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21/04/13 O que um psicanalista faz | Lucas Nápoli

Lucas Nápoli
Psicanálise em humanês

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O que um
psicanalista faz?
(final)
Publicado em 01/02/2011

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21/04/13 O que um psicanalista faz | Lucas Nápoli

Nos últimos três


posts desta série o
nosso foco esteve
sobre o desenrolar
de um tratamento
psicanalítico. Entre
outr as coisas ,
discutimos como o
psicanalista lida
com o pedido de
compreensão
implícito na
entrada do paciente
em análise, qual a primeira etapa do tratamento e
como o doente é auxiliado pelo analista na descoberta
de aspectos de si mesmo dos quais outrora era
ignorante.

Alguns leitores podem considerar de mau gosto o uso


que faço da palavra “doente” como sinônimo de paciente
ou analisando. De fato, atualmente é difícil ver analistas
se referindo assim a quem os procura. Eu, no entanto,
busco conservar o termo porque penso que sua
utilização coloca em relevo um aspecto
sistematicamente esquecido não só por alguns analistas,
mas também por boa parte daqueles que se interessam
pela teoria psicanalítica que é o fato de a psicanálise ser
um tratamento. Foi para isso que Freud a estabeleceu e é
para isso que ela continua existindo até hoje. A
psicanálise é um meio, uma técnica, uma abordagem (ou
seja, existem outras) de ajuda para determinadas
pessoas. Digo isso porque, principalmente depois do
estrondo provocado pelas teses de Jacques Lacan, uma
boa parcela dos analistas começou a pensar e a querer
extrair da psicanálise mais do que ela poderia oferecer.
Em bom português: os caras começaram a achar que a
psicanálise era “a última bolacha do pacote”, que ela era
um metadiscurso capaz de explicar e de se sobrepor a
qualquer outra forma de descrição do sujeito.

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21/04/13 O que um psicanalista faz | Lucas Nápoli

É por isso que uso a palavra “doente”, caro leitor: para


enfatizar que quem procura um analista espera receber
dele ajuda para ver restabelecida sua saúde.
Evidentemente, os conceitos de “saúde” e “doença” que se
tem a partir das descobertas advindas do método
psicanalítico não são os mesmos da medicina, mas
ainda assim não se pode perder de vista que a
psicanálise é um tratamento e, portanto, existe para
cumprir determinados objetivos. É exatamente sobre
isso que falaremos hoje:

Quais são os objetivos de um tratamento psicanalítico?

O primeiro post desta série foi dedicado às razões pelas


quais as pessoas procuram a ajuda de um psicanalista
ou de um psicoterapeuta. Vimos que, via de regra, as
pessoas nos procuram quando estão sofrendo, mas
sofrendo a ponto de não conseguirem vislumbrarem,
sozinhas, a solução para seu sofrimento. Isso porque
elas se sentem presas, limitadas, como se algo à revelia
delas próprias as impedisse de fazerem o que
gostariam.

É justamente com base nessa condição inicial daqueles


que recorrem a nossos serviços que estabelecemos os
objetivos do tratamento. Logo, se o doente se sente preso,
cercado de amarras, a finalidade do tratamento deve ser
a de ajudá-lo a se ver livre dessa prisão. Simples.

Numa visão panorâmica, vimos um pouco ao longo dos


posts como se dá esse processo de “libertação”. Hoje,
gostaria de focalizar precisamente a natureza dessa
libertação, ou seja, do que se constitui isso a que a
psicanálise visa enquanto método de tratamento. O que
me vem à mente nos últimos tempos ao pensar sobre
isso é o conceito do filósofo Benedictus de Spinoza de
conatus ou “potência de agir”. Para Spinoza todo ser
possui essa potência que faz com que o ser persevere no

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21/04/13 O que um psicanalista faz | Lucas Nápoli

próprio existir e, se possível, se expanda. Tal potência


pode ser refreada ou fortalecida de acordo com as
experiências que a gente vivencia. Penso que a
psicanálise seja uma das experiências capazes de nos
auxiliar a fortalecer a nossa potência de agir, justamente
porque a matéria-prima de seu funcionamento é
justamente a investigação cuidadosa daquilo que
diminuiu a nossa potência e fez com que procurássemos
ajuda. Um dos objetivos da psicanálise, portanto, é nos
dar mais “liberdade de movimentos”. O que a neurose
faz conosco é o oposto: ela restringe essa liberdade, por
exemplo: impedindo um jovem de ter uma ereção
completa ou uma dona de casa de sair à rua por medo
das pessoas ou um executivo de trabalhar por não
conseguir deixar de repetir: “Controle remoto” 30 vezes
a cada 15 minutos…

