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Jogo à italiana

Vivian Lemos
Revisão: Carolina Leocadio
Capa: Jeni Ramos
Foto de capa: Adobe Stock
Diagramação: Yasmim Mahmud Kader

Jogo à italiana Copyright © 2020 — Vivian Lemos


Todos os direitos reservados. Obra protegida pela Lei 9.610 de 1998 (Lei
de Direitos Autorais)
É proibida a reprodução total ou parcial ou comercialização desta obra sem a
autorização expressa da autora e indicação dos créditos autorais.

Plágio é crime.

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Jogo à italiana é um desafio pessoal para mim. Meu primeiro
lançamento na Amazon, Despedaçados, foi um sucesso bem maior do que eu
imaginava e é um livro bastante diferente deste aqui.
Em Jogo à italiana, mergulhei num universo de que gosto muito: as
comédias românticas. É um livro leve, sensual e divertido — e também tem
uma dose extra de pimentinha. Então aqui já cabe um aviso: em alguns
capítulos há linguagem mais explícita, portanto se você se incomoda com
isso fica o alerta. Não é um livro recomendado para menores de dezoito anos.
Mas fui desafiada pela Felipa Bezerra (do Instagram maravilhoso
@lendosonhando) a ir além da minha zona de conforto. Felipa se tornou mais
do que uma parceira literária e uma leitora-beta atenta. Ela se tornou uma
amiga.
E foi ela que puxou minha orelha: “Mulher, esse homem é um jogador de
futebol americano, um pegador, ele não falaria com essa poesia toda não.” E
eu tive que me render à voz do personagem e deixar as cenas calientes
fluírem.
Além disso, Jogo à italiana ganhou vida por causa da Felipa mesmo, a
louca dos secundários, que se apaixonou por Noah lá em Um amor, duas
versões, que publiquei como uma brincadeira no Wattpad. Ela me fez
acreditar que esse personagem tinha potencial para ganhar seu próprio livro.
E por que escrever cenas mais ousadas se tornou uma quebra de
paradigma? Porque ainda temos muitos preconceitos arraigados. Porque
ainda achamos que falar sobre sexo abertamente é vulgar. Porque as mulheres
sempre foram colocadas numa posição de coadjuvantes no que diz respeito ao
erotismo.
Então Jogo à Italiana é um tapa na minha cara acadêmica. Vamos ter
homem com abdômen tanquinho na capa sim. Vamos falar de sensualidade e
de empoderamento. E também há outro ponto importante nesta história: a
protagonista Sophia é gente como a gente. Uma mulher “fora dos padrões” do
que a sociedade dita. Uma mulher gorda. Desejo que com esta história eu
possa ajudar um tiquinho na discussão sobre padrões de beleza feminina.
Espero que vocês possam se divertir com esta história tanto quanto eu
curti escrevê-la. Em tempos tão duros quanto os que vivemos, de isolamento
social e incertezas, penso que merecemos sonhar e ter os corações
quentinhos.
Aproveito o espaço para agradecer ao chef Giovani Vivan, que elaborou
as receitas do cardápio de Soph, que você encontra no final do livro, à
Bárbara Oliveira (do Instagram maravilhoso @leiturasdabah) e à autora
Cindy Emy pela betagem e pelos apontamentos superprecisos, e à Evellyn
Miller, que também se tornou uma amiga e é uma escritora maravilhosa que
me incentiva e inspira demais. Outra mulher fabulosa em quem me espelho é
Karina Heid. O exemplo e a generosidade de vocês contagiam.
Sobre o cannoli, o doce italiano que nos enche de água na boca:
cannoli é, na verdade, plural de cannolo. Mas tanto no Brasil quanto nos
Estados Unidos todos se referem ao doce como cannoli, mesmo quando estão
falando de apenas uma unidade. Decidi manter esse uso coloquial.
E um agradecimento especial a você, que está dando uma oportunidade à
minha história. Espero que Noah e Sophia aqueçam o seu coração. Obrigada!
Dedico esta história a todas as mulheres que escutam que estão
“fora dos padrões”. Tenhamos coragem para estabelecer os
nossos próprios padrões. Somos lindas. Somos poderosas. Nós
podemos!
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Epílogo
Livro de Receitas da Soph
Sobre a autora
Fazer contas, definitivamente, minava o meu bom humor. E ali estava eu,
mordendo um lápis e analisando os números do antigo armazém. Apesar
de ter me formado em gastronomia no Institute of Culinary Education,
continuava acumulando as funções de contadora, compradora e atendente no
negócio da minha família.
O Di Lucca’s era um dos mais tradicionais negócios de Little Italy.[1]
Tinha sido fundado na década de 1940 pelos meus avós, recém-chegados da
Itália. Eu e meus quatro irmãos éramos a segunda geração de norte-
americanos da família. Mas as raízes mediterrâneas ainda gritavam na minha
casa.
Meus irmãos, Angelo, Enrico, Lorenzo e Nicolas, eram mais velhos.
Sim, eu era a única mulher numa família ítalo-americana. Todos tinham as
próprias empresas, e meu pai, Luiggi, machista do jeito que era, queria me
manter no cabresto e não acreditava que eu seria capaz de administrar uma
empresa sozinha. Isso em pleno século XXI — mas, enfim, italianos sendo
italianos.
Eu queria abrir o meu próprio bistrô. Desejava dar o meu toque
pessoal e modernizar pratos tradicionais italianos, mas antes precisava juntar
dinheiro. E eram muitos os zeros que me separavam do meu sonho. Por isso,
eu trabalhava para os meus pais, e às vezes para os meus irmãos e também na
Cantina da Mamma, a tradicional pizzaria da família Vicini.
Naquele dia, eu estava tão concentrada contabilizando entradas e
saídas de dinheiro e mercadorias que ouvi a sineta indicar a entrada de
alguém, porém não dei muita importância. Afinal, os outros funcionários
estavam ali. O cliente pigarreou para chamar minha atenção. Irritada, mas
tentando manter a compostura, levantei os olhos do livro contábil e quase
perdi o equilíbrio. Era ele.
— Oi, Soph, desculpe estragar sua diversão. — Noah deu seu
tradicional sorriso que, segundo as más línguas, era responsável por molhar
calcinhas, o que eu podia confirmar. — O sr. Di Lucca está?
Ele vestia uma camiseta vermelha justa, agarrada o suficiente para
que eu pudesse ver aqueles músculos esculpidos por horas de treinamento
diário. Em letras brancas gritantes, estava escrito Italians do it better
(Italianos fazem melhor). Revirei os olhos.
— Não, meu pai foi ao Chelsea Market. Ele foi ajudar na pizzaria do
Enrico. — Tentei transparecer indiferença.
— Gostou da camiseta? — Ele riu ao ver que eu olhava para aquela
frase ridícula.
— Por que eu deveria gostar? — Cruzei os braços na altura do peito.
— Você não acha que os italianos fazem melhor? — Ele me imitou e
cruzou os braços.
Que braços! Fortes, maravilhosos e tatuados. Não era justo que Noah
estivesse cada vez mais bonito.
— Depende: comida, definitivamente, sim. Igualdade de gêneros?
Não tanto… — Fiz uma careta.
— Você acha que os italianos são machistas? — Ele parecia estar se
divertindo.
Sério, Noah? Sério?
— Eu não acho. É um fato — grunhi.
— Você me acha machista, Soph?
— Não sei. E você não é italiano. Nem eu — bufei, mal-humorada.
— Somos ítalo-americanos. Mesmo que tenhamos nascido aqui,
nossos sobrenomes e o fato de termos crescido em Little Italy nos tornam
bastante italianos em Nova York, você não acha? Mas isso não responde à
minha pergunta: você me acha machista?
— Não sei, Noah. Você nem usa o sobrenome Vicini. E, além disso,
não te conheço mais tão bem assim…
— Como não, Soph? Você me conhece desde que nascemos. — Ele
deu uma risada.
Ah, seu cretino, pare de ser tão irritantemente bonito. Parecia que eu
estava no meio de um incêndio e meu corpo era consumido por labaredas.
Quente. Ficar perto dele sempre me deixava quente.
— Conheci o garoto que não era tão popular na escola, o menino que
descobriu que podia jogar futebol americano e, aos poucos, foi conquistando
o próprio espaço. Eu não conheço o quarterback[2] do New York Giants.
— Credo, Soph. Por que essa animosidade? — Ele franziu o cenho.
— Não é animosidade. Você é uma estrela agora. Você é Lacox. E
essa persona pública, o atleta, eu não conheço.
— Soph… — Noah veio para o lado do balcão onde eu estava. Tive
que inclinar minha cabeça para trás para poder enxergá-lo. Ele era tão alto.
— Eu sou a mesma pessoa que era antes.
— Não é. Nem sei mais do que você gosta, você nem sabe do que eu
gosto… Nós não somos mais crianças. Quase nem conversamos mais.
— Vejamos se você está certa… — Ele coçou o queixo. — Qual é a
minha comida favorita?
— Macarrão à carbonara? — Eu o encarei com dúvida.
Ele riu e assentiu com a cabeça.
— Qual é o meu filme favorito?
Oh, céus.
— Touro Indomável.
— Do que eu mais tenho medo na vida e quase ninguém sabe?
— Tubarão? — Cocei a cabeça com a ponta do lápis.
Ele deu mais uma risada e concordou fazendo um sinal de joinha.
— Bom, ainda bem que é difícil encontrar tubarões em Nova York
— brinquei.
— Ainda sou o mesmo, Soph. O mesmo garoto que gosta de jogar
futebol. Minha imagem pública não tem nada a ver com quem eu sou de
verdade.
— Nem as milhares de mulheres que aparecem com você nos
jornais? — Droga, Sophia, sua boca grande!
— Você está com ciúmes? — Ele me fuzilou com seus olhos azuis e
os semicerrou, como fazia quando queria debochar de alguém. Maldito.
— Eu não. Por que estaria?
— Não sei. Me diga você.
— Eu não tenho ciúmes de você, Noah. Pare de ser convencido. —
Dei um empurrão nele e me afastei.
A proximidade dele me sufocava. Eu precisava controlar meus
nervos.
— Bom, preciso ir. Ainda não visitei a mamma. Avisa ao seu pai que
eu estive aqui?
— O que você quer com ele? — Involuntariamente coloquei a mão
na cintura.
— Negócios, vim tratar de negócios. — Ele revirou os olhos,
parecendo estar contrariado.
— Que negócios?
— Como você é curiosa, Soph. — Ele chegou mais perto de mim.
Tão perto que eu estava sentindo o cheiro dele. Aquele aroma que eu
conhecia, misturado a um perfume caro.
— Depois sou eu quem vai ter que fazer a contabilidade de mais uma
empreitada do meu pai… Porque aparentemente para fazer contas, compras,
atender as pessoas e sorrir como uma idiota eu sirvo. Mas para opinar, não!
— Acredito que você vai opinar bastante, Soph. Mas não neste
primeiro momento. — Ele segurou meu queixo e suavemente inclinou minha
cabeça para que eu olhasse para ele.
Dei um tapa em sua mão e me afastei irritada.
— Viu o que eu disse? Você é tão machista quanto o meu pai e os
meus irmãos!
— Eu não sou machista, pare de falar isso! — Noah diminuiu o
espaço entre nós. Os pés dele praticamente tocando os meus. Como apenas
isso podia quase me tirar do prumo?
— Por que você acha que eu não sou capaz de contribuir com os
negócios? Por que não posso dar minha opinião?
— Porque você é uma mula teimosa, Sophia Di Lucca. É por isso!
Não há negócio nenhum, eu estava apenas te provocando. Seu pai quer que
eu leve uns jogadores lá na pizzaria do Chelsea Market, só isso! — Ele foi
caminhando em direção à porta.
— Ei, Noah Vicini Lacox, volte aqui! Eu ainda não acabei de falar.
— Mas eu acabei.
Quando ele girou nos calcanhares para sair do armazém, quase
esqueci quanto me irritava. A bunda dele era tão bem-feita. Ele era tão
perfeito. Que tortura. Noah era tão bonito que tinha posado para a capa da
revista GQ. E, para me torturar ainda mais, era a estrela de um anúncio da
Calvin Klein cujo outdoor ficava bem no caminho da minha casa. Eu o via
todos os dias de cueca. Mas não podia tocá-lo.
— Nossa, Soph… — Ele era a definição do deboche. — Fiz todo o
caminho até a porta e você não tentou mais me xingar. Está tudo bem com
você?
— Está tudo ótimo. Alguns de nós trabalham de verdade em vez de
correr atrás de uma bola que nem se parece com uma bola — respondi,
sarcástica.
— Ouch! — Ele levou as mãos ao peito como se tivesse levado um
tiro. — Sophia Di Lucca sempre partindo o meu coração.
— Ninguém parte o seu coração, Noah. Pare de fazer cena. — Tentei
fingir que ele não me afetava.
— Como é que é? — Ele voltou para o interior da loja, caminhando
em minha direção.
— Nada, não é nada. Eu preciso trabalhar — bufei.
— Soph, você sempre teve a língua afiada, mas hoje está pior. — Ele
soltou uma risada. — O que está rolando?
— Desculpe. Estou cansada e frustrada. Só isso. — Deixei meus
ombros caírem.
— Por que você está frustrada? — Ele apoiou as mãos no balcão e
chegou ainda mais perto de mim.
— Noah, a loja está cheia, eu preciso ajudar e…
— Não! — Ele me interrompeu num tom calmo, mas imperativo. —
Você não vai fugir do assunto como sempre faz.
— Aqui não é o melhor lugar para uma sessão de análise — zombei.
— Então vamos no Italia comer um cannoli[3] — retrucou ele.
— Ué, você pode comer cannoli? — Eu o fitei com uma expressão
de curiosidade.
— Teoricamente não seria a melhor escolha, já que estamos em pré-
temporada. Mas vou viajar amanhã para o Texas. Teremos jogo lá. Então um
cannoli não vai matar ninguém.
— Tenho que fechar as contas… — Olhei para o bolo de notas na
minha frente com desânimo.
— Eu te ajudo depois. Vamos lá. Preciso mesmo de um espresso.
Eu o encarei com descrença, confesso.
— Não me olhe com essa cara. Sou formado em administração por
Stanford, caso você tenha esquecido. — Ele parecia ofendido.
— Ok. Vamos ao cannoli. — Levei a pilha de notas para o escritório
e avisei aos atendentes que logo estaria de volta.
Eles deram um sorriso cúmplice e não pareciam se importar nem um
pouco, afinal os caras endeusavam Noah. Afe.
Atravessamos a rua e andamos pouco mais de uma quadra até
chegarmos ao Caffè Italia, que pertencia a Vitto, tio de Noah. Chegamos à
fachada do tradicional estabelecimento onde se lia num toldo marrom “O
melhor cannoli do planeta Terra”. Humildade não era o forte da família
Vicini mesmo. Dentro do café, havia um pôster autografado de Noah, todo
paramentado com o uniforme azul do New York Giants.
— Meu garoto! — Vitto abriu um enorme sorriso e saiu de trás do
balcão para dar um abraço apertado em Noah.
— Oi, tio. — Ele bateu nas costas do homem mais velho. — Viemos
comer cannoli.
— Mas que honra! Hoje tenho uma chef para provar os meus
cannolis. — Vitto riu e me deu um beijo na bochecha.
— Você sabe que os seus cannolis são os melhores. E venho aqui
pelo menos uma vez por semana, Vitto! — Dei uma gargalhada.
— Ainda bem, não suportaria uma traição de uma chef como você,
Soph — falou Vitto com sua habitual empolgação.
O tio de Noah era quase uma figura folclórica em Little Italy. Os
cannolis dele eram tão bons que frequentemente ganhavam todas as eleições
em revistas especializadas e nas colunas dos jornais. E ele aproveitou o
marketing e se autointitulou o “rei do cannoli”.
Pegamos nossos irresistíveis doces e nos sentamos em uma das
mesas que ficavam na calçada. Decidimos aproveitar o clima gostoso de
agosto. Logo, o frio estaria de volta a Nova York e seria impossível desfrutar
de qualquer coisa ao ar livre.
— Por que você está frustrada? — disparou Noah antes de dar a
primeira mordida no doce.
— Porque eu sou uma chef sem cozinha — grunhi.
— Como assim? — questionou ele, de boca cheia.
— Eu não tenho o meu restaurante! Ainda trabalho para o meu pai.
Não tenho dinheiro e parece que nunca vai ser o suficiente para abrir nada
nesta cidade tão cara!
— Soph… posso te ajudar.
— Eu não quero o seu dinheiro.
— Mas qual é o problema? É um investimento. Eu seria seu sócio.
— Você não pode ser meu sócio! — retruquei, irritada.
— Por que não? Somos amigos.
Viu? Esse era o problema. Amigos. Ah, Noah, se ao menos você
soubesse…
Ele comia o cannoli com tanta vontade que parecia que nunca tinha
experimentado um na vida. Noah passara a infância na cozinha de Vitto,
roubando as massas que o tio fritava, mas agora estava devorando a iguaria
com tanta sede ao pote que não notou que uma parte do recheio lhe sujava o
queixo. Eu me estiquei e limpei sua boca com o dedo. Ele me olhou com uma
expressão confusa e se afastou.
— Preciso ver a minha mãe… — Noah levantou de supetão.
— Mas você disse que ia me ajudar a fechar a contabilidade e…
— Sim, eu vou. Mais tarde. Preciso ir. — Ele saiu em disparada em
direção à pizzaria da família dele. Que louco.
Noah às vezes era muito difícil de entender…
algum tempo que eu não ficava tão perto de Sophia. Minha rotina de
Fazia
treinos era exaustiva, para dizer o mínimo, desde que eu tinha voltado a
viver em Nova York. Mesmo quando estava na cidade, eu passava mais
tempo em Jersey, treinando no MetLife Stadium, a casa do New York Giants.
E constantemente viajava para os jogos que aconteciam país afora.
Sim, eu a conhecia a vida toda, mas a cada momento em que ficava
ao lado dela Soph parecia diferente. Sempre havia um novo olhar, um novo
arquear de lábios insinuando um sorriso, uma nova forma de me encarar…
Ela era conforto e inquietação. Quando ela se curvou para limpar a minha
boca e vi aqueles seios fartos e generosos pulando do decote, tive
pensamentos nada fraternais. Quando senti os dedos dela roçando a minha
boca eu quis lambê-los… Era a abstinência da pré-temporada. Era isso.
— Oi, meu amor. Já estava me perguntando se você ia viajar amanhã
sem se despedir de mim. — Minha mãe abriu os braços ao me ver entrar na
pizzaria.
— Nunca viajo sem me despedir, mamma! — Peguei-a nos braços e
a girei, enquanto ela ria e gritava para soltá-la.
— Te vi passando com a Soph. Por que ela não veio com você?
— Ah, fomos só comer um cannoli no tio Vitto. Ela estava ocupada
com a contabilidade do Di Lucca’s e não podia demorar.
— Que pena! Ela tem trabalhado tanto aqui! Os novos sabores de
pizza foram ideia dela e estão fazendo muito sucesso. Pena que Luiggi seja
tão cabeça-dura com a própria filha. Soph tem várias ideias maravilhosas,
mas ele não a ouve! Ele é uma mula de tão teimoso! — lamentou minha mãe.
— A teimosia é um traço de família.
— Por que você diz isso? — Ela tirou o avental e sentou-se comigo a
uma das mesas.
— Sophia é tão cabeça-dura quanto o pai. Quer abrir o restaurante e
não tem dinheiro. Posso ajudá-la. E só por oferecer ajuda quase fui agredido!
— Ela tem o orgulho dela, meu filho. Soph é uma moça
extremamente batalhadora. Quer conseguir as coisas por mérito próprio.
— Eu sempre soube disso e é admirável. Mas eu só seria o
investidor. O sócio dela. Todo o trabalho seria de Soph. Aí sabe o que ela me
disse: Você não pode ser meu sócio! Gritou isso na minha cara!
Aparentemente, não sou bom o bastante para o restaurante dela —
resmunguei.
— Ah, figlio mio,[4] como você é tonto! — Ela deu um tapa na
própria testa.
— O quê?
— Ela é apaixonada por você. Sempre foi.
— Deixe de besteira, mamma! Ela me vê como um irmão.
— Ela não te olha como olha para os irmãos dela, Noah… — troçou
ela.
— Mãe… — suspirei enquanto pressionava as têmporas —, você vê
o que queria que fosse realidade. Você e a sra. Di Lucca sempre quiseram que
eu e Soph tivéssemos algo. Se fosse há algumas décadas, teriam arrumado
um casamento planejado!
— Seria tão ruim ser casado com uma mulher como Soph? Bonita,
trabalhadora, inteligente…
— Poupe-me, mamma. Sei que você faz parte do fã-clube da Sophia,
mas nós somos amigos. Ela não sente nada por mim. E eu também não sinto
nada por ela.
Bom, isso não era necessariamente verdade. As curvas de Sophia
sempre exerceram um certo fascínio sobre mim. A maneira como ela era
curvilínea e parecia preencher todos os espaços certos… mas ela sempre me
viu como o melhor amigo. Como o jogador fanfarrão. Soph nunca tinha me
levado a sério, e eu também não podia levá-la para a cama como mais uma.
— Prometi ajudá-la a fechar a contabilidade. Vou lá no Di Lucca’s
antes de ir para casa. Você precisa de algo? Alguma lâmpada para trocar?
Está tudo em dia?
— Ah, Noah… você é o melhor filho de todos, sabia? Está tudo bem.
Desde que você consertou a torneira não tive mais nenhum problema com a
manutenção.
— Eu te dei os contatos do seguro que fiz para a pizzaria, né?
Sempre que eu estiver fora, recorra a eles. O tio Vitto também tem os
telefones, deixei as instruções com ele.
— Não precisa se preocupar, figlio mio. Soph também tem me
ajudado bastante. Ela me auxilia quase todos os dias fechando a pizzaria.
— Fico aliviado por ela estar por perto e você não ficar aqui sozinha
com a nonna.[5] — Dei um beijo no topo da cabeça da minha mãe.
— A nonna agora fica mais em casa, meu bem. E quando ela vem
aqui é só para reclamar que estamos matando as tradições italianas. — Ela
riu.
— Bom, se ela não estivesse rabugenta é que deveríamos nos
preocupar, certo? — Soltei uma risada.
Nos despedimos e fui até o Di Lucca’s. Eu tinha prometido ajudar
Sophia e não era um homem de quebrar minhas promessas, por menores que
fossem. Ter pensamentos eróticos com Soph me deixava desconfortável,
devia confessar. Eu precisava extravasar, mas na pré-temporada decidi focar
cem por cento nos treinos. Estava há dois meses sem sexo e quase subindo
pelas paredes.
Sophia era uma mulher linda. Não era magérrima como muitas das
modelos com as quais eu saía. Ela era, como dizia a minha avó, bem fornida.
Claudia, a mãe de Soph, dizia que a filha foi batizada em homenagem à
Sophia Loren, e eu acreditava que a minha amiga de infância fazia jus à
estrela do cinema. Ela era tão gostosa que eu realmente não poderia pensar
numa associação mais feliz.
Enfim, tentando parar de pensar em todas as curvas perigosas dela,
me concentrei ao passar pela porta do velho armazém, que tinha uma
infinidade de salames e linguiças pendurados no teto. Era uma atração
turística à parte aquela decoração peculiar. Os atendentes me disseram que
ela estava no escritório nos fundos da loja.
— Soph… — chamei, batendo na porta.
— Entre! — gritou ela.
— Vim te ajudar com os números.
— Pensei que você ia viajar para o Texas sem passar por aqui…
Você saiu correndo como se tivesse visto um fantasma.
Não. Eu vi peitos. Deliciosos.
— É que eu precisava falar com a minha mãe e ainda tenho que ir
para casa arrumar as malas.
— É que você fez uma cara… Parecia que tinha levado um choque.
Eu levei. Nas calças.
— Bom, foi só a pressa mesmo. Ainda precisa de ajuda? — Franzi a
testa.
— Preciso. Odeio contas. — Ela soltou o ar com força.
— Vamos lá. — Sentei-me ao lado dela.
Começamos a separar as notas e conferir as compras, entradas e
saídas. Em cerca de quarenta minutos terminamos o serviço. Por mais que o
Di Lucca’s tivesse um contador, Luiggi gostava de acompanhar todos os
pormenores e Soph era tão detalhista quanto o pai.
— Obrigada, Noah. Você é demais. — Ela deu um beijo na minha
bochecha. Quente. Gostoso. Porra, Soph!
— Eu sei. — Soltei uma risada debochada.
— Esqueci que não posso elogiá-lo. O seu ego fica ainda mais
inflado. — Ela revirou os olhos de um jeito zombeteiro.
— Bom, agora que todos os seus números estão em ordem, eu me
vou, signorina.[6] — Levantei da cadeira e fiz uma reverência em deboche.
— Noah…
Eu me virei para ela antes de sair.
— Boa viagem. Se cuide. — Ela sorriu. Que sorriso!
— Me cuidarei.
— É que… futebol americano é tão violento. No último jogo que
você tomou uma pancada e ficou desacordado. Foi horrível.
— Você vê os meus jogos? Achei que só se interessava quando ia ao
estádio, com Nick… — Me apoiei no batente da porta bastante curioso.
— Claro que vejo, Noah! Quem em Little Italy não vê os jogos do
New York Giants, com o grande quarterback Lacox?
Claro. Não era nada especial para ela.
— Não se preocupe. Nós nos cuidamos, mas acidentes acontecem.
Ela se levantou e veio em minha direção.
— São esses acidentes que me preocupam. Eu não gostaria que nada
de ruim acontecesse com você.
— Você se preocupa comigo, Soph?
— Claro que sim. Você é meu amigo.
Amigo.
— Bom, sou bem grandinho e venci o Super Bowl[7] no ano passado.
Seu amigo sabe se cuidar — despejei com uma raiva não calculada.
— Tudo bem, sr. Quarterback Fodão. — Ela riu. — Boa viagem,
Noah. Bom jogo! — Ela veio em minha direção e me deu mais um beijo na
bochecha.
Ah, Soph… que merda. O que você estava fazendo com a minha
cabeça? Era a abstinência. Maldita falta de sexo!
altava uma semana para a tradicional Festa de San Gennaro, em Little
FItaly. A data foi celebrada pela primeira vez em Nova York em 1926 e
era uma homenagem ao padroeiro da cidade de Nápoles. O evento
mobilizava toda a comunidade e, sem dúvida, era o maior da nossa
vizinhança. Praticamente duas semanas de festança regada a muita comida,
do jeito que os italianos gostam.
Inúmeras barracas tomavam as ruas e ofereciam toda sorte de prato
italiano. Uma sobremesa em especial tinha lugar de destaque, e havia
inclusive uma competição que já era bastante tradicional: a batalha dos
cannolis. Já estava até ficando sem graça, pois Vitto ganhava quase todos os
anos, mas ainda era divertido.
A Festa de San Gennaro me trazia tantas boas memórias da infância.
Todas elas relacionadas a Noah, de uma forma ou de outra. Eu nunca dissera
a ele, nem a ninguém, mas o cheiro dos cannolis no óleo quente me lembrava
ele. Podia não parecer romântico, mas era. Todas aquelas vozes e cores me
transportavam para a rua Mulberry de quase vinte anos antes.

— Nossa, Soph, você é tão molenga! — Noah corria na minha frente


com um sorriso de deboche estampado no rosto.
As pernas dele eram bem maiores do que as minhas. Não era justo
ele pensar que eu iria alcançá-lo com tanta facilidade. Ele estava cada vez
mais bonito, apesar das pernas de garça, como Nick o chamava. Agora,
estava um palmo mais alto do que eu, mas na semana passada nem parecia
que tínhamos tanta diferença de altura.
— Você sabe que não consigo correr tão rápido quanto você —
reclamei, esbaforida, enquanto nos escondíamos nos fundos da barraca de
cannolis do Vitto.
— Ontem o treinador Jackson disse que tenho bastante jeito para o
futebol americano, sabia? Ele acha que se eu me dedicar bastante posso ser
realmente bom — falava ele, empolgado, enfiando mais cannoli na boca do
que cabia.
— Acredito que você pode ser bom no que quiser, Noah. — Eu não
sabia por quê, mas ultimamente meu coração batia mais rápido quando ele
estava por perto.
— Gosto quando sua mãe arruma seu cabelo assim. Você está muito
bonita, Soph. — Ainda com a boca cheia, ele apontava para as marias-
chiquinhas nas laterais da minha cabeça.
Eu achava meio bobo uma menina de onze anos com aquele tipo de
penteado, mas minha mãe ainda insistia. E, já que Noah achava bonito, talvez
não fosse uma ideia tão ruim.
— Não queria mais que minha mãe fizesse maria-chiquinha. Não
quero parecer uma idiota.
— Você nunca parece uma idiota, Soph. Você é a menina mais
bonita que eu conheço — disse Noah, sério.
— É mesmo? — Senti minhas bochechas arderem.
— É sim. — Ele abocanhou o último pedaço de cannoli.
Eu também o achava o menino mais bonito de todos. Mas não
consegui dizer.
— Soph… — ele limpou a garganta —, posso te dar um beijo?
— P-pode… — quase não consegui falar.
Noah se aproximou e colou os lábios nos meus. Meu coração
acelerou ainda mais. O gosto de baunilha do cannoli agora estava em mim.
Ele abriu os olhos e ficamos nos encarando com as bocas unidas. Depois de
alguns segundos, se afastou.
— Você gostou, Soph? — Ele me observava com seus grandes olhos
azuis.
— G-gostei.
— Eu também. Nunca tinha beijado ninguém antes, sabia?
— Nem eu.
Ele pegou minhas mãos e ficamos ali sentados na calçada, enquanto
toda a multidão que ziguezagueava entre as barracas de comida parecia
sumir…

