR LUCIANO, A Polícia e o Poder de Polícia no Direito Brasileiro, In Estudos de Direito de
Polícia, 1º. Volume, coord. de Jorge Miranda, Lisboa, AAFDL, 2003, p. 37.
158
Cfr. JÚLIO CÉSAR LUCIANO, A Polícia e o Poder de Polícia no Direito Brasileiro, In Estudos de Direito de
Polícia,… p. 37.
159
Cfr. JÚLIO CÉSAR LUCIANO, A Polícia e o Poder de Polícia no Direito Brasileiro, In Estudos de Direito de
Polícia,… p. 37.
160
Cfr. ÂNGELA MARIA CAVALIERE LORENTZ, Limites ao Poder de Polícia, In Estudos de Direito de Polícia,
1º. Volume, coord. de Jorge Miranda, Lisboa, AAFDL, 2003, p. 440.

52
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

polícia administrativa necessárias à contenção da atividade anti-social que ela visa a


obstar”161.
Em Angola, são excepções à auto-executoriedade dos poderes de polícia da
Administração Pública, a desapropriação e a execução fiscal, pois, nestes casos, essas
acções só podem ser executadas por via do poder judicial.
A coercibilidade representa também uma particularidade importante do poder de
polícia, e pode ser entendida como “a faculdade que a Administração tem de impor
coactivamente as medidas de polícia adoptadas”162. Todos os actos de polícia revestem
obrigatoriedade para o seu destinatário, admitindo mesmo o uso proporcional e adequado
da força para o seu cumprimento quando se verifica resistência do administrado e são
acompanhados das respectivas sanções.
Segundo MEIRELLES, “a coercibilidade do ato de polícia justifica o emprego da força
física quando houver imposição do infractor, mas não legaliza a violência desnecessária ou
desproporcional à resistência, que em tal caso pode caracterizar o excesso de poder e o
abuso de autoridade nulificadores do ato praticado e ensejadores das acções civis e
criminais para a reparação do dano e punição dos culpados”163.
De realçar que o uso da coercibilidade pela Administração no desempenho efectivo
dos seus poderes de polícia deve ser sempre acompanhado do princípio da
proporcionalidade, deslegitimando de per si, o uso inadequado e desproporcional da força,
o que poderá ser punível por lei.
De salientar que em Angola, qualquer das três particularidades depende em última
instância daquilo que a legislação ordinária específica determina, servindo sempre e
somente à lei, não apenas como limite de acção da Administração Pública tendo em conta a
supremacia da lei, como também o próprio fundamento que autoriza previamente a acção.
Portanto, o que a lei expressamente permite, pode e deve ser administrativamente
aceite enquanto medida de polícia, (…) traduzindo-se portanto em um "atributo" desse
poder; e o que a lei não permite expressamente, isso não pode ser adoptado”164.

161
Cfr. HELY LOPES MEIRELLES, Direito Administrativo Brasileiro, 35.ª Edição Actualizada, Malheiros, 2009,
p. 139.
162
Cfr. ÂNGELA MARIA CAVALIERE LORENTZ, Limites ao Poder de Polícia, In Estudos de Direito de Polícia,
1º. Volume, coord. de Jorge Miranda, Lisboa, AAFDL, 2003, p. 440.
163
Cfr. HELY LOPES MEIRELLES, Direito Administrativo Brasileiro, 35.ª Edição Actualizada, Malheiros, 2009,
p. 130.
164
Cfr. ITIBERÊ DE OLIVEIRA CASTELLANO RODRIGUES. Fundamentos dogmático-jurídicos de um poder de
polícia administrativo à brasileira, Revista Diálogo Jurídico, Salvador, nº. 17, 2008, p. 15.