A psicanálise ajuda pessoas como essas a se verem


livres dessas amarras que as impedem de alcançarem
seus objetivos, terem maior bem-estar etc. Todavia, há
um detalhe importantíssimo que é o que diferencia o
método psicanalítico em relação a outros tipos de
tratamento: a psicanálise só consegue ajudar as pessoas
a terem maior liberdade de movimentos precisamente
porque ela se coloca outro objetivo como anterior a esse!
Qual objetivo? Basta que você leia meia dúzia das
páginas de “Estudos sobre Histeria”, livro que Freud
escreveu com Joseph Breuer, para que você logo se dê
conta. Você verá naquelas páginas, Freud interessado
não tanto em fazer sumir o sintoma das histéricas, mas
sim em extrair delas um saber sobre aqueles sintomas,
em descobrir-lhes as causas! Ou seja, meus caros: a
psicanálise consegue ajudar os doentes a terem sua
saúde restabelecida ao ter como finalidade inicial não a
eliminação de seus sintomas, isto é, as amarras, mas
sim a reconstrução de sua história, a descoberta de seu
desejo e, assim, gradualmente os sintomas deixam de ter
serventia e o doente consegue abdicar da prisão da qual
tanto gostava – sem o saber. Matam-se dois coelhos com
uma única pedrada.

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21/04/13 O que um psicanalista faz | Lucas Nápoli

***

Pois bem, chegamos ao final desta série. Não estou certo


de que consegui responder com clareza à pergunta que
alguns familiares me fizeram e que me motivaram a
escrever os posts, lembram? Só sei que ainda resta uma
infinidade de aspectos da prática do psicanalista que
não foram abordados aqui, de sorte que para muitos
será talvez um pouco frustrante saber que não haverá
uma “parte 6”. A esses peço que, por favor, se
manifestem via comentários. Quem sabe a continuação,
juntamente com as partes já publicadas, saia em forma
de livro? ; ) Conto com o feedback de vocês!

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21/04/13 O que um psicanalista faz | Lucas Nápoli

winnicott • 18 Comentários

O que um
psicanalista faz?
(parte 4)
Publicado em 24/01/2011

Muitas
pessoas
costumam se
perguntar:
“Mas, afinal
de contas, por
que e u
deveria
desembolsar
boa parte do
meu salário
em anos de terapia se eu tenho meus familiares e
amigos com quem posso fazer o mesmo que faria com
um terapeuta, isto é, conversar, sem precisar pagar
nada?”.

Um dos meus objetivos com esta série de textos é


demonstrar em que consiste essa “conversa” que o
paciente tem com seu terapeuta e no que ela difere de
um desabafo para um amigo ou um bate-papo com
algum familiar. Nós já vimos algumas dessas
especificidades. Vimos que o analista, diferentemente do
seu amigo ou do seu cônjuge, não busca te compreender
ou se por no seu lugar. Pelo contrário, para o analista
você sempre será um enigma, um ponto de interrogação
insuperável. E a intenção é boa, meu caro: é para que
você também comece a se tornar um enigma para si
mesmo.

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21/04/13 O que um psicanalista faz | Lucas Nápoli

Vimos também que o analista não vai compartilhar com


você as suas delegações de responsabilidade. Um amigo
preocupado em não te magoar até faria isso, mas o
analista não. O analista quer saber o que te faz ficar
nessa plácida posição de passividade, mesmo que você
saia da sessão xingando até a última geração dele.

Pois bem, espero que com isso os leitores que


porventura costumam fazer aquele questionamento
inicial, já consigam discernir que uma análise não tem
nada a ver com uma conversa normal, a não ser pelo
fato de que são duas pessoas falando. E nem isso, pois
amiúde apenas um fala – o que não significa que seja
necessariamente o paciente…

Hoje veremos mais uma particularidade do tratamento


psicanalítico. Por enquanto temos visto os objetivos e
efeitos dessa “conversa” entre analisando e terapeuta.
Neste post veremos do que se constitui essa conversa,
como ela funciona, o que equivale a fazer uma das
perguntas do final do post anterior:

Como é que o paciente “descobre” coisas sobre si em


análise?