— Sophia! Sophia! — gritava meu pai do seu lugar tradicional à


cabeceira da mesa de jantar.
— Sim, babbo?[8] — respondi, voltando dos meus devaneios.
— Está com a cabeça no mundo da lua hoje? — Ele bebeu um gole
de vinho. — Que história é essa de que você quer ficar na barraca da Anna
este ano na Festa de San Gennaro e não conosco?
Essa não… Olhei para minha mãe como quem pedia socorro e ela
fez um sinal com a cabeça para que eu prosseguisse.
— Babbo, Anna está sozinha. Será difícil para ela. Além disso, Noah
não conseguirá vir. Você sabe que ele nunca mais a ajudou porque a Festa de
San Gennaro coincide com os jogos dele.
— Isso que dá ter só um filho — grunhiu meu pai irritado.
— Luiggi! Não seja tão insensível! — minha mãe o repreendeu.
— Babbo, não há problema algum em Soph ajudar Anna. Além do
mais, já que você teve uma grande prole não deveria ser tão egoísta.
Estaremos todos lá para te ajudar. — Nick deu uma piscadela cúmplice para
mim.
Agradeci apenas com o olhar.
— Você vai tentar alguma das suas novas receitas na barraca da
Anna, Soph? — retrucou babbo.
— Provavelmente sim. Anna não tem medo de experimentar —
respondi antes de dar uma garfada na macarronada.
— Hum. Bom para ela — resmungou meu pai.
— Sabe, Luiggi, acho ótimo mesmo que alguém deixe Soph
experimentar. Afinal, ela é uma chef de cozinha. E muito boa por sinal —
provocou minha mãe.
— As pessoas não vão a um restaurante italiano porque querem
novidade. Elas querem tradição.
— Tradição não significa ficar preso ao passado, babbo. Pode haver
inovação e ainda assim se manter as raízes — rebateu Nick.
— E o que você entende de cozinha para dar essa opinião tão
embasada? — debochou meu pai.
— Tanto quanto você — disse Nick, calmamente.
Eu estava quase ficando tonta tentando acompanhar aquele embate
familiar, que era por minha causa, do qual não queria participar.
— Bom, o fato é que quero ajudar Anna. Suponho que não há mal
algum nisso — pontuei tranquilamente, enquanto me servia de mais vinho.
— Você tem razão, cara mia.[9] E é bastante gentil da sua parte.
Tenho muito orgulho de você, Soph. — Minha mãe deu um beijo na minha
bochecha.
— Claudia, eu também tenho muito orgulho da nossa filha! Não me
faça parecer um monstro!
Pronto, o drama da família Di Lucca. Será que nunca conseguiríamos
ter um jantar tranquilo? Minha mãe começou a recolher os pratos,
resmungando, e meu pai a seguiu até a cozinha, onde eles continuaram
discutindo. Meu Deus, toda noite era a mesma coisa. Não sei como eles
aguentavam. Dali a alguns minutos, já estariam se tratando por amore mio[10]
e esqueceriam mais uma discussão. Nick me olhou dando uma risada.
— Como eles conseguem? — Meu irmão levantou os braços
teatralmente.
— Não podemos reclamar de monotonia, pelo menos.
— Soph, você conhece aquele programa, A Cozinha do Nuno?
— Claro! Adoro o Nuno Mancini. Ele é maravilhoso. A maneira
como ele revoluciona a cozinha italiana… era o que eu queria fazer com o
meu restaurante… se tivesse um. — Soltei um muxoxo.
— Por que você não participa do concurso dele? Vi que vão abrir
inscrições na semana que vem… Aparentemente dão um bom prêmio em
dinheiro.
— Ah, Nick, não sei…
— Tente, Soph. O que pode acontecer?
— Vou pensar. — Dei um beijo no topo da cabeça dele. — Preciso ir
para casa. Estou cansada. Mamma, babbo! — gritei da sala. — Estou indo!
Sem esperar o fim da discussão deles, saí de fininho.
Para chegar ao meu apartamento tudo o que eu tinha que fazer era
atravessar a rua e entrar num simpático prédio com tijolos aparentes. O
imóvel também era do meu pai, caso contrário não conseguiria bancar o custo
de vida cada vez mais alto de Little Italy. E não pude deixar de me sentir mal
ao constatar que tinha um diploma de uma das maiores escolas de
gastronomia do país e ainda estava sob as asas dos meus pais.
Talvez o concurso que Nick mencionou fosse uma boa opção. Não
me custava nada tentar, certo? Me joguei na cama e fiquei vasculhando
aleatoriamente o celular. Tinha publicado um TBT[11] no Instagram com uma
foto antiga na Festa de San Gennaro. Eu e Noah tínhamos uns sete anos e
sorríamos desdentados para as lentes de Anna. A mãe dele sempre gostou de
tirar fotos.
Eu estava triste porque era mais um ano em que viveria a festa sem
ele. Noah fazia falta. Suas péssimas piadas me faziam rir e eu também sentia
falta do som da risada dele. Acima de tudo, ele era o meu amigo mais antigo,
e eu o queria por perto, mesmo que as coisas estivessem confusas nos últimos
tempos. A presença dele me desconcentrava — e quem podia me culpar? O
cara era mais de um metro e noventa de puro músculo e tatuagens.
No meu mundo, Noah Vicini Lacox sempre foi o mais bonito de
todos, mas os últimos anos estavam sendo ainda mais generosos com ele. O
pior é que eu sabia tudo o que estava por baixo daquele físico de atleta, e era
igualmente maravilhoso.
Ele era um excelente amigo, tinha um coração de ouro, mas não me
enxergava como nada mais que a amiga de infância. Bem, eu não era mesmo
o tipo físico dele. Era um tanto quanto rechonchuda. Não me levem a mal —
eu me achava uma mulher bonita e não tinha problemas em sair com os caras
que queria, mas aquele que eu mais desejava estava fora do alcance.
Não me restava muita alternativa a não ser tomar um banho
demorado e cair na cama com Patrick, o meu crush não oficial. Há uma coisa
que todas as pessoas que conviviam comigo sabiam: Dirty Dancing era o
filme da minha vida. E não havia nenhum dia ruim que os quadris
requebrantes de Patrick Swayze não pudessem curar. E hoje era exatamente
um daqueles dias em que eu precisava ouvir “(I've Had) The Time of My
Life” e acreditar que uma pessoa poderia ser arrebatada por um amor como o
de Baby e Johnny.
Odia da abertura da Festa de San Gennaro tinha chegado. Para celebrar o
início das festividades, o padre Rossi fazia a tradicional bênção das
barracas, passando de uma em uma para que todos tivéssemos prosperidade.
Era uma tradição e uma alegria, mesmo que eu não fosse mais tão próxima da
religião. Ver o rosto alegre do padre da Igreja do Sangue Mais Precioso,
aquela em que eu, meus irmãos e Noah fomos batizados, fizemos primeira
comunhão e fomos crismados, era sempre reconfortante.
Tudo transcorreu como de costume. A rua Mulberry parecia um
formigueiro, apinhada de tanta gente, entre nova-iorquinos e turistas sedentos
por conhecer o pedaço mais italiano da cidade que nunca dorme. A única
coisa que foi diferente dos anos anteriores é que, com o apoio de Anna,
decidi arriscar: propus uma nova massa para as pizzas, feita com uma farinha
especial e que deixávamos fermentando por 48 horas, o que garantia uma
receita muito mais leve. E também propus novos sabores de pizza, como figo
e presunto de Parma. Quando soube, meu pai me lançou um olhar como se eu
estivesse cometendo a maior heresia do mundo. Nonna Violetta, a avó de
Noah, também não tinha ficado muito feliz, mas quando provou a massa
mudou de ideia e parou de reclamar.
A barraca da Cantina da Mamma, a pizzaria da família Vicini, era
uma das mais concorridas desta edição da Festa de San Gennaro, e nós demos
entrevistas para vários programas de TV e jornais, interessados na
“reinvenção” da culinária italiana. Para mim era o caminho natural, misturar
as minhas raízes com o que tinha aprendido no Institute of Culinary
Education, mas muitos dos mais antigos habitantes de Little Italy torciam o
nariz para as minhas criações. Bom, paciência. O mundo estava mudando e
quem não queria ver estava ficando para trás.
— Bellissima donna![12] — Uma voz abafada surgiu do meio da
multidão.
Quando virei, decidida a xingar o abusado, vi aquele cara com um
boné do New York Giants sorrindo para mim.
— Noah! — Larguei a travessa que estava segurando. — O que está
fazendo aqui?
— Sabe, é bom te ver também, Soph. — Ele riu.
— Pensei que você não conseguiria vir…
— Acabei de chegar de viagem. Na semana que vem jogamos em
casa. — Ele deu um suspiro cansado.
Antes que eu pudesse falar alguma coisa, uma multidão se aglomerou
ao redor dele, pedindo fotos e autógrafos. Ele atendia a todos com paciência,
apesar de estar visivelmente cansado.
— Soph, estou acabada! — Anna riu. — A idade pesa, meu bem. Se
não fosse muito abuso, aproveitando que Noah está aqui, você poderia levar
as coisas para a pizzaria?
— Claro, Anna. Pode ir tranquila.
Comecei a reunir as travessas e os utensílios que precisaríamos levar
até a pizzaria, enquanto Noah se desvencilhava dos últimos fãs.
— É, não deve ser fácil ser uma estrela… — debochei.
— Engraçadinha. — Ele revirou os olhos.
— Anna estava cansada, então pediu para você me ajudar a levar as
coisas até a Cantina da Mamma.
— Ai, ai, um campeão nunca descansa! — Ele abriu os braços em
sinal de rendição.
Carregamos o carrinho de mão e subimos a rua Mulberry, que agora
nem se assemelhava ao caldeirão de pessoas de apenas algumas horas antes.
— Obrigada! Você pode ir agora. Só vou lavar algumas coisas para
amanhã e logo vou embora também.
— De jeito nenhum. Você acha que vou te deixar sozinha para
arrumar tudo? — Ele cruzou os braços na altura do peito.
— É que você chegou agora de viagem e está supercansado…
— Bom, não vou embora. Você já devia saber que não adianta
discutir comigo.
— Ok, ok. Bom, vou lavar a louça.
Da cozinha, ouvi os acordes iniciais de alguma canção conhecida e
comecei a rir sozinha. Noah tinha a mania de fazer tudo com música, então eu
devia saber que com o simples ato de lavar louça não seria diferente. Olhei
para a porta da cozinha e ele estava parado, rindo.
— Eros Ramazzotti? — Minhas sobrancelhas quase tocaram o topo
da minha cabeça. — Não consigo acreditar que ele faz parte da sua playlist.
— Não faz. Mas da minha mãe sim. — Ele estalou a língua em
desdém.
— Anna sempre teve bom gosto — caçoei. — Amo o Eros
Ramazzotti.
— Todas as mulheres parecem amar.
— Bom, é difícil resistir a um homem bonito cantando em italiano.
— Dei de ombros.
— Você acha o Eros Ramazzotti bonito? — Noah tinha um ar de
incredulidade.
— Ele tem seu charme.
— O que é intensificado pelo fato dele cantar em italiano, suponho.
— Certamente. — Eu sorri.
— Vem cá, Soph. — Ele fez um sinal com o dedo indicador me
chamando.
— Tenho que lavar a louça!
— Deixa isso aí que a gente já dá um jeito. Vem cá.
— Meu Deus, o que você quer? — Joguei umas gotas de água no
rosto dele.
Ele estendeu os braços para mim.
— Você quer dançar? Aqui? A essa hora? — Eu estava boquiaberta.
— Quantas perguntas, Di Lucca. — Ele riu.
Por que Noah fazia isso? Talvez ele nem soubesse quanto podia ser
bonito tão cansado. Tirou o boné e fez uma reverência debochada, e eu não
consegui evitar o sorriso. Parecia que aquele homem podia ficar ainda melhor
com o cabelo bagunçado.
— Qual é o objetivo disso? — questionei sem encará-lo.
— Dançar.
— Você é louco. Duvido que os outros jogadores do New York
Giants estejam dançando depois de uma viagem exaustiva. — Firmei as mãos
no pescoço dele. Eu tinha que olhar para o alto para enxergar seu rosto, o que
foi uma péssima ideia, porque quase senti o ar me faltar.
— Não sou como os outros jogadores, Soph. Sabe… — ele parecia
analisar cuidadosamente o meu rosto —, seu nariz até que é bem bonito.
— Meu Deus, Noah! — Gargalhei. — Essa é a melhor cantada que
você usa por aí?
— Se eu elogiasse os seus olhos, seria muito óbvio. Não gosto de ser
previsível. Jogadores previsíveis raramente chegam muito longe.
— Hum… — Não consegui dizer mais nada. Ele estava me
cantando? Não, claro que não. Que ideia ridícula.
— Cantare d’amore non basta mai/ Ne servirà di più/ Per dirtelo
ancora per dirti che/ Più bella cosa non c'è/ Più bella cosa di te/ Única come
sei/ Immensa quando vuoi/ Grazie di esistere… — Ele cantava baixinho a
letra de “Più Bella Cosa” próximo ao meu ouvido.
Meu sangue parecia que ia ferver. Eu podia sentir minhas veias
borbulhando. Ele nem sabia o significado daquelas palavras. Como eu era
tonta.
— Você nem sabe o que está cantando — debochei.
— Claro que sei: Cantar o amor nunca é o suficiente/ Nem servirá
mais/ Para lhe dizer ainda, para lhe dizer que/ Coisa mais linda não há/ Coisa
mais linda que você/ Única como você é/ Gigantesca quando quer/ Obrigado
por existir… — entoou ele tranquilamente.
Eu o olhei e a surpresa devia ser evidente no meu rosto, porque ele
ficou me encarando com uma expressão de dúvida. Se não o conhecesse há
trinta anos, eu poderia acreditar que Noah estava dando em cima de mim. Por
uma pequena fração de segundo, pensei que ele estava olhando para os meus
lábios. Por um ínfimo momento, imaginei que estava interessado em me
beijar. E quase cedi ao impulso de beijá-lo.
— Bom, realmente preciso lavar a louça. — Me afastei dele em
direção à pia com borboletas voando descontroladamente no meu estômago e
as pernas bambas. Tonta!
— Ah, sim, claro… — Ele passou a mão pelos cabelos, meio
desconcertado. — Vou secando e guardando.
Evitei olhar para ele. Eu não tinha entendido bem o que havia
acabado de acontecer, mas era melhor não me enganar: Noah era um
jogador. E dos bons. Se caísse no jogo dele, eu tinha muito a perder.
Inclusive a nossa amizade.
Soph me rejeitou. Um baita fora sem dizer uma só palavra. O estranho é que
eu era tão bom em ler as reações das mulheres! Com qualquer uma delas
eu conseguia ter sucesso, podia captar um olhar de tesão a milhas de distância
e sabia que era desejado. Mas aquela que pensei conhecer melhor era a que
eu menos entendia.
Acabamos de arrumar as coisas e me forcei a ficar com um sorriso
idiota no rosto o tempo inteiro. Não queria que ela visse como sua recusa
havia me afetado. Bom, eu tinha que entender que para ela talvez eu ainda
fosse o menino desdentado e sardento de mais de vinte anos atrás. Talvez ela
me visse mesmo como um de seus irmãos. Paciência.
Finalmente, naquela noite poderia dormir na minha cama. A
temporada da NFL[13] já tinha começado com a corda toda e nós viajávamos
muito para os jogos, então ficar em casa em plena temporada era, sem sombra
de dúvida, um luxo.
Fui andando até o meu apartamento. Na caminhada de pouco mais de
dez minutos, pensei que poderia ter qualquer companhia hoje. Bastava pegar
o telefone e havia vários contatos à minha disposição. Mas esta noite não. O
cheiro de Soph não saía das minhas memórias, assim como o som das suas
gargalhadas. Mas que merda!

Na manhã seguinte, eu já estava bem cedo no Metlife, nosso


complexo de treinamentos, para mais um dia de trabalho duro. Ao contrário
do que muitos pensavam, não era nada fácil se manter na elite da NFL, um
ambiente altamente competitivo. Eu estava totalmente concentrado no treino
funcional, fazendo exercícios com a corda naval, quando ouvi um grito do
outro lado da academia:
— Lacox! — A voz de Phill Carter, nosso treinador, ecoou.
Ele tinha um semblante sério, o que logo me preocupou. Não que
Carter não ficasse com a cara amarrada a maior parte do tempo, mas não era
comum ele interromper nossos treinos e, além disso, a careca dele estava
vermelha, o que eu já havia identificado como sinal de preocupação.
— Treinador… — respondi esbaforido, ainda cansado do
treinamento.
— Reggie quer vê-lo na sala dele.
Reggie Solomon. O presidente do clube. Por que isso não parecia
nada bom?
— Ok. — Peguei a toalha para secar minimamente meu cabelo, onde
escorria suor, e me dirigi até a diretoria do clube.
Passando pelo corredor que ostentava diversas fotos da história do
Giants, um gelo percorreu minha espinha. Mas que merda será que tinha
acontecido? Ao abrir a porta, o frio na barriga praticamente me congelou.
Diversos executivos do time estavam lá, entre eles algumas pessoas do
marketing.
— Lacox! — Reggie me deu um tapinha amigável nas costas. — Por
favor, sente-se, campeão. — Ele apontou para uma das cadeiras em torno da
enorme mesa de reunião.
— O assunto que nos traz aqui é algo desagradável, porém
perfeitamente contornável… — Silvia Mason, a vice-presidente de
marketing, falava com uma voz tranquila.
— Você está sendo processado, Lacox… — disse Reggie,
secamente.
— O quê? — Quase cuspi o isotônico que estava tomando.
— Um tatuador, Bruno D’Angelo, entrou com uma ação reclamando
os direitos autorais das suas tatuagens. Como você aparece no videogame
Madden NFL, ele quer que você dê uma parte do que recebeu do jogo pelo
uso de sua imagem — explicou Silvia.
— Ele só pode estar louco! Não vou dar mais nenhum dinheiro para
aquele patife! Paguei, e muito bem, por todas as tatuagens — explodi.
— Sabemos disso. E você é um dos nossos, campeão! — Reggie deu
tapinhas no meu braço. — É por isso que vamos contar com os melhores para
te defender. A Silverstein & Berney’s é o nosso escritório e eles vão pegar o
seu caso. Você se lembra de David Silverstein?
Claro que lembrava. David era um jogador de futebol americano
frustrado. Nos conhecíamos de algumas festas, e eu sabia que ele era um
excelente advogado e estava crescendo cada vez mais na área do direito
esportivo. Então, sim, lembrava. Apenas assenti com a cabeça.
— Bom, ele vai assumir o caso. Acredito firmemente que é o nome
mais preparado de Nova York para defender seus interesses. Não quero que
isso tire o seu foco do jogo. Estamos indo muito bem nesta temporada, então
o importante é que saiba que estamos cuidando de tudo para você. — Reggie
deu um sorriso amarelo.
— Tudo bem, Reggie. Continuarei dando o meu melhor.
— Ah, e Lacox… temos uma reunião hoje à tarde no escritório da
Silverstein & Berney’s. Passo o endereço por mensagem e nos encontramos
lá — informou Silvia.
Ok, então era isso. Eu estava tomando um processo do filho da puta
do Bruno. Desgraçado! Nos conhecíamos desde pequenos e agora ele queria
arrancar dinheiro fácil. Eu tinha feito quase todas as minhas tatuagens com
ele e era assim que me agradecia? Eu havia até deixado uma camisa
autografada para expor na loja dele. Vigarista! Queria ir lá no estúdio dele e
enchê-lo de porrada! Só não faria isso porque, enfim, eu não era de sair por aí
agredindo as pessoas.
Voltei bufando e pisando duro para a academia. Se Bruno ou
qualquer outro imbecil pensava que poderia se colocar no meu caminho,
estava muito enganado. A raiva só me deixava ainda com mais vontade de
vencer. Descontei toda a minha ira na corda náutica e sequer percebi a força
com que a fazia ondular, com os punhos cerrados.
— Caramba, irmão, se isso aí for competitividade enrustida, nós já
ganhamos o Super Bowl! — Dwayne Stevens, nosso wide receiver[14] e um
dos jogadores de quem eu era mais próximo, se aproximou, rindo.
— O que você fez com o cabelo? — perguntei enquanto secava, com
o antebraço, o suor que escorria da minha testa.
— Resolvi inovar. Não gostou das cores do time? — Ele deu um tapa
nas minhas costas.
Ele agora ostentava dreadlocks com as cores azul e vermelho.
— Curti, irmão. Ficou maneiro.
— Você está com uma cara de muito puto. O que rolou no escritório
do Solomon?
— Estou sendo processado pelo filho da puta do meu tatuador. Ou
melhor, ex-tatuador. Ele quer me cobrar direitos autorais por eu ter aparecido
no Madden NFL com as minhas tatuagens. Que canalha!
— Irmão, que doideira… — Ele deu uma gargalhada. — Parece
aqueles barracos de divórcio.
— Ha, ha! Muito engraçado, Stevens.
— Calma, Lacox. Continue espancando a corda naval. Mas cuidado
para não ficar cansadinho para o jogo amanhã, minha estrela! — Ele lançou
um beijo em minha direção.
Não aguentei e soltei uma risada. Stevens era um dos melhores
jogadores que eu já tinha visto em campo e uma das figuras mais engraçadas
que conhecia. Ele sabia como levantar o astral.

Antes da tal reunião no escritório de advogados que iam defender o


meu caso, resolvi falar com a minha mãe. Eu estava muito, muito puto. Já
tinha mandado uma mensagem dando o contexto geral do caso, mas
precisava encontrá-la. Sim, vários jogadores no time me sacaneavam por ser
tão apegado a ela, mas eu era mesmo e não tinha intenção de negar.
Como de costume, a conversa com a minha mãe foi extremamente
reconfortante.
— Eu sabia que não ia dar boa coisa ficar rabiscando o corpo todo
desse jeito. Mamma mia! — disse minha avó, expressando seu desgosto.
— Nonna… é arte. Gosto de tatuagens. E estamos no século XXI! —
Ri.
— É por causa desse desrespeito às tradições que estamos vendo
Little Italy sumir… — afirmou nonna Violetta, com uma pontada de tristeza.
— As tatuagens não estão acabando com Little Italy. — Eu estava
me divertindo.
— Cáspita,[15] Noah! — praguejou ela. — Pare de me contrariar!
Olhei para minha mãe e nós rimos. Não havia como ficar brabo com
a nonna. Eu queria muito continuar implicando com a minha avó, mas
precisava encontrar os advogados.
— Noah! — Soph veio correndo em minha direção quando eu estava
saindo da pizzaria.
— Oi, Soph… — Dei um sorriso cansado.
— Eu soube o que aconteceu… o processo… — Ela estava
recuperando o fôlego.
— É… uma grande merda… — Pus as mãos nos bolsos da calça.
— Se o Bruno tivesse me dito que ia fazer isso, eu teria arrancado a
cabeça dele! — despejou ela, irritada.
— Você tem falado com o Bruno? — Uma onda de irritação me
tomou de assalto.
— Nós saímos algumas vezes. Eu o achava bem legal até, mas é
claro que depois do que ele fez com você…
— Vocês saíram? Algumas vezes? Tipo encontro? — bufei.
— Sim, Noah. Tipo encontro. Qual é o problema? — Ela pôs as
mãos nos quadris.
— Ele é um babaca! Você não deveria ter saído com ele!
— Ué, você gostava dele. Ele era seu tatuador até então… — Ela
batia o pé na calçada.
— É diferente.
— Por que é diferente? Você pode me explicar, por favor? — Aquele
tom de voz. Ela estava irritada.
— Ele não é bom o bastante para você, Soph — retruquei, com raiva.
— Ah, é? E quem é bom o bastante para mim, Noah? — Ela cruzou
os braços.
Eu. Eu sou bom para você.
— Não sei, Soph. Mas certamente não o Bruno. Você deveria ser
mais criteriosa ao escolher com quem sai — grunhi.
— Eu deveria ser mais criteriosa? Ah, que piada! E você é
criterioso? Levando todas aquelas Barbies para a cama? — Ela elevou a voz.
— Só acredito que você deveria tomar cuidado. Bruno é um otário.
— Eu jamais sairia com ele de novo depois do que ele fez com você,
seu tonto! Mas não me diga mais o que fazer! Você me irrita.
— Só quero te proteger.
— Não preciso que você ou qualquer outra pessoa me proteja!
— Não creio que você precise de proteção, mas eu quero te proteger.
É tão difícil assim entender que quero cuidar de você? — Eu já estava quase
gritando. Mulher irritante!
— Enfim… só queria dizer que estou muito chateada por você. Estou
com ódio do Bruno.
Ótimo. Odeie o Bruno. Odeie todos os outros.
— Tenho que ir agora para uma reunião com os advogados que vão
cuidar do caso. A gente se vê. Você vai ao jogo amanhã?
— Claro que vou. Jamais perderia um jogo do melhor quarterback da
NFL. — Ela riu e me deu um beijo no rosto. Aquele simples toque já me
causava uma descarga elétrica.
Fiquei parado observando-a descer a rua Mulberry. O jeito como ela
mexia os quadris enquanto caminhava era uma tortura. Os cabelos escuros
ondulando ao sabor do vento… Parecia a porra de um clipe do Santana!
Aquela mulher estava acabando comigo.
Ah, Soph, se você pudesse ler na minha mente tudo o que eu quero
fazer com você…
Because I've had the time of my life/ No, I never felt this way before/ Yes, I
swear it's the truth/ And I owe it all to youuuuuuu…[16] A música tocava ao
longe, e de repente minhas lambidas nas tatuagens de Noah ganharam a trilha
sonora de Dirty Dancing.
Abri os olhos e percebi que não havia Noah nenhum na minha cama e
o meu celular estava tocando, o que explicava a música! Saco! Eu odiava
acordar cedo. Quem ousava me ligar antes das nove da manhã?
— Alô — atendi com um resmungo.
— Sophia Di Lucca? — A voz feminina do outro lado tinha um tom
animado.
Ah, não, telemarketing a esta hora não!
— Sim… — grunhi.
— Aqui é Brenda Matthews, da produção do programa A Cozinha de
Nuno…
Levantei tão bruscamente que comecei a ver pontinhos pretos pelo
quarto.
— Oi, sim, olá… Tudo bem? — Meu coração palpitava.
— Você foi selecionada para participar do reality show Os Melhores
Chefs de Nova York. Nós adoramos o seu vídeo, parabéns! — Dava para
sentir o sorriso na voz de Brenda.
— Meu Deus! — Comecei a dar pulinhos. — Não acredito!
— Parabéns, Sophia! Vamos enviar as instruções para o seu e-mail.
Lá eu deixarei os meus contatos. Caso você tenha alguma dúvida, é só avisar.
— Muito obrigada, estou tão feliz!
Desliguei o telefone e continuei pulando pelo quarto. Precisava
contar a novidade para Nick! Afinal, tinha sido ele quem me incentivou,
gravou e editou o vídeo. Decidi mandar uma receita que era criação minha: o
panetone red velvet. Com ele, eu unia o melhor dos meus dois mundos: a
Itália e Nova York. A massa era feita com fermentação natural, o que já havia
se tornado uma tradição nas minhas receitas. Junto com o vídeo, precisei
entregar a receita, em mãos, na produção do programa. E, pelo jeito, minha
inovação tinha feito sucesso!
— Nick, Nick! — eu gritava ao telefone.
— Credo, Soph, o que foi? Aconteceu alguma coisa? — Ele parecia
preocupado.
— Fui selecionada para participar do Os Melhores Chefs de Nova
York!
— Que maravilha! Eu sabia que aquele panetone ia arrasar! — Ele
deu uma risada.
Saí em direção ao Di Lucca’s saltitando. Cheguei à loja e meu pai
estava lá sorridente.
— Buongiorno, bambina![17] — Meu pai me beijou na bochecha.
— Bom dia, babbo!
— Posso saber o motivo de toda essa alegria? Geralmente você não é
tão feliz pela manhã…
— Fui selecionada para participar do programa do Nuno Mancini! —
Dei um abraço apertado nele.
— Aquele que está mais preocupado em sorrir para as câmeras do
que em cozinhar? — bufou ele.
Oh, céus.
— Nuno é dono de um restaurante três estrelas no Guia Michelin,
babbo. Ele é um grande chef — rebati pacientemente.
— Que seja! — Ele abriu os braços. — Que receita você enviou para
o programa?
— Um panetone red velvet com massa de fermentação natural.
— Dio Santo,[18] Soph! O que há de errado com o panetone
tradicional? — reclamou ele.
— Não há nada de errado, babbo. Só gosto de inovar.
— Ok, bambina! Bom, de qualquer forma, estou orgulhoso de você!
— Ele beijou o topo da minha cabeça.

Eu estava ansiosa para contar para Noah, mas hoje ele teria jogo,
então nem atenderia o celular. Na verdade, sendo o jogador que era, ele
ficava praticamente incomunicável em semanas de partidas. Noah era aquele
tipo de atleta que em dia de competição não dava espaço para mais nada. E eu
admirava demais aquele foco dele. Com alguma sorte, conseguiria falar com
ele à noite (se o Giants vencesse) e contaria a novidade. Até porque se
perdessem — Deus me livre! — eu seria a primeira a sair correndo do
estádio. Ele ficava insuportável depois de uma derrota.
Ver Noah jogando era sempre complicado. Eu não era a maior fã de
futebol americano, mas ficava muito orgulhosa por tudo o que ele tinha
conquistado em quase dez anos de carreira. Ele era um dos maiores astros da
NFL. Por outro lado, eu não conseguia deixar de enxergar o esporte como
uma ameaça. No ano anterior, Noah tinha tomado uma pancada durante uma
partida e saído desacordado. Ele sofreu uma concussão, mas logo estava de
volta aos campos.
Era o que ele havia escolhido, com todos os riscos e louros que essa
escolha acarretava. Ele tinha muitas coisas a serem louvadas, mas talvez a
mais importante era que continuava a ser a mesma pessoa que eu conhecia
desde o nascimento. Ele nunca virou as costas para o próprio passado. Jamais
agia como uma celebridade. Nunca se comportava como o MVP[19] que era.
Em nossa companhia, era apenas o Noah de sempre. E isso me fazia não
conseguir deixar para trás o que eu sentia por ele. Ele fazia parte das minhas
memórias mais antigas. Do seu jeito, Noah tinha fincado uma bandeira em
meu coração e clamado sua propriedade.
Ao chegarmos ao Metlife Stadium, hordas de fãs trajando azul
caminhavam para a partida que teria como adversário o Dallas Cowboys,
uma das maiores equipes da nossa divisão da NFC.[20] A disputa seria
acirrada com certeza. E as pancadas também, o que me fazia gelar. Quando
passamos pelo portão de acesso, o cheiro de óleo requentado dos
hambúrgueres e cachorros-quentes invadiu as minhas narinas. E não era ruim.
Era familiar e reconfortante, de alguma forma.
— Realmente espero que o Giants jogue como na última vez e Noah
esteja no seu melhor dia. — Nick estendeu um copo de cerveja e um
cachorro-quente para mim. Ao ver minha cara de dúvida, completou. — O
Cowboys está indo muito bem. Vai ser uma partida difícil. E a defesa deles
vem sendo apontada como uma das melhores da temporada. Não vão facilitar
a vida do nosso quarterback.
— E algum dia facilitaram? — Passamos pelas cadeiras até achar o
nosso lugar, que não era muito distante do campo. Teríamos uma visão
razoável do jogo.
— A essa altura Anna já deve estar agarrada com o terço, rezando. —
Ele deu um gole em sua cerveja.
Ri em concordância. Anna só tinha comparecido a um jogo de Noah
em toda a sua vida. E foi justamente no dia em que ele sofreu a concussão.
Como era extremamente supersticiosa, ela entendeu o ocorrido como um
sinal para que nunca mais voltasse. E em todos os jogos do filho repetia o
mesmo ritual: rezava.
A música começou a soar ensurdecedora pelos alto-falantes. A voz
anunciava o time da casa, e eles vinham correndo pelo túnel, como
gladiadores prontos para lutar pela própria vida. Os fogos de artifício
começaram a espocar e a multidão gritava ensandecida pelo Giants. Logo o
vimos, correndo com a camisa oito e o nome Lacox estampado nas costas e
aquela tinta preta embaixo dos olhos que o fazia parecer um guerreiro.
Confesso que eu gostava de vê-lo todo paramentado. Aquilo parecia
potencializar ainda mais sua masculinidade, se é que era possível.
Depois que as duas equipes estavam em campo, a tradicional cena de
todo início de jogo: uma enorme bandeira dos Estados Unidos foi aberta em
campo e os atletas ficaram alinhados, em posição de reverência para o hino
nacional. Ao vê-lo com aquela cara de concentração absoluta, a certeza de
que o pensamento dele estava na vitória. Parecia que o Metlife Stadium
inteiro havia sumido e só restava Noah.
A tensão do início de jogo era palpável — parecia que o ar no estádio
ficava mais pesado. Os torcedores exalavam uma mistura de expectativa e
receio. Eu tinha apenas duas preocupações: que o Giants vencesse, para Noah
não ficar extremamente mal-humorado, e que ele saísse inteiro daquele jogo,
já que a cada partida era mais e mais caçado em campo.
Com os times alinhados frente a frente, o jogo começou. Para mim,
futebol americano era sempre uma confusão de corpos, pancadas e correria.
Num dado momento, parecia que havia uma massa única de jogadores, todos
colidindo uns contra os outros. Alguns movimentos pareciam até mesmo uma
luta greco-romana.
Noah conseguiu se destacar da massa de corpos e estava com a bola
em mãos. Fez um lançamento impecável para Dwayne Stevens, o wide
receiver que estava posicionado muito próximo da endzone[21] dos Cowboys.
Stevens era um dos jogadores mais rápidos da temporada, então não teve
muita dificuldade para marcar o touchdown[22] antes de ser derrubado por um
adversário.
— A noite vai ser nossa, Soph! Noah está com sangue nos olhos! —
gritava Nick.
De repente, a maré começou a virar e o Dallas Cowboys passou a
dominar o jogo. Eles abriram uma vantagem de sete pontos e eu só podia
imaginar a ira que tomava conta de Noah naquele momento. Ele gesticulava,
incentivava os jogadores e distribuía passes impecáveis, mas sempre algo
dava errado na finalização. Droga!
— O que é aquilo se mexendo no campo? — Apontei para uma
figura preta que corria de um lado para o outro.
— É um gato! — Nick não conteve a risada.
— Tadinho, ele parece assustado!
O pequeno felino ziguezagueava sem direção, confuso com todas
aquelas luzes e os gritos da multidão. A partida ficou suspensa enquanto
funcionários do estádio, policiais e seguranças tentavam capturar o bichano
sem sucesso. Quando o animal correu para a endzone, a multidão gritou:
— Touchdown, touchdown!
Noah apareceu no telão com os cabelos encharcados de suor, as
bochechas coradas pelo esforço. Eu conhecia bem aquele semblante que
podia exalar uma calma quase fria, mas a ruga entre as sobrancelhas indicava
que ele estava muito contrariado. Depois de seis minutos, o gato resolveu que
era hora de ir embora e se escafedeu. A torcida aplaudiu.
Quando o jogo foi retomado, o Giants parecia ter reencontrado o
foco. A defesa conseguiu neutralizar quase que inteiramente as tentativas de
ataque, enquanto Noah parecia crescer cada vez mais na partida. Foi uma
sucessão de passes certos e jogadas incríveis. Ele possuía uma velocidade
incomum para os quarterbacks do nível dele. Muitos analistas diziam que
Noah tinha tudo para ser um dos maiores de todos os tempos. E parecia não
ser exagero.
Finalmente a partida terminou e a carga de testosterona estava nas
alturas, com Noah se chocando a outros jogadores em pulos no ar. À
distância, parecia até mesmo algo tribal. Aquela energia masculina tomando
de assalto o ambiente. Ele, o quarterback, o líder da matilha. O macho alfa.
Ai, céus… esses pensamentos vão te guiar para lugares perigosos, Sophia….
— Eu sabia que seria o nosso dia, Soph! — Nick suspirou aliviado.
— Mas acho que o gato preto deu uma forcinha.
Pacientemente, esperamos a multidão evacuar o estádio. Nick, como
sempre fazia, havia mandado uma mensagem para Noah dizendo que o
esperávamos. Ele ainda teria que falar com a imprensa, o que levaria um bom
tempo. Fomos até a área de entrevistas aguardá-lo.
— Lacox, é unanimidade que você foi o melhor jogador em campo
hoje. Mas houve uma hora em que o Giants parecia perdido. Qual foi o
momento da virada? — questionou um jornalista atarracado com uma careca
vermelha e alguns fios brancos revoltos nas laterais da cabeça.
— Bom, na verdade, o melhor jogador em campo foi aquele gato. —
Noah riu. — Vocês viram como ele correu rápido e logo marcou o
touchdown?
A sala explodiu em risadas.
— Mas a verdade é que no início do segundo quarto conseguimos
reagir. Os sacks[23] de Eliah Jones foram sensacionais. Assim como a
precisão de Stevens, que finalizou muito bem os meus passes. O pocket[24]
funcionou muito bem hoje e consegui desenvolver um bom ritmo de jogo.
Estou muito contente com a atuação do time. — Ele tinha um sorriso de
absoluta satisfação estampado no rosto.
Noah estava muito lindo, de terno e perfeitamente alinhado. Mas vê-
lo em um uniforme despertava meus instintos mais primários, confesso.
— Cara, que partida! Parabéns! — Nick o abraçou e eles se
cumprimentaram com seus habituais tapas nas costas.
— Oi, Soph. Curtiu o jogo? — Ele me deu um beijo na bochecha.
— É claro! Você foi incrível! — Não consegui conter o entusiasmo.
— Agora eu preciso achar o gato… — disse Noah num tom de voz
baixo. Parecia que estava falando consigo mesmo.
Ao ver as expressões de dúvida que Nick e eu tínhamos no rosto,
Noah emendou:
— Quero adotar o felino que invadiu o campo hoje.
— Mas por quê? — Nick parecia intrigado.
— Existem centenas de gatos que vivem aqui no estádio. O clube
paga pela alimentação deles, e alguns funcionários cuidam, mas sempre fico
pensando que não deve ser a mesma coisa que ter um lar… — Noah coçou o
queixo. — Além do quê, aquele em especial foi um amuleto da sorte. Eu
quero retribuir.
— Noah, você não pode estar falando sério… É só um gato. —
Tentei trazê-lo de volta à razão.
— Ele é mais que um gato, Soph. Nos trouxe sorte.
Apenas revirei os olhos. Como podia um jogador do nível dele ser tão
supersticioso?
— Lacox… — um funcionário do Giants o chamou —, acharam o
seu bichano!
Ele deu um sorriso de orelha a orelha e foi em direção ao homem.
Quando voltou, tinha uma caixinha de transporte nas mãos. Dentro estava o
felino preto, com cara de assustado. Os olhos amarelos arregalados.
— Pronto, agora podemos ir. — Ele era a satisfação em pessoa.
— Já decidiu qual vai ser o nome dele? — perguntei tentando conter
a vontade de dar uma risada. Ele parecia uma criança de cinco anos feliz com
o novo pet.
— Claro! Vai se chamar Bono. Não há outro nome possível. — Ele
estufou o peito.
E assim eu, Nick, Noah e Bono saímos do Metlife Stadium em
direção a Little Italy. O quarterback e seu amuleto da sorte. Definitivamente,
ele não parava de me surpreender.
Que pergunta! Que nome eu daria ao bichano? Bono obviamente. U2 era a
minha banda favorita. Bono Vox era o cara mais legal do planeta. O meu
gato preto era o melhor de todos. O bichano fez um touchdown, tem noção
disso? Ele entrou em campo, correu em disparada até a endzone adversária e
deitou no chão em estilo majestoso. Um verdadeiro jogador que mal estreou e
já fez um touchdown.
Quando voltamos do jogo, corremos para uma loja de artigos para
animais e compramos os suprimentos necessários para Bono. Ele não deu um
pio, ou melhor, miado, até chegarmos em casa. Arrumei a caminha dele ao
lado da minha. Comprei uma cama do Giants, obviamente. Aprendi que ele
tinha que ter uma caixinha de areia. Ajeitei os potinhos de ração e água. Ah,
esse gato merecia o melhor.
— Vencemos por 32 a 17, Bono! O seu touchdown foi importante
para o resultado! — Gargalhei.
Ele me olhava com uma cara desconfiada. Meio abaixado, foi
examinar cada centímetro quadrado do apartamento. Muitas mudanças para
um só dia, né? De repente, de gato anônimo ele passou a celebridade da NFL.
Bono já havia rendido vários memes e matérias de TV. Eu havia recebido
vários contatos de repórteres interessados em contar a história da adoção dele,
mas só pensava em dormir.
Deixei o felino inspecionando o resto da casa, afinal ele tinha que se
habituar a seu novo lar. Desabei na cama, ainda com a adrenalina em alta,
repassando todos os erros e acertos do jogo, mas cansado demais para manter
os olhos abertos. Quando estava quase dormindo, senti uma presença ao meu
lado na cama. Vi que o bichano preto se aninhou nas minhas pernas. Nada de
caminha do Giants, pelo visto.
— Boa noite, Bono!
Ele pareceu ronronar em resposta. E eu fui caindo naquele estado de
semiconsciência que precede o sono. Fui transportado para quase vinte anos
antes, quando duas das minhas maiores paixões foram despertadas.