53
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

3. Limites Impostos ao Poder de Polícia em Angola


O poder é definido como sendo “a imposição da vontade e dos objectivos de alguém
a outrem independentemente da relutância eventualmente manifestada”165.
Todo o poder de um homem exercido sobre outrem tem seus limites, pois o poder
ilimitado contraria o juridicamente estipulado. Mas existem os chamados controles do
poder, que limitam na estreita medida do necessário os abusos de poder.
O exercício dos poderes de polícia encontram limites tanto no princípio da legalidade
como nos próprios direitos fundamentais declarados e assegurados pela CRA.
O exercício do poder de polícia encontra limites no princípio da legalidade estrita, ou
seja, a polícia administrativa deve ser regida por leis reguladoras da sua actuação, apesar
dos actos administrativos em grande parte permitirem uma actuação discricionária da
Administração; encontra ainda limites nos direitos e garantias fundamentais consagrados
na CRA, nomeadamente, à propriedade, à liberdade, à segurança pessoal e a tranquilidade.
A Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, veio densificar o
significado de dignidade humana, concebendo cada vez mais uma maior protecção e
garantia dos direitos fundamentais dos cidadãos. Foi devido a esta Declaração que os
Estados aderiram cada vez mais a uma chamada constitucionalização dos direitos,
liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos.
Na perspectiva de ÂNGELA LORENTZ, o primeiro limite ao poder de polícia, é pois, o
respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana – considerado o “princípio dos
princípios” e aos direitos fundamentais que dela derivam166. Este princípio serve de
impedimento àqueles a quem se confia os poderes de polícia da Administração a não
usarem de forma contrária ao legalmente estabelecido por lei.
O poder de polícia acarreta em si restrições ao exercício de um direito fundamental
em benefício do interesse público. Por outro lado, o reconhecimento de direitos
fundamentais dos cidadãos configura um limite ao poder de polícia, pelo que, estes não
devem ser suprimidos. Pelo que “nem sempre apresenta-se fácil situar o ponto onde
começa a violação dos direitos fundamentais, algumas hipóteses emergem”167:
«a) Existe lei disciplinadora do direito fundamental. Nesse caso, o poder de polícia é
limitado pelos preceitos da lei, não se admitindo prescrição mais rigorosa que a da lei; as

165
Cfr. ARTUR DA ROCHA MACHADO, O Poder – Da Estrutura Individual À Construção Mediática, Instituto
Superior de Ciências Sociais e Políticas, Lisboa, 2000, p. 447.
166
Cfr. ÂNGELA MARIA CAVALIERE LORENTZ, Limites ao Poder de Polícia, In Estudos de Direito de Polícia,
1º. Volume, coord. de Jorge Miranda, Lisboa, AAFDL, 2003, p. 449.
167
Cfr. ODETE MEDAUAR, Direito Administrativo Moderno. 18.ª Ed. Revista dos Tribunais, 2004, p. 400.

54
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

restrições da lei devem ser interpretadas de modo restrito, isto é, no sentido mais favorável
ao exercício do direito. Por vezes a lei confere à autoridade administrativa a faculdade de
agravar disposições da lei, em casos especiais, mas sempre de modo temporário.
b). Inexiste lei disciplinadora do direito fundamental. Neste caso observadas as
regras de competência, a medida de polícia, sempre fundamentada no interesse público,
deve ser: b1) necessária, isto é, exigida ante as circunstâncias, para evitar conflitos,
desordens, perigo à integridade de pessoas e bens; b2) eficaz, isto é, adequada para evitar
perturbação; por exemplo: em locais de grande afluxo de pessoas são impostas restrições
mais amplas que em locais sem nenhum afluxo de pessoas; em geral medidas temporárias
podem ser mais rigorosas que medidas gerais e permanentes»168.
Ainda segundo esta Autora, o poder de polícia encontra também o seu limite na
legalidade dos meios. A forma e os meios de exercício dos poderes de polícia devem estar
previamente estabelecidos por lei. Na falta desta norma, cabe à autoridade competente para
a escolha dos meios observar os princípios e limites apontados na supra citada alínea a).
Consideramos que, entre os limites ao poder de polícia, importa acrescentar os
princípios inerentes à actividade de polícia; os axiomas; as regras; as normas, bem como a
sua utilização incorrecta, especificamente quando o poder é exercido para servir fins de
interesse pessoal, subjectivos ou político-partidários, caso em que se desvirtua a sua
finalidade, a salvaguarda do interesse público da colectividade.

4. Dos Quadrantes dos Poderes de Polícia no Âmbito do Direito


Policial
A polícia, no desempenho das suas funções pode promover medidas de índole
policial, ou seja, “(…) medidas de competência própria das polícias, tendo em conta a
competência subjectiva activa para a promoção de cada uma das medidas. As medidas de
índole policiais podem-se sintetizar em três quadrantes de acordo com a natureza jurídica
da actividade policial: administrativa, de segurança ou judiciária/criminal”169.

168
Cfr. ODETE MEDAUAR, Direito Administrativo Moderno. 18.ª Ed. Revista dos Tribunais, 2004, p. 400.
169
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 4.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 69.