Tenho certeza de que todos vocês que estão lendo essas


linhas, sabem muito bem como funciona uma conversa
normal, certo? Se não, vou relembrá-los. Funciona mais
ou menos assim: primeiro a gente pensa, depois a gente
fala. Depois é a vez de o outro falar e, enquanto o outro
fala, a gente não perde tempo: pensa no que vai falar em
seguida. Com o outro acontece a mesma coisa. Logo, o
que se tem geralmente são dois monólogos: todo mundo
fala, mas ninguém ouve (de fato) ninguém. Se você acha
isso absurdo, comece a prestar atenção nas conversas
que você costuma ter com as pessoas e depois poste um
comentário aqui – mas seja sincero…

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21/04/13 O que um psicanalista faz | Lucas Nápoli

Pois bem, o que em geral desorganiza essa dinâmica de


“pensa, fala, não ouve” é quando um dos “interlocutores”
não pensa para falar. E aí o que acontece? Ele fala
besteira. E se ele fala besteira o que acontece? Isso
mesmo que você pensou: o outro finalmente presta
atenção ao que ele disse. Por conseguinte, os poucos
momentos de verdadeiro diálogo numa conversa
acontecem quando os interlocutores dizem bobagens!
Ora, não é exatamente isso o que ocorre o tempo todo
numa análise? Não se espantem. Essa é uma
decorrência direta daquilo que no início do tratamento
solicitamos ao paciente que faça, isto é, que ele,
diferentemente de quando está numa conversa normal,
não pense antes de falar, que fale o que vier a sua
cabeça. É o que Freud chamou de “intrusão livre” e que
na tradução portuguesa virou “associação livre”. A idéia
original da palavra alemã é intrusão mesmo: não há
qualquer processo associativo. O que a gente pede para o
paciente é que ele deixe introduzirem-se na sua mente
todas as representações que baterem à porta. E, como eu
disse acima, quando a gente não pensa pra falar a gente
fala bobagem…

A grande sacada de Freud foi ter percebido que são


justamente essas bobagens que a gente fala que
expressam a nossa verdade, o nosso desejo. É muito
comum o paciente falar alguma coisa e logo em seguida
se arrepender dizendo: “Mas não foi isso o que eu quis
dizer”. Uma tarefa essencial do analista é justamente
não permitir que o paciente cometa esse retrocesso de
não se reconhecer naquilo que disse. A gente aprende
com a psicanálise que nunca falamos aquilo que não
queríamos dizer. Quando acontecem ocasiões assim, o
analista busca fazer com que o analisando pense sobre o
que efetivamente disse. E é precisamente nesse processo
de elaboração, de trabalho mesmo, que outras
representações lhe advirão e ele encontrará uma trilha
para descobrir uma porção de coisas que estavam
engavetadas em sua alma.

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21/04/13 O que um psicanalista faz | Lucas Nápoli

É por isso que a expressão “associação livre” é ruim,


pois ela passa a idéia de que o analista tem que deixar o
paciente falar o tempo todo, ao léu, durante 50 minutos.
Como eu já disse em outra ocasião, a função do analista
é a de fazer a análise acontecer, mesmo que para isso
tenha que encerrar a sessão com apenas 5 minutos, pois
uma das maneiras de fazer com que o paciente trabalhe
sobre aquilo que disse e do qual se arrependeu, é
encerrar a sessão, impedindo o retrocesso. Foi isso o que
Lacan chamou de trabalhar com uma temporalidade
lógica e não cronológica.