Não me lembro de nenhuma outra situação em que tivesse sentido


tanto medo na vida. Em algumas noites, eu acordava gritando, sonhando que
nossa casa havia sido atingida por um avião, ou que Osama Bin Laden
atacava a minha mãe.
Não fazia nem um ano que as Torres Gêmeas tinham sido derrubadas
por um ataque terrorista. Eu tinha doze anos. O clima de Nova York era
diferente, parecia que todo mundo estava assustado. Ninguém se sentia mais
em segurança.
Apesar de todo o caos, eu estava cada vez mais interessado em
futebol americano. E agora totalmente concentrado, em frente à TV, com os
olhos grudados na tela para a final entre o New England Patriots e o St. Louis
Rams. O Patriots foi uma grata surpresa, mas todo mundo sabia que o Rams
era o favorito.
— Esse jogador é bem bonito! — Soph apontou quando Tom Brady,
o quarterback novato do Patriots, apareceu na tela.
— Ele é feio, mas tem jogado bem, isso é o que importa — repliquei
impaciente.
— Você está com ciúmes? — disse Nick, abrindo seu sorriso
metálico. Ele também estava ridículo com aquele aparelho com borracha
verde.
— Eu não. Está maluco? — Dei de ombros.
— Você e a Soph têm se olhado de maneira esquisita ultimamente.
— Nick semicerrou os olhos, como se estivesse nos investigando.
— O aparelho nos dentes está afetando o seu cérebro — Soph quase
gritou.
Desde o nosso beijo no ano passado, eu não conseguia parar de
pensar nela. Ela estava cada vez mais linda, mas não me dava bola. Se ela me
desse ao menos uma brecha, eu ia perguntar se queria ser minha namorada.
— Vamos parar de falar besteira e prestar atenção no jogo —
interrompi.
Kurt Warner, o quarterback do Rams, tinha sido eleito o MVP —
Jogador Mais Valioso — da temporada de 2001. E o cara era muito bom
mesmo. Era claro para todo mundo que eles eram os favoritos.
— A defesa do Patriots vai ter que fazer milagre para parar esse
ataque do Rams — comentou Nick com os olhos fixos na tela.
— Eles vão ter que fazer o que os jogadores fazem em todos os
jogos. Vão ficar batendo uns nos outros o tempo inteiro. Não sei como vocês
gostam tanto de futebol americano! — Soph deu um suspiro cansado.
Nick revirou os olhos e me olhou como quem diz ela está louca. Eu
não conseguia entender como alguém poderia olhar para um jogo como
aquele e ficar tão apática como Soph estava. Eu não torcia para nenhum dos
dois times, pois desde sempre o meu coração pertencia ao New York Giants,
mas aquela final foi espetacular. O jogo estava tão acirrado que durante todo
o primeiro quarto foi marcado apenas um ponto.
Com um field goal[25] de cinquenta jardas, Jeff Wilkins colocou o
Rams em vantagem, como era o esperado. O jogo estava bem equilibrado e
veio o intervalo. Soph estava mais preocupada com o show que logo iria
começar do que com o jogo. Deprimente!
A banda da vez era o U2. Claro que eu os conhecia, assim como todo
mundo, mas não podia dizer que era um profundo conhecedor das músicas
deles. Aí os caras começaram a tocar e fiquei verdadeiramente
impressionado, porque eles eram muito bons. De repente, uma projeção
apresentou os nomes de todas as vítimas do atentado de 11 de setembro e
“Where the streets have no name” começou. Um nó parecia se formar na
minha garganta. Comecei a me lembrar daquele dia que nenhum de nós tinha
superado, se é que iríamos superar. Soph pegou a minha mão por baixo da
mesa de centro. Ficamos de mãos dadas durante todo o intervalo e aquilo foi
tão bom. Saber que ela estava ali me deixava menos triste.
E foi naquele Super Bowl que a minha vida mudou para sempre: eu
descobri que U2 era a minha banda favorita. E depois daquela partida
espetacular, em que o Patriots surpreendeu o mundo e venceu, contando com
a ajuda de um quarterback novato e com um sangue-frio impressionante, eu
decidi o que queria da minha vida: ser atleta dos Giants e vencer um Super
Bowl.

O relógio despertou e eu senti meu braço dormente. Quando virei


para o lado, entendi o motivo: Bono estava acomodado perto do meu ombro,
como se fôssemos velhos amigos, nem parecia que tínhamos nos conhecido
na véspera. A notificação de uma mensagem não lida piscava no visor do
celular:
Noah, preciso te contar uma novidade. Queria falar ontem, mas Bono
roubou a cena. :)
Logo abri um sorriso. Soph. Sempre ela. Mesmo sem saber, ela era a
responsável pela maior parte dos meus sorrisos. Talvez apenas dividisse esse
posto com as minhas vitórias, mas, enfim, ela me deixava feliz. Com todo o
cuidado retirei meu braço de baixo de Bono, que ainda dormia
profundamente. Ao que parecia, ele já estava se sentindo bem à vontade.
Tomei uma ducha rápida e mandei uma mensagem dizendo para Soph me
encontrar no Caffè Italia.
— Que jogo ontem! — Tio Vitto veio em minha direção com os
braços abertos assim que entrei no café. — Por um momento pensei que
íamos perder.
— Confesso que estava preocupado. Mas Bono tomou conta de tudo
— respondi, rindo.
— Bono? — Ele me lançou um olhar de dúvida.
— O gato que adotei ontem.
— Não acredito que você pegou o gato que invadiu o campo! — Ele
bateu palmas e deu uma gargalhada.
— É claro! Ele fez um touchdown, você não viu? — debochei.
— Ah, Noah, só você! — Ele deu tapinhas nas minhas costas. — Vai
esperar a Soph?
Meu Deus, a minha vida era tão previsível assim? Acenei a cabeça
em concordância. Sentei-me a uma das mesas dentro do café. A televisão
ainda mostrava imagens da invasão de Bono ao campo durante a partida da
véspera. Os jornalistas exaltavam a minha iniciativa em adotá-lo. Será que
Nova York estava com tão poucas notícias assim? No mesmo noticiário
diziam que eu tinha tudo para me tornar o maior astro da NFL e que
provavelmente seria eleito MVP novamente. Bom, tomara que estivessem
certos.
Soph passou pela porta do café e estava deslumbrante. Usava uma
camiseta onde se lia I love NY com um nó na cintura e jeans rasgados. Todas
as curvas em evidência. Minha boca ficou seca de repente. Meu coração
disparou. Sério, Noah? Você conhece esta mulher há trinta anos! Como isso
ainda acontece?
— Oi, campeão! — Ela beijou minha testa.
— Ainda não. Só depois do Super Bowl.
— Bom, mas você ganhou o jogo ontem e também já venceu outros
Super Bowls. Isso faz de você um campeão. — Ela sorriu.
Meu tio trouxe os habituais espressos e o cannoli de Soph.
Infelizmente eu já não deveria comer um inteiro, então para não passar muita
vontade abocanhei um pedaço do dela.
— Então, qual é a grande novidade? — perguntei, com a boca cheia.
— Fui aprovada para o reality show do Nuno Mancini! As gravações
começam na semana que vem! — Ela era a própria tradução da empolgação.
— Isso é maravilhoso, Soph! Parabéns! É uma excelente
oportunidade para você mostrar o seu trabalho e se tornar conhecida.
— Estou feliz, mas também com medo. — Ela suspirou. — Será que
eles vão me detonar?
— Impossível. Você é a melhor chef que eu conheço!
— Ah, elogio do melhor amigo não vale. — Ela apertou meu braço.
Melhor. Amigo. Argh.
— Eu jamais diria isso se não achasse. Você é incrível!
— Você me acha incrível, Noah? — O olhar dela tinha um brilho
diferente.
— Acho. Sempre achei. Você sabe disso — declarei sem tirar os
olhos dela.
— Eu também te acho incrível. É muito bom saber que você não
mudou, mesmo com toda a fama e o dinheiro… Fico muito feliz por ainda
reconhecer em você o meu amigo de infância.
Olhe para mim, Soph. Olhe bem para o homem de um metro e
noventa e três que está à sua frente. Você ainda reconhece o seu amigo de
infância? Puta que pariu, que vontade de gritar!
— Bom, estou muito orgulhoso por você, Soph. Eu preciso ir. Tenho
trabalho me esperando no Giants. — Meu tom foi quase ríspido.
— Noah… — Ela segurou o meu braço quando eu estava levantando.
— Sou muito mais feliz desde que você voltou para Nova York. — Ela
sorriu.
Claro. Ela ficava feliz por ter o melhor amigo de volta.
— Eu também. Sempre foi o meu sonho jogar no Giants e voltar para
casa. — Tentei sorrir com sinceridade, mas estava irritado. — A gente se vê,
Soph.
Não olhei para trás porque a indiferença dela me irritou tanto que eu
estava quase explodindo. Eu amava demais aquela mulher para afastá-la.
Então, sim, era foda, mas eu preferia tê-la como amiga a não ter nenhum
pedaço dela. Entretanto, lentamente, aquilo estava me consumindo. Desde
sempre. O melhor mesmo era enfiar a cara no trabalho. O esporte era a única
coisa que desviava meus pensamentos dela.
Tum, tum, tum, tum. Eu sentia meu coração pulsar como num galope
descontrolado. Minha língua continuava seca, apesar de eu quase ter
acabado com o galão de água da recepção. Eu entrelaçava os dedos
nervosamente à espera do chamado. Aquele que poderia mudar tudo para
sempre.
— Sophia Di Lucca! — uma voz feminina me chamou do corredor.
Levantei-me num pulo e me dirigi à ruiva sorridente que estendeu a
mão para mim.
— Sophia, seja bem-vinda à Cozinha do Nuno! Sou a Brenda. Eu
estava ansiosa para conhecê-la.
— Brenda, é um prazer. Confesso que estou um pouco nervosa. —
Soltei uma risada meio abafada.
— Ah, não fique! Nuno já está no estúdio com alguns outros
candidatos. Antes de começarmos as gravações, ele quer conhecê-los melhor.
Ao chegarmos ao estúdio, que tinha uma cozinha completa com
eletrodomésticos de última geração, Nuno conversava despreocupadamente
com aqueles que eu julgava serem meus companheiros nessa jornada. Havia
tantos holofotes acesos que estava quente lá dentro.
— Nuno, mais uma competidora chegou. Essa é a Sophia Di Lucca.
— Brenda me levou até o chef.
Ele me olhou de uma maneira tão intensa que minha pele parecia
queimar nos lugares onde seu olhar se fixava. Ele era ainda mais bonito
pessoalmente. Os espessos cabelos pretos, os olhos verdes e a barba por fazer
o tornavam a própria definição do homem italiano.
— Seja bem-vinda à minha cozinha, bella Sophia. — Ele beijou a
minha mão.
— É um p-prazer conhecê-lo, sr. Mancini. Sou muito fã do seu
trabalho no Fusion Italy! — Despejei as palavras como se fosse uma
metralhadora.
— Fico muito feliz que uma colega considere tanto o meu trabalho.
E, por favor, me chame de Nuno. — Ele piscou para mim.
Nuno Mancini me chamou de colega? O dono do Fusion Italy, o
melhor restaurante italiano de Nova York? Meu. Deus. Ele se dirigiu ao
centro da cozinha para conversar com todos os dezoito participantes, que dali
a pouco iriam começar a competir pelo título de melhor chef da Big Apple.
— Gostaria de agradecer a todos vocês que decidiram abraçar este
desafio em nome do título de Melhor Chef de Nova York. — Ele esfregou as
mãos. — A competição vai ser dura. Vocês participaram de um processo
extremamente concorrido, então já são vitoriosos. Lembrando que o grande
vencedor levará um cheque-surpresa para casa, equipamentos profissionais e
o troféu Garfo de Ouro. Desejo boa sorte a todos e logo iniciaremos o nosso
primeiro desafio.
A equipe de produção nos guiou até os camarins, onde havia
[26]
dólmãs personalizados para cada participante. Logo encontrei o meu.
Depois de vestir a roupa, quando estava no corredor, uma mão tocou o meu
ombro.
— Sophia, né? — O homem loiro deu um sorriso. — Sou Peter
Jenkins. Vamos ser concorrentes.
— Prefiro dizer que vamos ser colegas. — Dei um meio sorriso.
— Qual é a sua especialidade?
— Cozinha italiana. Procuro modernizar algumas receitas —
expliquei.
— É, se eu tivesse que chutar diria que você é especialista em massas
mesmo. — Ele tinha um ar de desdém.
— Bem, a culinária italiana vai muito além das massas. Mas por que
você disse isso? — Arqueei a sobrancelha.
— Você… bem, parece mesmo italiana. É… voluptuosa.
— Sou neta de italianos. Minha família é uma das poucas de origem
italiana que restam em Little Italy, então tenho muito orgulho de parecer
italiana e levar o legado adiante. E também não tenho nenhum problema em
ser voluptuosa — retruquei, irritada.
— Nuno também parece não ter nenhum problema com isso. — Ele
tinha um tom sarcástico.
— Oi? — Eu já estava perdendo a paciência.
— Bom, ele é italiano. Gosta de mulheres como você. Tipo matrona.
Tire proveito disso, Sophia.
— Não lembro de ter pedido nenhum conselho — bufei. — Não te
conheço e não estou nem aí para a sua opinião. Então guarde o seu veneno e
tente se garantir na cozinha, carissimo.[27] — Virei as costas para aquele
varapau, sem dar a menor chance de resposta. Eu queria tacar a mão na cara
daquele cretino, mas minhas unhas estavam bonitas demais para correr o
risco de quebrá-las.
— Meu Deus, o que foi aquilo? Que otário! — Uma mulher muito
bonita, que parecia uma Jennifer Lopez mais jovem, veio em minha direção.
— Admirei muito o seu autocontrole. Eu estava quase avançando nele! —
grunhiu ela.
— Também me surpreendi por ter ficado tão calma. — Sorri.
— Ah, eu sou Adrienne Gonzalez. Prazer em conhecê-la. — Ela
estendeu a mão.
— Sou Sophia Di Lucca. — Retribuí o cumprimento.
— A gastronomia é uma área repleta de machismo. Não vamos
deixar esses porcos nos intimidarem! — bradou a morena.
— Olha, Adrienne, eu venho de uma família italiana. Tenho quatro
irmãos. Não sou facilmente intimidável, pode deixar. — Toquei o braço dela.
— Por favor, me chame de Adri. Gostei de você, Sophia. Sinto que
seremos boas parceiras.
— Também gostei de você, Adri. E me chame de Soph. Sim, sinto
que nos divertiremos juntas.

Sempre trabalhei muito, mas não me lembro de ter uma rotina tão
agitada quanto a dos dois meses seguintes. Eu mal conseguia ver Noah — o
Giants estava fazendo uma campanha fenomenal e eles avançavam cada vez
mais na divisão rumo à vaga no Super Bowl. Ele estava afundado em jogos e
treinos e eu vinha sendo engolida por todo o trabalho no reality show. Mas
trocávamos mensagens de texto e nos falávamos ao telefone. Eu também
avançava cada vez mais rumo à final do Melhores Chefs de Nova York.
As pessoas me paravam na rua para falar comigo, o que era
totalmente estranho. Pediam fotos e diziam que estavam torcendo por mim.
Recebi tantas solicitações no Instagram que tive que criar outro perfil apenas
dedicado à gastronomia. Estava assustada, na verdade. Eu não queria ser
famosa. Apenas sonhava em abrir o meu restaurante.
Hoje era um dos poucos dias em que não haveria nenhuma atividade
relacionada ao programa, então resolvi ficar quieta em casa. Como Noah
estava viajando, eu trouxe Bono para ficar comigo. E, devo admitir, o
bichano era uma excelente companhia. Ele já estava totalmente habituado à
vida em Little Italy. Para relaxar, abri um vinho e coloquei Dirty Dancing
para rodar. O gato se aninhou ao meu lado na cama.
— Ai, Bono…. — fiz carinho na cabeça dele —, Patrick Swayze era
tão perfeito. Jamais existirá outro homem como ele.
Meu telefone vibrou na mesa de cabeceira. Era o segundo homem
mais perfeito do mundo.
— Oi, Noah, como você está? — Não consegui evitar o sorriso.
— Cansado. Moído. Acabamos de sair de um jogo difícil, mas
ganhamos. O que está fazendo?
— Vendo Dirty Dancing e tomando vinho na companhia de Bono.
— Soph, você não tem outro filme para ver? — Ele riu. — E espero
que Bono não esteja tomando vinho!
— Ah, ele não gosta muito de cabernet sauvignon. Prefere malbec.
— Vi o programa desta semana, a semifinal! Você está arrasando,
Soph. Logo terá o seu próprio troféu Vince Lombardi.
— Bom, não vou ganhar a taça do Super Bowl. É o Garfo de Ouro
neste caso. — Ri.
— Bono está se comportando?
— Sim, bem melhor do que você.
— Como você sabe? Nunca estive na sua cama…
Nos meus sonhos já…
— Não seja tonto! E como você sabe que ele está na cama? — Soltei
uma risada.
— Ele só dorme na cama. Desprezou completamente a caminha do
Giants que comprei para ele. — Ele riu.
— Bom, ele é um gato. Os felinos mandam e os humanos obedecem.
— O que você está vestindo, Soph?
Meu. Deus. Do. Céu. No momento em que ele perguntou isso, com
aquela voz toda arrastada e sensual, a respiração pesada soando em meus
ouvidos, Johnny e Baby estavam na minha tela se pegando no quartinho dele
em Dirty Dancing. Uma das cenas mais quentes da história do cinema, e um
homem gostoso sussurrando em meu ouvido. Eu deveria parar por aqui?
Deveria. Mas eu tinha bebido demais para o meu próprio bem.
— Sua carência está nesse nível? Cadê as loiras peitudas para te
ajudar? — debochei.
— Só estou sendo cuidadoso. Não quero Bono exposto a algo
impróprio para a idade dele. Por isso, ficaria extremamente aliviado se você
me dissesse o que está vestindo para que eu possa dormir tranquilo.
Eu estava com um sorriso estúpido congelado no rosto. Aquilo era
ridículo. O problema é que comecei a imaginar como ele estava vestido. Eu
devia dizer que estava com uma camisola de renda preta, mas por algum
motivo nunca conseguia mentir para ele. Então, por mais brochante que fosse
a verdade, eu falei.
— Estou usando uma camiseta velha da Disney. Desculpe não
corresponder às expectativas. — Tomei um grande gole de vinho.
— Ah, não… Adoro a simplicidade. Além da camiseta, não há nada
que você queira compartilhar? Sua lingerie… — A respiração dele estava
pesada, e eu parecia sentir aquele sopro no meu ouvido.
Será que eu tinha bebido demais? Estava bêbada, com tesão, e a cena
de Baby e Johnny dançando sensualmente estava rolando. Eu nunca mais
ouviria “Cry to Me” do mesmo jeito. Agora para sempre eu ligaria essa
música a tesão e Noah. Talvez, quando nos encontrássemos, ele debochasse
de mim. Mas eu estava excitada demais para me importar.
— Estou com uma calcinha preta.
— Grande ou pequena?
— Pequena. Bem pequena.
— Hum… — Ouvi ele soltar o ar com força.
Oh, céus.
— Sabe… o que você está fazendo comigo é uma crueldade, Noah…
— choraminguei.
— É mesmo? Por quê? — Ele deu uma risada.
— Porque neste exato momento a cena mais quente de Dirty Dancing
está bem aqui na minha frente. Patrick Swayze gostoso, sem camisa. Uma
dança muito quente, sensual. E você sussurrando sacanagem no meu
ouvido…
— Não tem sacanagem nenhuma. Você é uma pervertida. Só quero
garantir a segurança do meu felino. — Eu o ouvi expirar profundamente. —
A sua calcinha pequena, bem pequena, está molhada agora, Soph?
Cretino.
— Está — falei quase sem fôlego. — E eu estou quase subindo pelas
paredes.
— Sabe, Soph… se eu estivesse aí com você, não te deixaria desse
jeito. Você iria dormir bem tranquila e satisfeita. — Ele gargalhou.
— Como você está vestido, Noah?
— Só de cueca.
— De que cor? — Parecia que o meio das minhas pernas estava
sendo consumido por labaredas.
— Vermelha. E está muito difícil manter meu equipamento dentro
dela.
— Noah…
— Soph…
— Acho melhor desligarmos. — Eu precisava jogar um balde de gelo
na minha cabeça. Em outras partes também.
— Talvez seja melhor mesmo…
— É…
— Boa noite, Soph. Obrigado por estar cuidando do Bono.
— Ele é uma boa companhia. Estou gostando de cuidar dele. Durma
bem, Noah.
Santo. Deus. O que tinha acontecido? Mais um pouco e nós teríamos
feito sexo ao telefone! Eu precisava de um banho gelado. Estava confusa
sobre a minha dinâmica com Noah ultimamente. Talvez ele não tivesse
problema nenhum em ser meu pau amigo, mas eu não conseguiria ter aquele
tipo de relacionamento. Não com ele. Agora, só a água gelada podia me
ajudar a sossegar depois de imaginá-lo de cueca vermelha. Maldição!
Ojogo do dia anterior contra o Green Bay Packers tinha sido um pouco
mais difícil do que eu previa. Demos algumas bobeiras e eu chamei o
time à responsabilidade. No fim das contas, deu tudo certo e avançamos mais
um degrau rumo aos playoffs da NFC.[28] Eu estava tomado pela adrenalina
quando deitei. Não conseguia desacelerar para dormir. Então resolvi ligar
para Soph. E foi um erro. Um grande erro.
Depois que desligamos, tive que ir para o banheiro e fazer justiça
com as próprias mãos. Se eu tentasse dormir, duro do jeito que estava, não
conseguiria. Mesmo depois do alívio momentâneo, sonhei com ela. Eu a
comia de todas as formas possíveis, ela gemia o meu nome e me prendia no
meio daquelas coxas maravilhosas. Ela estava me enlouquecendo.
A viagem de volta a Nova York foi tranquila. Mas, além do tesão
reprimido por Soph, eu ainda tinha que lidar com a porra do processo da
tatuagem. David Silverstein, um dos advogados que estavam cuidando do
caso, me convidou para um almoço para alinharmos a estratégia. Faltavam
menos de duas semanas para o julgamento e eu estava fervendo de raiva. Eu
não queria dar um centavo para o puto do Bruno.
Mal deixei as malas, me dirigi para o restaurante indicado pelo meu
advogado. Era um daqueles estabelecimentos cheios de frescura, perto do
escritório dele, na Quinta Avenida. Eu conhecia Dave há algum tempo — ele
era entusiasta do futebol americano e estava cada vez mais se estabelecendo
como o maior nome do direito esportivo do país. Os melhores times da NFL
tinham algum vínculo com a firma dele, a Silverstein & Berney’s.
Quando cheguei, me avisaram que ele e a outra advogada estavam
numa das mesas mais reservadas, atrás de biombos. À prova de paparazzi.
Dave era realmente esperto.
— Que alegria encontrar a minha dupla de advogados favorita! —
Estendi a mão para Dave.
Eu já havia encontrado Liz, a outra advogada que cuidaria do caso,
em reuniões anteriores, mas nunca tinha reparado verdadeiramente nela. Que
mulher bonita! Ela estendeu a mão para me cumprimentar, mas eu a puxei
para um abraço. Dave fez uma cara de poucos amigos. Hum, será que eles
tinham algo?
— Noah, como você sabe, temos uma batalha dura pela frente. Ainda
não existe nenhuma decisão judicial que defina a quem de fato pertencem as
tatuagens dos jogadores que aparecem no Madden e nos demais games de
esportes. Por isso, esse caso é tão importante para você quanto é para nós,
pois vai ajudar a estabelecer precedentes que guiarão a indústria — explicou
David.
— Temos um grande problema porque ilustrações criativas exibidas
em uma mídia tangível são protegidas por direito autoral, de acordo com o
Escritório de Direitos Autorais. E isso inclui as tatuagens — complementou
Liz.
— Meu corpo é uma mídia tangível? — Soltei uma gargalhada. Ah,
eu estava me divertindo com as bochechas coradas dela.
Passamos o resto do almoço discutindo o caso. Eles me davam
orientações sobre o que evitar nas entrevistas, como me comportar e toda
aquela baboseira de sempre. Em um determinado momento, me desliguei de
tudo e só fiquei observando-a. Liz. Uma mulher verdadeiramente inteligente.
Eu ainda estava desesperado pelos sonhos eróticos com Soph na noite
anterior, o que talvez contribuísse para que estivesse com vontade de beijar
aquela mulher diante de mim, que eu mal conhecia.
— Liz, Dave, foi um prazer. Estou muito confiante na estratégia que
vocês vão adotar. Liz, adorei te conhecer melhor. — Abri o meu melhor
sorriso.
Ela corou novamente e não respondeu nada. Dave deu um rosnado
que parecia dizer vaza daqui. Aquilo me indicava que eles tinham algo. Se
não estivessem num relacionamento, seria bom sair com ela. Liz era
extremamente atraente. E, já que a mulher que habitava meus sonhos eróticos
não queria nada além da minha amizade, a fila tinha que andar. Não vou
mentir e dizer que me mantive celibatário nos últimos meses, até porque com
toda a tensão dos jogos eu precisava relaxar. E não havia melhor maneira
para isso do que sexo.
Como já fazia bastante tempo que eu não via minha mãe, saí da
reunião direto para a Cantina da Mamma.
— Noah, meu querido! — Minha mãe veio correndo secando as mãos
no avental. — Você viu que Soph está na final do programa do Nuno
Mancini? E é hoje! Estou tão feliz por ela!
Resolvi ficar na pizzaria naquela noite. Ajudei a minha mãe e Carlo,
o pizzaiolo, a fazer algumas pizzas, enquanto mantínhamos um olho atento à
TV. Soph concorria com outra candidata muito boa, Adrienne Gonzalez. Elas
tinham que fazer uma refeição completa desde a entrada. Adrienne investiu
na gastronomia mexicana. Soph, num mix mediterrâneo.
Fiquei na cozinha o tempo todo preparando pizzas. A casa estava
cheia hoje e, se eu saísse para servir as mesas ou ficar no caixa como às vezes
fazia, iria causar tumulto. E realmente queria prestar atenção à final do reality
show.
— Noah! — gritou Nick da porta da cozinha. — Irmão, não consigo
ficar em casa com os meus pais, eles estão me enlouquecendo.
— Põe uma touca e entra aí. Estamos acompanhando a final também.
Confesso que estou nervoso como se fosse o Super Bowl — constatei,
enquanto colocava tomates em cima da pizza que já ia para o forno.
— O clima no salão da pizzaria lembra mesmo dia de final da NFL.
— Nick sorriu. — Estou muito nervoso pela Soph também.
— Vai dar certo. Ela é a melhor. — Tentei soar confiante.
— Você sabe que nem sempre os melhores vencem. — Nick roía as
unhas com os olhos fixos na pequena TV que tínhamos na cozinha da
pizzaria.
— Não sei. Sou o melhor e sempre venço — debochei.
— Cara, como você é convencido. — Nick deu um soco nas minhas
costas.
— Não. Sou realista. Ganhei quatro Super Bowls, Nick. — Abri os
braços.
— É, eu não acho que se possa contestar isso. Sabe o que é
engraçado? Você falou da Soph agora com a mesma confiança que ela tinha
no dia em que você foi escolhido pelo Philadelphia Eagles. Ela tinha certeza
de que você seria campeão.
— A gente se conhece há muito tempo. Acho que é normal que
saibamos das capacidades uns dos outros.
— Vocês sempre tiveram uma ligação diferente. Eu podia jurar que
vocês iam acabar casados. É estranho que nada além tenha acontecido. Ou
aconteceu? — Ele arqueou as sobrancelhas.
— Nada aconteceu, Nick. Você, certamente, seria o primeiro a saber
— declarei sem olhar para ele.
Nick logo voltou sua atenção à TV e batia palmas, desesperado, a
cada aparição de Soph. Ela estava tão linda, toda paramentada de chef. Por
algum motivo, agora, vendo a cara de determinação dela, eu sabia que ela
venceria. Não havia outra possibilidade para aquele olhar de campeã. E eu
sabia disso. Houve jogos em que eu previa que iria perder só ao detectar
aquele mesmo olhar no adversário.
O momento final do programa havia chegado. Era o tudo ou nada!
Soph e a outra finalista, Adrienne, olhavam para o trio de jurados com
absoluta concentração. Um a um eles iam falando da textura dos pratos, da
apresentação, do sabor — se era cítrico demais ou de menos —, e eu estava
quase gritando para eles acabarem logo com aquele suspense.
Era a hora da verdade. Soph estava mordendo o lábio inferior, com
aquelas ruguinhas na testa que indicavam preocupação. Nuno Mancini foi até
as concorrentes com um envelope nas mãos. Um suor frio escorreu pela
minha nuca. Cacete, eu estava nervoso! O apresentador abriu o envelope e…
— A melhor chef de Nova York é… — ele rasgou o envelope —,
Sophia Di Lucca!
Uma chuva de papel picado começou a cair do teto. Soph levou as
mãos à boca e tinha uma expressão de choque. A câmera invasiva captando
cada milímetro da emoção dela. Ela e Adrienne se abraçaram, e Nuno
entregou um troféu dourado, em formato de garfo, para ela.
— Estou muito feliz. E espero ter honrado as minhas raízes e a Little
Italy — disse Soph entre um soluço e outro.
Aquela expressão dela, de alegria absoluta e incredulidade, me
lembrou do dia do meu draft, que é a seleção de jogadores universitários para
se tornarem profissionais na NFL, quando fui escolhido pelo Philadelphia
Eagles. Eu estava muito feliz, afinal iria jogar na NFL, por um grande time, o
que era o meu sonho. Por outro lado, não moraria mais em Nova York e
jogaria por outra equipe que não o Giants.
Eu tinha ido muito bem durante a etapa de seleção para o draft, que
era conhecida como Scouting Combine.[29] Eu havia passado com
desempenho acima da média em todos os testes, então sabia que tinha
grandes chances de ser escolhido no draft. Mas também entendia que seria
quase impossível jogar no Giants. Eu era um dos jogadores universitários
mais bem cotados e, pela ordem, o Giants estaria entre os últimos a escolher
seus atletas.
O Philadelphia Eagles havia feito uma campanha terrível no ano
anterior, por isso tinha prioridade no draft. Como esperado, eu fui a primeira
escolha, logo na primeira rodada. A torcida do Eagles delirou e o Radio City
Music Hall veio abaixo. Quando chamaram meu nome, a nossa mesa vibrou.
Tio Vitto gritou tanto que pensei que ele ia infartar. Minha mãe estava
chorando e Nick não parava de pular. Por alguns segundos, eu e Soph
ficamos nos olhando naquele misto de felicidade, porque, afinal, caramba eu
iria jogar na NFL! Ao mesmo tempo, deu uma certa tristeza porque ainda
ficaríamos distantes. A Filadélfia nem era tão longe assim de Nova York,
mas isso nos deixaria separados, mais uma vez.
Eu queria ter falado tanta coisa para ela, mas o que eu diria? Espere
por mim? Eu nem sabia como seria a minha vida agora. Estávamos
destinados a sermos amigos. Até porque ela nem queria nada comigo mesmo.
Eu é que sempre tive uma esperança quase infantil de que um dia ela seria a
minha mulher. Que estupidez!

