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Presente – Um conto de Shosuro Akemi

Akemi acordou de um sonho, o que era estranho em diferentes níveis. Em um


primeiro olhar, era estranho pelo local, já que ela estava sob a luz da Lua e agarrada a
um enorme cedro sem folhas. Após alguns segundos de análise, o tempo seria a maior
fonte de estranheza, já que era um rigoroso inverno e até dormir em um dia tão frio seria
bastante difícil naquela situação. No entanto, o mais estranho naquela situação era o fato
de Akemi estar tendo um sonho.
Mesmo em comparação a outros assassinos treinados, Akemi dormia muito
pouco e tinha uma audição extremamente aguçada, o que sempre a impedira de ter
sonhos. Em uma certa ocasião bem mais confortável, ela foi acordada pelo barulho do
trote de um cavalo a uma distância de 100 metros. Akemi se sentia muito mais
confortável acordada, porque é muito mais difícil de ser esfaqueada quando se está
atento, e ela sempre soube disso, portanto seu corpo não conseguiu nem ao menos
suportar aquele estado e rapidamente a despertou. Era preciso atenção naquele
momento.
Não haviam se passado nem dois minutos inteiros, mais foi o suficiente para
desnorteá-la. Os 15 guardas estavam em posições diferentes, e falando sobre diferentes
assuntos. Algumas tochas haviam se apagado e outras haviam sido acesas. Até mesmo
os poucos sons de animais haviam morrido naquele curto período de tempo. O mundo
havia se transformado, mas ela precisava de foco, já que a lua estava sendo encoberta
pelas nuvens e essa era a sua deixa.
Akemi levantou-se desamarrando a cordas que a mantinham presa à árvore
enquanto a lua desaparecia por entre as nuvens. Ela rapidamente fez um gesto e disse
palavras em uma língua que nem mesmo ela entendia completamente. As sombras que
estavam por toda a mata começaram a se mover, mesmo que paradas, e por um instante,
pode sentir toda a escuridão da mata preencher seu corpo. Em alguns instantes já podia
sentir nitidamente a fraca luz das tochas atravessarem seu corpo. Ela sabia que havia
conjurado forças antigas e proibidas, mas era necessário, pois ninguém poderia vê-la
naquela noite, e usando essa técnica ela ficaria invisível por ao menos 42 minutos se a
luz da lua não a atingisse. “Mesmo resquícios de um deus morto ainda podem
atrapalhar”, pensou.
Ela saltou por algumas árvores escorregadias até chegar nas proximidades do
palácio Bayushi. Os símbolos do Escorpião eram razoavelmente menores que os de
outros Clãs, mas seu vermelho-sangue era memorável para todos aqueles que o vissem.
O vermelho estava nos estandartes, nas armaduras dos guardas e nas máscaras de cada
um dos quatro líderes que estavam discutindo sobre a demarcação de terras de vilas
próximas. Era mais um perigo. Se fosse pega, seria executada por insubordinação, por
invadir um castelo do Clã, por usar de magia negra e por interromper uma reunião muito
importante. Ser executada quatro vezes não seria um problema tão grande, mas ser pega
a impediria de ajudar Mayumi a cumprir seus objetivos, e isso seria pior que 462
execuções.
Akemi como um Ritmo Claro que que precisam do que lá eu não escuto uma
cantada assim a sério Individual na recepção Esta foto salvar a sua o que afinal é meus
amigos viram a mesma resposta investir essas todas que é sim Agência distância como é
que isto se longo do dia você é saltou da árvore em que estava e pousou com suavidade
no chão de carvalho vermelho que recobria os muros de pedra negra do castelo e usando
o impulso deu outro salto, agora mais próximo do de uma lebre, acabando por pousar
em um pequeno canteiro de flores amarelas que estavam no meio do grande jardim. Os
passos continuavam constantes e as conversas também. Ninguém havia escutado as
pancadas na madeira ou o cruel assassinato das pobres flores amarelas, ou ao menos
ninguém humano, já que naquele momento as nuvens deram espaço para que
Tsukuyomi decidiu que desejava ver o que era todo aquele barulho e sua luz espantou
todas as sombras daquele jardim.
“Acabou... Vou me entregar para os guardas e pedir para ser torturada com
carinho”, pensou enquanto ouvia os passos constantes dos guardas. Ali Akemi
permaneceu estática por alguns segundos longos como horas pensando nas diversas
formas de arrancar dedos que usariam em suas mãos, mas rapidamente retomou a
compostura e se arrastou até chegar na construção principal.