Portanto, uma das coisas que torna a psicanálise um


método capaz de levar as pessoas a saberem um pouco
mais de si e “sacarem” muitas coisas a respeito do
próprio comportamento é o fato de que frente ao
analista nossas bobagens e besteiras são o que de
melhor podemos oferecer. E o analista, por seu turno,
não permite que a gente escape de assumir a
responsabilidade por essas besteiras e bobagens. Pelo
contrário, as transforma em arautos do desejo…

CONTINUA…

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21/04/13 O que um psicanalista faz | Lucas Nápoli

O que um
psicanalista faz?
(parte 3)
Publicado em 18/01/2011

No

primeiro post desta série dissemos que via de regra o


paciente inicia um processo terapêutico atribuindo a
responsabilidade por sua atual condição de sofrimento
a outras pessoas, geralmente familiares e pessoas de seu
círculo mais próximo de contatos. Talvez os únicos
pacientes que não se comportam dessa maneira sejam
os deprimidos, os quais padecem exatamente do oposto,
isto é, de um excesso de culpa. Nesses casos, a primeira
atitude do analista deve ser a atenuação do sentimento
de culpa através da investigação de suas raízes, as quais
estão quase sempre vinculadas à ferocidade da
instância superegóica. Do contrário, se o analista não se
preocupar em ajudar o paciente a se livrar da carga
excessiva de culpa que carrega nas costas, a
continuidade do tratamento se torna praticamente
inviável, transformando-se numa ladainha de lamúrias
e lágrimas sem qualquer possibilidade de elaboração ou
redundando no pior, a saber: o suicídio.

Pois bem, agora que já sabemos que os casos de


depressão são os únicos em que a tendência a atribuir a
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21/04/13 O que um psicanalista faz | Lucas Nápoli

culpa a outrem não incide na entrada do paciente em


análise, passaremos ao objetivo principal deste post que
é tentar dizer qual a tarefa do analista nos outros casos,
isto é, na maioria, em face dessa tendência do paciente
de se eximir da responsabilidade por seu sofrimento.
Essa tarefa, por sinal, é a primeira etapa de um
tratamento analítico. Façamos, pois a pergunta:

Qual é a primeira etapa de um tratamento


psicanalítico?

Inicialmente, devo fazer um aviso: quando digo que em


geral os pacientes se eximem da responsabilidade por
seu sofrimento ao entrarem em análise, não estou
fazendo nenhum tipo de juízo de valor sobre tal
comportamento. Não estou dizendo, portanto, que o
correto seria o paciente agir de maneira diferente. Nós
agimos assim o tempo todo, inclusive num nível social,
basta ver a nossa relação com os alagamentos urbanos:
sempre os responsáveis por tais coisas são as outras
pessoas que jogam lixo nas ruas ou o governo que não
cria estratégias de prevenção; nós mesmos não temos
nada a ver com a coisa…

Então, quando a gente entra em análise, fazemos o


mesmo, só que com os nossos sintomas, ou seja, com
aquilo do qual a gente se queixa, que não gostaríamos de
fazer, mas fazemos. Sempre achamos um culpado para
eles: “Sou assim porque minha (meu) mãe (pai)…” é
talvez uma das frases que mais se ouve num divã. Mas o
culpado não precisa ser feito de carne e osso! Pode ser o
despertador que, por um defeito qualquer, não tocou e
fez o cara perder uma excelente entrevista de emprego.
Vejam: não foi ele que dormiu a mais, foi o despertador
que não tocou… Esses são apenas alguns de incontáveis
exemplos.

Com efeito, quando se entra em analise é hora de mudar

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21/04/13 O que um psicanalista faz | Lucas Nápoli

essa posição de passividade. E como isso acontece?


Através de um processo que os analistas lacanianos
chamam pomposamente de “retificação subjetiva” e que
não acontece só no início, mas ao longo de todo o
tratamento. O que significa isso? A retificação subjetiva
corresponde a intervenções, isto é, falas, interpretações,
encerramento da sessão, silêncio, cujo objetivo é mostrar
ao paciente que aquilo do qual ele se queixa também lhe
é útil. Nesse ponto, o leitor pode perguntar: “Mas, peraí,
como pode ser útil se o faz sofrer?”. E eu respondo: útil
na medida em que “resolve” determinados conflitos
inconscientes, ou seja, como realização de intenções que
até então o paciente ignorava que possuía. Ora, não é
paradoxal que justamente aquilo que o faz sofrer tanto
seja justamente o que o paciente não consegue deixar de
fazer? Por que isso acontece? Justamente por que aquilo
que conscientemente o faz sofrer, no nível inconsciente o
satisfaz, resolvendo determinadas questões que se
deixadas em aberto o fariam sofrer muito mais. O
doente é, portanto, levado a um estado em que não é
possível mais infligir culpa a ninguém por sua
condição, reconhecendo que é ativo em seu próprio
sofrimento.

