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“Gostaria de começar este texto fazendo, com Roland Barthes, uma distinção radical entre
o escrito (o que, na escrita, refere-se ao traço, à grafia) e a escrita, “a que produz textos”
(Barthes 1981, p.12). Roland Barthes, em muitos dos seus textos discute as complexas
relações entre a língua falada e a escrita.” (p.51-52)
“Pode-se dizer que é com o advento da impressa e da inscrita mecânica que esta ganha
autonomia em relação a palavra falada deslocando-se do território do som e do tempo
para o do olho e do espaço. O texto ganha autonomia em relação a palavra e a escrita
passa a significar mais do que simplesmente o escrito.” (p.52)
“Claro esta hoje, nas modernas sociedades ocidentais, diferentemente da idade média,
para que um autor produza um texto (produza a escrita) e o faça circular socialmente de
maneira aberta a virtuais leitores, não só é preciso que este domine o escrito (a grafia),
como também que tenha acesso a instituições – mais ou menos democráticas – que
colocam a escrita em circulação: a impressa, a internet.” (p.53)
“O que define, então, escrita tal como ela está aqui abordada, isto é, no seu plano
discursivo ou enunciativo e não a partir da sua materialidade gráfica?” (p.54)
“Diferentes autores vão apontar como traço definidor da escrita em relação à fala uma
característica que emergiu historicamente no momento de seu desdobramento de um
espaço teocrático para um espaço democrático: a descontextualização a disjunção, a
autonomia do texto em relação à sua situação de produção e (re) produção.” (p.54)
“Por exemplo, Barthes e Marty (1987, p. 49) vão afirmar que:” (p.54)
sentido poder-se-ia dizer que o texto escrito se baseia mais na sua autotextualidade que
no seu contexto, ou seja, que seu princípio fundador da sua organização se encontra na
sua estruturação interna dos seus significantes, e que, pelo contrário, o discurso oral de
organiza em parte segundo a situação em que evolui.” (p.54)
“Para estes autores, portanto, o traço diferencial mais importante entre a palavra falada e
a escrita encontra-se na relação que o sujeito enunciador estabelece com os parâmetros
da situação social e material de produção material enunciativa (lugar de enunciação,
interlocutores, temas, finalidade da enunciação).” (p.55)
“Na maioria das vezes, letramento e escolarização se dão simultaneamente, pelo fato de
a escola ser hoje em quase todas as sociedades modernas, a principal agência de
letramento e de circulação de textos escritos. Segundo Kleiman (1995, p.25), isso leva a
uma não distinção entre a aquisição e desenvolvimento da escrito (Letramento) e
escolarização como variáveis determinantes de muitas das diferentes entradas pelas
pesquisas do modelo autônomo, entre letrados/iletrados, em termos de comportamentos
de solução de problemas e de funcionamento cognitivo.” (p.66)
“[...] desde que a escola, nas sociedades modernas e urbanos, assumiu o seu “destino” de
transferir às camadas da população a “tecnologia” letrada (a escrita alfabética), ficou
difícil de se desfazer a mescla ideológica entre letramento, capacidades (cidadãs e
cognitivas), bem falar e escolaridade – seja para o senso comum, como bem o demostra
Signorini (1988), seja para a elaboração científica sobre o tema”. (p.66)
Nesses casos, oral e escrito não se separam tão radicalmente, mas, ao contrário, mantém
relações complexas, de hibridização de gêneros e de modalidades.” (p.68)
“Em resumo, para o que nos interessa neste momento, os resultados de pesquisa dentro
do modelo ideológico de letramento conflitam com a maioria dos pressupostos e dos
resultados do modelo autônomo, em pelo menos dois pontos principais: o das relações
entre oralidade e letramento/escrita – e, logo, entre aquisição de 1ª língua e letramento –
e o papel da escolarização nesse processo.” (p.69)
“Apesar dos desdobramentos e avanços que o modelo ideológico traz para o enfoque das
práticas de letramento, ainda assim, a questão da relação entre escolarização e letramento
nele parece fora de foco. A própria necessidade de se distinguir qual a “variável”
determinante das construções, se o letramento e a escolarização, parece-me indicativa
desta falta de foco, determinada, talvez, por uma falta de perspectiva histórica.” (p. 70)
“Embora correndo o risco de excesso de discurso reportados – bem próprios dos discursos
escritos – gostaria, a este respeito, de encerrar este texto fechando temporariamente
também o diálogo com um de seus interlocutores centrais: Roland Barthes, para quem”
(p. 71)
“Talvez se pudesse resumir numa fórmula a relação entre escrito e oral na comunicação
linguística com a seguinte frase: o escrito funciona numa relação com o idêntico, o oral
com uma relação com o outro; relação com o idêntico, a repetição, a re-anunciação que o
leitor faz do texto que lê; relação com o outro, a comunicação oral que tem origem na
alteração, no desvio produzido pela presença do outro. (R. Barthes e E. Marty 1987,
p.49)” (p.71)