— Ela ganhou, meu Deus, ela ganhou! — Minha mãe entrou gritando
na cozinha, me despertando daquelas memórias.
— Bom, agora vou para casa comemorar com os meus velhos e
esperar Soph. — Nick saiu saltitando.
— Ufa… — desabei na cadeira. — Parecia que era um jogo meu.
Ainda bem que acabou! — Sequei minha testa suada com o antebraço.
— O que você está esperando? — Minha mãe me olhava com sua
típica doçura.
— Mamma, acabei de fazer um monte de pizzas. Só vou descansar
um pouco. Eu estava tenso por Soph, caramba!
— Eu não estou falando das pizzas, figglio mio.
Soph. Ela estava falando de Soph.
— Mamma, não há nada entre mim e Soph. Ela só me vê como amigo
de infância e…
— Vocês são dois cabeças-duras! Como pode você conseguir jogar
aquele jogo tão complicado e não enxergar algo que está bem na sua cara! —
Ela pôs as mãos nos quadris.
— Mamma… a senhora realmente acredita que Soph sente algo por
mim? Além da amizade?
— Eu não acho. Tenho certeza. Só um tonto como você não vê —
bufou ela.
Será que eu realmente era tão idiota? Será que aquele tempo todo
Soph sentiu exatamente o que eu sentia? Bom, eu precisava arriscar. Não era
nenhum chef, mas se tinha uma coisa que eu fazia bem era pizza. Então,
decidi esperá-la da melhor maneira possível: faria uma pizza para ela. Peguei
a forma de coração que usávamos no Dia dos Namorados. Ia fazer uma de
chocolate com morango em formato de coração. Eu sabia que podia ser
brega, mas ela gostava dessas coisas.
A pizzaria encerrou o expediente. Imaginei que ela estava cercada de
repórteres e tudo mais. Limpei toda a cozinha e deixei a pizza pronta, só
precisava assar. Mandei uma mensagem para ela pedindo que quando
chegasse me encontrasse ali. Ela demorou, demorou e demorou, mas esperei
pacientemente.
Fui para a porta da pizzaria e fiquei observando a rua Mulberry vazia.
Vi um carro parando em frente ao prédio dela. Um cara desceu e abriu a porta
do carona. Acho que era o Nuno Mancini. Mesmo a distância, consegui ouvir
os sons das risadas deles e, logo depois, eles se beijaram.
Entrei rapidamente na pizzaria. Não queria que ela me visse. Idiota,
idiota, idiota! Ah, mamma! Dessa vez você se enganou! Fui até a cozinha e,
tomado pela fúria, joguei a merda da pizza fora. Ela estava saindo com um
dos melhores chefs de Nova York e ia comer a bosta da minha pizza em
forma de coração? Ela ia rir da minha cara! E, naquele momento, o que eu
senti foi pior do que qualquer derrota que já havia experimentado dentro de
campo.
O meu maior fracasso era Sophia Di Lucca.
Como era possível que uma pessoa vivesse anos de marasmo e num único
dia acontecessem tantas coisas? Tudo agora parecia um borrão. Os flashes
espocando na minha cara, o abraço apertado de Adrienne. Nos meses de
convivência, formamos um laço de amizade. Em nenhum momento nos
enxergamos como rivais e isso foi maravilhoso.
Decidimos honrar nossas raízes no final do programa. Contudo
escolhi ir um pouquinho além da Itália. Me arrisquei e fiz uma mistura de
comidas mediterrâneas, o que impressionou bastante os jurados. Resolvi fazer
de entrada uma versão das tapas espanholas com massa de pizza e queijo
parmesão e presunto di parma. Como prato principal fiz uma fritata de bisteca
fiorentina e de sobremesa fiz cannolis com recheio de queijadinha. Uma
mistura dos sabores mediterrâneos que deu muito certo!
Eu ainda não tinha conseguido assimilar tudo muito bem. Estava em
choque, parecia um filme. Nuno se ofereceu para me levar em casa. Desde o
início do programa, notei que ele lançava olhares diferentes para mim, mas
nunca permiti nenhum avanço e me fiz de desentendida. Não queria que
ninguém dissesse que ele estava me favorecendo.
— Você realmente é uma chef incrível, Soph. — Nuno beijou minha
mão ainda dentro do carro.
— Obrigada, Nuno. Eu te admiro demais. Sua opinião é importante
para mim. — Sorri, sem graça.
Ele saiu do carro e abriu a porta do carona para mim. Quando
levantei, ele estava mais próximo do que jamais havíamos estado.
— Soph… desde o dia em que te vi pela primeira vez, você me
atraiu. — Ele enrolou uma mecha do meu cabelo no dedo. — E entendi a
distância que você manteve, o que me fez admirá-la ainda mais. Adoro
mulheres de fibra.
É, agora não dava mais para dizer que isso não era uma cantada.
Dei uma gargalhada nervosa, que saiu mais alto do que o planejado. E,
quando menos esperei, Nuno me beijou. Ele tinha um cheiro delicioso e os
lábios dele estavam quentes como brasas. Com uma das mãos, ele me puxou
pela cintura e enganchou a outra no meu cabelo. Acho que nunca fui beijada
daquele jeito. A língua dele demandava espaço, mas, ao mesmo tempo que o
beijo parecia imperativo, era suave.
— Boa noite, bellissima. — Ele me deu mais um beijo.
Fiquei parada, vendo o carro dele ir embora, meio sem ação. Num
mesmo dia, eu havia vencido o maior reality show de culinária do país e tinha
sido beijada por um dos melhores chefs de Nova York. Que turbilhão! E eu já
tinha uma sessão de fotos agendada e várias entrevistas. Meu Deus, só queria
abrir o meu restaurante. Eu tinha muita vontade de perguntar a Noah como
ele conseguia lidar com toda essa coisa de ser celebridade. É claro que a
minha fama seria passageira, mas eu já estava quase surtando.
Quando entrei no meu apartamento, vi que ele tinha mandado uma
mensagem havia umas três horas:
Parabéns, chef. Quando chegar, me encontre na Cantina da Mamma.
Vitórias precisam ser celebradas <3
Droga! A essa altura, ele já devia ter ido para casa e estar dormindo.
Eu ainda não o tinha visto desde que ele retornara a Nova York da última
viagem para competir. Na verdade, não sabia bem como encará-lo depois do
nosso quase sexo telefônico. Eu tinha muitas perguntas. Por que ele tinha
feito aquilo? Ele realmente estava a fim de transar comigo ou estava me
usando como válvula de escape por estar sozinho e carente?
E se ele quisesse mesmo fazer sexo comigo? Como seria? Um pinto
amigo? Ele iria na minha casa, apagaria o meu fogo e no dia seguinte a gente
ia conversar como sempre? Como se nada tivesse acontecido? Sabia que sexo
era melhor com intimidade, mas não conseguiria ter aquele desprendimento.
Não com o cara pelo qual eu era apaixonada por toda a minha vida. Talvez o
melhor fosse ignorar aquela conversa. Fingir que nunca existiu.
Na manhã seguinte, logo que acordei, mandei mensagens para ele.
Nada de resposta. Estranhei, pois Noah não era de dormir muito. Bom, era
melhor ir até o apartamento dele. Hoje ele teria folga, pelo que Nick tinha me
dito. Mesmo não sendo em Little Italy, que estava cada vez menor, diga-se de
passagem, sendo engolida por Chinatown, o prédio dele era bem pertinho.
Uma caminhada de dez minutos até o Soho. Eu só não contava que o trajeto
duraria o triplo de tempo, porque as pessoas me paravam para tirar fotos e
pedir autógrafos. Eu nunca iria me acostumar àquilo.
Quando finalmente consegui chegar até a porta do apartamento dele,
gelei. Toda a nossa conversa quente do outro dia veio à minha memória. O
que eu deveria dizer: Noah, muito obrigada porque agora “Cry to Me” é a
minha música oficial de masturbação pensando em você? Quase fui embora,
mas antes que pudesse pensar muito meus dedos já estavam na campainha.
Quando ele abriu a porta, percebi que, sim, talvez tivesse sido um
erro eu ir até lá. Ele estava com uma calça de moletom preta, com a cintura
bem baixa. Aquele V maravilhoso, que descia em direção à virilha, o
abdômen que parecia esculpido por Michelangelo. Os braços fortes e
tatuados. E eu só ouvia a voz dele perguntando: A sua calcinha pequena, bem
pequena, está molhada agora?
— Oi, Soph! — Ele parecia surpreso.
— Mandei mensagens e liguei, mas você não respondeu. Fiquei
preocupada.
— Ah, é que estou estudando os vídeos de alguns jogos do nosso
próximo adversário.
— Posso entrar ou você está muito ocupado?
— Pode, claro! — Ele saiu do caminho para eu passar.
— É isso que você toma de café da manhã? — Apontei para uma
shakeira em cima do balcão da cozinha.
— Também. — Ele riu. — É um shake proteico. Não é tão ruim
quanto parece.
— Mas também não é tão bom quanto comida de verdade.
— Nunca é. — Ele suspirou. — Bom, mas devo parabéns à campeã!
Foi incrível ontem! — Ele sorria, mas não havia nenhum entusiasmo na voz
dele.
— Ah, obrigada! Você viu o programa?
— Vi enquanto estava trabalhando na pizzaria… — Ele deu de
ombros.
— Ah… vi sua mensagem ontem, mas cheguei tarde demais. Foram
muitas entrevistas e fotos. Um saco, na verdade.
— Não se preocupe. Eu estava bem cansado também, então foi até
melhor ter vindo para casa. Então agora é só sucesso? Abrir o restaurante? —
O tom de voz dele era neutro.
— Bem, na verdade, não é tanto dinheiro quanto pensei que fosse…
São cinquenta mil dólares. Não consigo abrir o restaurante do jeito que quero
com esse dinheiro. Mas, enfim, talvez eu aplique e espere um tempo…
— Eles não diziam qual era o valor do prêmio no início da
competição? — Ele franziu a testa.
— Não. É um cheque-surpresa. Realmente pensei que seria um valor
compatível com a abertura de um restaurante em Nova York.
— Parece que no final das contas esse Nuno Mancini é um picareta,
então?
— Não é bem assim. Nuno é uma parte apenas. Ele trabalha para a
emissora. E é um chef maravilhoso, que me incentivou muito e…
— Ah, sim, claro. Posso imaginar as maravilhas que ele fez por você
— ele me interrompeu, irritado.
— O que você está querendo insinuar? — Cruzei os braços.
— Nada. Tenho certeza de que ele é maravilhoso — bufou ele. —
Bom, Soph, preciso continuar trabalhando. Vou terminar de ver o jogo e fazer
minhas anotações.
— O que está acontecendo? Por que você está sendo tão ríspido
comigo?
— Desculpe se dei essa impressão. Estou muito ocupado, só isso. —
Ele me encarava com indiferença. Eu nunca tinha visto aquela expressão
antes.
— Tudo bem, então. Desculpe se atrapalhei.
— Você não tinha como saber que eu estava ocupado. — Ele se
sentou de frente para a TV, de costas para mim.
— Tem alguma coisa estranha… — Parei em pé ao lado dele. — Por
que você está me tratando assim? Eu fiz algo?
— Não, Soph… — Ele passou a mão pelos cabelos, de forma
impaciente. — Eu realmente preciso trabalhar.
— Tá bom, Noah. Eu estava muito empolgada para dividir a minha
vitória com você, mas agora vejo que foi um erro. Quando tiver uma brecha
na sua agenda de melhor quarterback da NFL, me procure. — Virei as costas
e saí do apartamento sem olhar para trás. Ele não tentou impedir.
Aquele foi um golpe muito duro de assimilar. Em todos os anos em
que nos conhecíamos, Noah nunca havia me tratado daquele jeito. O que
tinha mudado? Seria a nossa conversa ao telefone? Ele achava que eu tinha
ido longe demais? Ele me achava oferecida? Ah, eu não ia cair nessa
armadilha machista da minha própria cabeça. No entanto, algo me dizia que
era outra coisa. Ele estava distante e eu não sabia o motivo. Mas eu iria
descobrir.
Euquevinha evitando Soph nas últimas semanas. Sempre dava a desculpa de
precisava me concentrar nos jogos, o que não era uma mentira. Mas, é
claro que eu teria uma brecha para ela. Porém a vi beijando Nuno Mancini.
Só de pensar na cara daquele idiota meu estômago embrulhava.
A única coisa que desviava os meus pensamentos dela era a merda do
julgamento sobre o caso das minhas tatuagens no Madden. Eu ainda não
conseguia acreditar que Bruno tinha sido tão escroto comigo. Enfim, não
adiantava lamentar. Era hora de partir para o combate.
— Você está tão bonito, meu filho — disse minha mãe enquanto
fazia o nó da gravata. — Pena que é por uma coisa tão chata.
— Ossos do ofício, mamma. — Beijei o topo de sua cabeça. —
Vamos logo terminar com essa dor de cabeça.
Resolvi ir dirigindo até o tribunal. Era uma boa maneira de
espairecer. Se eu parasse para pensar, não era nada assim tão grave. Bruno
era um golpista, que resolveu processar um jogador da NFL e um dos
maiores games de esportes para lucrar mais do que ganharia apenas tendo os
jogadores como clientes. Podia apostar que ele iria se ferrar. Um cara,
sozinho, lutando conta a NFL e a Electronic Arts Sports? Eu estava quase
com pena da imbecilidade dele. E também confiava muito no time de
advogados que estava defendendo o caso.
A minha preocupação não era com a grana. O que me deixava puto
era a traição de Bruno. Ele se tornou um tatuador popular entre outros
jogadores graças a mim. Levei vários clientes até ele. E o cara era um bom
profissional mesmo. Por que ia querer arrancar dinheiro de mim dessa forma?
E o outro ponto era: eu odiava perder. Se alguém me convidasse para um
campeonato de cuspe a distância, pode ter certeza de que eu me tornaria o
mais competitivo possível e capricharia nos perdigotos. Vencer era parte de
mim. Eu não sabia lidar com a derrota.
Encontrei Liz e Dave uma esquina antes do tribunal. Os dois não
paravam de falar, e eu só fazia sinal de concordância com a cabeça. Estava
difícil acompanhá-los.
— Não fale absolutamente nada com a imprensa, está entendendo
Lacox? — Dave deu uma leve sacudida no meu braço.
— Sim, papai — debochei.
— Deixe que cuidemos da imprensa. Agora é crucial que você siga as
nossas orientações — Liz gesticulava como se fosse o técnico antes de uma
partida importante.
— Eu já entendi. Entrar mudo e sair calado. Fiquem frios.
— Seja simpático e amigável, mas evite as perguntas. Não responda
nada sobre o caso — complementou a advogada.
— Posso ser bastante simpático e amigável, Liz. — Fiz cara de
inocente.
— Lacox… — Dave pigarreou. — Temos um caso muito sério nas
mãos. Não é hora para brincadeiras.
Eu sorri em deboche. Dave estava marcando território?
Ao chegarmos na frente do tribunal, o circo estava armado. Flashes
espocavam para todos os lados, um mar de jornalistas vinha em nossa direção
com os microfones em riste:
— Lacox, você se sente traído por ser processado por um amigo de
infância?
— Lacox, esse julgamento pode tirar a sua concentração das partidas
do Giants?
— Lacox, você quer mandar algum recado para os fãs?
Acenei e sorri como se estivesse em um desfile depois do Super
Bowl. Não respondi a nenhuma pergunta, até porque achei todas idiotas. Se o
julgamento estava tirando minha concentração de campo? Eles eram loucos?
Eu vinha fazendo a melhor campanha da minha carreira. Aquilo já era
resposta o suficiente. Se me sentia traído por Bruno? Ah, pode apostar que
sim. Eu queria encher a cara dele de porrada, mas não era dado a violência.
Recado para meus fãs? Continuem torcendo que o Super Bowl é nosso.
Ao entrarmos no tribunal, Bruno, o vigarista, já estava em seu lugar
com os advogados. Encarei-o com tanto ódio que ele baixou a cabeça. Sim,
envergonhe-se da merda que você está fazendo. Era o que eu transmitia pelo
olhar.
— Sr. Lacox, estamos bem confiantes de que sairemos vitoriosos. —
Liz pousou as mãos sobre os meus ombros.
— Liz, por favor, me chame de Noah. — Dei o meu melhor sorriso.
Ela corou e ficou me observando com aqueles grandes olhos
castanhos, sem saber muito bem o que fazer. Ela não era imune a mim.
Excelente.
— Lacox, precisamos que você esteja focado. Encare isto aqui como
o Super Bowl. Concentração total — disse Dave em tom ríspido.
Eu apenas bati continência em resposta.
Liz fez as considerações iniciais sobre direitos autorais e suas
relações com o ambiente digital.
— A indústria de games é relativamente nova nos Estados Unidos,
por isso temos tanta dificuldade em estabelecer certos parâmetros ainda não
previstos em lei — apontou ela de maneira decidida. — Mas o direito de
imagem é um direito de todos os seres humanos e isso abrange todos os
aspectos que compõem a identidade do indivíduo, incluindo aí suas
tatuagens.
Brilhante! Eu não entendia porra nenhuma de direito, mas só pelo
discurso inicial já daria a causa como ganha.
Depois, os advogados da EA Sports também defendiam a tese de que
as tatuagens pertenciam a mim, óbvio, e que, portanto, somente eu poderia ter
qualquer direito sobre elas. As empresas donas desses jogos já pagam uma
fortuna pelo direito de imagem dos atletas e não estão dispostas a ter que
arcar também com direitos autorais dos tatuadores. David auxiliou os
advogados da empresa na construção da argumentação, já que ele era fera em
direito desportivo.
Um blá-blá-blá sem fim. Que coisa chata! Tudo isso por causa de um
canalha que não se satisfazia apenas em fazer uma grana tatuando os maiores
nomes do futebol americano. Imbecil. Eu não conseguia manter as pernas
quietas — não estava acostumado a passar tanto tempo parado, aquilo era
uma tortura. Sobre as alegações dos advogados de Bruno, para ser sincero,
nem prestei atenção. Comecei a repassar mentalmente as jogadas que tinha
estudado essa semana. Para meu alívio, aquele primeiro dia interminável de
julgamento estava acabando.
Parecia que estava ainda mais tumultuado agora, na saída do tribunal.
Tinha tanta gente esperando, inclusive alguns torcedores segurando cartazes
de incentivo. Achei melhor já me enfiar no sedã preto da firma de advocacia
que nos aguardava. Eles me deixariam próximo ao meu carro. Antes,
decidimos parar numa lanchonete. Eu estava azul de fome.
— Digam a verdade: estamos ganhando ou perdendo? — perguntei
antes de dar uma mordida no cheeseburger.
— Veja, sr. Lac… er, Noah, não estamos numa partida de futebol.
Creio que começamos muito bem, mas ainda temos um longo caminho pela
frente — afirmou Liz, em tom sério e profissional.
— Confio plenamente na sua capacidade, Liz. — Sorri.
— Lacox, você deveria estar levando isso mais a sério. Esse
julgamento é muito importante, vai ajudar a definir os parâmetros para toda
uma indústria. E uma vitória ajudaria bastante a sua imagem junto às
empresas envolvidas. Não é hora de ficar de palhaçada! — rosnou Dave.
— Dave, meu caro, não precisa ficar tão irritado. Como estou sendo
um cliente muito bonzinho, seguindo todas as suas orientações e me
comportando como um anjo, esse seu ataque de fúria só pode ter uma razão:
você está com ciúmes da Liz. Mas, sabe, não te culpo. — Engoli mais um
pedaço do sanduíche, olhando com o ar mais inocente para os dois.
— Não seja ridículo. Por que eu estaria com ciúmes? Liz e eu não
temos nada. Somos apenas colegas — cortou David, ríspido.
Liz parecia que ia engasgar com a Coca-Cola Light. Ela ficou
visivelmente perturbada. Hum, ela também era a fim dele. Mas não posso
negar que estava sendo divertido provocar os dois. Eu merecia um
passatempo, afinal.
O julgamento durou uma semana e houve um momento em que
pensei que nunca terminaria. Uma semana de jurisdiquês no meu ouvido,
flashes e câmeras, fofocas, mensagens do time desejando força. Eu só queria
que chegasse ao fim. E acabou. Como eu previa, foi decidido que eu era o
dono das minhas tatuagens e o porco do Bruno não receberia nada por isso.
Rá! Queria mostrar o meu dedo médio para ele, mas me controlei.
— Valeu, irmão! Ganhamos! E você sabe que adoro ganhar, então
estou muito feliz neste momento! — Dei tapinhas nas costas de Dave.
— Agora que não sou mais seu cliente, podemos comemorar, certo,
Liz? Vamos tomar um drinque? — Dei um sorriso de canto de lábio, o que eu
sabia ser o mais eficiente.
— Bem, Noah, o que eu te devia era a sua vitória, e aqui estamos.
Vencemos. Em relação ao drinque, agradeço o convite, mas preciso ir para
casa. Estou cansada. — Ela me deu um abraço.
— Tudo bem, Liz. Se quiser me encontrar em algum outro momento,
tem o meu telefone. E você e Dave são apenas colegas, né? Sei — falei no
ouvido da advogada.
Sorri para os dois e me despedi. Eles que lutassem. Mas, se Liz
tivesse aceitado o meu convite, poderíamos ter nos divertido muito. Eu
realmente precisava de uma distração e ela também.
Enfim, sem companhia para o meu drinque, fui encontrar aquela que
sempre me acalmava.
— Ah, meu querido, que bom que essa chateação acabou. — Minha
mãe veio praticamente correndo em minha direção quando entrei na Cantina
da Mamma. Vários clientes também vieram me cumprimentar. Todo mundo
estava do meu lado nessa história. Bruno tinha se fodido. E eu não sentia
pena. Ele escolheu aquilo.
— Cara, que alívio! — Nick entrou na pizzaria e me deu um abraço.
— Sim, acabou. Finalmente. — Dei um sorriso cansado. — Mas que
cara é essa? Está tudo bem?
— Acabei de sair de um papo meio desagradável com Soph… — Ele
tinha uma expressão preocupada.
— Aconteceu alguma coisa com ela? — Senti meus pelos da nuca se
eriçarem. Mau sinal.
— Ela está arrasada porque com o prêmio do reality show não vai
conseguir abrir o restaurante. São cinquenta mil dólares. Ela precisaria de
bem mais do que isso.
— Você sabe de quanto ela precisa? — perguntei enquanto
arquitetava um plano.
— Estamos fazendo o levantamento…
— Ótimo, Nick. Me diga de quanto ela precisa. Vou dar o dinheiro
— afirmei.
— Ela não vai aceitar. — Nick apoiou o antebraço no balcão do
caixa.
— Eu sei. É por isso que você vai dizer que você está emprestando.
— Não tenho esse dinheiro. Se tivesse, emprestaria. — Ele parecia
chateado.
— Nick, você é criativo. Invente uma desculpa. Diga que conseguiu
um empréstimo no banco com juros baixos porque é um bom cliente, e que
aceitará o pagamento quando o restaurante dela estiver estabelecido. Depois
pensamos nisso. O importante é ela abrir logo esse restaurante. Se Soph fosse
menos cabeça-dura, as coisas seriam mais fáceis.
— Você tem razão, Noah. Se não for com a sua grana, ela não vai
conseguir. — Ele suspirou. — É uma mentira, mas é para ajudá-la. E também
não vai fazer a menor falta para você. — Ele riu e me deu um tapa no braço.
— Ela está muito chateada?
— Está. Foi para casa chorando — lamentou Nick.
— Bom, vou lá conversar com ela.
— Essa relação de vocês é estranha… — Ele sorriu, debochado.
— Não tem nada de estranho. Não posso me preocupar com ela? —
Cruzei os braços.
— Pode, claro. Mas lembre-se: se quiser ter outro tipo de
relacionamento com ela, vai ter que pedir consentimento para o meu pai e os
quatro irmãos dela. Estou incluído nisso. — Ele soltou uma gargalhada.
— Vai se ferrar, Nick! — Mostrei o dedo do meio para ele.
Eu precisava ver Soph. Mesmo que ela estivesse com aquele babaca,
chef renomado das frescuras, eu queria checar se estava tudo bem com ela.
Era o que eu sempre fazia. Era o que iria fazer para sempre. Cuidar dela,
mesmo que ela não soubesse disso.
idiota do ano era meu. Real. Oficial. Me ferrei toda para participar
Otroféu
daquela bosta de reality show e nem conseguirei abrir o meu restaurante.
Que inferno! Eu estava quase aceitando o dinheiro do Noah. Não, era
humilhante demais ter que pedir dinheiro a um homem, ainda mais um que
não era nada além de amigo. Eu sabia que não faria falta para ele, mas minha
dignidade não me permitiria.
E eu também não queria pedir aos meus irmãos. Mas bem que eles
podiam oferecer. Ou o meu pai. Eu sabia que já morava de graça num imóvel
dele e que era ele quem pagava o meu salário, mas eu tinha certeza de que o
meu restaurante daria certo. Eu sabia administrar um negócio e era uma boa
chef. Tanto que ganhei aquele maldito concurso que não me deu nem metade
do dinheiro de que eu precisava. Bosta. Da minha cama, onde estava com a
cabeça afundada no travesseiro, me afogando em autopiedade, ouvi a
campainha.
— Oi, Soph… — Noah estava parado com uma sacola nas mãos. O
cabelo levemente desgrenhado. Ele estava de terno, com a gravata frouxa.
— Oi, Noah. Entre. — Saí do caminho, limpando as lágrimas.
— Nick me contou que você estava chateada. Aí eu trouxe cannoli.
— Ele estendeu a sacola de papel pardo para mim.
— Meu irmão é um fofoqueiro — resmunguei.
— Não. Seu irmão é um cara muito legal que se preocupa com você.
— Ele se jogou no sofá e tirou a gravata.
— Fiquei feliz por tudo ter dado certo no julgamento. Queria ter visto
a cara do Bruno — respondi, enquanto abria a sacola e pegava dois cannoli.
Estendi um para ele e sentei-me ao seu lado.
— Ele estava com uma cara de derrota. Fiquei feliz, não vou negar.
— Noah soltou uma risada. — Mas não vim aqui para falar de mim. O que
houve, Soph?
— Bom, a essa altura o Nick já te contou sobre o prêmio do Melhores
Chefs de Nova York, né? Bom, e também foi isso que tentei contar no dia em
que você praticamente me expulsou do seu apartamento. — Funguei antes de
morder o cannoli.
— Desculpe, Soph. Eu estava mal-humorado. Mas mantenho minha
opinião de que esse Nuno Mancini é um pilantra.
— Não é responsabilidade dele. Ele não é o dono da emissora de TV.
E Nuno não é um pilantra, é um chef renomado e…
— Sei que você gosta dele, e que vocês dois estão envolvidos, mas
ele não me inspira confiança. — Noah abocanhou o final do cannoli.
— Quer outro? — Apontei para o pacote dos doces.
— U-hum — grunhiu ele, de boca cheia.
— Por que você diz que eu e Nuno estamos envolvidos?
— Vi vocês se beijando. Quando você voltou da final do programa.
— Ele pegou o cannoli da minha mão.
— Foi por isso que você ficou irritado comigo no dia seguinte?
— Também. — Ele repuxou um pouco o lábio. Estava com raiva.
— Eu não tenho nada com o Nuno.
— Foi coisa de uma noite só? — Ele me encarava.
— Eu não transei com ele! — retruquei, irritada.
— Não perguntei nada… — Ele deu um sorrisinho, fingindo
inocência.
— Mas insinuou! — bufei. — Olha, nem que quisesse, eu teria ido
para a cama com ele! Ele me acha gorda! — gritei. Sentia o nó se formando
na minha garganta.
— O quê? — As sobrancelhas dele praticamente se uniram.
— Ele me chamou para jantar no restaurante dele. Nuno é um
excelente chef. E eu, bom… gosto de comer… — tentei me justificar.
— Bom, quem não gosta de comer é louco! — Ele apontou para o
pacote me pedindo mais um cannoli.
— Enfim, ele disse que eu deveria comer menos, porque tenho o
rosto muito bonito, mas estou um pouco pesadinha. — Desenhei aspas com
os dedos. — E que, como os chefs vivem em contato com comida, é preciso
ter controle para manter a forma. Me senti tão humilhada…
— Mas que filho da puta! — Ele deu um tapa na própria perna.
— Talvez ele tenha razão… — Olhei para o último cannoli que
estava dentro da sacola, ponderando se deveria mesmo comê-lo…
— Esse babaca não tem razão em nada. Eu te disse, sabia que ele era
um otário.
— Ele falou a verdade, Noah. Sou gorda. Vamos aceitar os fatos. —
Droga, uma lágrima estava se formando no canto dos olhos.
— Soph… você é linda! — Ele segurou a minha mão.
— Claro que você vai dizer isso, Noah! Você é meu amigo.
— Eu te acho bonita, Soph. Sempre achei. Você sabe disso — bufou
Noah.
— Não tenho nada a ver com as mulheres que você costuma levar
para a cama…
— Você não conhece todas as mulheres que levei para a cama… —
Ele me olhava fixamente, os olhos azuis pareciam faiscar.
— Uau, que garanhão! — Ri.
— Nunca disse que não gostava de sexo. Isso não é um segredo. Sou
solteiro e as mulheres com as quais me relaciono também. Qual é o
problema? — Ele deu de ombros.
— Nenhum. — O problema é você não estar na minha cama. —
Quer vinho? Você pode beber? — Fui em direção à cozinha.
— Sophia Di Lucca, acabei de comer três cannolis. O céu é o limite.
Traga o seu vinho.
Peguei um Carménère da pequena adega que mantinha e duas taças e
fui até ele, no sofá.
— Poderia fingir que ia provar o vinho e ficar girando a taça embaixo
do nariz para te impressionar, mas você saberia que é mentira. — Ele riu.
— Ah, o grande Noah Lacox! É assim que você faz para seduzir? —
debochei.
— Não. Apenas sou eu mesmo. Pode parecer difícil de acreditar, mas
com a maioria das mulheres funciona. — Ele estava sério.
— Tenho certeza que sim. — Quase bebi a taça toda.
— Você me acha bonito, Soph? — Noah bebia vagarosamente o
vinho.
— Que pergunta é essa? — Me servi de mais bebida. Estava quente,
não? Talvez eu devesse diminuir a calefação.
— Uma pergunta. Simples. A resposta é sim ou não. Você. Me.
Acha. Bonito? Ou atraente, pelo menos?
— É estranho… Crescemos juntos e você é como…
— Ah, não! — Ele estendeu a mão em minha direção para que eu
parasse de falar. — Não me venha com essa de somos como irmãos, porque
não somos!
— Não. Não somos. — Quase engasguei. — Mais vinho? — Dei um
sorriso sem graça.
— Nossa, nunca tinha visto que essa foto estava aqui! — Ele se
levantou e foi até a estante. — É do dia do nosso primeiro beijo, não é? Na
Festa de San Gennaro? — Ele pegou o porta-retrato.
— É sim. Primeiro e único.
— Poxa, Soph, precisamos mudar isso. — Ele devolveu o retrato ao
seu local e voltou ao sofá. Calmamente, apoiou a taça de vinho na mesa de
canto.
— Não me olhe assim. — O vinho já estava começando a fazer
efeito. Só podia.
— De que jeito?
— Do jeito que está me olhando agora. Pare. — Estava quase
bebendo do gargalo. Eu queria correr e, ao mesmo tempo, queria me afogar
nele.
— Deste jeito? — Ele chegou mais perto de mim. Eu podia sentir a
respiração dele no meu rosto.
— É… — respondi num fio de voz.
— Esse é o meu olhar de tesão, Soph. — Ele pegou a taça de vinho
das minhas mãos e colocou na mesinha, junto da dele.
— Não faça isso, Noah. Por favor.
— Quero te beijar — sussurrou ele.
— Você não precisa sentir pena porque o Nuno me chamou de
gorda… — Eu estava tremendo. Nervosa e excitada.
— Shhh… — Ele colou o dedo nos meus lábios. — Quietinha. — Ele
pegou a minha mão e beijou a palma. Dei um pulo.
— O que você está fazendo? — Eu estava ofegante.
— Soph, o que sinto não é pena, pode ter certeza. Estou sentindo os
efeitos do que você faz comigo neste momento. — O nariz dele estava quase
grudado ao meu.
— Meu Deus, Noah, eu… Ah… — E era isso, eu estava incapacitada
de formar uma frase.
— Vou te fazer mais uma pergunta. — Ele riu. — E dessa vez exijo
uma resposta, Soph.
Eu assenti com a cabeça.
— Você está com tesão agora? — Ele passou o polegar pelo meu
lábio inferior. Eu estremeci.
— O que você acha? — murmurei.
— Quero que você me diga — ordenou ele, frio e calmo, como se
estivesse em campo.
— Estou. Bastante.
— Bom. Muito bom. — Ele passou o braço pelas minhas costas, me
puxando para ele. — Há dezenove anos venho esperando a oportunidade de
beijá-la como você merece. — Ele sorriu diabolicamente. — Pratiquei
bastante. Aprimorei a técnica.
— Imagino… — Engoli em seco.
— Está com medo, Soph? — provocou ele.
— Não. Eu deveria?
— Claro que não. — Ele riu. — Você, Sophia Di Lucca, é a mulher
mais irritantemente linda que conheço. — Ele começou a beijar a lateral do
meu pescoço e meu corpo imediatamente entrou em combustão. — Adoro
cada curva sua. — Ele subiu em direção à orelha e mordiscou o lóbulo.
— Eu… eu… eu… acho que a gente devia parar… — falei sem
forças para resistir.
— Você quer que eu pare? — disse ele no meu ouvido. — Se quiser,
me diga: Noah, quero que você pare. E farei a sua vontade. — Ele me olhava
nos olhos.
— Droga… Não pare. — Pousei minha mão no rosto dele.
Ele pegou meu rosto entre as mãos e se aproximou ainda mais,
lentamente, como se estivesse estudando o terreno. Um jogador.
— Dezenove anos, Soph… — sussurrou ele e depois pôs o lábio no
meu. E a minha cabeça parecia um caleidoscópio desgovernado, não pelo
vinho, mas por ele. Todas as lembranças daquela Festa de San Gennaro,
quando tínhamos onze anos, vieram à minha cabeça. Os lábios dele, que
agora praticamente era outra pessoa, assim como eu.
Eu não conseguia mais me conter. Abri minha boca para que ele me
invadisse, para que atacasse, para que ele não fosse o Noah suave do passado,
mas fosse o Lacox, o gladiador que ele era agora. Os sabores do vinho e do
cannoli se misturavam a outro gosto tão familiar, que, mesmo que eu não
tivesse experimentado antes, já conhecia: era o sabor de Noah.
A mão dele desceu para o meu peito, por cima da camiseta. Ao
mesmo tempo que não parava de me beijar, ele brincava com o meu mamilo,
e eu achei que ia enlouquecer. Passei as pernas ao redor dele, sentando-me
em seu colo. Ele estava muito duro, parecia uma pedra.
— O que você quer que eu faça com você? Esperei tanto por isso…
— Ele arfava.
Oh, céus… eu queria tantas coisas. Queria a língua dele dentro de
mim de todas as formas possíveis. Queria a minha boca passeando por todas
aquelas tatuagens. Queria ser consumida por ele até que não restasse nada
mais de mim. Eu o desejava mais do que desejei qualquer coisa, mas não
conseguiria. Não daquele jeito.
— Isso é… um erro… — Afastei meus lábios dele.
— O quê? — Ele parecia confuso.
— Não posso transar com você. — Levantei do sofá e fiquei em pé,
perto da estante.
— Por que não? — Ele passou as mãos pelos cabelos, desorientado.
— Porque isso vai acabar com tudo o que existe de mais bonito entre
nós. Não posso jogar fora a nossa amizade por causa de sexo, Noah.
— É isso que você pensa? — questionou ele, visivelmente com raiva.
— É. Não posso. Não com você.
— Tudo bem, Soph. Como você quiser. — Ele parecia um raio,
saindo em disparada do apartamento e batendo a porta, enfurecido.
O que Noah sentia era desejo. Sim, talvez ele realmente me achasse
bonita, talvez sentisse tesão, mas eu o amava. Não podia me permitir uma
noite de sexo casual com ele. Se isso acontecesse, eu estaria arruinada. Teria
o meu coração partido para sempre e não conseguiria tê-lo na minha vida
nunca mais. A amizade dele era melhor do que nada.
Não posso. Não com você. Argh, que ódio! Quer dizer que o problema era
eu? Se fosse qualquer outro otário, até o imbecil do Nuno Mancini, ela
poderia? Mas transar comigo era repugnante demais para ela? Vá se ferrar,
Soph! Saí do prédio dela pisando duro. Estava com dor no saco de tanto
tesão.
Ah, maldita!
Cheguei em casa e vesti uma roupa para correr. Bono nem chegou
perto de mim, porque sentiu que o meu mau humor estava numa escala
estratosférica. Coloquei U2 no último volume nos fones de ouvido e saí para
correr. Eu precisava descontar toda a fúria que estava sentindo. Os acordes
iniciais de “I Will Follow” invadiram a minha cabeça: Where you go, I'll go/
Where you stay, I'll stay/ When you move, I'll move/ I will follow.[30] Ah,
Soph, eu estava cansado de seguir você como um cachorro sarnento.
Não fui até a casa dela esperando me dar bem. Eu realmente queria
consolá-la. Aí cheguei lá e ela estava tão frágil, tão humilhada. Eu só queria
que ela pudesse se enxergar da forma como eu a via. Ela era a mulher mais
linda de todas. E daí que ela estava acima do peso? Foda-se. Eu achava que
ela tinha tudo o que é preciso nos lugares certos. Então ela me deu vinho. E
eu sou um atleta disciplinado. Quase nunca bebo. Depois, eu vi aquela foto
nossa, do, como ela disse, nosso primeiro e único beijo até então. E foi
demais para mim. Fora toda a adrenalina do julgamento e o tesão que eu
sentia por ela. Não consegui me segurar.
Mas eu sabia que ela queria também. Ela estava com tesão, era
visível. Mas, quando ela disse que uma transa iria destruir a nossa amizade,
foi um balde de água fria. Porque era óbvio, então, que ela não sentia nada
além de desejo. E, se eu a provasse por completo, seria muito difícil deixá-la
ir. Aquele beijo e aqueles amassos no sofá já tinham sido o suficiente para me
mostrar que eu nunca me saciaria. De todas as mulheres do mundo, tinha que
querer justamente ela?
Voltei para casa exausto, mas pelo menos mais calmo. O Bono gato
estava me esperando na porta e veio se esfregar na minha perna.
— Sabe por que a sua vida é boa, Bono? — Abaixei-me para fazer
carinho na cabeça dele. — Porque você é castrado, então nunca vai sentir dor
no saco por causa de um fora.
Depois do banho, me joguei na cama e liguei minha caixinha de som
bluetooth. Se eu iria continuar ouvindo U2? Com toda a certeza. One. Ficava
só imaginando os caras do time me sacaneando. Na fossa por causa de
mulher, Lacox? Bom, eu ia sofrer escondido mesmo. Tinha uma reputação a
zelar. Certamente, jamais daria uma entrevista dizendo que sofria por causa
de um amor não correspondido ouvindo One.
Nas semanas seguintes, todo o trabalho ajudou a manter minha
sanidade. Tivemos alguns jogos fora de Nova York, e Soph estava bastante
ocupada com o restaurante. Ela tinha encontrado um local para alugar e
estava iniciando as reformas. Nick me disse que ela engoliu a história do
empréstimo dele. Fiquei aliviado por saber que ela estava tocando adiante o
próprio sonho. Era assim que deveria ser.
Voltando de mais uma viagem, me deparei com uma surpresa, ou
algo no mínimo inesperado. Uma mensagem de texto de Liz, a advogada que
havia cuidado do processo das minhas tatuagens:
Noah, se ainda estiver disposto a sair comigo, eu topo :)
Bom, o campeão sempre estava pronto para o jogo! Logo mandei a
minha resposta:
Só me diga quando, que eu vou buscá-la em casa :)
Eu realmente estava precisando de uma novidade. Meu celular
vibrou:
Sexta às 20h?
Respondi:
Fechado, gata. Mal posso esperar!
A semana transcorreu como de costume. Treinei à exaustão, e agora
jogamos em casa. Avançávamos cada vez mais nos playoffs. Os
comentaristas de esporte disseram que essa talvez fosse a melhor campanha
da história do Giants, ainda melhor do que no ano passado, quando fui
contratado pelo time e vencemos o Super Bowl. Eu estava bastante satisfeito
com o nosso desempenho, mas só o tempo diria se aquela era de fato a nossa
melhor temporada. Antes precisávamos conquistar o Super Bowl.
A sexta-feira chegou e era o dia do encontro com Liz. Confesso que
eu estava empolgado. Ela mexia comigo. Havia algo nela que me atraía
demais. Combinei de pegá-la às oito da noite e eu era pontual. Estacionei, fui
até a recepção do prédio e liguei no interfone para avisá-la que já tinha
chegado.
Quando ela apareceu, quase fiquei sem ar. Ela era bonita pra cacete.
Mais do que eu me lembrava.
— Uau! Você está simplesmente maravilhosa. Agora sinto que não
estou à sua altura. — Me abaixei para beijar a bochecha dela.
— Não seja modesto, Noah. Você está muito bonito hoje. — Ela
sorriu.
Ao chegarmos no meu carro, abri a porta para ela. Mamma Vicini me
ensinou a tratar bem uma dama. E não era porque tinha fama de mulherengo
que não respeitava as minhas companhias, pelo contrário.
Chegamos à Cantina da Mamma e Liz tinha uma expressão de
curiosidade.
— É uma pizzaria fechada?
— Exatamente. Mas não é qualquer pizzaria. É a pizzaria em que
cresci. Minha mãe é de origem italiana. Este estabelecimento está na minha
família há gerações — expliquei para ela enquanto abria a porta.
Eu queria ter privacidade. Meu nome estava em todos os jornais, todo
mundo em Nova York sabia quem eu era, então pedi à minha mãe que
cedesse o espaço da pizzaria para o meu encontro de hoje. A princípio, ela
ficou meio contrariada, mas, quando eu disse que pagaria em dobro o valor
do movimento usual de uma sexta-feira, minha avó concordou por ela.
Liz observava atentamente o interior daquele ambiente que era tão
familiar para mim. Ela olhou para o teto, onde havia bandeiras da Itália e dos
Estados Unidos pendendo sobre o balcão. Depois passou a ponta dos dedos
por uma das toalhas em xadrez vermelho que cobriam as mesas. Vi que ela
teve a atenção despertada pelas fotos antigas que decoravam as paredes e se
fixou em uma, especialmente.
— Esse era o meu avô, Lucca Vicini. Foi ele que fundou a pizzaria
— expliquei.
— Você é muito parecido com ele. Era um homem muito bonito.
— Está querendo dizer que sou bonito, Liz?
— Você sabe que é, Noah. — Ela me lançou um olhar de fingida
reprimenda.
— É sempre bom para o ego saber que uma mulher bonita e
inteligente acha isso. — Pisquei para ela.
Eu a puxei pela mão em direção à cozinha. Vi que ela me lançou um
olhar de espanto. Arregacei as mangas da camisa e polvilhei um pouco de
farinha no balcão de inox. Ela me estudava atentamente.
— Você vai fazer pizza para nós?
— É o que parece, não é? — Sorri para ela.
— Você é uma caixinha de surpresas, Noah. Mas por que a pizzaria
está fechada hoje? Deve ser um dia de bastante movimento por aqui, não?
— É, geralmente as sextas são uma loucura. Mas eu pedi para que a
pizzaria ficasse fechada hoje. Disse que ia trazer uma convidada especial.
— Eu não acredito! Agora sua família deve estar com raiva de mim
sem ao menos me conhecer. — Ela riu e levou a mão à boca, como se
estivesse envergonhada.
— Fica fria. Elas foram bem remuneradas pelo fechamento da casa
hoje.
— Noah, quantas mulheres você já trouxe aqui?
— Só uma. Hoje. Estou fazendo pizza para ela agora.
— Você quer realmente que eu acredite que você NUNCA trouxe
uma mulher aqui?
— Aham. E, só para constar, desde que meu avô inaugurou esta
pizzaria ela nunca fechou antes também.
— Por quê?
— Por que o quê?
— Por que você nunca trouxe ninguém aqui?
— Vou ser sincero: não sei bem. Nunca pensei em trazer ninguém
aqui, mas eu queria privacidade depois de todo esse circo do julgamento. Este
ambiente é um lugar seguro para mim. E, de quebra, posso exibir minhas
habilidades de pizzaiolo. Ou seja, uma excelente combinação, não acha?
Liz apenas riu em resposta e fez um meneio com a cabeça em
concordância.
Era verdade que eu nunca tinha levado uma mulher lá. A outra que
tinha acesso àquele lugar era Soph, mas eu não era nada além de um amigo
de infância. Eu a conhecia demais, talvez até mais do que conhecia a mim
mesmo. Mas Liz era uma mulher interessante e talvez pudesse desviar meus
pensamentos de Soph.
— Liz, você poderia cortar o tomate em cubos para o molho? —
Tentei quebrar o gelo.
— Ah, sim, claro. Isso eu posso fazer. Sou uma péssima cozinheira,
mas isso está no meu nível de habilidades gastronômicas. — Ela riu.
— Quer vinho? — ofereci.
— Eu adoraria.
— Você gosta de pizza marguerita?
— Gosto. É uma das minhas favoritas.
— Bom, então marguerita é o que teremos, senhorita.
— Vendo os documentos do processo, observei que o seu sobrenome
é Vicini Lacox e imaginei que Vicini pudesse ser italiano. Mas não sabia que
você era tão italiano. — Ela deu uma risada.
— Minha mãe é de origem italiana. Meus avós maternos nasceram na
Itália. Meu pai era cem por cento americano. Família de Boston. E você, Liz?
De onde é a sua família?
— Bom, você já deve ter notado pelo sotaque. Sou do Alabama. Mas
não há nada de muito interessante sobre isso — desconversou ela.
Continuamos papeando a respeito de amenidades e ela me perguntava
sobre cada etapa do preparo da pizza. Para mim aquilo era tão natural que já
era automático. Eu nem lembrava quando tinha sido a primeira vez que eu
havia feito uma massa de pizza.
Nos dirigimos até o salão principal da pizzaria e arrumamos uma das
mesas. Peguei duas velas no estoque e acendi. Até que tinha ficado bem
ajeitado. Puxei a cadeira para ela sentar e fui buscar a pizza.
— Agora chegou a hora da verdade! Você vai ter que ser sincera e
dizer se está boa!
— Então vamos lá. Me sinto como a jurada do Master Chef agora! —
brincou ela enquanto dava a primeira garfada na pizza. — Meu Deus, está
deliciosa! Acho que é a melhor pizza que eu já comi na vida!
— Espero que você não esteja falando isso apenas para não arrasar o
ego frágil de um atleta competitivo.
— Não mesmo. Você é um excelente pizzaiolo, Noah Vicini Lacox.
— Grazie, Signorina![31] — Levantei a taça para um brinde.
O jantar foi ainda mais agradável do que eu imaginei. Liz era uma
mulher inteligente e divertida e me contou que tinha um gato, o Orlando.
Contei toda a epopeia do resgate de Bono e demos boas risadas. Quando
acabamos de comer, fui até o balcão em que ficava o caixa e conectei meu
celular à caixinha USB. De repente, lembrei da música preferida dos meus
avós: “Dream a Little Dream of Me”, da Ella Fitzgerald. Ok, não era o meu
tipo favorito de música, mas achei apropriado.
— Você me concede a honra desta dança, srta. Rogers? — Me curvei
estendendo a mão para ela.
— Com prazer, sr. Lacox. — Ela pegou a minha mão.
— Essa música combina muito com a pizzaria. Quando eu era
criança, meus avós frequentemente a colocavam para tocar e ficavam
dançando quando já estávamos fechados.
— É uma imagem bem romântica. Você é surpreendente! — Ela
apoiou a cabeça no meu peito.
— Liz, olhe para mim.
Ela me atendeu e olhou para mim. Sua boca estava entreaberta. Era
desejo o que eu lia nos olhos dela. E eu a queria muito também. Comecei a
beijar o pescoço dela. Ela jogou a cabeça para trás, e eu estava ficando
completamente dominado pelo tesão.
— Liz, preciso dizer que não vou conseguir me controlar muito mais.
Se você quiser ir adiante, eu estou mais do que preparado. Mas, se quiser que
fique por aqui, teremos que parar agora. E também preciso ser honesto: eu te
desejo demais, mas tenho uma história complicada com outra pessoa. Não
estou pronto para ter algo sério agora, entende? — declarei com a voz firme.
— Sobre histórias complicadas com outras pessoas? Ô, se entendo…
— Ela riu. — Noah, fique tranquilo. Vim aqui buscando diversão. Vamos nos
divertir essa noite e esquecer nossos problemas? Eu estou pronta para
seguirmos em frente — afirmou ela sem rodeios.
Ah, e aquilo foi a senha para mim. Me posicionei atrás dela e beijei
sua nuca. O cabelo dela estava preso num coque alto, e eu tive vontade de
entrelaçar meus dedos naqueles fios castanhos, mas agora tinha algo mais
interessante a fazer: desabotoar o vestido dela. Havia uma fileira de pequenos
botões. Mulheres e suas complicações. A cada botão que eu desabotoava, eu
depositava um beijo nas costas dela. Ela estava arrepiada e o calor da pele
dela estava me excitando demais.
Eu a virei de frente para mim e ela estava só de calcinha e sutiã. Era
realmente uma mulher linda. Observei cada centímetro do corpo dela, tomado
de desejo, de um instinto primitivo, aquele em que você sabe que só restam
poucos momentos antes de perder o controle. Mas eu era um homem de
estratégia, não tinha pressa.
Ela mordeu o lábio inferior e os olhos estavam vidrados em mim.
Começou a desabotoar a minha camisa e por alguns instantes ficou olhando
para as tatuagens no meu braço e no meu peito. Lentamente, ela passou a
mão pelo meu peitoral e abdômen e olhava atentamente, como se estivesse
gostando do que estava vendo. Obrigado, NFL.
Desabotoei as calças, a coisa ali embaixo já estava complicada. Ela
não se fez de tímida e olhou fixamente para a cueca branca que eu vestia. A
peguei no colo e ela trançou as pernas ao meu redor. Eu a levei até o balcão
onde ficava a antiga caixa registradora. Desabotoei o sutiã dela. Suavemente
brinquei com o polegar em um de seus mamilos, enquanto comecei a sugar o
outro. Liz gemeu alto de prazer.
— Vamos deixar as coisas bem preparadas por aqui antes da ação. —
Afastei as pernas dela e me curvei diante do balcão. Vagarosamente, tirei sua
calcinha. Enfiei a língua naquela fenda deliciosa e úmida. Como ela estava
molhada!
— Deus abençoe a depilação brasileira! — Ri, enquanto enfiava a
língua ainda mais profundamente nela.
Liz deu uma gargalhada em resposta e arqueou as costas no balcão,
se oferecendo ainda mais à minha boca. Eu aprofundei as lambidas, sugando
aquela mulher deliciosa, que estava tão entregue, e o tesão que eu sentia
brigava com a minha consciência. Comecei a pensar em como seria ter Soph,
ali, daquela mesma maneira. Merda!
Tentando apagar as imagens que invadiam a minha mente, aprofundei
minha língua em Liz, sugando-lhe tudo o que ela tinha a oferecer. E ela
respondeu. Quando senti o tremor em suas pernas e ela se apertando contra
mim, sabia que ela estava chegando ao ápice. Quando ela gemeu com a
respiração entrecortada, percebi que o primeiro objetivo tinha sido alcançado:
ela tinha gozado.
— Você é muito, muito linda, Liz — falei levantando a cabeça para
olhá-la. Saí do meio das pernas dela, e ela tinha aquele olhar vidrado, de
satisfação. Beijei-lhe o pescoço e fui descendo pela barriga dela, chupando
cada pedaço de pele. Tirei minha cueca e peguei uma camisinha no bolso.
Coloquei o preservativo numa velocidade impressionante. Ela já estava
encharcada e entregue.
Fiz movimentos circulares no clitóris dela ao mesmo tempo que a
penetrava. Eu dava estocadas profundas, saboreando cada centímetro dela.
Mantive o ritmo lento, porque eu queria que ela gozasse de novo. Ela chegou
ao orgasmo e logo depois me permiti gozar. Ficamos abraçados por algum
tempo. Liz sobre o balcão e eu em frente a ela.
Um barulho chamou a minha atenção. Parecia ter vindo dos fundos
da pizzaria. Falei que iria ver o que era. Vesti minha cueca e a calça e fui até
a cozinha. Não havia sinal de ninguém, mas a porta dos fundos estava aberta.
Fui até lá e nada, o que era muito estranho, pois jurava que ela estava
trancada antes.
Voltei até Liz. Ela estava terminando de se vestir. O sexo com ela
realmente foi maravilhoso. Mas havia algo dentro de mim que destoava da
explosão de prazer que eu tinha sentido. O problema é que na maior parte do
tempo em que eu estava chupando ou fodendo Liz, queria que fosse Soph
naquele balcão. Puta que pariu!
Euconseguia
estava tremendo tanto que achei que ia cair no meio da rua. Mal
manter o controle para abrir a porta do apartamento. Assim que
entrei, me escorei na parede e comecei a chorar. Compulsivamente. Que Noah
comia um monte de mulheres eu sabia. Mas na pizzaria da família dele? Essa
realmente devia ser especial. Agora ele tinha encontrado uma com a qual
teria um relacionamento sério.
Quando passei em frente à Cantina da Mamma e vi tudo apagado,
fiquei preocupada. Liguei para Anna várias vezes e ela não atendeu. Eu iria
até a casa dela, mas decidi verificar se estava tudo bem e usei a minha chave
reserva, que abria a porta dos fundos. Ouvi uns barulhos vindos do salão
principal e decidi ir com cuidado. Será que alguém tinha invadido a pizzaria?
Fiquei paralisada. Primeiro pela visão da bunda de Noah, da qual eu
só tinha lembranças de quando éramos crianças e não se parecia em nada com
o que eu via naquele momento. Ele estava nu em pelo e as pernas de uma
mulher, que estava meio deitada em cima do balcão, o entrelaçavam. Senti
meu estômago queimar. E tentei sair dali o mais rápido possível, fazendo o
mínimo de barulho possível.
Para Noah era isso. Sexo era o mais importante. Por que eu sequer
cogitei que podia ser diferente comigo? Romance era uma invenção do
capitalismo para vender filmes e livros para gente trouxa. Isso não existia!
Fique mesmo esperando por ele, sua idiota! Ah, eu queria ir para a janela e
gritar: “Noah, você é um filho da puta que não consegue manter esse pau
dentro das calças!”. Mas se fizesse aquilo provavelmente acordaria os meus
pais, que moravam quase em frente.
Ódio era pouco para definir o que eu estava sentindo. Quem era
aquela mulher? Pelas pernas, era magra. É claro. Você é linda, Soph, ele
tinha dito. Que piada. Será que Anna já a conhecia? Será que ele ia assumir
logo um relacionamento sério? Ah, meu Deus, eu não suportaria ter que
conviver com aquilo. Fui para o meu quarto e fiz a única coisa possível para
salvar a minha vida. Coloquei Dirty Dancing para rolar.
— Patrick, você é um mentiroso! Eu te odeio! Mas espero que você
esteja descansando em paz — consegui dizer em meio a muitas lágrimas.
Eu amava Noah demais. E estava desesperada sem saber o que fazer
para apagá-lo da minha vida. Ah, como eu queria fazer igual à Clementine de
Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças e deletá-lo das minhas
memórias. Noah era um personagem tão presente na minha vida que todos os
grandes marcos da minha história o envolviam de uma forma ou de outra.
Abri a gaveta da mesa de cabeceira e peguei a caixa onde guardava os restos
do corsage[32] que ele me deu em nosso baile de formatura. Olhando para
aquelas flores secas, eu lembrei de um dos dias mais felizes da minha vida.