55
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

4.1 Das Licenças e Autorizações como Exteriorização dos Poderes de


Polícia Administrativa
A Administração Pública pode exercer os seus poderes de polícia de diversas formas.
De acordo com o disposto no nosso ordenamento jurídico, a Administração pode publicar
decretos regulamentares, decretos executivos, resoluções, portarias e até despachos.
ODETE MEDAUAR defende, como exemplos intimamente associados ao exercício dos
poderes de polícia, as licenças e as autorizações170.
MARCELLO CAETANO considera a licença como “o acto administrativo que permite a
alguém a prática de um acto ou exercício de uma actividade relativamente proibidos”171.
Diz-se actividade relativa quando a lei admite que a actividade previamente proibida seja
exercida em casos de permissão por parte da Administração. A priori, o administrado ao
pedir à administração que lhe seja concedida a licença não goza de quaisquer direitos,
tendo em conta que a actividade é proibida por lei, contudo cabe à Administração conferir
esse direito de exercício ao administrado mediante licença administrativa172.
A licença, na linha de ODETE MEDAUAR, é definida como todo “o acto administrativo
vinculado pelo qual o poder público, verificando que o interessado atendeu a todas as
exigências legais possibilita-lhe a realização de atividades ou de fatos materiais, vedados
sem tal apreciação”173. A licença para ser concedida necessita de apreciação do titular do
poder público com competências jurídicas no que concerne ao exercício de direitos que o
ordenamento jurídico reconhece ao interessado, por estes factos a licença não deve ser
negada pela autoridade administrativa quando o requerente reúne em si todas as condições
necessárias e legais para a obtenção da licença.
A licença pode ser retirada por cassação da mesma, quando o particular incumprir os
requisitos estabelecidos por lei e pelos quais a mesma lhe foi passada; e por revogação do

170
Cfr. ODETE MEDAUAR, Direito Administrativo Moderno. 18.ª Ed. Revista dos Tribunais, 2004, p. 398.
171
Cfr. MARCELLO CAETANO, Manual de direito Administrativo, Volume I, 10.ª Edição, 4.ª Reimpressão,
Coimbra, 1990, p. 459.
172
MARCELLO CAETANO adverte-nos sobre a imperatividade de não confundirmos a licença administrativa
que acabamos de referir, com a licença fiscal que condiciona o exercício de certa actividade lícita ao
pagamento de um imposto ou de uma taxa, pois, trata-se de um acto de natureza diferente do primeiro, pelo
que, na segunda, o que importa é sobretudo o aspecto tributário e não o preenchimento de requisitos. Na
primeira, mesmo quando motiva o pagamento de emolumentos ou taxas, resulta da verificação pelas
autoridades competentes, de que certa actividade proibida ou condicionada pode ser exercida em tal caso
concreto e por tal pessoa, sem inconveniente ou risco para os interesses que se pretende cautelar. Cfr.
MARCELLO CAETANO, Manual de direito Administrativo, Volume I, 10.ª Edição, 4.ª Reimpressão, Coimbra,
1990, p. 460; Cfr. MARCELLO CAETANO, Manual de direito Administrativo, Volume II, 10.ª Edição, 3.ª
Reimpressão, Coimbra, 1990, p. 1168.
173
Cfr. ODETE MEDAUAR, Direito Administrativo Moderno. 18.ª Ed. Revista dos Tribunais, 2004, p. 398.

56
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

acto, se entretanto haver interesse público que entenda existir fortes motivos que legitimem
a não realização da actividade que acabara de licenciar174.
Segundo MARCELLO CAETANO, a autorização é o acto administrativo que permite a
alguém o exercício de um seu direito ou de poderes legais”175.
Para ODETE MEDAUAR, a autorização é entendida como um “ato administrativo
discricionário e precário, pelo qual a Administração consente no exercício de certa
actividade; portanto, inexiste o direito subjectivo à actividade; no âmbito do poder de
polícia, diz respeito ao exercício de actividades cujo exercício pode, em muitos casos,
constituir perigo ou dano para a colectividade, mas que não é oportuno impedir de modo
absoluto; por isso a autoridade administrativa tem a faculdade de examinar, caso a caso, as
circunstâncias de facto em que o exercício pode desenvolver-se, a fim de apreciar a
conveniência e oportunidade da outorga”176.
Ao contrário das licenças, nas autorizações, o administrado (entidade autorizada)
possui um direito ou determinado poder, mas o exercício dos mesmos está-lhe vedado por
lei, antes que haja um consentimento prévio da Administração, após fundada apreciação
das circunstâncias de interesse da colectividade que considerem conveniente ou
inconveniente o exercício de tal actividade. Como ensina MARCELLO CAETANO, trata-se “do
condicionamento de um direito do particular ou do exercício da competência de um órgão
ou agente da Administração (autorizações tutelares e, delegações de poderes…)”177.
Definidos que estão os conceitos de licença e autorização, importa clarificar que nem
todas as licenças e autorizações são actos de polícia. Tanto a licença como a autorização só
revestem natureza policial se forem praticadas por autoridades policiais com poderes de
polícia e no âmbito do desempenho desses poderes de polícia em exercício da actividade
policial.
Existem no ordenamento jurídico angolano determinadas licenças e autorizações que
não revestem natureza policial, pois não são autorizadas por autoridades de polícia e,
noutros casos revestem de dupla natureza pois, dependem tanto de autorização da
Administração dos municípios como da autoridade de polícia competente: vg., as
autorizações disciplinares ou tutelares, bem como as licenças concebidas pelo superior
174
Segundo ODETE MEDAUAR, as licenças exteriorizam através de documento próprio denominado Alvará.
Vg., licença de construção de obras; licenças de actividade comercial; licença ambiental etc… Cfr. ODETE
MEDAUAR, Direito Administrativo Moderno. 18.ª Ed. Revista dos Tribunais, 2004, p. 399.
175
Cfr. MARCELLO CAETANO, Manual de direito Administrativo, Volume I, 10.ª Edição, 4.ª Reimpressão,
Coimbra, 1990, p. 459.
176
Cfr. ODETE MEDAUAR, Direito Administrativo Moderno. 18.ª Ed. Revista dos Tribunais, 2004, p. 399.
177
Cfr. MARCELLO CAETANO, Manual de direito Administrativo, Volume I, 10.ª Edição, 4.ª Reimpressão,
Coimbra, 1990, p. 459.