Era uma enorme construção feita de papel, carvalho vermelho e pedra negra,
porém o mais importante não estava na construção em si, mas abaixo dela em um local
que pouquíssimas pessoas conheciam, e Akemi não era uma dessas pessoas, porém ela
tinha uma boa ideia de onde estava, pois só existia um local em que existiam guardas
rondando.
Akemi sentou-se no chão e tentou pensar em alguma outra forma de entrar no
castelo sem ser vista, porque além de ser extremamente proibida por conjurar energias
sombrias, o ritual só podia ser realizado uma vez por dia de forma segura. Enquanto
imaginava uma solução para esse dilema, Akemi conseguiu ver ao longe uma jovem
mulher de quimono branco florido segurando uma caixa. Essa era a sua deixa.
Ela levantou-se e rastejou como uma serpente até um dos quartos em que não
havia som algum. Por sorte, metade dos guardas estava guardando a reunião, e a outra
metade estava fazendo rondas do lado oposto do local. Ao entrar na sala, Akemi sentiu
um forte cheiro de vinho e de poeira. Era um depósito. Lá era possível de se encontrar
toda a sorte de coisas, o que deveria incluir ao menos um quimono.
Após alguns minutos procurando, Akemi encontrou um grande baú com
máscaras e alguns quimonos cerimoniais vermelhos com o desenho de flores brancas.
Não era do gosto dela, mas era um grande avanço. Akemi retirou suas roupas quentes e
um pouco úmidas por conta da neve e estava prestes a vestir o quimono, mas um
barulho na porta a fez paralisar novamente.
Akemi sempre confiou e confiaria em seus ouvidos, mas sua sorte já havia sido
completamente gasta, e os passos extremamente leves da jovem cortesã não
atravessaram as finas paredes de papel. Ao se virar para trás, ela pode ver a garota
parada e de máscara, mas com o olhar estático a observando.
Ela num pulo agarrou a moça pelo quimono e a acertou contra um dos pilares de
madeira que estava no meio de uma das paredes. O som de madeira rachando foi baixo
demais para que qualquer outra pessoa pudesse escutar, mas Akemi sabia que havia
utilizado força demais naquele momento, força o suficiente para que a máscara da
cortesã voasse de seu rosto e caísse sobre um dos caixotes empoeirados. Ela tinha
aproximadamente 17 anos, com um rosto bastante bonito, ainda que muito assustado,
porém não era só medo que Akemi via nos olhos daquela jovem.
Existis ali um certo fascínio pela criatura desnuda que havia surgido em um
depósito quase que deserto. Era um fascínio que Akemi conhecia, e que até em Mayumi
ela explorava. Ela se aproximou e sentiu o cheiro de erva doce e de chá preto, e o
branco do rosto jovem foi rapidamente substituído por um vermelho forte. Esse era um
dos poucos momentos em que Akemi se sentia no controle da situação, e de fato ela
estava no controle. Naquele momento pouco importavam a vontade do Imperador ou os
desejos de um deus da Lua.
Akemi por anos pensaria naquela mulher com carinho, principalmente no gosto
doce de sua boca, já que ela provavelmente havia roubado um pedaço de bolo de
morango antes de entrar naquele quarto. E lá ela a deixou, ainda parada na parede e
estática.
Agora que já estava vestida, ela só precisava passar por seis ou sete guardas para
chegar até o porão, porém mais uma vez sua sorte a ajudou, pois aquele quimono era de
um tipo muito específico: o de shugenjas da família Soshi, os responsáveis por guardar
aquele templo. Após passar pelo terceiro samurai que realizou uma longa reverência,
Akemi percebeu que aquelas eram roupas importantes. Após passar pelo quinto, decidiu
que essa era uma oportunidade grande demais para ser desperdiçada.
Akemi seguiu o fluxo de guardas até chegar a uma enorme porta vermelha
vigiada por três homens com armaduras pesadas. Assim que a viram, empurraram os
pesados blocos de pedra e revelaram uma longa escadaria. Era extremamente longa,
larga e escura. Nem mesmo o fogo que iluminava a entrada conseguia penetrar na
escuridão sobrenatural daquele lugar. Era não-natural, mas Akemi não poderia ter medo
nesse momento.
Diferente de outros assassinos, ela não gostava da escuridão, e poucas vezes
gostava de usá-la. Ela simples a suportava em grande parte do tempo, então quando os
grandes portais foram fechados ela soube instintivamente que precisava fazer algo.