— Nossa, Soph, você… — Ele sorria segurando o corsage.


— Você está muito bonito, Noah. — Dei um abraço nele.
— Ah, tenho certeza de que vocês serão o casal mais bonito do baile.
— Minha mãe sorriu.
Noah estendeu a mão para pegar a minha e colocar o arranjo no meu
pulso. Eu olhava o minibuquê, maravilhada.
— Você gostou? — Ele pôs as mãos nos bolsos da calça. — Minha
mãe me ajudou a escolher.
— Adorei, é perfeito. — Sorri.
— Juízo nesse baile! — grunhiu babbo.
— Pode deixar, sr. Di Lucca. Vou cuidar dela — disse Noah, em um
tom tranquilizador.
Dei o braço para ele e saímos em direção à caminhonete com a
logomarca da Cantina da Mamma estampada na porta. Ele a abriu para mim.
— Bom, não é a melhor maneira de se chegar ao baile de formatura,
mas é melhor do que ir a pé. — Ele riu.
— Não tenho vergonha da caminhonete da pizzaria, Noah.
Quando chegamos ao ginásio da escola, onde o baile seria realizado,
ele abriu a porta para que eu descesse. É, Anna realmente tinha criado um
cavalheiro. Ele era gentil, mesmo nos pequenos gestos do dia a dia. Sempre
me oferecia o casaco quando eu estava com frio, por exemplo, e carregava
minha mochila até em casa.
— Achei que você não ia querer vir comigo ao baile — disse Noah
enquanto parávamos para tirar fotos na entrada do ginásio.
— E por que eu não ia querer?
— Porque talvez você quisesse vir com alguém em quem estivesse
interessada. — Ele me encarou.
Eu estou interessada em você, seu tonto.
— De qualquer maneira não ia adiantar muita coisa, né? — Ri. —
Depois desse baile cada um de nós vai para um canto mesmo. Qual é o
objetivo de iniciar um relacionamento que logo vai acabar?
— É… — Ele suspirou.
— E eu pensei que você ia querer convidar alguma das líderes de
torcida loiras e magras que vivem te perseguindo — declarei com um pouco
de amargura.
— Elas não me interessam. Prefiro a sua companhia.
O tema do baile era anos oitenta. De repente, os acordes iniciais de
“True” do Spandau Ballet começaram a soar.
— Meu Deus, eu amo essa música! — Dei um pulinho, empolgada.
— Vamos dançar? — Ele me olhou com o que parecia ser
expectativa.
Assenti com a cabeça. E lá estávamos nós, debaixo daquela chuva de
luzes que cintilavam pelo salão. Eu estava aninhada ao peito dele, ouvindo as
batidas daquele coração que em breve iria para tão longe…
— Não queria que você tivesse que ir embora… — Minha voz saiu
trêmula.
— Eu também não queria ir. Mas você nem vai lembrar que eu existo
em Columbia. — Ele deu uma risada amarga.
— Nunca vou deixar de pensar em você, Noah.
— Soph…. — Ele me chamou num tom suave.
Olhei para ele.
— Também nunca vou deixar de pensar em você, Soph. Você sempre
será a minha melhor amiga.
Melhor amiga. Quase revirei os olhos. Mas, enfim, não podia forçá-lo
a sentir o mesmo que eu.
— Tenho certeza de que você ficará muito ocupado em Stanford com
o campeonato universitário de futebol. Deve estar muito orgulhoso. —
Novamente afundei minha cabeça no peito dele para não o olhar.
— Um dia, voltarei para Nova York e nós ficaremos juntos
novamente. — Ele beijou o topo da minha cabeça.

Fitei o teto do meu quarto, despertando daquelas lembranças.


Ficamos longe um do outro por muitos anos. Permaneci em Nova York e fui
para Columbia, onde cursei relações internacionais e odiei. Só terminei para
os meus pais não me encherem o saco. Logo depois, fui estudar gastronomia,
que era a minha verdadeira paixão. E Noah foi para Stanford, onde tinha
conseguido uma bolsa graças ao seu fantástico desempenho no futebol
americano durante o ensino médio. Depois, ele foi para a Filadélfia jogar
profissionalmente.
Fazia dois anos que ele tinha voltado para Nova York, mas era
engraçado pensar em nós ficaremos juntos novamente. O que era ficar junto?
Eu sabia que para um cara como ele, no topo da carreira, com um monte de
gente interesseira ao redor, era confortável saber que tinha para onde voltar e
que os amigos de infância o enxergariam exatamente do jeito que ele era, e
não pelos títulos. Era isso o que eu significava para ele: conforto. Uma pessoa
que conhecia os defeitos e as qualidades dele. Uma pessoa que o enxergava
de verdade.
Mas daí a achar que ele nutria um interesse romântico por mim era
ridículo. Depois da noite em que quase transamos no meu apartamento,
realmente cheguei a pensar que ele podia sentir alguma coisa. Mas era só
vontade de me comer. Eu seria a amiga conveniente com a qual ele poderia
transar quando não tivesse nenhuma outra mulher à disposição. Desgraçado!
Se fosse possível continuar vivendo sem o coração, eu arrancaria o
meu agora mesmo. Não queria mais pensar nele, naquelas malditas tatuagens,
naquele abdômen tanquinho… E também não queria me lembrar de quanto
ele podia ser generoso. Da cara dele de preocupação, segurando aquela sacola
de papel pardo cheia de cannolis. De quando ele me ofereceu dinheiro para
que eu pudesse realizar o meu sonho… Ele sempre tentava ajudar os amigos.
Aquilo era maravilhoso. Ah, merda, eu não devia odiá-lo agora?
Como faria para arrancá-lo da minha vida? Como ele poderia sumir
das minhas lembranças se eu nunca tinha vivido sequer um dia sem conhecê-
lo? Quando nasci, já fazia uma semana que ele havia vindo ao mundo. Todas
as nossas festas de aniversário na infância foram celebradas juntas. Ele era
parte de mim. Como você arranca uma parte de si mesmo e continua a
existir?
Não sei se seria capaz de esquecer a cena que tinha presenciado
naquela noite. Na pizzaria, Noah? Por que você fez isso? No lugar em que
passei boa parte da minha infância? Onde celebramos tantas conquistas das
nossas vidas? Um lugar no qual me sentia em casa. Agora estava tudo
arruinado. Como eu entraria de novo na Cantina da Mamma sem lembrar de
você comendo outra mulher? Filho da puta.