57
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

hierárquico ao seu funcionário subalterno. No que concerne às licenças de dupla natureza,


em Angola, a licença de construção pertence simultaneamente à polícia administrativa e às
administrações municipais; já as licenças de condicionamento industrial são ao mesmo
tempo actos de polícia económica no que concerne ao controlo da tecnologia instalada, e
actos da Administração no que concerne à licença e alvará que autorizam a edificação da
obra.
A licença policial “só é concedida quando se verifique não provirem delas
inconvenientes para a ordem pública; a licença fiscal é dada a todos os que satisfaçam o
imposto e fica sendo, por natureza, irrevogável durante o período a que o mesmo imposto
respeite”178.
Ainda na perspectiva deste Autor, as licenças policiais podem ser facultativas ou
obrigatórias. A licença é facultativa179 se a lei confere à autoridade policial um poder
discricionário para apreciar caso por caso e conceder a licença ou não, como em seu
critério entender que melhor é preenchido o fim legal. É obrigatória se a autoridade policial
está vinculada por lei e tem de passar a licença a todo aquele que a requeira e demostra
reunir todas as condições exigidas por lei.

4.2 Dos Poderes de Polícia de Ordem e Segurança Pública e de


Polícia Judiciária/Criminal
Na construção de um Direito Policial de Angola não se deve circunscrever apenas
aos poderes de polícia administrativa, tendo em conta que no âmbito do Direito Policial as
relações jurídicas estudadas são as “designadas relações jurídico-administrativas ou
jurídico-criminais de momento (…)”180. Por este facto, vamos ainda abordar de maneira
sucinta a questão dos poderes de polícia de ordem e tranquilidade públicas (segurança
nacional) e de polícia judiciária (actividade de investigação criminal).
A polícia em Angola, na sua actividade jurídico-administrativa (ordem e
tranquilidade públicas), está, em regra, “(…) dotada de atribuições e investida desses
poderes especiais – de ius imperii – como defensora da legalidade democrática, como

178
Cfr. MARCELLO CAETANO, Manual de direito Administrativo, Volume II, 10.ª Edição, 3.ª Reimpressão,
Coimbra, 1990, p. 1168.
179
Podemos dar como exemplo as licenças de uso e porte de arma que são passadas pelas autoridades de
polícia em Angola.
180
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 4.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 39.

58
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

defensora e garante da segurança [nacional] e dos direitos dos cidadãos181. Por este facto,
desenvolve as “(…) designadas medidas puras de polícia, que são ordenadas pelas
Autoridades de Polícia e/ou promovidas pelos Agentes de Polícia que estão subordinados
àquela Autoridade, que exerçam uma função de comando e/ou direcção, ou seja, os
Agentes de Polícia encontram-se em situação de dependência hierárquica”182.
Podem essas medidas consistir tanto em medidas (gerais) de polícia, como em
medidas especiais de polícia.
No que concerne à polícia de natureza judiciária [actividade de investigação
criminal], esta pode aplicar, por iniciativa própria, as designadas medidas cautelares e de
polícia, previstas e tipificadas [em toda a legislação processual penal de Angola, de acordo
com os princípios que orientam a actividade policial]183.

5. A Problemática da Desintegração da Actividade de Investigação


Criminal na Polícia Nacional de Angola – e o Direito Policial
A PNA caracteriza-se por ser uma polícia integral184. Desenvolve actividades de
polícia em todos os seus domínios: actividade de polícia de ordem e tranquilidade públicas,
administrativa geral e especial e de polícia judiciária (actividade de investigação criminal),
até hoje levada a cabo por duas direcções do Comando Geral da PNA (CGPNA); a
Direcção de Investigação Criminal e a de Investigação e Inspecção das Actividades
Económicas. Esta última, como o nome nos indica, mais virada para a investigação e
inspecção de crimes económicos, desde a fraude fiscal, fuga ao fisco e ao branqueamento
de capitais.
As competências de investigação criminal integram o objecto do Direito Policial e,
por isso, relevantes para o nosso estudo.
A investigação criminal é definida em termos materiais como a “área do
conhecimento especializado que tem por objecto de análise o crime e o criminoso e, por
objectivo, a descoberta e reconstituição da verdade material de factos penalmente
relevantes e a demonstração da sua autoria”185.