Akemi então novamente um ritual, não com a intenção de atrair as sombras, mas de
espantá-las. Após alguns minutos parada fazendo um gesto de mão, uma pequena chama
branca surgiu na ponta de seus dedos erguidos, refletindo levemente no seu pingente de
cobra verde, o único vestuário que ela havia mantido após sua troca de roupas. Não era
o suficiente para derrotar aquela escuridão, mas conseguia ao menos afastá-la um
pouco.
Akemi desceu pela escada por longos minutos, em que escutava sussurros e
gritos ao longe, mas após tempo, pode ver uma sala cheia de luzes azuis. Ela era repleta
de pilares, e cada um dos pilares era coberto por máscaras ornamentais de diversos
tipos, algumas de ferro e a maioria de um tipo de bronze, todas já oxidadas pela
umidade do local, que possuía um ar pesado de um verão numa praia bem quente e um
cheiro estranho
Ao entrar, foi recebida por duas figuras: um homem grande, que segurava um
enorme tacape de aço, e uma mulher tão grande quanto, que segurava duas cimitarras
rachadas. “Você não deveria estar aqui...”, disseram as figuras num uníssono. Com
certeza não eram humanos, mas um amontoado de músculos e partes de metal grudadas
em um arranjo que tentava formar um tipo de armadura. Nem mesmo os olhos podiam
ser vistos, porque estavam cobertos por um tipo de capacete de aço, feito com pancadas
desalinhadas e inconstantes de uma marreta.
Akemi rapidamente sacou três agulhas pouco maiores que um hashi e as lançou
contra o pescoço do homem, porém só usou de uma das mão, já que a outra estava fixa
mantendo a tênue chama branca viva. Elas o perfuraram acertando diretamente a artéria
jugular, porém dessa ferida fluiu um líquido negro e viscoso. “Sobraram 24”, pensou.
Nenhuma daquelas figuras se abalaram por conta do ataque, mas agora mostraram-se
bem mais agressivas.
Ambos partiram numa investida simultânea contra Akemi. A mulher girou suas
espadas e acertou um dos pilares, lançando uma rajada de pedras, máscaras e barras de
um aço negro. O homem saltou e lançou um poderoso ataque, que, no melhor dos casos,
destruiria só um crânio e parte da coluna do alvo. Ao ver tamanha demonstração de
força, Akemi soube de imediato que não era um ser humano que estava no controle
dessas criaturas. Mesmo o mais poderoso dos Shugenjas teria dificuldade em controlar
um desses seres tão poderosos, então controlar dois desses de forma coordenada era
algo impossível, no entanto descobrir como aquelas criaturas funcionavam era o menor
dos problemas de Akemi.
Num salto, ela se aproximou do homem e com duas agulhas perfurou novamente
seu pescoço, dessa vez mão com a intenção de feri-lo, mas de se prender a ele. O
enorme monte de aço e músculo foi uma ótima barreira contra a chuva de pedras nos
primeiros milissegundos de sua intentona, porém o ataque com o bastão lançou Akemi a
uma distância de quatro metros, porém não a acertou diretamente, o que impediu um
velório prematuro de Akemi.
Enquanto voava, ela pode ver a chama, que ainda estava acesa, ser tomada pela
luz azul da sala, e seu pingente verde tornou-se completamente preto, o que
estranhamente a fez lembrar de Miura. Ela o odiava do fundo da alma, porém também
existia ali um pequeno resquício de pena. Ela há muito já havia esquecido de que o
garoto havia dado esse presente a ela, então a única coisa que sobrou de Miura naquele
presente foi um aperto no peito e uma imagem cheia de tristeza.
Akemi levantou-se ainda tonta e percebeu que as criaturas preparavam ainda
mais um ataque, o que em sua situação atual poderia ser letal, mas isso não a
preocupava tanto quanto a imagem de Miura gravada em sua mente. Ela precisava fugir
disso para rever Mayumi, ainda que não fosse forte ou tivesse talento natural, e no
fundo sabia como fazê-lo. Akemi respirou profundamente e deixou sua mente ser
tomada pelo vazio. Ali não existia Miura, ou Mayumi, ou até mesmo Akemi. Só existia
instinto. Ela saltou de olhos fechados, e decidiu instintivamente por um ataque suicida
em todas as direções, lançando todas as suas agulhas restantes ao mesmo tempo.