Na manhã seguinte, minha cara ainda estava inchada. Passei quase a


noite toda em claro chorando. E ainda decidi ouvir U2, a banda preferida
dele, para a tortura ser completa. O que havia de errado na minha vida para
eu continuar me comportando como uma adolescente aos trinta anos?
Bom, o importante era que eu iria com Nick hoje fechar o aluguel do
ponto onde funcionaria o meu restaurante. O meu irmão tinha feito uma
loucura: pediu um empréstimo para me ajudar. De início, fiquei muito irritada
com ele, mas, na verdade, era a minha única chance e eu fiquei muito feliz
por ele ter me ajudado.
Pelo menos alguma coisa estava dando certo. Todo o processo de
gentrificação[33] em Little Italy era terrível para os pequenos comerciantes, e
muitas das famílias que ajudaram a fundar a nossa comunidade haviam se
mudado. Foi se tornando caro demais, para a maioria daquelas pessoas, se
manter na região. E era por isso que eu não possuía dinheiro para alugar nada
na área. Graças ao empréstimo de Nick, consegui o local onde funcionaria o
Modern Pasta. Era triste que o local tenha pertencido antes a uma família que
não conseguiu manter o seu negócio, mas eu faria o máximo para honrar o
ponto.
— E aí, chef? — Nick balançou as chaves diante do meu rosto. —
Feliz?
— Muito! Eu nem acredito que vou, finalmente, ter o meu
restaurante! Parece um sonho! E graças a você, Nick… Nem tenho como
agradecer!
— Não precisa agradecer, Soph. Agora vamos pensar em tudo o que
é necessário para deixar este lugar tinindo!
Passamos praticamente a tarde inteira inspecionando o local, que
estava em excelente estado, mas precisaria de algumas modernizações para
suportar a estrutura que eu estava prevendo. Além de toda a situação com
Noah, a outra coisa que estava me tirando do sério era o frio. As ruas já
estavam cobertas de branco. Tinha começado a nevar, e as lojas já estavam
decoradas com renas, papais noéis e sinos. Eu sempre amei o Natal, mas as
perspectivas deste ano não eram das melhores.
Desde sempre, Anna, a nonna Violetta e, claro, Noah passavam o
Natal com a minha família. Este ano não seria diferente. O que me
preocupava era a possibilidade de ele levar a nova namorada. Eu não
conseguiria sorrir para ele como se nada tivesse acontecido. Só de pensar
nisso eu sentia um buraco no peito. Bom, era melhor eu me preparar para o
que viesse.
ONatal era sagrado para mim. Minha mãe era muito católica, então fazia
questão de que sempre estivéssemos juntos em datas especiais para a
religião, como Páscoa e Natal. Nós sempre celebrávamos a véspera de Natal
— La Vigilia di Natale — com os Di Lucca, no melhor estilo ítalo-
americano: com a Festa dos Sete Peixes — Festa dei Sette Pesci.
Essa tradição não fazia parte do calendário do catolicismo romano,
mas não deixava de ser uma reverência à religião. A véspera de natal,
historicamente, significava um dia de abstinência, sobretudo de carne, sendo
geralmente autorizada a quebra do jejum à noite. Então o que você faz com
um bando de italianos famintos? Tasca comida neles no jantar, desde que não
seja carne. Daí surgiu a tradição da Festa dei Sette Pesci.
Não havia uma regra predeterminada sobre a festividade, e cada
família encontrava o seu jeito de celebrar, sempre, claro, com muita comida.
A nossa celebração não poderia ser diferente. Ainda mais porque Claudia, a
mãe de Soph, sempre foi uma excelente cozinheira, assim como a minha mãe
e, lógico, Soph.
Pode parecer meio machista ter só as mulheres na cozinha, e de fato
era. Eu não era um excelente cozinheiro, mas sabia me virar e fazia uma
pizza bem acima da média até. Fora isso, nunca deixei minha mãe
sobrecarregada de tarefas domésticas: se ela cozinhava, eu lavava a louça. Eu
limpava uma parte da casa, e ela outra. Foi assim que ela me ensinou desde
sempre, então era natural para mim que se uma pessoa cozinhasse a outra
lavasse a louça. Mas na casa de Soph era diferente.
Claudia, a mãe daquela grande família, sempre fazia tudo e, depois
que teve Soph, muitas das tarefas domésticas sobraram para a filha também.
Até que há uns cinco anos, de saco cheio de tanto machismo, Soph promoveu
um barraco digno dos melhores italianos e disse que se nenhum homem —
além de mim — lavasse a louça ela quebraria todos os pratos. Sabendo que
ela não brincava em serviço, todos os irmãos arregaçaram as mangas e, desde
então, a louça virou uma atribuição exclusivamente masculina. Eu adorava
isso em Soph. Ela não levava desaforo pra casa.
Como mandava a tradição, aquele era um dia agitado. Nós já
começávamos cedo os preparativos dos pratos que levaríamos para a casa dos
Di Lucca. Neste ano, minha mãe ficou encarregada das sobremesas. Então
comecei triturando as amêndoas para que ela fizesse pasta reale,[34] um dos
meus doces favoritos desde criança. Nonna Violetta já não botava a mão na
massa fazia tempo, mas sempre estava com a língua afiada para dizer que
estávamos fazendo algo errado. Eu só ria da rabugice dela. Também
levaríamos susamielli, o tradicional biscoito em formato de S, que não podia
faltar em nosso Natal.
Naquela noite, mal chegamos na porta do apartamento dos Di Lucca
e já dava para ouvir o vozerio. Lá estavam Soph, os pais, os irmãos, cunhadas
e sobrinhos. Todos animados e falando alto. Eu gostava daquela atmosfera
acolhedora — de certa forma eles também eram minha família. Ainda da
porta, vi Soph agitada, arrumando a mesa e carregando travessas de um lado
para o outro. Ela estava linda, num vestido vermelho com alguns detalhes
dourados. Parecia um presente de Natal. Pronta para ser lentamente
desembrulhada. Foco, Noah. Foco.
— E aí, cara? Quanto tempo! — Angelo, o irmão mais velho de Soph
veio em minha direção me cumprimentar. — Que temporada é essa,
campeão? O Giants tá voando!
— É, estamos indo bem… — Dei um abraço nele.
— Indo bem? Irmão, já estou vendo que o Super Bowl é nosso —
disse ele, sem esconder a empolgação.
— Calma. Angelo. Só acaba quando termina. — Sorri.
— Grande Lacox. Rapaz, que partida foi essa contra o Packers? Você
acertou todos os passes! — Lorenzo, outro irmão de Soph me deu um tapinha
nas costas. — Que visão de jogo, QB.[35] Não tem ninguém jogando como
você nesses playoffs.
— Você realmente quer que eu acredite nesses elogios de amigos de
infância? — brinquei.
— Você não vê ESPN ou Fox Sports não? Eles já dizem que você
provavelmente vai ser eleito o Jogador Mais Valioso deste ano. De novo. —
Lorenzo tinha um tom animado.
— Vamos com calma, ok? Ainda temos jogos pela frente — retruquei
tranquilamente.
Enquanto os dois ainda discutiam os meus melhores lances até agora,
tive minha atenção atraída por Soph. Ela estava gargalhando de alguma coisa
que a minha mãe dizia. Soph não fazia nenhuma questão de tentar bancar um
papel de pessoa discreta. Ela gostava de rir com vontade, gesticulava bastante
e falava alto. Quando aquela mulher chegava em algum lugar, atraía os
olhares. Primeiro porque era muito, muito linda. E depois porque ela tinha
um tipo de presença que era magnético.
Eu estava tomando coragem para falar com ela. Desde a nossa quase
transa não tínhamos mais nos falado pessoalmente. E de uma semana para cá
não trocávamos sequer mensagens de texto. Eu estava bastante ocupado com
os jogos e ela com as reformas do restaurante, mas havia um clima estranho
entre nós. Quando se conhecia uma pessoa há tanto tempo, até um ponto
numa mensagem de texto era passível de interpretação.
— Oi, Soph… — Me aproximei dela sentindo a garganta seca.
— Oi, Noah… — Ela me encarou com uma expressão séria,
enquanto colocava uma travessa de frutas secas na mesa. — Cadê sua
namorada? — despejou ela e em seguida foi para a cozinha.
Fiquei igual a um pateta, parado, olhando para a mesa cheia de
comida. O que ela queria com aquela pergunta? Quando eu ainda tentava
entender o objetivo daquilo tudo, ela voltou com uma travessa de macarrão
com camarões.
— Que namorada, Soph?
— Achei que você estivesse namorando… — Ela deu de ombros, em
sinal de indiferença.
Ah, não! O gelo de Sophia Di Lucca. Ela estava decidida a me
ignorar. E, quando aquela mulher decidia ignorar alguém, era a pior coisa que
poderia acontecer. Você podia estar de frente para ela, e ela parecia olhar
através de você. Quando Soph desprezava alguém, fazia com que a pessoa se
sentisse um fantasma. E eu não ia passar toda a noite de natal assim. Nem
fodendo!
Aproveitei que todo mundo estava na sala, no meio daquela confusão
de vozes, música italiana e crianças correndo e fui atrás dela na cozinha.
— O que você está fazendo? — Bloqueei a porta com o meu corpo.
— Estou arrumando a mesa de jantar. Aliás, você poderia me dar
licença, por favor? — disse ela num tom irritado.
— Soph… você não pode ficar me dando esse gelo até o fim da noite
— bufei.
— Que gelo, Lacox? Estou falando com você agora, não estou? —
Ela bateu a porta da geladeira com raiva.
Ela me chamou de Lacox. Ok, ela estava muito puta mesmo. Merda.
— Olha… — respirei fundo —, se você está chateada pelo que
aconteceu da última vez que nos vimos… peço desculpas. Não quero que
você pense que eu… é… Jamais quero que você pense que tentei te
desrespeitar.
— Ah, não… — ela deu um sorriso debochado —, não tem nada a
ver. O que aconteceu naquela noite não tem a menor importância. Sei que
para você é muito difícil manter o pau dentro das calças. Então vale tudo.
Cacete. Ela realmente estava bastante irritada.
— Soph… não é bem assim. O que eu sinto é que…
— Não importa, Noah. Já passou. Foi um momento sem importância
para nenhum de nós, já entendi. Vamos fingir que nada aconteceu e seguir em
frente. Agora, por favor, realmente preciso passar para terminar de arrumar a
mesa. — Ela me olhou com indiferença.
Saí do caminho dela, sem conseguir dizer mais nada. Foi um
momento sem importância para nenhum de nós. Você não consegue manter o
pau dentro das calças. Bom, não se podia acusar Soph de não expressar
aquilo que ela estava pensando. Ela realmente acreditava que eu era um
galinha.
— Noah, o jantar já vai ser servido. — Claudia veio me chamar na
cozinha. — Está tudo bem? Você está com uma cara…
— Está tudo bem, sra. Di Lucca. Só estou um pouco cansado.
O jantar transcorreu como em todos os outros anos. Muitas risadas,
memórias da nossa infância, a lembrança da vez em que Soph arrancou o
meu primeiro dente de leite e eu o dela. Tudo parecia bem, mas eu podia
sentir as faíscas de raiva de Soph. No entanto, tinha que reconhecer: ela vinha
fazendo um excelente trabalho para fingir que estava bem.
Depois do jantar, recolhemos a louça e arrumamos tudo. O clima de
festa continuava na sala, mas eu não estava tão animado e notei que Soph não
estava ali. Imaginei onde ela podia estar: em seu antigo quarto. Pela porta
entreaberta, a vi de frente para a TV assistindo Esqueceram de Mim. Um
clássico de todos os nossos natais. Discretamente, entrei.
— Credo, Noah! — Ela deu um pulo. — Que susto.
— Vendo Esqueceram de Mim e nem me chamou? — Estalei a
língua em sinal de reprovação.
— Achei que você estava ocupado conversando lá na sala. — Ela
chegou para o lado, me dando espaço para sentar na cama. Um sinal de
trégua!
— Trouxe um presente para você — eu disse.
— Não precisa me dar presente! — retrucou ela, irritada.
— Soph, uma trégua, por favor, vai? — Eu estava quase implorando.
— Tudo bem, Noah… — bufou ela.
Tirei a caixa do bolso da jaqueta e entreguei para ela.
— Meu, Deus, Noah… — Ela arregalou os olhos e abriu a caixa
branca.
— Você gostou?
— Adorei. Os pingentes são tão fofos… — Ela olhava cada um com
cuidado. — Esse do gato é o Bono?
Assenti com a cabeça.
— Uma bandeira da Itália… uma bola de futebol americano, ah como
você é egocêntrico. — Ela gargalhou. — Um buquezinho de flores?
— Peônias. Iguais às do corsage que você usou no baile da
formatura. E tem um chapéu de chef também.
— Toque blanche — replicou ela, zombeteira.
— Ah, esse é o nome daquele chapéu? Bom, tinha que ser alguma
frescura em francês — debochei.
— Não tenho palavras… Muito obrigada. — Ela olhava para a
pulseira.
— Posso colocar em você?
Ela estendeu o braço direito para mim. Peguei a pulseira da caixa e a
prendi no pulso dela.
— Depois você pode ir acrescentando mais pingentes, se quiser. Foi
o que me disseram na loja.
— Achei linda demais. Eu… Muito obrigada, Noah. — Ela me deu
um beijo na testa. — Também tenho um presente para você. Bom, não é uma
joia, porque ainda nem abri o restaurante. — Ela riu e foi até a mesa de
cabeceira, onde buscou um pacote de presente em formato retangular.
— Obrigado, Soph. — Peguei o pacote das mãos dela e comecei a
desamarrar o laço azul.
Quando abri o pacote, quase fiquei sem ar. Imediatamente minha
visão ficou turva pelas lágrimas. Como era possível? Eu nem sabia que
aquela foto existia.
— Estava ajudando a mamma na arrumação do escritório na semana
passada e encontrei essa foto. Na hora pensei que teria que dá-la a você.
— Caramba, Soph… isso é… o melhor presente que eu já ganhei.
Era uma foto do meu pai, segurando a mim e Soph no colo quando
tínhamos uns quatro anos. Deve ter sido um ano antes de ele morrer. Todos
estávamos com camisas do Giants. O meu pai era um torcedor fanático, e isso
foi o que me impulsionou mais ainda a jogar pela equipe.
Já não estava mais conseguindo manter a compostura. Desabei a
chorar. Todos aqueles anos eu buscava informações sobre ele. Perguntava
para minha mãe e minha avó como Mark Lacox era, do que gostava. O que
todo mundo sempre me disse é que ele era o pai mais apaixonado pelo filho
que as pessoas já tinham visto. Minha mãe sempre falava sobre o quanto ele
gostava de estar conosco sempre que podia. E eu tinha raras lembranças dele,
mas elas existiam bem no fundo das minhas memórias. Ele me ensinando a
arremessar…
Meu pai era caminhoneiro. Viajava muito. Quando estava em Little
Italy, queria ficar na companhia da família todo o tempo. Ele e minha mãe
eram muito apaixonados, era o que a sra. Di Lucca sempre falava: nunca vi
um casal mais apaixonado do que os seus pais. E aí, bem, um dia ele não
voltou para casa. Morreu num acidente. Aquilo devastou a minha mãe, mas
ela sempre me contava que fui eu quem a tirei da escuridão. E era por isso
que eu sabia que tinha que ser a melhor versão de mim para ela. Para a
mulher que me fez ser tudo o que era agora.
Soph me olhava com ternura. Os olhos vermelhos — ela também
estava chorando. Peguei a mão dela e beijei. A puxei para mim e a envolvi
num abraço apertado. Ela podia não querer ter um relacionamento romântico
comigo, mas eu precisava dela. Como a minha melhor amiga. Ela me apertou
forte e alisou os meus cabelos.
— Queria me lembrar mais dele — funguei.
— Eu também, Noah. Você é muito parecido com ele. Os mesmos
olhos.
— Queria que ele estivesse aqui para ver como o Giants tem ido
bem…
— Ele está vendo. E está orgulhoso. — Ela me deu um beijo na
bochecha e se sentou em frente a mim.
— Soph… — sequei as lágrimas com o antebraço —, não me
abandone. Vou lutar até o fim para preservar a nossa amizade. Preciso de
você.
— Não vou te abandonar, seu tonto. — Ela bagunçou meus cabelos e
secou as próprias lágrimas.
— O que está acontecendo aqui? — Nick entrou no quarto com uma
cara de curiosidade.
— Ah, cara, o Natal deixa as pessoas emotivas. — Mostrei o porta-
retrato com a foto que Soph tinha me dado.
— Caramba, que foto legal! — Nick pressionou o meu ombro em
sinal de conforto. — Bom, vim te convidar para jogar uma partida de
Madden. — Ele riu.
— Com qual jogador você pretende competir, Nick? — Lancei um
olhar de desafio para ele.
— Obviamente vou jogar com o melhor quarterback: Lacox.
— Vocês parecem loucos. — Soph riu.
— Ok, Nick. Jogue com meu alter-ego.
— Beleza, vou preparar a TV na sala. — Ele saiu, rindo.
— Soph, muito obrigado. Esse é o presente mais especial da minha
vida. — Dei um beijo no topo da cabeça dela e me dirigi até a sala disposto a
dar uma surra em Nick no videogame. Bom, eu não gostava de perder.
Saí do quarto de Soph com o coração mais leve. Por mais que
tivéssemos nossos problemas, ainda tínhamos essa ligação tão intensa que às
vezes criava faíscas. Eu a queria como mulher, como a minha mulher, mas tê-
la na minha vida, da forma que fosse, era o mais importante. Iria preservar o
que tínhamos com unhas e dentes.
era possível!!!! Merda, merda, merda!!! O restaurante seria
Nãoinaugurado no dia seguinte e justo agora tinha um problema com o
encanamento? Eu vinha tentando falar com o seguro, mas, como já havia
passado do horário de expediente deles, ficou difícil conseguir ajuda. Nick
estava fora de Nova York, visitando vinícolas na Califórnia para conseguir
mais fornecedores para a loja dele. Ele só chegaria no dia seguinte, a tempo
da inauguração. Meu pai e meus irmãos ainda estavam trabalhando no
Chelsea Market. Inferno!
Ouvi batidas na porta de vidro. Noah! Graças a Deus!
— Que bom que você está aqui! — Dei um abraço aliviado nele.
— Nossa, que recepção calorosa! — Ele riu.
— Preciso de ajuda! Deu algum problema com o encanamento da
cozinha! Está tudo alagado…. Tentei ligar para o seguro e ninguém atende.
Nick não está aqui e…
— Calma! Seu salvador chegou! — Ele abriu os braços. — Vou lá na
Cantina da Mamma buscar a caixa de ferramentas e já volto.
Fui para a cozinha e continuei tentando secar a inundação. Eu estava
torcendo mais um pano quando Noah voltou, agora com os equipamentos.
— Bella mia,[36] me deixa ver o que está rolando aí… — Ele pediu
para eu me afastar da pia.
Então se posicionou embaixo da pia e deu uma olhada no
encanamento.
— O vazamento é no sifão. Está com uma rachadura. Provavelmente
você vai ter que trocar depois, mas acho que consigo dar um jeito com um
adesivo de silicone — disse ele, concentrado. — Você fechou o registro
geral?
— Ah, que idiotice! Esqueci! — Fui correndo fechar.
— Bom, então vamos aos trabalhos. — Ele tirou o casaco e a
camiseta e me entregou as peças de roupa. — Caramba, tá uma piscina aqui
embaixo. — Ele riu.
Vendo aquele homem maravilhoso sem camisa e bancando o
encanador, pensei que o chão da cozinha não seria a única coisa molhada
naquela noite. Noah tinha muitas, muitas qualidades. Era desnecessário ser
tão bonito. Depois de alguns minutos, ele se levantou com um sorriso
estampado no rosto.
— Fiz uma limpeza emergencial também no sifão. Estava meio
nojento. — Ele fez uma careta. — Mas o mais indicado é trocar mesmo.
Tente falar com o seguro amanhã. Agora abra o registro geral para checarmos
se o vazamento parou.
Fiz o que ele pediu e, sim, o vazamento tinha parado!
— E parece que Noah Vicini Lacox salvou o dia, senhoras e
senhores. — Bati palmas.
— É o que eu faço de melhor. — Ele fez uma reverência em
agradecimento.
Antes de devolver o casaco e a camiseta, me permiti dar mais uma
olhada naquele corpo perfeito, coberto de tatuagens. Antes que a baba
pudesse escorrer, entreguei a roupa a ele, tentando manter uma expressão
blasé.
— Gostou? — perguntei quando chegamos ao salão principal.
— Adorei. O restaurante está lindo, Soph. Você está feliz? Ficou tudo
do jeito que esperava? — Ele fechava o zíper da pesada jaqueta do Giants.
— Ficou muito melhor do que eu imaginava. Foi uma loucura o Nick
ter feito o empréstimo, mas graças a esse dinheiro consegui deixar o Modern
Pasta do jeito que sempre quis. — Sorri.
— Que bom, Soph. Isso é o mais importante. — Ele curvou
levemente os lábios.
— Ei, o que é isso? — Me aproximei dele. — Você está com um
machucado aqui. — Passei o dedo na lateral dos lábios dele.
Nós ficamos nos encarando em silêncio por um tempo. Se eu o
beijasse agora, o que aconteceria?
— Ah, não é nada. — Ele riu. — Foi durante um choque no treino de
hoje.
Me afastei. Eu não precisava de mais complicações. Amanhã seria a
inauguração do restaurante e eu precisava me concentrar nisso.
— Muito obrigada por ter me ajudado, Noah. — Toquei o braço dele.
— Não foi nada, Soph.
— Você vem à inauguração amanhã?
— Claro que venho. E vou trazer uns colegas do time. Acho que pode
ser bom para o seu marketing.
— Falando em marketing… você me faz mais um favor? — Eu o
olhei com cara de cachorrinho pidão.
— Claro!
Fui até atrás do balcão onde ficava o bar e peguei um pôster dele.
— Autografa para mim? Quero deixar em exposição. Você vai ser o
primeiro cliente ilustre do Modern Pasta. — Estendi o pôster e uma caneta.
— Que honra! — Ele levou a mão ao peito. — Achei que você iria
querer um pôster do Patrick Swayze aqui — debochou Noah.
— Engraçadinho. — Dei um soquinho nas costas dele.
— Pronto. Aqui está seu pôster autografado. — Ele deixou em cima
do balcão.
— Obrigada mais uma vez.
— Boa noite, Soph. — Ele beijou minha bochecha.