Darei um exemplo para que a idéia fique mais clara: um


rapaz se queixa de que não consegue namorar com
nenhuma garota por mais de 6 meses. Ele chega à
análise culpando às garotas com quem namorou: foram
elas que sempre terminaram com ele antes dos 6 meses
e diante disso demanda do analista uma resposta: o que
há errado consigo? Por que as garotas sempre terminam
com ele? (Como vocês já sabem, o que há por trás dessa
demanda é um outro pedido que se enuncia mais ou
menos assim: “Me diga que não é nada, que não sou eu o
problema, que são elas mesmo!”) Após determinado
período, o paciente gradualmente vai percebendo que na
verdade é ele próprio que gera condições para que as
garotas tenham como única alternativa a saída do
relacionamento. E por que gera tais condições? Essa é
outra questão… e que também demandará tempo para

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ser respondida. Mas o que precisa ficar claro é que a


análise operou uma transformação na posição subjetiva
do rapaz: se antes ele era o abandonado, aquele que
nenhuma moça queria por mais de 6 meses, agora ele
passa a se perceber como aquele que, pelo seu próprio
desejo, não quer uma relação de mais de 6 meses!

Mas como é que acontece esse processo de


reconhecimento de conflitos que o sintoma resolve?
Como é que o paciente “saca” que por detrás do seu
sofrimento subsiste um desejo? São essas as perguntas
que tentaremos responder no próximo post…

CONTINUA…

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O que um
psicanalista faz?
(parte 2)
Publicado em 10/01/2011

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21/04/13 O que um psicanalista faz | Lucas Nápoli

Escrever este
texto tem me
feito sentir
uma sensação
de esta r
“entregando o
ouro para o
bandido” no
sentido de
estar expondo de maneira acessível a qualquer pessoa o
que numa psicanálise se encontra trancado a sete
chaves na cabeça do analista. Não estou sozinho nessa
inquietação: Freud também a sentiu ao escrever seus
célebres artigos sobre técnica. E, como o mestre,
prosseguirei nessa difícil tarefa de explicar o que faz
um psicanalista, certo de que, em se tratando da
psicanálise, saber as regras do jogo tanto quanto ignorá-
las não exerce diferença significativa no andamento da
terapia.

Antes, porém, de dar seqüência a este escrito, gostaria de


deixar claro aos leitores que as considerações que aqui
faço são derivadas da minha prática clínica de
psicanalista cotejada com uma trajetória de
aprendizado teórico que também é pessoal. Nesse
sentido, à questão “O que um psicanalista faz?” subjaz
outr a : “O que Lucas Nápoli faz ao atuar como
psicanalista?”. Evidentemente, eu não compartilharia
aqui o modo como exerço a psicanálise se não tivesse a
esperança de que a minha prática possa ser semelhante
à de muitos outros analistas e nesse sentido servir de
parâmetro para que o leitor leigo possa imaginar como
os psicanalistas em geral atuam. No entanto, é preciso
que os que se debruçam sobre essas linhas tenham
sempre em mente que se trata de um relato pessoal e
não um discurso institucional sobre o que um
psicanalista deve ou não fazer.

Feita tal ressalva, retornemos ao que de fato nos


interessa. No último post tentamos responder à

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21/04/13 O que um psicanalista faz | Lucas Nápoli

pergunta relativa a quem procura o auxílio da


psicanálise ou das psicoterapias de maneira geral.
Concluímos que se trata de alguém que sofre, que
geralmente atribui a outras pessoas a causa de seu
sofrimento e que demanda do analista ou do terapeuta
compreensão. Hoje veremos o que o analista faz frente a
tal cenário. Portanto, prossigamos com nossas questões.

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O que o psicanalista faz frente à demanda do paciente


de ser compreendido?

Sejamos sintéticos: o analista não atende a tal demanda.


