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POR FALAR EM DEUS

por Percival Puggina. Artigo publicado em 15.01.2019

Você nem se deu conta, mas no breve espaço de sua geração, Deus sumiu do
vocabulário corrente no outrora Ocidente cristão e este artigo se torna, digamos
assim, fora das expectativas. Junto com o vocábulo, decresceu, também, o
persignar-se, o ajoelhar-se, a frequência à missa ou culto, os símbolos
religiosos, as confissões, os sinais interiores e exteriores de fé, mesmo entre os
que a preservam. Em parcelas crescentes da população desapareceram,
igualmente, os esplêndidos benefícios estéticos, éticos e espirituais da
transcendência, alcançáveis por aqueles que se elevando acima dos imanentes
rochedos, tendo olhos para o infinito, conheceram e desenvolveram a dimensão
espiritual, superior e eterna de sua natureza.

Um dos objetivos centrais da guerra cultural empreendida pelo movimento


totalitário e pelo moderno globalismo consiste em constranger o cristianismo
ao silêncio, fazer com que a mensagem cristã não encontre eco nem repercuta
na vida das pessoas e das sociedades políticas. Quem conduz ou segue tal
estratégia observa a receita de Marx, cujo modo de preparo adverte que a
religião é “o ópio do povo”, e está desatento à de Raymond Aron, para quem o
marxismo é “o ópio dos intelectuais”. Fecho com ele. Conheço raros inimigos
das religiões em geral e do cristianismo em particular que não sejam marxistas
e esforçados coletores nos lixões da história. Nesta última função, incorrem no
paradoxo de, por um lado, atribuir a Deus a culpa pelos pecados, erros e burrice
dos homens; por outro, isentar Marx e o marxismo de toda a desgraceira que
trouxeram à humanidade.

É claro que isso não tem graça alguma. Que o digam os chineses ainda hoje
perseguidos por cultuarem o mesmo Deus que o Ocidente estabeleceu ser
socialmente inconveniente e politicamente incorreto. Que o digam os milhões
de cristãos e judeus vitimados por revoluções comunistas mundo afora. Que o
digam as religiosas estupradas pelo simples motivo de estarem e permanecerem
em seus conventos durante as eclosões levadas a cabo em nome dos “altíssimos
valores humanos” dos revolucionários da hora. Afinal, a revolução, detentora
de incontrastável superioridade moral, tem prerrogativas que a habilitam a toda
iniquidade.

No entanto, se olharmos à volta e refletirmos sobre as transformações


experimentadas pela sociedade ao longo do tempo, será impossível não
contabilizar graves perdas. Bem feitas as contas, se evidenciará, também, o
quanto é socialmente benéfico que as condutas humanas sejam mais
influenciadas pelo amor a Deus e ao próximo, do que pelo peso das sanções do
Estado. É na simultânea perda daquele amor e desse temor que o caos se instala
e a criminalidade se expande.

* Percival Puggina (74), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto,


empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais
e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia;
Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.

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