O Universo de fato tem seus favoritos, e Akemi não era uma deles. Mesmo
sendo a mais esforçada e tendo o maior desejo de se aprimorar, ela sempre acabou
sucumbindo aos desejos daqueles que foram mais favorecidos, seja Mayumi com seu
destino grandioso ou Miura com seu enorme talento, porém naquele momento a própria
vontade do Universo se curvou perante tamanha frustração de Akemi. Ela iria rever
Mayumi, e ninguém a impediria de fazer isso.
Cada uma das agulhas ricocheteou em média nove vezes. Algumas se perderam,
outras acertaram as paredes ou as criaturas, porém uma, a que ricocheteou mais vezes
num total de 45 impactos, acertou superficialmente um minúsculo símbolo escondido
sob uma máscara de ouro.
Após alguns instantes, Akemi recuperou seus sentidos. A grande porta vermelha
estava a poucos metros de suas costas e ela ainda estava parada fazendo o mesmo gesto
de mão, porém a outra estava perfurando um pequeno símbolo na parede com uma
agulha. Os Shugenjas da família Soshi são famosos por conseguirem deixar o mais são
dos homens preso em devaneios por anos sem que ele sequer soubesse que estava
sonhando e aquela era uma ilusão poderosa o suficiente para causar danos físicos ao
alvo. Akemi só descobriu sua tremenda sorte dias após ter saído após minutos dessa
ilusão com apenas duas costelas fraturadas, porém naquele momento ela só estava
nervosa e extremamente irritada com aquela idiotice.
Akemi desceu a curta escada e chegou ao seu objetivo: a Hoploteca do
Escorpião. Lá estavam dispostas armas tão antigas quanto o Império e tão letais quanto
uma arma poderia ser. No centro desse grande quarto estava disposta uma Wakizashi
vermelha com detalhes em preto. “A Lâmina Shosuro”, pensou alto. Ela tirou a espada
de seu pedestal e a colocou na bainha, porém antes a girou num movimento circular.
Espadas não eram seu tipo preferido de arma, mas aquela era um exemplar que merecia
ser usado.
Quando estava saindo da sala, voltou-se para a coleção novamente, como se algo
a atraísse, e lá, entre duas espadas curvas, estavam duas agulhas tão grandes quanto
espadas, perfeitas e afiadíssimas. Akemi guardou a lâmina e sacou as agulhas. Era quase
como se fossem destinadas a ela.
Akemi saiu da sala com um número três vezes maior de espadas do que o
recomendado para uma cortesã Soshi, porém nenhum dos guardas foi instruído a
questionar esse fato, nem a questionar o fato de ela se perder dentro de um castelo
conhecido, nem de entrar num depósito e desaparecer deixando só um buraco discreto
no chão mais macio das proximidades da parede, deixando só as roupas e uma cortesã
paralisada.
Ela andou e saltou pela noite levando as lindíssimas espadas que havia
conseguido naquele dia. Depois de um dia começou a usar a Wakizashi como cajado, o
que se mostrou mais útil do que o esperado, já que ela precisava fazer quatro dias de
viagem em dois, porém ela estava determinada, e demorou só um dia e meio para
chegar em casa, o que a garantiu um banho demorado.
Mayumi ao ver a Lâmina Shosuro deu três pulos de alegria. “Eu disse que eu
mataria meio Clã por uma dessas... Como você conseguiu?”, disse com olhos animados
e curiosos.
Ela havia guardado suas agulhas em um lugar bastante seguro, e as mostraria em
uma outra oportunidade. Mayumi sem dúvida teria um uso para aquela espada, e era
preciso garantir que suas novas agulhas estariam seguras, porém sua felicidade a
enganou, já que ela nem pensou em descobrir o fim da espada antes de cedê-la. “O
aniversário de 17 anos de uma garota merece um presente a altura”, falou Akemi com a
alegria de uma trupe de palhaços.
Essa alegria logo morreu ao descobrir que a espada iria ser dada a Miura. Se ela
soubesse disso, provavelmente teria destruído a espada na primeira oportunidade, mas
esse foi o primeiro e maior erro de Akemi naquela ocasião, já que seu primeiro sonho
havia sido um pesadelo em muitos aspectos profético. Nele, Akemi era decapitada por
Miura com o corte de uma belíssima lâmina avermelhada. Suas agulhas ficaram bem
escondidas. Nem decapitada ela as daria a Miura.

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