No dia seguinte, eu estava uma pilha de nervos. A sorte é que


Adrienne tinha topado me ajudar. Ela era uma chef experiente, havia
trabalhado em grandes restaurantes de Nova York, então o auxílio dela no
contato com fornecedores e também na cozinha estava sendo fundamental
nessa semana. Graças à notoriedade que eu tinha conquistado com o reality
show, várias matérias haviam sido publicadas sobre a nossa inauguração. A
noite de hoje seria apenas dedicada à família, à imprensa e a alguns
formadores de opinião.
— Soph, está tudo em ordem. Acho que vai ser um sucesso. Essa sua
ideia de servir alguns dos principais pratos do restaurante como finger
food[37] é ótima! Uma excelente pedida para que todos possam degustar e
conhecer o menu. — Adri bateu palmas em sinal de entusiasmo.
— Você gostou mesmo dos pratos? Mudaria alguma coisa? —
questionei, preocupada.
— Mudaria… — Ela levou a mão ao queixo. — Mudaria essa sua
insegurança, chef Sophia Di Lucca. — Ela deu um tapinha na minha bunda.
Meus pais também passaram no restaurante para me dar uma força na
organização do evento. A princípio, babbo não queria dar o braço a torcer,
mas pareceu bastante satisfeito com o que viu. Ele tinha ficado bem chateado
com o fato de eu ter que me afastar do Di Lucca’s para tocar o meu próprio
negócio, mas no final entendeu que era o meu sonho e me apoiou. Anna, a
mãe de Noah, ficou superfeliz também. Apesar de eu não poder mais estar tão
presente na Cantina da Mamma quanto antes, continuaria ajudando-a sempre
que pudesse.
Com toda a correria para os preparativos da inauguração, o resto da
tarde passou num piscar de olhos. Meu corpo inteiro pulsava de apreensão e
ansiedade. Em um movimento arriscado, aproveitando que meu nome ainda
estava em alta por causa do programa do Nuno, chamei alguns críticos
gastronômicos bem conhecidos e o convidei também. Sim, ele foi um otário
ao falar do meu peso, mas era um chef bem importante e a presença dele
atraía mídia.
— Soph, acho que está tudo sob controle. Vamos para sua casa nos
arrumar? Você tem que brilhar esta noite! — Adri riu.
Fomos para o meu apartamento e percebi como era bom ter uma
amiga. A vida toda eu vivi cercada por homens. Noah era um excelente
amigo e Nick também, mas havia coisas que eu só poderia dividir com uma
mulher, incluindo minha paixão platônica por Noah. Nos últimos meses, Adri
e eu ficamos muito próximas e senti confiança para me expor para ela, assim
como ela também compartilhava seus problemas mais íntimos comigo.
Adri disse que tinha habilidade com penteados, pois a mãe dela era
cabeleireira, o que, confesso, me deixou muito feliz — eu não tinha muito
jeito para arrumar o cabelo. Sempre secava e só. Ela fez ondas nas pontas das
minhas madeixas e me maquiou. Quando vi meu reflexo no espelho, me senti
poderosa.
— Linda como a sua xará, Sophia Loren — disse Adri, rindo.
Ela terminou de se arrumar e fomos para o restaurante. Eu também
estava muito feliz com a equipe que tinha contratado. Adri me ajudou em
cada etapa do processo. Os convidados iam chegando e todos pareciam
aprovar o local e o menu, até mesmo os críticos mais chatos.
E, de repente, uma energia diferente tomou conta do ambiente. Até o
volume das conversas diminuiu. Noah estava chegando, acompanhado por
um bando de jogadores do Giants. Testosterona pura. Todo mundo parou
para olhar. Todos eles trajavam agasalhos do time, e eu senti minhas pernas
bambearem. Não fazia ideia de quantas vezes eu já o tinha visto na vida, em
diferentes fases, com todos os tipos de roupa. Mas, quando ele abriu um
sorriso para mim, foi como se eu o estivesse vendo pela primeira vez.
— Mana, eu sabia que o Lacox era bonito, bom, dá para ver pela TV
e pelos anúncios de cueca espalhados pela cidade… — Adri riu —, mas
pessoalmente o cara é ainda mais gato.
— Ele está tão lindo hoje… — Suspirei.
— Esse negócio de paixão platônica é uma merda! — Ela alisou o
meu braço em sinal de consolo.
— Oi, Soph. Caramba, como está lotado aqui. — Noah se aproximou.
— Ah, essa é a Adrienne. Eu te falei dela, lembra? — Apontei para a
minha amiga.
— Ah, claro que lembro! Ela disse que você salvou a vida dela. É um
prazer conhecê-la. — Noah estendeu a mão para Adri.
— É um prazer conhecê-lo também, Lacox. Bom, se vocês me dão
licença, vou dar uma olhadinha na cozinha… — Ela saiu de fininho.
— Você está linda, Soph. Gostei desse lance aí no seu olho… — Ele
apontou para o meu rosto.
— Adri me maquiou e ajeitou o meu cabelo.
— Não que você precise de nada disso. Mas ficou muito bom. — Ele
riu.
— Obrigada. Você também está bonito, Noah.
— Fiquei preocupado de você não aprovar que a gente viesse com o
uniforme do Giants, mas saímos tarde do treino… — Ele parecia se justificar.
— Gosto de te ver de uniforme. E também é uma boa publicidade.
Por que eu não iria gostar?
Ele sorriu aliviado e me puxou pela mão para cumprimentar seus
colegas. Todos elogiaram muito a comida e disseram que iam voltar com as
famílias, o que me deixou bastante animada. Estávamos numa animada
conversa, quando vi que Nuno havia chegado.
— Quem convidou esse cara? — rugiu Noah.
— Eu convidei. Ele é um chef importante e preciso fazer a política da
boa vizinhança — expliquei.
— Você não precisa desse otário. Ainda mais depois de tudo o que
ele te disse! —contestou ele num tom raivoso.
— São só algumas fotos e em seguida ele vai embora. Não posso
arrumar briga com um chef do calibre dele, Noah. Preciso me firmar no ramo.
— Tudo bem, Soph. Mas, se ele disser qualquer babaquice para você,
quebro a cara dele.
— Ei, calma, machão. — Pressionei o braço dele. — Uma confusão
não seria boa para ninguém. Nem para o meu restaurante, nem para a sua
carreira, certo? Fique aqui sendo um bom menino com seus companheiros de
time, que vou lá ter uma conversa cordial com Nuno.
— Ok, mas se ele fizer qualquer coisa me chame.
Revirei os olhos e fui em direção a Nuno. Por que Noah sempre
achava que eu precisava da proteção dele vinte e quatro horas por dia? Ah, o
sangue italiano às vezes o dominava por baixo daquela aparente frieza.
— Oi, Nuno. Que bom que você veio. Obrigada!
— Sophia! Bellissima! — Ele beijou a minha mão. — Seu restaurante
está maravilhoso. Já provei alguns dos pratos e estão excelentes também.
Adorei a ideia da apresentação como finger food. Funciona muito bem e
deixa os convidados à vontade.
— Era essa a intenção. Fico feliz que tenha dado certo.
— Tenho certeza de que seu restaurante será um sucesso. Bom, agora
vou deixá-la à vontade para receber os outros convidados. Vou conversar
com alguns conhecidos.
Quando olhei na direção de Noah, vi que ele estava me observando.
Com certeza estava vigiando Nuno. Ah, cão de guarda!
— Soph… — sussurrou Adri em meu ouvido. — Acabou de chegar
um cara e ele é muito gato. Ele está bem perto da entrada com um suéter
vermelho, segurando um casaco. Você sabe quem é?
— Sei… — ri —, é meu irmão, Nicolas.
— Caramba, você não disse que tinha um irmão tão gato!
— Bom, na verdade, além dele, eu tenho mais três irmãos. Só que
eles são casados. Nick é o único que está solteiro. — Dei uma risada
maliciosa. — Venha, vou apresentá-los.
É, Nick era realmente um homem bem bonito, mas sei lá, era meu
irmão. Para mim, era só o meu maninho, mas achei divertidíssimo o interesse
de Adri por ele.
— Oi, Nick! — Dei um abraço apertado nele. — Que bom que você
conseguiu chegar a tempo.
— Vim correndo! Deu tudo certo? E o lance do encanamento? — Ele
passou a mão pelos cabelos, que estavam meio bagunçados.
— Noah me ajudou. Ah, Nick, quero te apresentar a minha amiga,
Adrienne. Ela me ajudou bastante, especialmente nesta semana em que você
esteve fora. Adri, este é meu irmão, Nicolas.
— Prazer, Adri. — Nick apertou a mão dela. — Obrigado por ter
ajudado a Soph.
— Ah, imagina… — disse ela numa voz derretida. — Me diverti
muito.
Os dois começaram uma conversa animada e os deixei. Estavam tão
envolvidos no papo que sequer perceberam que eu tinha me afastado.
A noite transcorreu da melhor forma possível. Todos foram só
elogios. Quando os últimos convidados saíram, aproveitei e dei um
empurrãozinho pedindo para que Nick levasse Adri até em casa, já que estava
tarde. Tirei os sapatos de salto e respirei aliviada. Meu dedinho do pé parecia
que tinha sido esmagado.
— Foi um sucesso, Soph! — Noah veio em minha direção e me deu
um abraço apertado.
— Foi sim. Estou cansada e muito aliviada. — Despenquei sobre
uma das cadeiras.
— O Nuno te tratou com respeito? — Ele sentou-se ao meu lado com
cara de poucos amigos.
— Sim. Foi um perfeito cavalheiro.
— Hum — rosnou ele.
— Ai, como meus pés doem. — Comecei a massagear o calcanhar.
— Odeio usar salto alto.
— Me dê aqui. — Ele deu tapinhas no próprio colo.
— O quê? — Olhei para ele com uma expressão de dúvida.
— Seus pés.
— Ah, não precisa…
— Sou ótimo massagista. Ponha logo os pés aqui.
Ainda meio confusa, obedeci e apoiei meus pés no colo dele. Noah
iniciou uma massagem e ele era realmente muito bom — não tinha mentido
quanto às próprias habilidades.
— Você está usando a pulseira! — Ele abriu um sorriso maravilhoso.
— Tenho usado todos os dias.
Ele sorriu de novo e continuou a massagear os meus pés. O toque
dele, suave, mas firme nos lugares certos, me fazia imaginar quais outras
habilidades ele teria com aquelas mãos. Meu Deus, ele só estava sendo legal
e eu tendo pensamentos eróticos…
— Estou muito feliz por você, Soph. A sua felicidade é importante
para mim. — Ele subiu as mãos para as minhas panturrilhas.
Conforme os dedos dele iam desenhando círculos e pressionando
pontos da minha panturrilha, eu estava quase gritando de desespero. Porque,
sim, ele era o meu melhor amigo e eu daria tudo por ele, mas essa situação
platônica estava me matando.
— Ah, bom… Já aliviou bastante… — agradeci, tirando minhas
pernas do colo dele.
— Se quiser, eu faço mais… — Ele era a própria expressão da
inocência.
— Não, está ótimo. Preciso ir para casa. Estou exausta.
Ele alcançou os meus sapatos por baixo da mesa, abaixou-se e os
calçou nos meus pés. Enquanto o admirava, sendo tão cuidadoso como
sempre, pensei que a mulher que ganhasse o coração dele seria mesmo muito
sortuda. Noah era o pacote completo. Será que ele ainda via a mulher com a
qual tinha transado na pizzaria?
— Vamos? — Ele levantou-se e foi em direção ao mancebo para
pegar nossos agasalhos. Vestiu o dele e trouxe o meu.
— Obrigada. — Dei um beijo na bochecha dele.
— Pelo quê? — Ele parecia confuso.
— Por ser quem você é.
— Acho que essa foi a coisa mais legal que alguém já disse para
mim. — Ele sorriu com ternura.
Saímos do restaurante e eu fiquei pensando por quanto tempo
suportaria aquilo. Os versos de “Stay”, do U2, tomaram os meus pensamos:
Far Away… So Close…[38] Ele estava bem ali. Só não era meu.
Hoje era dia de cannoli, bebê! Sim, eu era absolutamente fanático por essa
iguaria italiana, mas hoje eles teriam um sabor especial. Era dia da Festa
do Cannoli. Já havia alguns anos que eu promovia o evento no Caffè Italia, o
estabelecimento do meu tio Vitto. O dinheiro era destinado à escolinha de
futebol americano que eu mantinha com meu companheiro de time Dwayne
Stevens, em Brownsville, uma das regiões mais perigosas de Nova York.
Eu conhecia a realidade daquele bairro havia muitos anos. Um dia,
levei alguns jogadores do Giants lá para uma aula especial com a garotada.
Stevens ficou tão impactado que disse que queria me ajudar a manter o centro
de treinamento. E, desde então, somos sócios nessa empreitada. A Jogue pelo
Seu Futuro tinha aulas para meninos e meninas. Nem todos se tornariam
grandes astros do esporte, mas ficariam fora das ruas. Também oferecíamos
alimentação, auxílio psicológico e médico.
Mais do que arrecadar fundos, o objetivo da Festa do Cannoli era
chamar a atenção para o projeto e fazer as pessoas enxergarem que a
verdadeira Nova York ia muito além de Manhattan. Brownsville, o berço de
figuras como Larry King e Mike Tyson, era conhecida mesmo por ser a área
que mais concentrava assassinatos na cidade. Era preciso manter a criançada
da vizinhança ocupada e ativa. Aquela era uma das minhas maiores
preocupações.
A frente do Caffè Italia já estava apinhada de fãs. Logo alguns
veículos da imprensa também viriam para fazer entrevistas comigo, com
Stevens e alguns outros colegas de time que viriam nos ajudar. A grande
atração era ver um monte de jogadores de futebol americano tentando fazer
cannoli. Para mim não era tão difícil, afinal eu cresci com tio Vitto fazendo
os doces. Mas para a maioria dos caras era uma tarefa mais complicada do
que um touchdown ou um tackle,[39] e eu me divertia.
— Olá, rapazes! — Soph chegou e cumprimentou meus colegas de
time.
Os caras olhavam para ela como se Soph fosse a última garrafa de
Coca-Cola no meio do deserto do Saara. Cerrei meus pulsos com tanta força
que quase quebrei a massa do cannoli que estava em minhas mãos, pronto
para ser recheado.
— Tem certeza de que vocês são só amigos de infância? — Stevens
me deu um tapa nas costas e tinha um sorriso debochado no rosto.
— U-hum — bufei.
— Você está com ciúmes dela! — Ele gargalhou.
— Claro que não, Stevens. Não ferra!
— Ok, ok! — caçoou ele. — Então, se eu quisesse sair com ela, você
me daria uma forcinha?
Quase enfiei o cannoli no olho dele. É claro que não!
— Você não serve para ela! — grunhi.
— Ah, é? Por que a gente não deixa que ela decida?
— Não!
— Lacox, Lacox… — Ele riu. — Admita logo que você é a fim
dessa mulher e tome alguma atitude antes que seja tarde.
Antes que seja tarde… Aquilo ficou ecoando na minha cabeça por
um tempo.
Soph estava se revezando entre ajudar o pessoal da cozinha a fritar as
massas e também com o recheio, já que cada um dos jogadores levava o
dobro, às vezes o triplo, do tempo normal para rechear um cannoli a
contento. Ela estava com um lenço florido no cabelo e, para mim, parecia
mais italiana do que nunca. Che bella donna![40]
Eu já estava com o maxilar dolorido de tanto sorrir para fotos.
Realmente achava muito legal o contato com os fãs, mas a Festa do Cannoli
exigia muito em termos de energia: era preciso dar atenção a uma multidão, e
isso não fazia parte da minha rotina.
No final de toda aquela zona, só sobramos eu, alguns funcionários do
café, tio Vitto e Soph. Eu estava exausto, parecia que aquilo era mais
cansativo do que um dia de competição. Era um cansaço diferente. Mas
estava muito satisfeito — com certeza tínhamos conseguido uma contribuição
significativa para o projeto. Soph estava passando pano no balcão principal.
Cruzei os braços e fiquei observando-a.
— O que foi? — Ela sorriu. — O quarterback fodão já está cansado?
— Confesso que estou. — Soltei o ar com força.
— Mas foi ótimo, não foi? Acho que nunca vi o Caffè Italia tão
cheio! É incrível isso que você faz, Noah, o trabalho com a fundação. Admiro
muito.
— Soph… — Me aproximei dela e apoiei as mãos sobre o balcão. —
O que você pensa sobre mim?
— Que pergunta estranha. — Ela riu. — Como assim?
— Sua opinião é importante para mim. É sério.
— Hum… vejamos… — Ela pôs a mão no queixo. — Você é o cara
mais determinado que eu conheço. É um excelente amigo. O melhor que
alguém pode ter. Você é um bom ouvinte. É generoso. Tem um grande
coração. É o melhor filho que alguém poderia ter… mas tem pavio curto às
vezes e pode ser marrento, além de mulherengo…
— É uma descrição interessante.
— E o que você acha de mim? — Ela me encarou.
— Você é uma pessoa impossível de ser ignorada. Adoro a sua
coragem, a maneira como se posiciona sempre. Você também é uma
excelente amiga. Admiro demais a maneira como você enxerga a vida, apesar
de ser rabugenta e esquentadinha às vezes.
— Sou impossível de ser ignorada? — Ela sorriu. — Por que falo
muito alto e sou escandalosa?
— Não. Eu não consigo explicar exatamente o motivo, mas quando
você está em algum lugar é impossível não olhar para você, mesmo que você
esteja em silêncio… — Suspirei. — Sempre sei quando você está em algum
lugar, mesmo se não estiver te vendo…
— Ah, é? — Ela parecia curiosa.
— Sempre sinto a sua presença. É inevitável.
— Por que você está me falando tudo isso?
— Porque tive vontade.
— É… Noah Vicini Lacox sempre faz o que tem vontade. Mimado!
— Ela jogou o pano de prato em cima de mim.
— Nem sempre…
— O que você tinha vontade de fazer que não fez?
— Ah, Soph, não queira nem saber… — Eu a olhei fixamente.
— Se não te conhecesse, poderia jurar que você está me cantando.
— Eu estou.
— Deixa de ser tonto… — Ela deu uma risadinha nervosa. — Você
lembra quando a gente era criança e dizia que ia ter uma loja de cannoli igual
ao café do Vitto?
Por que ela tinha que falar disso agora? Que mulher escorregadia!
— Lembro. Você dizia que eu poderia ser seu sócio, desde que a loja
tivesse um toldo rosa. — Arqueei levemente os lábios com a lembrança. — O
que aconteceu com essa ideia? O Modern Pasta não tem nenhum toldo rosa.
— Não mesmo. — Ela tinha o olhar carregado de nostalgia. — O
fato é que você sempre fez parte dos meus planos, Noah. Nunca imaginei
fazer nada na minha vida que não te incluísse. Mas você tinha os seus
próprios sonhos, foi atrás de tudo o que queria e isso é maravilhoso. Tenho
muito, muito orgulho por tudo o que você se tornou.
— Por que você está lembrando disso tudo?
— Porque sinto que fiquei parada no tempo, de alguma forma te
esperando. E não realizei sonho nenhum até abrir o restaurante. Minha vida
ficou em stand-by. E isso é culpa exclusivamente minha, claro. Você nunca
pediu nada, mas é assim que me sinto.
— Não estou entendendo, Soph…
— Não brinque comigo, Noah. Não arrisque tudo o que a gente tem
por um impulso.
— Eu jamais faria isso, Soph!
— Você já está fazendo! — retrucou ela, aumentando o tom da voz.
— Não estou brincando! — Elevei o tom. — Nunca brinquei com
você!
— Sabe qual é o seu problema, Noah? Você pensa que vai estalar o
dedo e ter o que quer. Sempre!
— Ah, Sophia, pode ter certeza de que você tem me ensinado muito a
respeito de frustração.
— Posso imaginar o grande quarterback rejeitado pela amiga gorda!
Que golpe na sua autoestima! — ironizou ela, raivosa.
— É isso que você pensa de mim? Que sou um homem tão fútil a
esse ponto? E que te enxergo como uma amiga gorda?
— Você é vaidoso, Noah! Todo mundo enche a sua bola! Aí você
tentou transar com a sua amiga gorda solteirona e foi rejeitado. Posso
imaginar como ficou irritado.
— Peraí… — Levantei a mão. — O que é isso? Você consegue ouvir
o que está falando?
— E qual é o motivo dessa insistência em transar comigo? — Ela pôs
as mãos na cintura.
— Você acha que tudo o que faço é para te levar para a cama? —
contestei.
— E você não quer fazer sexo comigo?
— Não! — Bati com a mão no balcão. — Quer dizer, quero... mas
não é do jeito que você está pensando.
— E de que outro jeito seria? — Ela se jogou na banqueta, bufando.
— Realmente não sei como a nossa conversa pôde degringolar desse
jeito!
— Nem eu.
— Por que você gosta tanto de Dirty Dancing?
— O quê? — Ela me encarou com surpresa.
— Por que ele é o seu filme preferido?
— Você quer saber disso agora? — questionou ela, exasperada.
— Por favor, Soph… me responda.
— Sei lá, Noah… — Ela revirou os olhos. — Porque é um filme
romântico. É uma menina que está se descobrindo mulher, que percebe que
pode ser atraente para um cara inalcançável. É um cara que banca o durão,
mas se abre para o amor de uma mulher e ainda por cima ele dança bem…
Mas por que você quer saber disso justamente agora?
— O que você quer, Soph? — Eu a encarei, sério.
— Você bebeu, Noah? Suas perguntas não fazem sentido… — Ela
parecia confusa.
— Elas fazem todo o sentido. Por favor, só responda.
— Como assim o que eu quero? Espero que o restaurante seja um
sucesso, que eu consiga ser uma chef respeitada…
— Não… — Cheguei perto dela e segurei, de leve, seu braço. — O
que você quer de um homem?
— Por que você quer saber?
— É importante para mim.
— Quero um homem que me queira do jeito que eu sou, que não me
diga que eu como demais, que falo alto, que a minha risada é escandalosa.
Quero um homem que respeite a minha carreira, que me ame, que olhe para
mim e diga que viver sem mim o levaria à loucura…. Bom, essa parte aí é de
“She’s Like the Wind”, a música que o Patrick Swayze gravou para o filme.
— Ela deu um sorriso sem graça.
— Hum…
— Falei isso tudo e você só diz hum? — Ela arqueou as
sobrancelhas. — Você está me analisando?
— Estou.
— Por quê?
— Porque eu sempre preciso conhecer o campo onde vou jogar.
— Você está me comparando a um jogo? — Ela riu. — Você não
presta!
— Não a um jogo. A bem mais do que isso. Você é o meu desafio. O
maior de todos. O mais importante.
— Então é isso… a sua competitividade não permite que eu te
rejeite? Você não aceita essa derrota.
— Não é competitividade. O meu coração não permite que você me
rejeite.
— Noah… — Ela tinha um ar de reprimenda.
— Soph… — Eu ri.
— Por que a gente não esquece isso? Por que não deixar as coisas
como estão?
— Porque não consigo mais suportar isso. Não consigo mais fingir
que sou só o seu melhor amigo. Quero mais. Preciso de mais.
— O que você quer, Noah? — Ela suspirou.
— Você vai saber. Na hora certa.
— Odeio esse seu sangue-frio! — Ela deu um gritinho.
— Vantagens da minha profissão. — Dei de ombros.
Então era isso. As cartas estavam na mesa. Soph tinha medo de ter
seu coração estraçalhado, mas eu acreditava que ela tinha me dado uma boa
oportunidade. Mal sabia ela que, por mais que eu tentasse sair de campo,
minha vida sempre estaria atrelada a ela.
Eu tinha saído com Liz, a advogada, algumas vezes, mas não rolou a
conexão que esperávamos. Eu só pensava em Soph. Se ela me desse o passe
perfeito, eu faria o touchdown. Iria mostrar para ela que era muito mais do
que um mulherengo inveterado. Agora eu tinha entrado em campo para valer.
Que começassem os jogos!
quase um mês desde a minha conversa estranha com Noah. Ele deu
Fazia
todos os indicativos de que estava a fim de mim, certo? Eu não estava
louca. Fiquei possessa com o sangue-frio dele. Se ele me queria como deu a
entender, por que esperar? Será que ele achava que eu iria rejeitá-lo? Ah, eu
não aguentava mais ficar remoendo essas questões… Nos falávamos quase
todo dia por mensagem de texto, mas com o avanço do Giants nas
competições da divisão Noah era cada vez mais exigido. Além disso, o
Modern Pasta estava indo muito bem e eu também tinha mergulhado no
trabalho.
O restaurante foi assunto de matérias muito positivas e nós já
tínhamos fila de espera para reservas! Pouco depois da inauguração, convidei
Adri para ser minha sócia e ela topou. Então agora, além de adaptações da
tradicional cozinha italiana, tínhamos também as criações dela, que
carregavam um pouco de seu tempero mexicano.
— Nossa, parece que as coisas estão indo bem mesmo… — Meu
pai veio até o balcão, sorridente.
— Não posso reclamar. — Dei um beijo na testa dele.
— Ao que tudo indica, ninguém mais gosta de manter as tradições.
Todo mundo só se preocupa com essas inovações — disse ele, em um tom
cheio de rabugice.
— Babbo, modernizar uma tradição é mantê-la viva. É uma forma
de chamar a atenção das pessoas para a nossa história.
— O que as pessoas têm contra a comida italiana tradicional? —
Ele arqueou a sobrancelha.
— Nada. As duas coisas podem conviver em harmonia. Mas sem
inovação não se sobrevive.
— Little Italy está acabando… — Ele suspirou em sinal de
desânimo. — Não há mais quase famílias italianas aqui. Estamos sendo
esmagados por Chinatown. Os valores tradicionais estão se perdendo. Você
quis seguir o seu próprio caminho em vez de ficar no Di Lucca’s. A empresa
seria sua mesmo.
— Eu respeito muito o que você construiu. E tentei por várias vezes
abrir um restaurante no Di Lucca’s, mas você nunca deixou. E meus irmãos
têm os negócios deles, por que eu não poderia ter o meu?
— Porque você precisa de proteção. É difícil tocar um negócio
sozinha…
— Por que eu preciso de proteção? Porque sou mulher? —
retruquei, irritada.
— O mundo dos negócios é difícil para as mulheres, Soph. Eu não
quero que você se machuque.
— Babbo… o mundo é difícil para as mulheres. Todos os dias
temos que provar que somos capazes, que podemos fazer qualquer coisa tão
bem ou melhor do que qualquer homem. Eu não posso ficar em casa,
encolhida, com medo da batalha. Escolhi lutar. — Sorri.
— Ah, tesoro mio…[41] — Ele pegou a minha mão. — Pode parecer
que não torço por você. Eu devia ter te apoiado antes. Você me surpreendeu,
bambina mia.[42] Não entendo muito bem todas essas suas invenções, mas vou
te apoiar sempre. Desculpe o seu babbo. Se eu errei foi por querer te
proteger. Mas parece que você não precisa mais de mim. — Ele tinha os
olhos marejados.
— Eu sempre vou precisar de você, babbo. Porém sou uma mulher
agora, responsável pela minha própria vida. Mas não é por isso que deixarei
de precisar do seu colinho. — Eu o abracei com força.
— Mas por que inventar tanto? — Ele me lançou um olhar de
reprimenda.
— Babbo… — Revirei os olhos e ri. Era difícil superar velhos
hábitos.

Eu nunca havia trabalhado tanto, mas também jamais tinha me


sentido tão completa. Ver o restaurante cheio, com os clientes sorrindo, me
fazia ter certeza de que eu estava exatamente no lugar onde deveria estar.
Adri e eu nos tornávamos cada vez mais próximas. E ela também estava cada
vez mais perto de outra pessoa: Nick. Eles vinham saindo havia algumas
semanas e eu não poderia ficar mais feliz.
— Soph, tudo bem se você fechar o restaurante hoje sozinha? Eu
combinei de encontrar o Nick hoje…
— Own, que fofos! — Apertei as bochechas dela. — Claro, Adri.
Não precisa nem perguntar duas vezes.
— O seu irmão é tão legal, Soph. — Ela suspirou.
— Eu sei. E ai dele se não fosse! — respondi, rindo.
— Bom, Soph, eu vou indo então. Você acha que tudo bem
mesmo?
— Sim, pode ficar sossegada. O movimento agora está bem mais
tranquilo. Saia logo daqui! — Fiz um sinal com a mão dispensando-a.
— Sim, chef! — debochou ela.
Depois que Adri foi embora, me desdobrei para atender as mesas —
eu achava importante ir até os clientes e cumprimentá-los —, coordenar a
cozinha e também o caixa. Com certeza ela fazia falta, mas eu não iria
atrapalhar o encontro dela. Ainda mais com Nick!
— Soph… — Alice, a recepcionista, me chamou da porta da
cozinha. — O Nuno Mancini está aí e quer falar com você. Ele não tem
reserva e sei que daqui a pouco estamos fechando, mas… é o Nuno Mancini!
— Ela abriu os braços.
— Deixa comigo, Alice. Obrigada!
Eu não acreditava que teria que ciceronear Nuno Mancini àquela
altura da noite. Mas era aquilo: política da boa vizinhança.
— Oi, Nuno, como você está? — Abri um sorriso falso.
— Soph… bellissima como sempre! — Ele beijou a minha mão. —
Imaginei que a essa hora o movimento seria mais tranquilo para
conversarmos sem pressa.
Sem pressa. Oh, céus!
— Ah, sim, claro… Vou te acomodar e já trago o cardápio.
— Nem preciso de cardápio. — Ele sorriu sedutoramente. — O que
você sugere?
— Bom, pode ser o mix mediterrâneo, que são várias porções
pequenas de diversos pratos. O que acha?
— Excelente pedida!
— Vou fazer o pedido na cozinha e já volto.
Dio Santo! Eu só queria fechar o restaurante, ir para casa, vestir
meu velho pijama de flanela e despencar na cama. Mas, pelo visto, meus
planos teriam que ser alterados.
Já fazia duas horas que o restaurante tinha fechado. Liberei os
funcionários e eu estava quase dormindo em cima da minha taça de vinho.
Nuno não parava de tagarelar. Ele disse que veio me visitar, pois estava
muito impressionado com o sucesso do restaurante, mas a verdade é que
parecia que ele queria um pretexto para falar sobre si mesmo.
Nuno era um daqueles caras que à primeira vista são muito gentis e
encantadores, extremamente charmosos, mas depois de um tempo começam a
mostrar que são apenas sujeitos egocêntricos. Contudo ele era um chef muito
influente, então eu tinha que fazer o meu melhor para não o mandar às favas.
— Sophia… — Ele deslizou a mão por cima da mesa até alcançar a
minha. — Você é uma mulher incrível.
Oh, não…
— Obrigada, Nuno. — Discretamente puxei a minha mão.
— Sabe, acho que nós devíamos ter um outro encontro e…
— Eu agradeço o convite, mas ando muito ocupada. Inclusive,
preciso fechar o restaurante, porque amanhã vou começar cedo.
— Não seja assim, vai… — Ele riu. — Não banque a difícil.
O quê?
— Nuno, eu realmente acho melhor você ir embora. — Levantei-
me abruptamente da mesa. Quem ele pensava que era? Aquilo estava
ultrapassando todos os limites.
— Sei que você quer, Sophia… — Ele deu uma risada debochada.
— Está na hora de você ir para casa — retruquei, irritada.
— Quanto mais você banca a difícil, mais eu te quero. — Ele me
lançou um olhar predatório.
— Qual é a sua dificuldade em entender que eu não quero nada com
você? — esbravejei, me afastando dele.
— Ah, Sophia… você assim, bravinha, é tão gostosa. Nunca pensei
que poderia me interessar por uma mulher como você… mas você tem seu
charme — Ele veio atrás de mim.
— Nuno, saia do meu restaurante!
— Você só tem esta merda de restaurante graças a mim. Deveria
ser mais boazinha. Inclusive porque, se eu quiser, posso acabar com essa
espelunca a qualquer momento — Nuno alterou o tom da voz.
— E isso significa que eu deveria ir para a cama com você? —
gritei.
— Você deveria estar agradecida inclusive por um homem como eu
querer ir para a cama com você.
— É mesmo? — retorqui, debochada.
— Sabe, Sophia, não são muitos os homens que se sentem atraídos
por mulheres gordas… — Ele arqueou as sobrancelhas.
— Nossa, Nuno, nem tenho palavras para descrever quanto eu me
sinto lisonjeada por ser o alvo da sua atenção. É o ponto alto da minha vida
— respondi, gargalhando.
— Sua vagabunda gorda, cale a boca! — Nuno segurou o meu
braço com força.
— Largue ela! Agora! — A voz familiar surgiu da entrada do
restaurante, que já estava escura. Eu reconheceria aquele tom em qualquer
lugar.
— Ei, calma lá… — Nuno se afastou de mim. — Nós só estávamos
conversando…
— Filho da puta! Eu vou fazer você engolir cada merda que disse
pra ela! — Noah vociferou, e nem percebi como, mas ele já estava em cima
de Nuno, puxando-o pelo colarinho.
E, mais rápido do que consegui acompanhar, Noah já o estava
arrastando em direção à saída. Ele deu um soco na cara de Nuno, que caiu por
cima de uma das mesas, derrubando taças e pratos no chão.
— Noah, já chega! Ele vai embora agora! — supliquei.
Ele não pareceu me ouvir.
— Eu vou embora, eu vou embora! — choramingava Nuno.
— Vou te matar! — Noah avançou para cima de Nuno, que se
escondeu atrás de uma cadeira.
— Noah, chega! Me ouça, por favor! — Segurei o braço dele. —
Agora chega. Não vale a pena. Pense na sua carreira…
Ele pareceu sair do transe.
— Saia daqui, seu filho da puta! — ele rugiu para Nuno. — E não
tente mais se aproximar dela, você está me ouvindo?
Nuno parecia um rato acuado e saiu sem falar uma palavra. O nariz
dele sangrava e talvez estivesse quebrado. Mas eu tinha que confessar que
não sentia pena.
— Você está bem, Soph? — Noah pegou meu rosto entre as mãos.
— Ele te machucou?
— Não, ele não me machucou.
— Eu queria matá-lo! — rosnou ele.
— Não vale a pena.
— Eu sei — retrucou Noah, irritado. — O que ele estava fazendo
aqui?
— Ele disse que queria conversar…
— Vocês estavam num encontro?
— Não, Noah! — bufei. — Ele apareceu aqui sem avisar e eu tentei
ser gentil, apenas isso.
— Você não devia ser gentil com ele! Avisei que esse cara não
prestava!
— Você está me culpando pelo que aconteceu?
— Claro que não, Soph! — Ele passou as mãos pelos cabelos. —
Só estou com muita raiva ainda e não estou conseguindo pensar direito, me
desculpe.
— Você se machucou! — Peguei a mão dele. Os nós dos dedos
estavam feridos.
— Esse panaca tem uma cara dura!
Tentei não rir, mas não consegui evitar.
— Vou pegar gelo. Mas… tenho uma curiosidade. Como você veio
parar aqui?
— Cheguei de viagem ainda há pouco. Vim ver a mamma.
Estranhei as luzes do restaurante estarem acesas a essa hora e resolvi passar
aqui na frente.
— Obrigada, Noah. Eu realmente estava tendo dificuldades em
fazer o Nuno ir embora.
— Que babaca! — Ele cerrou os punhos.
— Bom, vamos botar um pouco de gelo na sua mão.
— Ah, não precisa… — Ele deu de ombros. — Além disso, o
estrago na cara dele foi muito maior, você viu? — E riu.
Peguei o gelo e coloquei numa trouxinha para aplicar nos nós dos
dedos de Noah. Não era um superestrago, mas era melhor tentar aliviar, afinal
ele usava as mãos para trabalhar.
— Nunca te vi com tanta raiva — praticamente sussurrei,
pressionando o gelo na mão dele.
— Jamais senti tanto ódio — rosnou ele.
Num impulso, peguei a mão machucada e a beijei. Com a outra
mão, ele tocou de leve o meu queixo e fez um movimento suave para eu que
levantasse a cabeça.
— Noah… — Acariciei o rosto dele.
— Soph… — Ele me encarou, os olhos azuis vidrados nos meus.
— Eu não consigo mais… — E suspirou.
— Do que você está falando?
— De nós dois. Você sente o que eu sinto? — Ele pegou a minha
mão e colocou no coração dele. — Não aguento mais viver desse jeito. Meu
corpo inteiro grita o quanto te quer, mas tenho que lutar para me conter.
— O que você quer de mim, Noah? É só sexo? Vamos falar
abertamente…
— Sim, vamos ser claros: quero você. Completamente. Não só
sexo, mas você me deixa louco de tesão, não vou negar.
Dio. Santo.
— Eu te quero tanto, Noah… — acariciei o rosto dele. — Nem
consigo te dizer quanto, mas você vai pisotear o meu coração.
— Eu nunca faria isso. O meu coração é seu, Soph. — Ele segurou
a minha mão, que estava pousada no rosto dele.
— E a mulher da pizzaria? — Puxei minha mão abruptamente.
— Que mulher da pizzaria? — Ele parecia confuso.
— A que você estava comendo há uns dois meses na Cantina da
Mamma — respondi, irritada.
— Era você? — Ele arregalou os olhos. — Eu ouvi um barulho e…
Ah, Soph, não era para você ter visto aquilo.
— Claro que não. E quantas mulheres mais você vai levar lá?
— Soph, eu estava muito puto com você. Tinha sido rejeitado…
— Ah, o grande Lacox nunca pode ser rejeitado! — caçoei.
— Não tem nada a ver com ego, Soph! Será que você não entende
isso? —retrucou ele, exasperado.
— O que você sente por aquela mulher que levou à pizzaria da sua
família?
— Eu me senti atraído por ela. Bastante. Ela foi a advogada no caso
das tatuagens. Liz é inteligente e muito bacana. Saímos algumas vezes, e te
juro, Soph… eu não consigo parar de pensar em você e ela se envolveu com
outro cara! Quando estava transando com ela, era em você que eu estava
pensando! — Noah elevou o tom da voz.
— Mentiroso! — berrei.
— Para com isso! Por que você se recusa a enxergar uma coisa que
está aqui, bem na sua cara?
— Porque você está confundindo as coisas! Você nunca saiu com
uma mulher como eu! Nunca te vi com uma mulher como eu!
— O que quer dizer com uma mulher como você?
— Uma mulher gorda, Noah! Quer que eu desenhe? — vociferei.
— O seu peso não tem nenhuma importância para mim, nem nunca
teve. Você é linda!
— Mentiroso! — rugi.
— Para de me chamar de mentiroso!
— Não faça isso comigo! — Comecei a chorar. — Você vai dizer
todas essas coisas só para me levar para a cama!
— EU TE AMO, SOPHIA! EU. TE. AMO!
— Ah, meu Deus… — Chorei mais ainda.
— Eu não planejava me declarar assim, mas sempre pensei que no
dia em que dissesse eu te amo para alguma mulher, ela reagiria de forma
diferente.
— Meu Deus, Noah… como? — Meu coração começou a palpitar
como se estivesse num galope descontrolado. As palavras dançavam na
minha cabeça, mas não conseguia escolher nenhuma delas.
— Eu te amo desde sempre. Te quero desde aquela maldita Festa de
San Gennaro, quando nos beijamos aos onze anos… Você nunca saiu da
minha cabeça. Sempre tive muito medo de te perder. Muito. O meu maior
temor é que você saia da minha vida. Então você pode me dizer hoje que não
sente o mesmo por mim. Vou entender e te respeitar. Mas cansei de viver
uma mentira. Preciso que você saiba que quero mais, sempre quis mais. Você
é a minha única insegurança. E eu estou aqui, diante de você, correndo o
risco de ter a maior derrota de todas, mas estou sendo honesto. Te amo mais
do que tudo.
— Ah, meu Deus… — Levei as mãos à boca.
— Soph, por favor, você consegue dizer outra coisa além de Ah,
meu Deus? — Ele arqueou a sobrancelha.
— Noah, isso é… é… a coisa mais linda que já ouvi na minha vida.
— Sentei-me no colo dele. — Eu te amo. Demais. Mas sempre achei que
você só me via como amiga. — Colei meus lábios à testa dele.
— Você sempre foi tudo para mim. Tudo. Era com você que eu
queria dividir minhas alegrias nas vitórias e a frustração das minhas derrotas.
— Amo você, Noah.
Ele passou a mão pelas minhas costas e foi depositando beijos
quentes no meu pescoço até chegar no meu ouvido.
— Se você soubesse tudo o que sonho em fazer com você... São
muitas, muitas coisas diferentes, que estão acumuladas depois de tantos
anos…
— Ah, é? — Ofeguei.
— A-ham… — Ele mordeu o meu queixo.
— O que você quer fazer agora, Noah?
— Você vai ver… — Ele sorriu diabolicamente.
EuBowl
nunca havia sentido tanta expectativa na minha vida. Nem um Super
poderia fazer o sangue correr pelas minhas veias da maneira como
acontecia agora. Soph me olhava com os olhos castanhos fixos em mim,
aqueles lábios carnudos entreabertos. O peito subindo e descendo
rapidamente. Todos os sinais estavam ali: tesão.
— Você não tem ideia do quanto pensei em você, em todas essas
curvas deslizando sob os meus dedos. Ah, Soph, quantas noites me
masturbando, sonhando que estava te comendo… — Com as mãos firmes, a
segurei pela bunda. Deliciosa.
Grudei meus lábios aos dela, e eu tinha tanta urgência por aquela
mulher que não consegui ter calma. Queria aquele beijo mais do que queria
respirar. Soph cravou as unhas em minhas costas e gemia em minha boca.
Tantos anos de expectativa resumidos em grunhidos, em saliva, em
respirações entrecortadas…
— Noah… — Ela arfou e jogou a cabeça para trás.
Passei a língua pelo pescoço dela, disposto a lamber, morder e chupar
cada centímetro de pele daquela mulher. Soph tinha um gosto familiar e,
ainda assim, inteiramente novo. Como era possível se sentir em casa e, ao
mesmo tempo, parecer um expatriado numa terra desconhecida? Era assim
que eu ficava diante dela.
— Eu te quero demais, amore mio. — Comecei a desabotoar a camisa
que ela vestia. A cada botão aberto, a expectativa de encontrar aquilo pelo
que eu mais ansiava me fazia tremer. — Você consegue imaginar quantas
vezes pensei nesses seus peitos maravilhosos? Quantas vezes sonhei que
estava enterrando minha cara neles?
Soph levou os próprios braços para trás para me ajudar a despi-la. Ela
estava com um sutiã preto de renda. Os seios fartos e generosos pareciam
saltar do decote. Eu os segurei com as duas mãos, unindo-os diante do meu
rosto. Beijei o vale que se formava entre eles, maravilhado com o cheiro da
pele dela e com todos os sons de prazer que ela fazia. Ela abriu o meu casaco
e pousou a mão quente sobre a camisa, alisando o meu peito.
— Todas as vezes que te vi sem camisa… — Soph ofegava —, eu
ficava pensando em como seria acariciar suas tatuagens…
Joguei o casaco no chão e tirei rapidamente a minha camiseta. Ela
acariciava lentamente as tatuagens no meu peito e foi explorando os desenhos
até chegar aos meus braços. As pontas dos dedos dela pareciam me causar
ondas de choque. Eu estava duro como uma pedra. Me levantei com ela no
colo. Eu a sentei sobre uma das mesas. Ela me encarava em expectativa
enquanto eu tirava as calças.
— Uau! — Ela riu.
— Gosta do que vê? — Abri os braços.
— Muito.
— Isso é o que você faz comigo… — sorri maliciosamente —, desde
sempre.
Soph mordeu o lábio inferior e, meu Deus, como eu queria comer
aquela mulher! Ela abriu sua calça e eu a tirei pelas pernas dela. A calcinha
era pequena, bem pequena. Me ajoelhei diante dela.
— O que você vai fazer? — perguntou ela num fiapo de voz.
— Te adorar.
Afastei as pernas dela e fui beijando desde o tornozelo, em direção às
coxas. Quando minhas mãos chegaram em suas virilhas, ela gemeu. Ah,
Soph, eu quero ouvir você gritar. Afastei a calcinha dela e senti que ela
estava encharcada. Com as mãos, abri aquela boceta deliciosa que eu tanto
desejava. Eu precisava saboreá-la, ter o gosto dela impregnado em mim,
como jamais sentira.
Ao mesmo tempo que eu a abria com as mãos, meus dedos brincando
naquela entrada úmida e quente, minha língua a invadia. Soph prendeu minha
cabeça entre as coxas e aquilo foi a deixa para que eu mergulhasse mais
fundo dentro dela. Que mulher deliciosa! Com as mãos, ela agarrou meus
cabelos como quem pedia para que eu me aprofundasse mais e mais.
— Ah, Noah… — Ela suspirou.
Segurei as coxas dela por baixo, com firmeza, e fui ainda mais fundo.
Com a língua, eu desenhava palavras que nem eu entendia no sexo dela.
Talvez eu quisesse deixar o meu nome marcado nela, assim como ela já
estava gravada em mim. As pernas dela começaram a tremer e, quando ela
gritou, eu me senti o maior campeão de todos. Sim, existia algo melhor que o
Super Bowl. Era dar um orgasmo à Soph.
Levantei-me e ela estava com o olhar vidrado, com uma expressão de
êxtase absoluto, as bochechas coradas. Ela estava mais linda do que em
qualquer outra lembrança que eu tinha.
— Você é gostosa demais, Soph…
— Onde você aprendeu a fazer isso? — Ela riu.
— Ah, tem muito mais. Isso é só uma amostra. — Desabotoei o sutiã
dela e deslizei as alças por seus braços. — Agora é que vai ficar bom.
Ela cobriu os seios e parecia estar envergonhada. Eu a beijei mais uma
vez e lentamente afastei seus braços. Soph tinha seios magníficos, fartos, com
mamilos rosados que estavam em sinal de alerta.
— Soph, olhe pra mim — supliquei.
Ela atendeu e me encarou.
— Você está vendo isso? — Segurei o meu pau e o friccionei
lentamente. — Estou assim por sua causa. Porque você é gostosa demais.
Não se cubra, esperei muito tempo por isso. Quero ver você, principessa[43]
— pedi.
Com o polegar fiz movimentos circulares no mamilo de Soph, que se
enrijeceu ainda mais. Fui até o outro seio e o chupei. Quando a minha barba
roçou na pele dela, Soph enganchou os dedos nos meus cabelos, me guiando
em busca do próprio prazer. Eu mantinha o foco total na tarefa de satisfazê-
la, mas quem já estava quase explodindo era eu. O corpo inteiro de Soph
vibrava e aquilo foi demais para mim. Eu precisava tê-la, era uma
necessidade primária foder aquela mulher.
Ainda desorientado, fui até minha carteira, que estava jogada no chão,
buscar a camisinha. A ondulação do corpo de Soph sentindo prazer, depois
que a chupei, ainda ressoava em mim. Novamente abri suas pernas e me
posicionei em sua entrada. Queria compensar todos os anos em que me
masturbei pensando nela, desfrutando daquele momento lentamente, mas eu
não sabia se iria aguentar.
— Eu não preciso que você tenha calma… — Ela parecia ler meus
pensamentos. — Me coma, Noah!
E aí foi a minha perdição. Deslizei para dentro dela. Soph estava tão
molhada e tão entregue que logo eu estava totalmente unido a ela. Ela
pressionou os seios contra o meu peito, a sensação daqueles mamilos
friccionados contra mim estava me deixando ainda mais louco de tesão. Eu a
puxei pela bunda como se pudesse me enterrar ainda mais naquela mulher.
Ela começou a rebolar e respondi dando estocadas profundas. Não havia a
menor condição de eu manter o mínimo controle que fosse — ela tinha me
dominado inteiramente.
— Olhe para mim, Soph… Não deixe de olhar para mim… — Segurei
o rosto dela.
Ela fixou os grandes olhos castanhos nos meus e deu um sorriso
perverso. Soph sabia o poder que tinha sobre mim. Aquilo foi um
combustível para eu me enterrar completamente nela. Quando ela murmurou
meu nome, pressionei seus quadris com força.
— Você é minha. Só minha — grunhi no ouvido dela.
Ela cravou as unhas nas minhas costas e acelerei ainda mais. Um único
pensamento invadia a minha mente como um mantra: goze, Soph, goze.
Porque eu não sabia por quanto tempo mais aguentaria me segurar. Senti-la
tão quente e molhada ao meu redor estava me levando ao abismo.
— Goze para mim, Soph, quero ver você gozar… — Quando percebi,
minha súplica havia saído em voz alta.
Soph arqueou as costas e segurou com firmeza os meus cabelos. Ela
me beijou e gemeu em minha boca. Seu corpo começou a vibrar numa
frequência diferente e senti o aperto dentro dela. Nossas línguas continuavam
a se acariciar. Ela mordeu o meu lábio inferior com força, e eu senti todo o
desespero que tínhamos um pelo outro, guardado por tantos anos. Quando ela
gritou, se libertando, me permiti gozar.
— Ah, Soph, puta que pariu! — berrei.
Eu a abracei apertado. Enquanto respirava nos cabelos dela, sentindo
aquele aroma familiar, algo diferente explodiu dentro de mim. Era uma
mistura de tesão saciado, vontade de nunca mais sair de dentro dela, medo,
felicidade, expectativa… tudo! Aquela mulher me fazia sentir tudo.
— O que vai acontecer agora? — Ela beijou o meu pescoço.
— O que já deveria ter acontecido há muito tempo. Vamos ter um
relacionamento. — Beijei o topo da cabeça dela.
— Noah, estou tão feliz, mas com tanto medo… — Ela alisava uma
das minhas tatuagens no braço.
— Eu também, Soph. Mas não há a menor chance de eu voltar atrás.
Você é minha!
— Eu não sou de ninguém. — Ela riu.
— Você é minha e eu sou seu. Não há nada que você possa fazer a
respeito disso. E esse é o meu lado italiano falando agora. Vá em frente e
chame de machismo. — Dei de ombros.
— Não… — Ela pousou a mão em meu rosto. — Eu até achei fofo.
— Você já pensou quando nossas famílias ficarem sabendo? —
Acariciei os cabelos dela.
— Vai ser engraçado. E barulhento. — Soph deu uma risada.
— Não há nada que eu queira mais do que ficar com você, bella mia.
— Nem ganhar mais um Super Bowl? — Ela riu.
— Não. Nenhuma experiência na minha vida jamais poderá se
comparar ao que vivi hoje. Foi muito melhor do que em qualquer sonho… E
olha que eu tive muitos ao longo desses anos — debochei.
— Quando acordei hoje para vir trabalhar, eu jamais imaginei que meu
dia terminaria assim — disse ela, em tom zombeteiro.
— E foi uma boa surpresa?
— A melhor de todas. — Ela enterrou a cabeça no meu peito. — Noah,
eu posso te pedir uma coisa?
— O que você quiser! — Beijei-lhe o pulso, que estava com a pulseira
que eu havia dado de presente.
— Você pode dormir comigo hoje? — Ela tinha um olhar pidão.
— Soph, a partir de agora você vai ter que pedir para eu não dormir
com você. — Eu ri.
— Meu Deus, Noah! Isso está acontecendo de verdade?
— Está. — Dei-lhe um beijo demorado.
— Sabe, é estranho… — Ela suspirou.
— O quê? — Enrolei uma mecha de cabelo dela nos dedos.
— Você é o mesmo Noah que conheço desde sempre e, ao mesmo
tempo, uma pessoa inteiramente diferente agora. Parece loucura?
— Não. Eu também estou te vendo assim.
— Nunca senti nada parecido com o que você me fez experimentar
hoje. — Ela corou.
— Nem eu, Soph.
— Mentiroso! — Ela riu.
— Soph, sou totalmente sincero com você.
— Eu sei, mas de alguma forma tenho medo de acordar amanhã e você
falar que se arrependeu…
— Soph… — Peguei a mão dela e pus no meu peito. — Está sentindo?
Ela fez um sinal de concordância com a cabeça.
— Meu coração só fica acelerado assim em treino ou em jogo. Eu
nunca senti nada parecido com o que vivemos hoje. E não foi só por causa do
sexo. Foi por causa da nossa conexão, que eu sempre soube que estava aí em
algum lugar, mas que nunca nos permitimos viver, pois somos dois idiotas.
Então, por favor, acredite em mim. Nada vai mudar o que sinto por você.
Nem amanhã, nem em um milhão de anos. Você é a minha mulher. Eu sou o
seu homem. — Beijei-lhe a palma da mão.
— Você é o meu homem… Gosto disso. — Ela arqueou sensualmente
os lábios.
— Tendências dominadoras, Soph? — zombei.
— Pode acreditar que sim!
— Ficarei feliz em me submeter às suas vontades.
— Cuidado, Noah, cuidado. — Ela sorriu.
Eu a ajudei a descer da mesa e começamos a nos vestir para irmos
embora. Iríamos dormir juntos. Como um homem e uma mulher. Porque, ao
longo de todos aqueles anos, eu e Soph já havíamos dormido até na mesma
cama, mas jamais da maneira como seria agora. Nós já havíamos dividido até
o mesmo saco de dormir numa viagem de férias, num acampamento com toda
a família dela.
Agora havia a promessa de compartilharmos algo muito mais profundo
do que apenas um espaço físico. Havia a promessa de dividirmos os nossos
corpos, o nosso prazer e as nossas vidas. Não havia nada que eu desejasse
mais do que aquela mulher. Nem mesmo o Super Bowl, que parecia cada vez
mais perto de mim. A minha conquista mais importante para sempre seria
Soph. E eu sabia que o nosso campeonato estava apenas começando.
Abri os olhos e demorei um pouco para me situar a respeito do que estava
acontecendo. Uma espiral de desenhos tribais estava ali, bem diante de
mim. Eu estava deitada sobre o peito de Noah. Meu coração acelerou. Era
verdade, ele estava ali na minha cama. Me desvencilhei do braço dele com
cuidado e me apoiei nos cotovelos para observá-lo. Ele era tão lindo… Eu já
o tinha visto sem camisa algumas vezes, mas nunca assim tão de perto. Passei
as pontas dos dedos por uma das inúmeras tatuagens que ele tinha, no ombro.
Ele abriu os olhos.
— Buongiorno, principessa.[44] — Ele sorriu.
— Buongiorno, amore mio.[45] — Beijei a testa dele.
— Dormiu bem? — Ele bocejou.
— Como nunca dormi antes…
— Nunca acordei tão feliz! — Ele me puxou para um abraço.
— Noah, você tem muitas tatuagens… Sei o significado de algumas
delas, mas não de todas. Aliás, há um motivo para todos os desenhos que
você tem no corpo?
— Todas as minhas tatuagens têm algum significado. Não são apenas
pela questão estética.
— Por que você tatuou essas flores aqui no ombro? — Passei os
dedos pelo desenho.
— Ah, essas flores são peônias… — Ele beijou meus dedos.
— Peônias?! — Arregalei os olhos.
— É isso mesmo que você está pensando. Fiz essa tatuagem para
você, bella mia.
— O corsage da formatura?
— Aham.
— Meu Deus, que coisa linda! — Dei-lhe um beijo. — Não sei nem
o que dizer…
— Só diga que me ama. — Ele sorriu.
— Eu te amo! — Beijei a tatuagem floral que cobria o ombro dele.
— Soph — ele passou a mão pelos meus cabelos —, eu nem sei
como vou conseguir passar as horas seguintes longe de você.
— Nem eu… — Suspirei.
— Tenho que ir para o Giants. Esta semana nosso jogo será em casa,
então à noite estou de volta. Te busco no restaurante. Podemos ir para a
minha casa? Bono deve estar chateado por ter dormido sozinho.
— E quem disse que vou dormir com você hoje? — Arqueei as
sobrancelhas, em sinal de deboche.
— Ah, Soph, não maltrate o meu coração. — Ele fez um beicinho.
— Claro que podemos ir para a sua casa.
— Soph — ele afastou uma mecha de cabelo do meu rosto —, se
aquele palhaço do Nuno aparecer de novo lá…
— Ele não vai.
— Mas, se ele aparecer, você me avisa — grunhiu ele.
— Não quero que você saia por aí batendo nas pessoas.
— Eu não tinha planos de bater nem nele nem em ninguém. Mas,
quando ouvi você gritando para ele te soltar, perdi o controle. Você me faz
perder o controle. — Ele soltou uma risada.
— Ah, é? O frio quarterback Lacox perde o controle comigo? —
Mordi o queixo dele.
— Pode ter certeza que sim. Inclusive estou prestes a perder o
controle neste momento. — Ele pegou a minha mão e pôs na ereção dele. —
Está vendo só?
— Estou… — sorri maliciosamente. — Posso te ajudar com isso.
— É mesmo, principessa?
Me posicionei em cima dele e espalmei as mãos em seu peito. Noah
tinha um corpo tão maravilhoso, e eu amava que ele fosse cheio de tatuagens.
Me curvei e fui beijando lentamente cada pedaço daquela pele deliciosa, e ele
estremeceu.
— Você me deixa louco, Soph — murmurou ele.
Fui beijando aquela barriga cheia de gominhos, enquanto pensava
que agora aquele homem me pertencia. Possessiva, eu? Talvez… Ele apertou
com força as laterais das minhas coxas, e a respiração dele ficou pesada. Não
vou negar que era ainda mais erótico ter aquele campeão invencível, uma das
maiores estrelas da NFL, ali na minha cama entregue a mim. Puxei a cueca
boxer preta dele, e lá estava Lacox Jr. me dando oi, prontinho para o serviço.
Ele sentou-se na cama e eu me posicionei entre as pernas dele. Passei
a língua por toda a extensão da ereção de Noah. Ele tremeu. Enganchou as
duas mãos nos meus cabelos e fez uma leve pressão como quem diz mais,
mais… Eu abocanhei todo o membro dele, que estava incrivelmente duro. Ele
se contorcia de tesão. O prazer dele estava me deixando excitada demais. Eu
queria que ele explodisse, que ele me desse tudo o que tinha. Continuei
torturando-o deliciosamente, num movimento de vai e vem, sentindo-o pulsar
na minha boca, e fixei meus olhos nos dele. Ah, a expressão que ele tinha
agora…
— Soph, eu preciso te comer — anunciou ele, ofegante.
Ele segurou meus ombros. Eu me levantei do meio das pernas dele e
estava explodindo de tesão. Ele se posicionou diante de mim, de joelhos.
— Abra as pernas para mim, principessa.
Eu o obedeci e afastei as pernas.
— Agora afasta essa calcinha, Soph, deixa eu ver você… — Ele
segurava o próprio pau e o esfregava devagar.
Fiz o que ele mandava e estava inebriada pela voz dele, pela visão
daquele homem cheio de tesão, ao mesmo tempo tão imperativo e tão
entregue. Eu queria que ele me fodesse até eu desmaiar. Achava que não
tinha mais tempo a perder. Por que nós não fizemos isso antes?
— Você já se masturbou pensando em mim, Soph? — Ele tinha um
sorriso lascivo estampado na cara.
— Muitas vezes — murmurei.
— Mostra para mim, Soph. Mostra como você se toca quando pensa
em mim… — Ele continuava com as mãos subindo e descendo lentamente no
próprio pau.
— Assim… — Coloquei e tirei um dedo dentro de mim sem desviar
os olhos dele. Depois comecei a fazer movimentos circulares no clitóris.
— Caralho, Soph, você é gostosa demais. — Ele veio em minha
direção, pegou a minha mão e chupou meus dedos. — Não há cannoli melhor
do que este gosto.
Ele pôs a camisinha e meu corpo inteiro parecia tomado por uma
descarga elétrica. Eu precisava daquele homem mais do que precisava de
qualquer outra coisa. Ele se deitou na cama.
— Vem em cima de mim, principessa.
Me posicionei em cima dele e comecei a cavalgar lentamente. Ele
segurou meus quadris com firmeza, me puxando mais para baixo e se
enterrando cada vez mais em mim. Enquanto ele me preenchia, eu esquecia
de todas as outras coisas — nada mais importava a não ser Noah dentro de
mim. Eu o sentia cada vez mais fundo. Sem conseguir se conter, ele arqueou
os próprios quadris para estocar cada vez mais fundo. Comecei a gritar e a
gemer, e meus sons o encorajavam a meter mais rápido e mais fundo.
— Olhe para mim — pediu ele, com a respiração entrecortada, sem
parar de arremeter —, goze para mim, grite o meu nome, Soph…
Cravei minhas unhas nos ombros dele e não consegui mais me
segurar. Berrei como nem imaginava ser capaz. Ele só estava me esperando,
porque logo depois apertou a minha bunda com força e grunhiu. Um som
primitivo, que era só meu.
— Por que a gente demorou tanto para fazer isso? — Dei uma risada
e despenquei ao lado dele.
— É o que eu me pergunto… Agora só nos resta dar o nosso melhor
para recuperar o tempo perdido — aconselhou ele.
— Eu te atrasei para o treino? — Me apoiei em um dos cotovelos e
acariciei o rosto dele.
— Não se preocupe com isso. — Ele me deu um selinho. — Tenho a
impressão de que vou render mais hoje do que em qualquer outro dia da
minha carreira.

