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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS – UFPEL

INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS


BACHARELADO EM ANTROPOLOGIA
LINHA DE FORMAÇÃO EM ARQUEOLOGIA

Resenha do texto: Rituais e festas Bororo: A construção da imagem do índio como


“selvagem” na Comissão Rondon

Gabrielle Reis Ferreira- 17102082

Resenha apresentada à Disciplina de “Antropologia


Audiovisual e da Imagem” como atividade avaliativa, sob a
responsabilidade da Profa. Dra. Cláudia Turra Magni

2021
Em sua introdução o autor já deixa bem evidente sobre o objetivo do texto e como
o mesmo irá se desenvolver. O objetivo do artigo era abordar a Comissão Rondon pela
sua produção visual e analisar o filme Rituaes e Festas Bororo (1917) produzido por Luiz
Thomaz Reis, que aparentemente foi de grande importância para antropologia, por ter
sido um dos pioneiros filmes etnográficos do mundo.

Antes de desenvolver suas análises a cerca do filme, Fernando de Tacca, fala um


pouco sobre a Comissão Rondon, comandada pelo Marechal Rondon, da qual Luiz Reis
participou ativamente como cinegrafista e fotógrafo.

Rondon participou das ações que levaram a queda da monarquia, entrando para a
doutrina positivista e aceitando o cargo para chefiar a expansão das linhas telegráficas de
Mato Grosso e Amazonas. Rondon fez parte de várias comissões telegráficas e colaborou
no processo de criação, implantação e ação do conhecido Serviço de Proteção ao Índio
(SPI), criado em 1910 e que tinha como responsabilidade a proteção e assistência aos
povos indígenas, desde saúde e educação, a demarcação de terras. Todavia, sabe-se bem
pelo Relatório Figueiredo, que essa “preocupação” era só uma farsa. Funcionários
públicos vendiam as crianças e abusavam sexualmente delas; torturavam crianças, jovens
e adultos com a falácia de ministrar justiça. Servidores do SPI mantinham uma rotina de
castigos físicos contra os indígenas, os espancamentos eram tão severos, que
ocasionavam em morte. Os funcionários chegaram a crucificar indígenas, além de
obrigarem parentes torturar uns aos outros, filho espancar mãe, irmão abusar de irmã, e o
indígena que recusasse, era morto (Ioiô, A. 2018).

Durante a empreitada das linhas telegráficas, o autor revela que Rondon esteve
frente a frente com grupos indígenas de pouco contato com os brancos; ele usa civilização,
mas somente porque o colonialismo implantou que os brancos é que são os “civilizados”.
Nesse percurso, o marechal levou vários cientistas para fazer levantamento da fauna e da
flora, enquanto ele fazia a topografia e medições antropométricas dos indígenas como se
fossem animais exóticos, não pessoas.

Em 1912, o Marechal Rondon cria a ‘Secção de Cinematographia e Photografia’


deixando sob responsabilidade de Luiz Thomaz Reis, o produtor do filme sobre os
indígenas Bororo. A criação dessa seção especializada em documentação e em materiais
fotossensíveis foi uma inovação para a época de 1912, levando em consideração que essa
tecnologia exigia um custo alto de investimentos. Rondon carregava de importância os
registros de imagens, pois usava-os como forma de convencimento em seus relatórios
para o Presidente da República da época, Artur Bernardes. Nesses relatórios ele
exemplificava o trabalho com as linhas telegráficas, mas sempre tratava do contato com
os grupos indígenas. E através das fotografias, apresentações dos filmes e de seus artigos,
Rondon alimentava o espírito nacionalista da imprensa criando uma ilusão do “fazer
ciência”.

Devido à falta de preservação algumas imagens e filmes se perderam em travessias


de rios e nas expedições por dentro da mata. Uma das buscas da Comissão Rondon, de
acordo com o autor, era conseguir registrar etnograficamente os costumes dos povos e
um pouco do que hoje entendemos como cultura material. Mas como relatei alguns
parágrafos acima, isso não aconteceu de uma forma muito tranquila; os indígenas,
colocados no texto como “índio genérico”, sofreram muita tortura para que esses filmes
e fotografias chegassem na imprensa de uma forma totalmente utópica entre o que
consideram como “selvagem” e “civilizado”.

Na segunda parte do texto, Fernando de Tacca, parte enfim, para a análise do filme
‘Rituaes e festas Bororo’. Ele divide o filme em duas abordagens; a primeira com um
foco nos aspectos da vida cotidiana dos indígenas, como a pesca, a tecelagem e a
cerâmica; e a segunda parte se dá com o ritual funerário apresentado ao fim do filme. Ele
levanta uma questão a cerca da presença da câmera, em como no momento em que os
homens indígenas estão pescando, eles notam e fazem questão de olhar para a câmera,
inclusive ao realizar o ritual de morder o peixe que luta para não ser pescado; Tacca trás
isso numa explicação em que a câmera dirige o filme, ela é notada em vários momentos
de gravação. No que ele explanou como sendo a segunda parte do filme, que é o
acontecimento do ritual fúnebre, a câmera já não é mais o centro do evento, ela é apenas
uma coisa, fazendo acontecer uma filmagem, “em um lugar onde vários aconteceres se
entrelaçam” (Ingold, 2012, p.29), mas ela não “interfere” nas ações do grupo; a dança e
o ritual de enterramento acontece independente da filmagem da câmera, as pessoas
participantes do ritual nem dirigem o olhar para ela. O autor fala que a câmera que
comporta nessa parte do filme, de uma maneira não agressiva, ela se mantém distante dos
acontecimentos, somente a observar, ela é dirigida pela ação do ritual e não mais a
diretora.

O autor trás um comentário interessante acerca da dimensão temporal do filme.


Em como esse ritual de sepultamento primário dura dias, sabendo que a pessoa é
enterrada, desenterrada todas as manhãs por sete dias para ser molhada, numa tentativa
de facilitar a decomposição, e no oitavo dia é descarnada ao rio e tem seus ossos limpos
até ficarem brancos; contudo, na gravação parece uma coisa contínua de um dia só.

Fernando de Tacca finaliza o artigo dizendo que o filme ‘Rituaes e festas Bororo’,
é considerado um dos primeiros filmes etnográficos do mundo, por conter metodologias
específicas que a antropologia desenvolveu mais a frente da publicação do filme.

REFERÊNCIAS

DE TACCA, Fernando. Rituais e festas Bororo. A construção da imagem do índio como


“selvagem” na Comissão Rondon. Rev. Antropol. vol.45 no.1 São Paulo 2002.

INGOLD, Tim. Trazendo as coisas de volta à vida: Emaranhados criativos num mundo
de materiais. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, ano 18, n. 37, p. 25-44, jan./jun.
2012.

IOIÔ, Adonias Guiome. Relatório Figueiredo como prova de genocídio, massacres e


monstruosidades perpetradas contra os povos indígenas no Brasil. Espaço Ameríndio,
Porto Alegre, v. 12, n. 2, p. 460-468, jul./dez. 2018.

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