181
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 4.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, pp. 39-40.
182
Jdem, pp. 68-69.
183
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 4.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 69.
184
Cfr. Disposto no art.º 5.º do Decreto-lei n.º 20/93, de 11 de Junho, que aprova o Estatuto Orgânico da
PNA.
185
Cfr. JOSÉ BRAZ, Investigação Criminal, 3.ª Edição, Coimbra: Almedina, 2013, p. 21.

59
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

MANUEL VALENTE define investigação criminal como “ um processo de procura de


indícios e de vestígios que indiquem, expliquem e façam compreender quem, como,
quando, onde e porquê foi cometido o crime X (o quê?)”186.
Na perspectiva deste Autor, a investigação criminal, tem “como fim último a
realização do direito das prossecuções de defesa da sociedade, do colectivo, que tem o
direito de viver em segurança e numa ordem social e internacional que lhe garanta a
efectivação plena dos seus direitos e liberdades, ou seja, a realização dos fins de interesse
da ordem jurídica, em particular do direito penal e das penas, subjugados a princípios
consagrados constitucionalmente que só se alcançam quando se descobre quem é que,
como é que, quando é que, onde é que, e o porque é que se praticou aquele delito: o que é
que. Realiza-se desta forma o “Direito como instituição, como ordem concreta (…)
culminando-se o processo jurídico de ordenação da vida em sociedade”. A realização do
Direito concretiza o alcance da paz jurídica pública”187.
Como vimos, a actividade de investigação criminal não visa, desta forma, uma
formulação de causas explicativas e etiológicas do fenómeno criminal em geral ou das
diversas categorias de crime, visa somente, a explicação e demostração objectiva concreta
de um determinado crime, permitindo desta forma ao poder judicial a realização da
justiça188.
Até a aprovação do Decreto Presidencial n.º 14/209, de 18 de Agosto de 2014, que
aprova a nova orgânica do MININT, a actividade de investigação criminal anteriormente
definida constava das competências da PNA enquanto polícia integral, como podemos ver
no seu Estatuto Orgânico e no art.º 210.º da CRA que a define e a reconhece como única
força de segurança no país.
A entrada em vigor deste estatuto vem criar um Serviço de Investigação Criminal
(SIC), que deve depender directamente do MININT e absorver todas as funções
anteriormente desenvolvidas pela PNA, tanto no capítulo da Investigação Criminal como
da Investigação e Inspecção das Actividades Económicas.

186
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 4.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, p. 395.
187
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, 4.ª Edição, Coimbra:
Almedina, 2014, pp. 398-399.
188
Cfr. JOSÉ BRAZ, Investigação Criminal, 3.ª Edição, Coimbra: Almedina, 2013, p. 21.

60
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

A PNA segue um modelo de polícia nacional em que a sua organização é única e as


suas missões serão exercidas em todo o território nacional que faz parte do Estado
Angolano189.
Posto isto, face aos princípios da legalidade, da unicidade territorial e ao da
hierarquia, dispostos no Estatuto Orgânico da PNA, bem como os preceitos constitucionais
da República de Angola, questionamo-nos sobre o seguinte: será admissível a
desintegração da actividade de Investigação Criminal da PNA e, consequentemente, a
criação de um Serviço de Investigação Criminal na dependência directa do MININT?
Não se afigura profícuo esse desiderato, na medida em que a legislação angolana
(Estatuto Orgânico da PNA e CRA) procurou sempre e, desde cedo, deixar clara a ideia de
unificação formal e material das atribuições e competências da polícia em uma única
polícia, denominada pela CRA como PN. Por outro lado, as novas concepções de polícia
que têm vindo a ser criadas por Estados que procuram a modernização desses serviços
apresentam uma tipologia de polícia única (o caso da PNA antes da criação do SIC) cuja
actividade está assente em três vertentes da actividade policial: a da ordem e tranquilidade
públicas, administrativa geral e especial e a judiciária; assim, a prossecução do seu
trabalho deve desenvolver-se de acordo as medidas de polícia e aos princípios190 basilares
da actividade policial.
A PNA ganhou legitimidade constitucional com a aprovação da CRA de 2010, que
veio determinar a sua orgânica, a sua unicidade territorial, bem como a materialidade e
sobretudo a subordinação aos princípios gerais do regime jurídico-constitucional da
Administração Pública que a CRA consagra, nomeadamente, o princípio da reserva da lei,
da unicidade de comando e organização única e da responsabilização judicial.
A legislação angolana em vigor, no que tange à matéria de polícia, impõe que as
diversas vertentes da actividade policial devem estar centradas numa única estrutura (uma
só polícia), cujas competências e atribuições estejam plasmadas na lei.
Admite-se que o legislador angolano denominou a Polícia angolana de PN, de
maneira a deixar claro a consolidação e a materialização da unidade nacional, um objectivo
claro do Estado angolano; por outro lado, fê-lo de maneira que não permitisse a criação de
vários corpos de polícia sob a dependência tanto de ministérios diferentes, como do próprio
MININT.

189
Cfr. Disposto no n.º 2 do art.º 3.º, Capítulo IV do Decreto-lei n.º 20/93 de 11 de Junho, que aprova o
Estatuto Orgânico da PNA.
190
Cfr. Art.º 210.º da CRA que define a PN.

61
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

À génese do Serviço de Investigação Criminal, está subjacente a ideia de que uma


investigação criminal autónoma do CGPNA e sob tutela directa do MININT promoveria
uma melhor e mais célere prevenção e investigação da criminalidade que vem crescendo
cada vez mais em Angola, o que permitiria uma grande aproximação e um consequente
maior relacionamento com as autoridades judiciárias angolanas.
Em nosso entender, não se afiguram correctas essas afirmações. Consideramos que
há um afastamento constitucional decorrente do art.º 210.º da CRA. A prossecução da
actividade policial não se deve afastar do preceito constitucional a que se vincula. Esses
preceitos têm que ver com o cumprimento escrupuloso dos princípios da
constitucionalidade, da legalidade, da igualdade, da imparcialidade, da isenção e
objectividade, bem como o dever de colaboração com as demais instituições do Estado
sempre que se afigure necessário. Como afirma MANUEL VALENTE, “constitucionaliza-se o
princípio da colaboração das polícias com os tribunais no âmbito em que forem solicitadas
a participar na garantia e reposição da legalidade, revestindo a polícia, nos casos de
processo penal, a veste de órgão de polícia judiciária como órgão auxiliar da
administração da justiça”191.

6. As Implicações Jurídicas da Desintegração da Actividade de


Investigação Criminal na Polícia Nacional de Angola à Luz do Direito
Positivo Vigente
O n.º 3 do art.º 210.º da CRA dispõe que cabe à lei regular a organização e
funcionamento da PN. Da leitura do exposto, apercebemo-nos que estamos diante de uma
situação de reserva da lei, pois, a CRA exige a regulamentação integral desta norma por
lei. Está vigente nesta norma o princípio da reserva da lei na definição das bases gerais da
organização e funcionamento das forças de segurança.
A questão que se coloca agora é saber se estamos diante de uma competência
absoluta ou relativa da lei.
A alínea j) do art.º 164.º da CRA responde-nos à questão, ou seja, estamos
definitivamente diante de uma competência absoluta da AN, passamos a citar: à AN
compete legislar com reserva absoluta sobre as seguintes matérias: Bases gerais da

191
Cfr. MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Da Polícia da República de Moçambique (Parecer), In
Galileu, Revista de Economia e Direito, Vol. XI, n.º 2, 2006, p. 164.

62
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

organização, do funcionamento e da disciplina das Forças Armadas Angolanas, das forças


de segurança pública192 e dos serviços de informações.
E por que razão o nosso legislador entendeu que toda matéria de organização e
funcionamento da PN deveria ser de legislação absoluta da Assembleia Nacional (AN)?
Porque das actividades desenvolvidas pela PNA podem resultar lesões de direitos,
liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos, pelo que só a AN, composta por
deputados que representam democraticamente os desejos da plebe devem legislar essas
matérias. Pelo que, nunca outra norma jurídica de nível hierárquico inferior a lei deve
legislar matérias relativas ao regime das forças de segurança (PN).
Esse desiderato não se verificou, com a aprovação do Decreto Presidencial n.º
209/2014, de 18 de Agosto. Este veio aprovar a nova orgânica do MININT e criar um novo
serviço de segurança (SIC) que absorve todas as competências de investigação criminal da
PN, o que não vai de encontro ao plasmado no supra citado art.º 210.º da CRA que
consagra uma reserva absoluta à lei para legislar sobre essas matérias.
O Presidente da República (PR), enquanto titular do poder executivo, tem
competências para definir a orgânica dos Ministérios e aprovar o regimento do Conselho
de Ministros. Parece-nos que esta foi uma das prerrogativas que levaram a criação do SIC,
mas que nos parece de duvidosa constitucionalidade. Essas competências não se devem
confundir com matérias de polícia. O acto de criar o SIC retirou competências a uma força
de segurança e, como já adiantamos, parece-nos não tem competência constitucional para o
fazer.
Outra prerrogativa que entendemos que levou a esta situação é o disposto no n.º 2 do
art.º 18.º da LSN, que passo a citar: a organização e funcionamento dos órgãos e serviços
da ordem interna são regulados por decreto-lei. Esta prerrogativa também não se afigura
válida, pois, em nosso entender a LSN consiste num diploma legal antigo, desactualizado e
em inconformidade com o actual texto constitucional – inconstitucionalidade
superveniente, pelo que, essa norma perdeu aplicação prática logo que entrou em vigor a
nova Constituição, deixando esses serviços da ordem interna, onde consta a PN a serem
regulados por decreto-lei, passando a ser legislados só e somente por lei da AN.
Contudo, face ao exposto, a criação do SIC sob a tutela do MININT, retirando
competências de Investigação Criminal à PN impõe uma revisão do art.º 210.º da CRA,

192
Por forças de segurança entenda-se Polícia Nacional, pese embora o legislador não se referisse a esta
directamente como o fez com as FAA e os Serviços de Informações, todavia, devido as actividades que
constituem o cerne da actividade policial em Angola, nomeadamente a de garante da segurança nacional não
nos afiguram dúvidas do alcance da norma supra citada.

63
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

caso contrário, esta decisão política e legiferante do PR pode estar ferida de uma
inconstitucionalidade, porque, como nos ensina MANUEL VALENTE193, viola claramente o
princípio da separação de poderes194 e da reserva de lei, ambos consagrados na nossa CRA.

193
Posição do nosso orientador, que “foi por si defendida nas reuniões de orientação, e que sufragamos por
respeito à própria imperiosa legitimidade de ordem jurídico-constitucional material válida, vigente e efectiva
em Angola, que foi democraticamente consagrada com a CRA de 2010”. Reunião realizada aos 20 de Abril
de 2015.
194
Cfr. n.º 1, do art.º 2.º da CRA.

64
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

CONCLUSÃO

Esta nossa Dissertação de final de curso, que esperamos que possa servir de base
para futuros estudos na área do Direito Policial angolano, e que seja sobretudo um pilar
inicial para uma futura obra sobre a Teorização do Direito Policial de Angola, tendo em
conta a necessidade de adequação das matérias e técnicas policiais de maneira a dar
resposta às exigências constitucionais de um Estado Democrático e de Direito e, por
consequência, algumas questões de organização da estrutura policial, obrigou-nos a fazer
um enquadramento teórico do nosso tema tendo em conta o contexto, pelo que optámos
por fazê-lo em quatro capítulos do nosso trabalho.
A composição do nosso trabalho em quatro capítulos permitiu fazermos um
enquadramento teórico do tema e da nossa questão de estudo, facilitando a percepção de
quem o consultar.
Ao longo dos vários capítulos do nosso trabalho de investigação científica, tivemos
sempre como objectivo permitir responder com a maior clareza e objectividade possível às
nossas perguntas, tanto de partida, como derivadas, tendo em conta que correspondem o
nosso objectivo central.
A resposta à nossa interrogação inicial (Como se caracteriza o Direito Policial
Angolano?), bem como a resposta das duas perguntas derivadas, nomeadamente: (Que
policias podem integrar uma teorização do direito policial angolano?) e (Que
consequências podem advir da desintegração da actividade de investigação criminal na
PNA face a uma teorização aglutinadora?) encontram-se ao longo dos vários capítulos,
construídos em vários subtemas, sucintamente abordados. Ao fim deste percurso,
chegamos às seguintes conclusões:
Quanto a P1: o direito policial angolano é caracterizado por ser um direito
constitucionalmente novo, pelo facto de que a actividade policial em Angola ganhou
apenas legitimidade constitucional com a aprovação da nova e actual CRA aprovada em
2010.
Este direito pode, ainda, ser caracterizado através dos traços gerais da actividade
policial desenvolvida em Angola, socorrendo-se de um estudo pormenorizado das
legislações que abordam as matérias de polícia; as suas funções e competências no que diz
respeito à PNA enquanto força de segurança e aos serviços de segurança que auxiliam na
defesa e integridade da segurança nacional do Estado e dos cidadãos que nele fazem parte.