Mas, para que os leitores mais afoitos não tirem
conclusões precipitadas, é bom deixar claro: dizer que o
analista rejeita a demanda por compreensão não
significa dizer que ele seja alguém frio e insensível, que
não se importa com o paciente. Não é nada disso. Não
ser compreendido é justamente o que o doente necessita,
ou seja, a postura “incompreensiva” do analista não é
veneno, mas sim remédio. Explico: é que a pessoa,
quando resolve buscar a ajuda da psicanálise, já se
compreendeu muito, já conseguiu estabelecer nexos
causais para seu sofrimento e seu desejo mais imediato
é apenas ter alguém que lhe diga: “Você está certa, eu te
entendo, deve estar sendo muito difícil pra você
enfrentar tudo isso.”. Metaforicamente, é como alguém
que está numa poça de lama há muito tempo, de modo
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21/04/13 O que um psicanalista faz | Lucas Nápoli

que já se acostumou com a sujeira, e agora seu desejo já


não é mais o de sair da lama mas sim de arranjar um
cúmplice que tope viver na lama consigo. Se o analista
atendesse a demanda de compreensão ele estaria
encarnando esse companheiro.

Mas a função do psicanalista é outra: é justamente a de


colocar em questão a vida na lama, dizendo: “Eu
realmente não entendo porque você está há tanto tempo
nessa poça”. É justamente ao ser confrontado com essa
incompreensão que o paciente terá que se esforçar para
fazer-se entender e tentar produzir um saber sobre
aquilo que até então era óbvio. É por isso que
dificilmente um paciente ouvirá do analista uma
resposta afirmativa a questões do tipo: “Ah, você sabe,
né?”. Pelo contrário. Ao dizer “Não, eu não faço idéia” ou
a perguntar: “Como assim?” a idéia é ajudar o paciente a
chegar a um ponto tal que ele será capaz de discernir
quão frágeis e tolas são as bases de sustentação do que
até então lhe parecia tão sólido como justificativa de seu
sofrimento, ou seja, o ponto em que ele perceberá que o
saber que produziu é manco, constitucionalmente
incompleto. Chegar a esse ponto costuma demorar anos
de trabalho duro por parte do doente, justamente porque
abdicar do peso das palavras ao mesmo tempo em que é
libertador, é também desnorteante no sentido mais forte
dessa palavra, isto é, o qualificativo de algo que provoca
uma falta de direção, de norte.

A palavra compreensão comporta muitos sentidos, não


apenas o de entendimento que está na base da demanda
do paciente. Compreensão também pode ser pensada
como sinônimo de acolhimento e é nesse e apenas nesse
sentido que se poderia dizer que o psicanalista exerce
compreensão. Todavia, levando em conta a confusão de
significados, preferimos falar em acolhimento mesmo.
O analista acolhe. Acolhe a queixa, acolhe o sofrimento,
acolhe o paciente. E acolher não significa pegar no colo,
como muitos pensam. Acolher significa aceitar a
demanda de ajuda como legítima, o sofrimento como

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21/04/13 O que um psicanalista faz | Lucas Nápoli

real e se colocar à disposição para que o paciente efetue


o seu trabalho de análise. Sim, porque quem de fato
trabalha no sentido estrito da palavra é o paciente. A
nossa função é muito mais modesta; é de estar ali como
uma presença que o incita a continuar, como um objeto
que deve ser usado para que o trabalho seja concluído. O
único desejo que nós, analistas, nos permitimos ter na
análise, é o desejo de que a análise prossiga…

CONTINUA…

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Já!

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O que um
psicanalista faz?
(parte 1)
Publicado em 02/01/2011

Este texto, produto


de uma reflexão, é
também fruto de
uma conversa que
tive recentemente
com familiares os
quais, é preciso que
se diga, são pessoas
não apenas leigas
em relação à
ciência psicológica,
mas completamente
alheias ao universo
psi, de sorte que o
momento em que temas ligados à Psicologia se tornam
assunto de nosso bate-papo, este se torna uma ocasião
bastante auspiciosa para o incitamento de reflexões
sobre aspectos fundamentais de minha prática como
psicanalista e psicoterapeuta, aspectos que se não
tivessem sido postos em questão em tais encontros,
permaneceriam como dogmas, isto é, irrefletidos e
tomados como óbvios.