Não foi só Noah que se atrasou naquele dia. Entrei praticamente


correndo no restaurante. Felizmente, eu tinha Adri para salvar a minha vida!
— Soph! Eu estava preocupada! Ia te ligar agora.
— Oi, Adri, desculpe. Perdi a hora…
— Que cara é essa? Aconteceu alguma coisa que eu não sei? — Ela
parecia curiosa.
— Ah, aconteceu… — Eu ri.
— Meu, Deus! Me conta! — Adri dava pulinhos e batia palmas.
— Eu e Noah transamos. — Cobri o rosto com as mãos
— Detalhes, Soph, detalhes! — Ela deu um gritinho.
Repassei todos os acontecimentos da noite que foi a mais bizarra e
também a melhor da minha vida. A surra que Noah deu em Nuno, a
declaração de amor que ele fez…
— Ah, isso explica as taças e os pratos quebrados. Achei ótimo que
Nuno tenha levado uma surra! Porco machista! — declarou Adri. — Eu não
acredito que aquele imbecil teve essa cara de pau!
— Nem eu. Mas ainda bem que Noah apareceu. Olha, sei que sou
uma mulher bem resolvida, que posso lidar com os meus problemas sozinha,
mas naquele momento foi bom me sentir protegida, sabe? Foi bom sentir que
eu tinha um herói, por mais errado que isso possa parecer.
— E por que parece errado?
— Sei lá. Porque é como se eu estivesse fortalecendo um padrão: o
da mocinha que precisa de um príncipe encantado para salvá-la. — Suspirei.
— Soph… — Adri segurou o meu braço. — Vamos pensar assim:
qualquer pessoa precisaria de ajuda num momento como aquele. Nuno é mais
forte do que você e estava te acuando. Eu poderia ter aparecido para te ajudar.
Eu iria tacar uma panela na cabeça daquele infeliz! Mas foi o Noah. E isso
ainda rendeu uma transa fenomenal! Pare de pensar e aproveite.
— É… Acho que você tem razão. — Lancei-lhe um sorriso
resignado. — E como estão as coisas com Nick?
— Sérias. Ele quer me levar para jantar com os seus pais. — Ela
arregalou os olhos.
— Ah, Adri! Boa sorte! — Dei uma gargalhada. — Eles vão te fazer
tantas perguntas, mas vão te amar, eu tenho certeza.
Tivemos mais um dia típico no Modern Pasta, que, ainda bem, vivia
lotado. Noah chegou quando eu fechava o restaurante. Ele estava tão lindo
com o agasalho e uma touca do Giants.
— Que frio da porra! — Ele entrou esfregando as mãos.
— Vou pegar o meu casaco e a gente já pode ir. — Dei um selinho
nos lábios gelados dele.
— Soph, você ficaria muito chateada se houvesse uma pequena
mudança de planos? — Ele franziu a testa.
— Acho que não… Qual é a mudança?
— A minha mãe me chamou para jantar com ela hoje. Eu não quis
dizer não e gostaria que você fosse.
— Claro, Noah! Eu nunca me chatearia em jantar com a Anna, você
sabe disso!
— E tem mais uma coisa…
— Ih, já está ficando muito pidão! — Arranquei a touca da cabeça
dele.
— Eu quero contar a ela que estamos namorando.
— Nós estamos namorando? — Levei a mão ao queixo
debochadamente.
— Deixa de ser tonta! — Ele deu um tapa na minha bunda.
— Como será que ela vai reagir?
— Ela vai começar a preparar o enxoval dos netos. Isso é tudo o que
ela sempre quis.
— Ah, é?
— Soph, pelo amor de Deus! Não vai me dizer que você não sabia
que Anna Vicini já planejava nosso casamento há tempos? — Ele riu.
— Ah, ela dava umas indiretas, mas eu pensava que era brincadeira.
— Dei de ombros.
— Para mim ela dava diretas, viu? Muitas diretas. Ela é a sua fã
número um.
— Eu também amo a Anna, Noah. Ela é especial para mim. —
Baguncei-lhe os cabelos.
— Eu sei, principessa. Ela vai ficar muito feliz.
Nos dirigimos para a Cantina da Mamma e eu estava com o coração
aos pulos. Sabia que Anna gostava de mim, mas não deixava de pensar que
era engraçado agora olhar para ela como sogra. Eu só esperava que tudo
corresse bem na pizzaria e Anna realmente ficasse feliz com a notícia.
ao lado de Soph não era exatamente uma novidade para mim. Andar
Andar
de mãos dadas com ela, sim. Um gesto tão pequeno, talvez insignificante
para a maioria das pessoas, significava o mundo para mim. Eu estava mais
próximo dela do que jamais havia estado. E essa era a melhor sensação de
todas.
— Por que você está com essa cara? — Soph me encarava com uma
expressão de curiosidade.
— Que cara?
— De bobo — Ela riu.
— Porque estou bobo.
— Ah, é? E por quê?
— Por sua causa, principessa. Você me deixa doido, bobo, feliz…
Tudo ao mesmo tempo. — Apertei a bunda dela.
— Noah! — Ela soltou uma risada e deu um tapa na minha mão. —
Alguém pode ver!
— Que vejam. Não consigo resistir, Soph. Você é muito deliciosa. —
Beijei-lhe o pescoço.
— Você não tem vergonha? — Ela deu um soquinho no meu ombro.
— Não, inclusive você pode apertar a minha bunda também. Eu
deixo.
Ela só revirou os olhos e riu. Mas tudo o que eu disse era verdade.
Ela me deixava bobo, louco como um adolescente em guerra com próprios
hormônios. A mulher que eu conhecia a minha vida inteira se revelava, de
alguma forma, diferente. Nós nos conhecíamos tanto e, ao mesmo tempo,
ainda havia muito a descobrir. Eu queria estar dentro dela o tempo inteiro,
queria consumi-la a cada minuto do dia…
— Espere! — Ela agarrou meu braço quando eu estava prestes a abrir
a porta da Cantina da Mamma. — O que nós vamos dizer para Anna?
— Que estamos namorando? — Dei de ombros.
— Nós vamos entrar e dizer: Surpresa! Descobrimos que sempre
fomos apaixonados um pelo outro e, com um pouco de atraso, decidimos
namorar? — Ela franziu a testa.
— É, basicamente era o que eu tinha em mente…
— Meu Deus, Noah, eu tenho que me preparar para falar com ela.
— Soph… — pus as mãos nos ombros dela —, você conhece a
minha mãe há trinta anos. Ela espera por essa notícia há pelos menos uns
vinte. Por favor, não me diga que você precisa de mais uma década para se
preparar. Eu vou cair duro aqui na frente da pizzaria. — Levei as mãos ao
peito.
— Deixa de ser ridículo! — grunhiu ela. — Então vamos logo!
— Assim que eu gosto. Decidida!
Ela bufou e eu apertei seu nariz. Ela ficava linda bravinha. Ficava
linda feliz também. Bom, Soph era maravilhosa de qualquer jeito. Entramos
na pizzaria de mãos dadas. Minha mãe logo abriu um sorriso.
— Oi, meus queridos. — Ela deu um beijo na bochecha de Soph e
depois na minha. — Que bom que você veio jantar conosco, Soph.
— Desculpe ter vindo sem avisar, Anna. É que Noah me chamou e…
— Desde quando você precisa de convite para vir jantar aqui, Soph?
Vamos subir? — Minha mãe a abraçou.
Ela já sabia de tudo. Como podia?
— Cadê a nonna? — questionei, quando não a vi em sua tradicional
poltrona.
— Foi dormir. Disse que está velha demais para ficar esperando para
jantar tão tarde — Minha mãe revirou os olhos.
— Bistecca alla fiorentina?[46] — Abri o meu melhor sorriso.
— Você sempre vem morto de fome. — Minha mãe sorriu.
Eu e Soph arrumamos a mesa enquanto minha mãe pegava as
panelas. Minha namorada arregalou os olhos para mim como quem pede
socorro. Eu realmente não conseguia entender o que tanto a assustava.
— Mamma — limpei a garganta —, eu e Soph precisamos falar com
você.
— Anna, não quero que você pense que foi algo intempestivo e…
— Ah, Soph — minha mãe deu uma gargalhada —, eu não sei por
que vocês demoraram tanto…
— V-você já sabe? — Soph quase engasgou com o vinho.
— Vocês estão namorando, não estão? — indagou ela, com a maior
naturalidade possível.
— Eu avisei… — Dei uma garfada na bisteca.
— Vocês dois estão com ainda mais cara de tontos apaixonados do
que jamais estiveram. E ainda entraram aqui de mãos dadas. Não foi muito
difícil deduzir. Finalmente, Dio Santo, vocês tiveram juízo! — Minha mãe
uniu as mãos em sinal de prece.
— Nossa, Anna, eu…
— Soph — minha mãe segurou as mãos da minha namorada —, não
há nada que eu queira mais no mundo do que a felicidade de vocês dois.
Noah é meu filho, e eu te amo como uma filha. Sempre soube que vocês
estavam destinados um ao outro. Só não sei por que foram tão teimosos.
— Nem eu. Perdemos tanto tempo… — Soph suspirou.
— Vocês são jovens. Vivam o presente e sejam felizes. Nada de olhar
para o passado. Nada de colocar a cabeça lá na frente. Vivam cada dia como
se fosse o único. O amor é precioso demais para não ser celebrado todos os
dias. — Minha mãe tinha os olhos marejados. Com certeza, estava pensando
no meu pai.
— Eu falei, Soph. Sabia que ela ia ficar desse jeito. Era o maior
sonho dela.
— Era mesmo. Já imagino o casamento de vocês…
— Quem foi que acabou de falar para a gente viver no presente? —
Soltei uma risada debochada.
— Sim, sim, mas me deixe fazer planos. Estou tão feliz por vocês.
— Eu também estou muito feliz, Anna. Eu amo Noah demais —
declarou Soph, com a voz embargada.
— Eu sei bambina, eu sei… — Minha mãe deu tapinhas na mão de
Soph.
Minha mãe e Soph não paravam mais de tagarelar, animadas. As duas
lembraram vários episódios da nossa infância. O que eu senti, enquanto
lavava a louça e via as duas conversando, não sei nem descrever. Foi um
sentimento de conforto, de saber que tudo estava onde deveria estar, algo que
eu jamais havia experimentado. Depois que arrumei a cozinha, como de
costume, estava pronto para ir embora. Eu tinha treino no dia seguinte e ainda
queria desfrutar da companhia de Soph.
— Ti voglio tanto bene, amore mio.[47] — Beijei a testa de Soph
quando saímos da pizzaria. Ela me abraçou apertado.
— Anche io.[48] — Ela mordeu o meu queixo.
— Acredito que nunca tive um dia mais feliz em toda a minha vida.
— Ah, é? Nem em dia de Super Bowl? Nem quando você foi
escolhido para ser jogador profissional? — Ela tinha um sorriso nos lábios.
— Não. Hoje, bem na minha frente, estavam todas as coisas
necessárias para eu ser feliz: você, minha mãe e comida italiana.
— Ah, então vai ser fácil te manter feliz — zombou ela.
— É fácil me fazer feliz, Soph. Sou um homem simples. E você pode
me dar todas as coisas que me deixam contente… — Sorri maliciosamente.
— É mesmo? Fale mais sobre isso. — Ela pôs a mão no queixo,
fingindo estar pensativa.
— Você é uma excelente cozinheira. E é a mulher mais gostosa que
existe. Sexo e comida no melhor nível. Como não ser feliz? — Abri os
braços.
— Já tivemos comida em alto nível hoje… — Ela me olhou com ar
de inocência.
— U-hum…
— E agora, para fechar a noite, teremos sexo em alto nível, Noah
Vicini Lacox? — Ela beijou o meu pescoço.
— Você pode apostar que sim, Sophia Di Lucca.

Eu jamais havia me exercitado tanto. Aquela foi uma semana intensa


de treinos, mas o esforço extra do sexo com Soph me fazia treinar mais, e,
vejam bem, eu não estava reclamando. Havíamos chegado à final da divisão.
Era ganhar aquele jogo e ir para o Super Bowl. E aquela, que era uma das
partidas mais importantes de todas, seria em casa, o que deixava tudo ainda
mais especial. Soph, Nick e tio Vitto marcavam presença no estádio, é claro.
Eu estava no vestiário me concentrando, como de costume, quando senti
alguém puxando meus fones de ouvido.
— Elevation… uh… uh… — Stevens dava gritinhos afetados e fazia
uma dancinha escrota na minha frente. Esforcei-me para não rir.
— Devolve os meus fones, porra. — Tarde demais, eu já estava
rindo.
— Cara, U2 antes do jogo, Lacox? — Ele estalou a língua. — Você
precisa de algo com mais testosterona.
— Não fode, Stevens!
— Sério, irmão, como pode você entrar em campo tão cheio de
sangue nos olhos e a sua playlist pré-jogo ser U2?
— “Sunday Blooddy Sunday”? Já ouviu? — Arqueei as
sobrancelhas.
— É… Não posso debochar dessa. Tem meu respeito. — Ele me deu
um tapa nas costas.
Logo que saímos do vestiário, a minha mentalidade mudou. Como
em todos os dias de jogo. Naqueles poucos instantes que antecediam a
partida, eu mantinha concentração total — era como se nada mais existisse
além do futebol americano. Eu nunca entendia bem quando as pessoas
falavam sobre meditação e “esvaziar completamente a cabeça”, mas talvez o
estado mental em que eu ficava antes de uma partida se assemelhasse a isso.
Eu quase nem ouvia os ruídos externos, da multidão gritando. Durante o jogo,
tinha total atenção ao ponto eletrônico que ficava no meu capacete, pelo qual
eu me comunicava com o técnico e, claro, às jogadas. Não havia espaço para
mais nada que não fosse o compromisso com a vitória.
A partida de hoje seria contra o Philadelphia Eagles, meu antigo time
e um dos maiores rivais do New York Giants de todos os tempos. Cheiro de
carnificina no ar? Pois é. Futebol americano era um jogo, segundo muitos,
violento, mas não era bem assim. Sem dúvida, era um esporte de contato e
alto impacto, mas não sei se violência era uma boa palavra para descrever o
que rolava em campo. Quer falar de violência? Veja jogos de hóquei. Os
caras têm um tempo regulamentado para cair na porrada!
Enfim, agora mesmo não havia mais tempo para nada. Entramos em
campo e era a hora da guerra. Tudo ou nada. Não havia outra opção que não
fosse vencer. Estávamos indo bem. Nossa defesa conseguia neutralizar
Jackson Rodgers, que era um excelente quarterback, mas não melhor do que
eu. E, a essa altura, eu já conseguia basicamente pôr em prática todo o jogo
que havíamos desenhado. Confesso que achei que seria mais difícil. Nossas
blitzes[49] foram mais efetivas do que eu esperava, e algumas recuperações
depois de fumbles[50] adversários garantiram nossa vantagem.
Já estávamos no terceiro quarto do jogo, com uma vantagem de 25 a
17. Era bom, mas ainda não tinha acabado. Eu sabia que teríamos que suar.
Analisei aquele exato momento. Nem todos os quarterbacks eram tão rápidos
como eu. Mas, da posição em que eu estava, podia lançar para Stevens, que
estava lindamente posicionado bem próximo da endzone adversária. E era
isso que eu iria fazer. Quando me preparei para o arremesso, uma montanha
se colidiu contra mim. Ok, de onde o cara tinha vindo para fazer esse sack?
[51]
O problema é que o jogador da defesa adversária se chocou com tanta
força contra mim que eu caí, ele veio por cima e a minha perna ficou presa no
braço do cara. Então eu vi que alguma coisa tinha dado muito errado. Saímos
rolando embolados, o filho da puta tirou a bola das minhas mãos e veio tudo
o que eu não queria: dor, muita dor. Eu não sabia ainda o que tinha
acontecido, mas havia só uma certeza: deu merda.
— Nick, o que aconteceu? — eu berrava.
— Não sei, Soph, mas o Noah se machucou. E é sério. — Meu irmão
esfregava as mãos nervosamente.
— Ele está saindo do campo de maca! — gritei.
— Calma, Soph… — Adri apertou o meu braço. — Não entendo
nada de futebol americano, mas não é comum os jogadores se machucarem o
tempo todo?
Tentei acreditar no que minha amiga me dizia, mas eu sentia que
alguma coisa estava muito estranha. O telão ficava reprisando sem parar a
cena do jogador da defesa adversária se chocando com Noah. O pé dele
praticamente tinha dado um giro de 360 graus. Ele socava a grama de dor. Eu
nunca o vira assim. Quando a câmera focalizou o rosto dele, a expressão era
de sofrimento. Meu Deus, eu precisava ir até ele!
Vitto estava pálido como uma folha de papel e não dizia uma só
palavra. Ele me encarava com os olhos arregalados e entendi que também
estava apavorado. Eu não aguentava mais ver aquela cara de dor no telão,
sem saber o que tinha acontecido com ele. Não conseguiria mais ficar ali na
arquibancada. Nick, