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Resumo
São examinados, neste trabalho, alguns aspectos do cenário
internacional que tendem a acentuar a instabilidade e a gerar
tensões ou crises passíveis de afetarem, nesta etapa do século XXI,
o processo de realização dos objetivos nacionais brasileiros. Passa-
se, daí, a considerar a atuação das Forças Armadas, como um dos
alicerces da segurança, no andamento desse processo.
Palavras chaves: Forças Armadas; Cenário Internacional.
Abstract
This work presents some aspects of international scenario that
tend to provoke instability and tensions with capacity to affect the
Brazilian national priorities. With this premise we should consider
the role of Armed Forces, as the main structure of Brazilian Security,
in this process development.
Keywords: Armed Forces; International Scenary.
O cenário internacional
O fim da Guerra Fria é referência apropriada ao exame do panorama
da segurança internacional nestes primeiros anos do século XXI. Ele
representa um corte na história. O desmoronamento da União Soviética e a
desintegração do bloco comunista determinaram o fim do sistema bipolar e
sua substituição por um cenário em que os Estados Unidos emergiam como
única superpotência militar. Poder-se-ia imaginar, então, que se iniciava
uma era de paz e entendimento entre as nações. O desafogo de deixar-se
para trás as tensões da Guerra Fria, exacerbadas pela imagem angustiante
da hecatombe nuclear, dava a impressão de que surgia agora um mundo
mais seguro e estável, onde crises como a dos mísseis de Cuba, ou as
chamadas “guerras limitadas”, seriam apenas uma lembrança do passado
(FRIEDMAN, 2001).
Vinte anos depois, seria um evidente contras senso dizer que o fim da
Guerra Fria deu lugar à tão esperada era de paz e segurança. Uma era de
paz e segurança ante-vista, na verdade, a partir de pressupostos otimistas ou
arbitrários, estranhos à realidade da geopolítica mundial. Logo, novas crises
e atritos, conflitos de maior ou menor envergadura, viriam desacreditar essa
visão (DIEGUES, 2008).
O arrefecimento das tensões e a dissolução dos alinhamentos ideológicos
próprios da Guerra Fria abriram espaço a conflitos decorrentes de tentativas
de afirmação de uma identidade étnica ou nacional, como nos Bálcãs, na
Chechênia, na Cachemira, em outras partes do mundo, tendentes a se
alastrarem, a atraírem terceiros atores, como a OTAN no Kosovo, ou a
Rússia na Georgia, em apoio às pretensões separatistas da Ossétia do Sul
e da Abcásia.
O fim da Guerra Fria não eliminou as causas da instabilidade e da
violência políticas no mundo. Mais de uma dezena de países africanos, por
exemplo, passaram, nos últimos dez ou quinze anos, por guerras civis ou
outros tipos de conflito. Muitos deles oficialmente terminaram, mas a paz
permanece frágil, os focos de luta continuam acessos, como na República
Democrática do Congo, onde, desde 1998, mais de 5 milhões de pessoas
pereceram em guerras.
Na América do Sul, como uma herança da Guerra Fria, a guerrilha
associada ao narcotráfico prossegue alimentando na Colômbia um
conflito cujos rescaldos atravessam as fronteiras do país. Nada garante
que as hostilidades, até então retóricas, entre os governos venezuelano e
diz respeito aos elementos que definem a lógica do jogo. O que mudou
foram as circunstâncias, o peso político dos jogadores, o ambiente em que
as iniciativas geopolíticas se desenvolvem.
Para isso, muito contribuíram as mudanças ocorridas na economia
mundial. O avanço da globalização acentuou a interdependência financeira
entre as nações. Um intenso fluxo de capitais tornou-as mais vulneráveis
a abalos e pressões externas. Trilhões de dólares passaram a circular
diariamente sem controle no sistema financeiro mundial, suscitando crises
portadoras de riscos e instabilidade, como no México (1994), na Ásia
(1997/98), na Rússia (1999), na Argentina (2001) e, mais recentemente, a
partir de 2008, uma crise que, nascida no próprio centro nervoso da economia
mundial, se propaga pelo mundo na forma da “Grande Recessão”.
A competição entre empresas e nações tornou-se mais acirrada.
Parodiando Clausewitz, o cientista político Edward Luttwak viria a defini-la
como a “expressão da guerra por outros meios”. São os subsídios concedidos
pelos países ricos à agricultura; a aplicação de sobretaxas, a pretexto de
dumping, sobre produtos importados; o apoio político e financeiro seletivo
dos governos a empresas, com vistas à conquista ou à manutenção da
liderança industrial em setores de alta tecnologia; a desvalorização artificial
da moeda nacional para aumentar exportações, conferindo-se, assim, ao uso
do câmbio, um sentido protecionista, em uma conjuntura que evoca - dizem
os especialistas - a de uma “guerra cambial” (LUTTWAK, 2001).
Nessa economia mundial em evolução não se distingue – pelo menos
sob o ponto de vista de suas implicações geopolíticas - mudança mais
expressiva do que aquela concernente à distribuição do poder econômico no
mundo. Os assim chamados mercados emergentes passaram a responder por
mais da metade do comércio e por parcelas cada vez maiores da economia
mundial. Enquanto, entre 2003 e 2010, os países desenvolvidos tiveram
um crescimento médio de 1,5%, o dos emergentes foi de 6,3%. Conforme
dados do FMI, a participação dos BRIC (Brasil. Rússia, Índia e China) na
economia mundial passou de 16%, uma década atrás, para 25%, em 2010.
Nesse mesmo ano, a China alcançou o Japão e já é a segunda maior economia
do mundo (TOH, [201-] ).
Projeções para as próximas décadas, baseadas nas atuais tendências
da economia mundial, reforçam os traços dessa mudança. É certo que as
previsões nem sempre se concretizam; não deixam de estar sujeitas aos
imprevistos e contratempos tão comuns na história. Mas, normalmente,
invadem a percepção e, daí, tendem a ocupar lugar nas decisões e políticas
governamentais.
Uma dessas projeções deriva de um estudo conduzido pelo Goldman
À guisa de conclusão
Procurei aqui abordar o papel estratégico das Forças Armadas e,
portanto, os eixos mais salientes de sua atuação em um cenário que,
nessas próximas décadas do século XXI, se prenuncia sobretudo incerto
e, possivelmente, turbulento. Já não se trata de um cenário relativamente
estável e bem definido quanto a seus pressupostos políticos e militares,
como no tempo da Guerra Fria.
Dentre tais eixos mais salientes, ressalto a dissuasão, com um
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