A pergunta que os familiares em que estão me


colocaram toca na mais basal das questões relativas ao
fazer psicanalítico e psicoterapêutico e fora enunciada
mais ou menos assim: “Se uma moça vai até você e se
queixa de depressão, o que você faz? Nós sabemos que se
trata de uma conversa, mas o que você faz de fato?”. O
exemplo da jovem deprimida serviu-lhes apenas como
ilustração. O que meus interlocutores efetivamente

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21/04/13 O que um psicanalista faz | Lucas Nápoli

queriam saber era o que eu fazia ao fazer psicanálise e


psicoterapia. Minha resposta naquele momento, posto
que eu não esperasse uma indagação como ela, não foi
das melhores. Em síntese, eu repliquei que minha
função era ajudar o paciente a identificar as razões de
seu sofrimento, supondo que a ignorância das causas
seja um dos fatores que causam e mantêm sua aflição.
Obviamente, como os leitores psicólogos, psicanalistas e
psiquiatras sabem, não é essa a função primordial de
um processo terapêutico. Levar o paciente a enxergar o
que antes não era capaz talvez seja uma tarefa
importantíssima da terapia, mas não a única.

Julgando, portanto, insatisfatória minha resposta e na


intenção de sistematizar num discurso o que penso
sobre a prática da psicanálise e da psicoterapia, escrevo
este artigo, esperando que os colegas que porventura o
leiam possam emitir suas próprias opiniões e
manifestar sua concordância ou discordância com
relação a meus posicionamentos, de modo a ensejar
uma discussão conjunta sobre nossa prática. Como a
influência maior para este escrito foi uma indagação, é
na forma de perguntas que vou formatá-lo, pois penso
ser este o melhor método de exposição neste caso. Para
pensarmos sobre o que nós, como terapeutas fazemos no
consultório, primeiramente é necessários nos
perguntarmos:

Quem busca psicoterapia ou psicanálise?

Quem está sofrendo. Como regra, é esse o perfil das


pessoas que nos ligam querendo marcar uma consulta.
Atualmente, alguns indivíduos de poder aquisitivo mais
elevado têm recorrido à psicanálise ou outro tipo de
tratamento não porque estejam sofrendo, mas porque
querem ser mais felizes, isto é, não querem deixar de ter
desprazer, mas sim de terem prazer a mais, o que é
uma demanda perfeitamente legítima. No entanto, essa
parcela de pessoas não representa nem 1% de nossa
clientela. A maior parte das pessoas chega ao

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21/04/13 O que um psicanalista faz | Lucas Nápoli

consultório queixando-se de dores da alma, que limitam


sua capacidade de usufruir de uma vida que desejam
viver. É o rapaz que tem as mãos esfoladas e está
sempre atrasado porque não consegue deixar de lavá-
las 50 vezes após usar o banheiro; é a adolescente que
não consegue ter sucesso em nenhum de seus
relacionamentos amorosos; é a senhora que sofre
desmaios toda vez que entra numa fila; é o executivo de
meia-idade casado que não gostaria de sentir desejo
sexual por seu estagiário. Esses são exemplos de coisas
que levam as pessoas a buscar a ajuda de um
psicoterapeuta ou um psicanalista. O pedido que nos
chega, portanto, pode ser expresso grosso modo da
seguinte forma: “Eu sou assim, mas não gosto de ser
assim, pois acho que eu seria mais feliz sendo diferente,
mas não consigo ser diferente. Portanto, espero que o
senhor me ajude a ser diferente.”. Na maior parte dos
casos, há sempre algumas pessoas às quais o indivíduo
que nos procura atribui a culpa pelo seu estado atual
infeliz: é o pai que nunca lhe deu muita atenção; o
marido, grosseiro e irascível; a mãe que prefere a irmã a
ela, enfim, a lista varia, mas há sempre um culpado por
suas mazelas. Evidentemente, não é preciso ser Freud
para saber que essa atribuição de culpa é apenas uma
estratégia empregada pelo doente para se livrar da
responsabilidade por suas queixas, mas o detalhe é que,
na maioria dos casos, o paciente não possui tal
consciência. Logo, quando alguém nos procura, além de
sofrer, sentir-se limitado e querer ser diferente, essa
pessoa espera que nós legitimemos o seu sofrimento,
compartilhando com ela da crença de que fulano de tal é
o responsável por ela estar como está. Ou seja, o doente
espera não só que nós o tornemos diferente do que é,
mas que nós o compreendamos no sentido de que nós
reconheçamos que seu sofrimento é razoável e
justificado.

Portanto, diante desse cenário, o que deve fazer o


psicanalista? É a próxima pergunta que tentaremos
responder no próximo post.

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