65
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

Quanto a P2: quando nos referimos a Polícia, pensamos nós, na polícia em sentido
formal, ou seja, nos “poderes desenvolvidos pela polícia em sentido funcional e orgânico,
não apenas no exercício de polícia administrativa geral, mas também quando exerce a
actividade de polícia administrativa especial e polícia judiciária”195.
Desta forma, numa teorização do direito policial angolano podem integrar
primeiramente a PNA, por ser a força policial que se encontra consagrada no art.º 210.º da
CRA, que faz referência à polícia; o SME, pois apesar de a sua orgânica não o identificar
como uma polícia desempenha actividade de polícia administrativa especial, como
podemos constatar nas suas atribuições e competências196, bem como os SP197, pelos
mesmos motivos que entendemos contemplar o SME.
Poderia, eventualmente, integrar ainda uma teorização do direito policial angolano o
SIC, se se tratasse de um serviço de segurança criado mediante o respeito às leis e à CRA,
o que não é o caso, pois entendemos inconstitucional a sua criação. Pelo que, propusemos
que para a sua legalidade sejam tomadas determinadas medidas, nomeadamente: ou a
revogação completa do art.º 210.º da CRA; ou a alteração parcial do texto constitucional do
art.º 210.º da CRA, primordialmente no seu n.º 3, sendo que ao invés de constar a lei
regula a organização e o funcionamento da Polícia Nacional, passasse a constar, a lei e
decretos presidenciais regulam a organização e o funcionamento da Polícia Nacional;
ou ainda, a que nos parece ser a solução mais coerente, que o SIC fosse aprovado por lei da
AN.
Quanto a P3: a implicação jurídica que pode advir da desintegração da actividade de
investigação criminal na PNA à luz do direito positivo vigente, tendo em conta uma
teorização aglutinadora é a inconstitucionalidade explícita, pois viola uma norma
constitucional do acto que a criou; bem como a inconstitucionalidade por acção, pois
resulta de um acto contra a CRA.
A “inconstitucionalidade só se afigura verdadeiramente operativa quando
confrontada com as consequências que o Direito Constitucional organiza para a hipótese
desse incumprimento, com incidência em dois níveis, numa dimensão sancionatória que
comporta por força do princípio da constitucionalidade”198. O que resulta na

195
Cfr. HÉLDER VALENTE DIAS, Metamorfoses da Polícia – Novos Paradigmas da Segurança e Liberdade,
ICPOL – Colecção do Centro de Investigação do ISCPSI, Coimbra: Almedina, 2012, p. 76.
196
Cfr. Cap. III, pp. 43-44.
197
Cfr. Cap. III, pp. 45-46.
198
Cfr. JORGE BACELAR GOUVEIA, Manual de Direito Constitucional, Vol. II, 2.ª Edição, Coimbra:
Almedina, Coimbra, 2007, p. 1305.

66
Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

desvalorização dos actos jurídicos inconstitucionais. Ou seja, pelos ensinamentos de


BACELAR GOUVEIA e DE MANUEL VALENTE, deve ser desvalorizado o Decreto Presidencial
que criou o SIC, o que desde logo torna esse serviço de segurança ilegal.
A norma que o criou, deve ser submetida ao Tribunal Constitucional para
fiscalização sucessiva abstracta de inconstitucionalidade formal, orgânica e material, sob
pena de não estarmos a cumprir nem a lei, nem os preceitos constitucionais e, sobretudo, a
admissão de um enorme desrespeito às normas plasmadas na CRA e uma eminente ameaça
à credibilidade do Estado Democrático e de Direito de que fazemos parte, como dispõe o
art.º 2.º da nossa Constituição.
Ciente da necessidade de crescimento e desenvolvimento em matérias relacionadas
com a actividade policial – Direito Policial –, é imperativo que haja uma urgente
adequação das normas que regulam a actividade policial em Angola, enquadrando-se ao
texto constitucional vigente e salvaguardando, desta forma, tanto a própria actividade dos
corpos e serviços de polícia, como principalmente o cidadão enquanto destinatário do
serviço da polícia enquanto instituição da Administração Pública vocacionada para o
garante da ordem e tranquilidade públicas, prevenção e investigação de crimes de várias
naturezas.
Fiéis aos mais altos anseios do povo angolano de estabilidade, dignidade, liberdade,
desenvolvimento e edificação de um país moderno, próspero, inclusivo, democrático e
socialmente justo199, que deve possibilitar aos seus cidadãos e habitantes usufruir de
máxima segurança proveniente do sistema policial criado para este fim, esperamos
materializar todos os objectivos propostos por nós, tendo em conta que a segurança não é
tarefa fácil e que o poder de polícia deve ser utilizado na estrita medida do estipulado por
lei, ou socorrendo-se do princípio da oportunidade, melhor segundo o Direito.
Temos plena consciência de que esta nossa reflexão sobre o direito policial angolano
contém em si várias imperfeições, não só no sentido de que toda a obra do ser humano não
escapa a elas, mas porque será entregue com determinadas lacunas e talvez erros que
teríamos todo gosto em colmatá-los.
Lisboa, 24 de Abril de 2015
---------------------------------------------
Aspirante a Oficial de Polícia, n.º 800000/A

199
Preâmbulo da CRA

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Direito Policial em Angola: Breve Reflexão

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Lei n.º 18-A/92, de 17 de Julho – Lei da prisão preventiva em instrução preparatória.
Lei n.º 2/93, de 26 de Março – Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas.
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Decreto-Lei n.º- Sistema de Protecção Social do Pessoal do Ministério do Interior.
Decreto-lei n.º 35:007, de 13 de Outubro de 1945 – que remodela alguns princípios
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Estrangeiros.
Decreto Executivo n.º 013/2000 – Regulamento Orgânico do Serviço Penitenciário.
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