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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA

CENTRO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS


DISCIPLINA : BIOQUÍMICA BÁSICA BQA 5117 A
CURSO : MEDICINA 99.2
ALUNA : CHRISTIANE CARDOSO FALCÃO

HEMOGLOBINA - Hb

INTRODUÇÃO
A hemoglobina é uma hemeproteína capaz de ligar-se a gases, sendo responsável
pelo transporte de oxigênio em diversos organismos. Para tanto a hemoglobina deve ser
suficientemente versátil para ligar-se e desligar-se facilmente do O2, conforme varie a
tensão deste gás no tecido a ser perfundido.
A hemoglobina humana do adulto (Hb A) é composta por quatro cadeias
polipeptídicas (α 1, α 2, β 1, β 2), cada uma contendo um grupamento heme (anel
tetrapirrólico com um átomo de Fe central, Figura 1), onde se liga a molécula de O 2. É
também através do Fe (5a. posição de coordenação) que o heme está covalentemente
ligado à cadeia polipeptídica (a um resíduo de histidina).

COO- COO-
CH2 CH2

CH2 CH2
CH CH3
CH3

N N
CH Fe CH
N N
H2C
CH3
CH CH
CH3 CH
CH2

Figura 1 - Protoporfirina IX (grupamento heme). Na hemoglobina a quinta posição de


coordenação, do átomo de ferro está associado a um aminoácido (resíduo de histidina
distal) da cadeia polipeptídica. A sexta posição permite a associação ao oxigênio
molecular.
As cadeias α da Hb A tem 141 aminoácidos, enquanto as cadeias β tem 146
resíduos cada. As quatro cadeias polipeptídicas da hemoglobina, independentemente
possuem a mesma alta afinidade pelo O2. Porém a afinidade do tetrâmero é bem
menor*, indicando um mecanismo adaptativo molecular que lhe permite a ligação
reversível e, conseqüentemente, a capacita para a função de transporte de O2
*A Hb A, no sangue circulante tem uma afinidade pelo O 2, definida por P50 (a pressão
de O2 para saturar 50% dos sítios de ligação da hemoglobina) de 27 mmHg.
A mioglobina é a outra hemeproteína humana com função de ligar-se ao O2 com
fins de suprir os tecidos corpóreos. A mioglobina está presente nos músculos vermelhos,
e possui uma única cadeia polipeptídica, semelhante a cadeia β da Hb. Em função
disso sua afinidade pelo O2 é maior (P50 ≅ 1 torr), o que vem salientar a sua função de
armazenadora de oxigênio, para liberação nas atividades aeróbias extenuantes.

Mecanismos fisiológicos de controle da afinidade Hb/O2: 2,3-BPG e Efeito Bohr

O controle da afinidade Hb/O2 é fundamental para a fisiologia das Hb e fatores


como o pH, níveis de CO2 e poliânions fosfato como o 2,3-bisfosfoglicerato (2,3-BPG)
são conhecidos agentes controladores dessa afinidade. Na verdade o 2,3 BPG tem um
importante papel nas modificações estruturais da associação das quatro subunidades da
molécula de Hb com a oxigenação. O 2,3-BPG estabiliza a forma desoxigenada da Hb,
diminuindo a afinidade Hb/O2 (Figura 2).

Figura 2 : Efeito de 2,3 BPG na afinidade de hemoglobina por oxigênio.

É interessante notar que a Hb fetal, que representa cerca de 80% da hemoglobina


total do recém-nascido (e vai sendo substituída pela Hb A de tal forma que a partir de 2
anos de idade tem-se apenas 1 a 2 % de Hb F) não sofre modulação por fosfatos
orgânicos, incluindo o 2,3 BPG, característica fundamental ao transporte de O2 entre
mãe e feto.
O efeito dos íons H+ e CO2 é conhecido como Efeito Bohr. Quando a Hb A se
liga ao O2 em pH fisiológico sofre uma mudança conformacional que lhe confere um
caráter ácido, o que faz com que libere prótons, conforme a reação:

HbH +4O2 ⇔Hb ( O2 ) 4 + H +

Desta forma, um aumento do pH , ou seja, a remoção de prótons, estimula a Hb


a ligar-se ao O2 (Figura 3).
O CO2 formado pela respiração difunde-se dos tecidos para os capilares,
principalmente como CO2 dissolvido (na forma de HCO3-, cuja formação é catalizada no
eritrócito pela enzima anidrase carbônica).

CO 2 + H 2 O ⇔ H + + HCO 3
Nos capilares, onde a pO2 é baixa, o H+ gerado pela formação de bicarbonato
está envolvido também com a liberação de O2 pela Hb. Este próton facilita o transporte
de CO2 estimulando a formação de HCO3-. Desta forma, nos pulmões, onde a pO2 é alta,
o O2 liga-se à Hb e o próton é liberado. Assim, o efeito Bohr contribui para o
suprimento de O2 aos tecidos em grande atividade aeróbica (cujas mitocôndrias
consumirão este O2 nas reações de óxido-redução da cadeia de transporte de elétrons,
para produção de ATP).

Figura 3 : Efeito de pH na afinidade de hemoglobina por oxigênio.

A partir de 1970 começou-se a pesquisar a relação entre a subunidade estrutural


da Hb e sua ligação com o O2. Observou-se que os efeitos interativos da ligação Hb/O2
são mediados por mudanças conformacionais da molécula. Assim a molécula de Hb
existiria sob duas conformações: T (tensa) e R (relaxada); a primeira representando o
estado de baixa afinidade pelo O2, sendo que esta forma é estabilizada pelas condições
do meio e pelas reações alostéricas com o 2,3 BPG. A forma R seria aquela em que o
O2, vencendo os fatores estabilizadores da forma de menos afinidade, liga-se para
formar a oxi-Hb, com as modificações estruturais .

Ligação com O2 aumenta a afinidade Hb/O2

A oxigenação e a desoxigenação da hemoglobina determinam modificações na


estrutura das subunidades, que acarretam alterações em sua área de contato . Na desoxi-
hemoglobina, o átomo de ferro está situado fora do plano do grupo heme, mas ao ligar-
se ao oxigênio ele se desloca para aquele plano. Este deslocamento se transmite aos
radicais vizinhos, produzindo uma alteração conformacional na subunidade ( a
hemoglobina possui 4 subunidades , duas do tipo α e duas do tipoβ ), que é
transmitida para as outras subunidades através de quebra de algumas ligações não-
covalentes e formação de novas ligações nas áreas de contato. Deste modo, a ligação do
oxigênio com o grupo heme de uma subunidade dispara a seqüência de novos eventos
que acarretam a alteração da estrutura quaternária da hemoglobina.
As novas conformações assumidas pela molécula de hemoglobina por sucessivas
ligações com o oxigênio têm afinidades crescentes pelo O2 , de tal maneira que a ligação
da quarta molécula de O2 é 300 vezes mais fácil que a primeira. A esse fenômeno dá-se
o nome de cooperatividade. A coopertividade resulta da influência exercida de um sítio
sobre outros, localizados em subunidades diferentes de uma mesma molécula e,
portanto, só pode ser apresentada por proteínas oligoméricas , como a Hb. No caso da
mioglobina, por exemplo, que apresenta uma única cadeia polipeptídica semelhante à
subunidade β da Hb e com um único grupo heme, a cooperatividade evidentemente
não é observada.

Interação Hb/O2

Nas interações da Hb e O2 ocorrem alterações colorimétricas da hemeproteína,


em resposta a oxigenação. Simplificando muito poderia-se comparar esse procedimento
a observação da variação de cor entre o sangue arterial e venoso. O princípio do método
espectrofotométrico reside nas diferenças espectrais das formas oxigenada e
desoxigenada de Hb. Utilizando recipientes hermeticamente fechados (tonômetros, onde
se controla a pO2) acoplados a cubetas, é possível determinar as variações da absorção
de luz da Hb, enquanto aumenta-se a oferta de O2 ao sistema ( sendo que a variação na
absorção é proporcional à saturação de Hb com oxigênio )

Variações na molécula de Hb

A mutação gênica que resulta na mudança de um único aminoácido, em uma


única proteína, pode produzir doença. A doença molecular mais conhecida é a anemia
falciforme. A Hb S , a hemoglobina anormal nesta doença, consiste na substituição do
glutamato na posição 6 da cadeia β por valina. Esta substituição de uma cadeia lateral
polar por uma apolar, reduz dramaticamente a solubilidade da desoxi-hemoglobina S, o
que leva à formação de precipitados fibrosos, que deformam a hemácia dando a ela um
aspecto de foice. A anemia falciforme surge quando uma pessoa é homozigota para o
gene falcêmico mutante. A condição heterozigota, chamada de caráter falcêmico é
relativamente assintomático e confere uma maneira de proteção contra a forma mais
letal da malária, comum em alguns países da África. Além da Hb S, há várias centenas
de hemoglobinas mutantes.

Referências
Lehninger, A.L. , Bioquímica , vol. 1
Stryer, L. , Bioquímica,
Baker e Allen , Estudo da Biologia

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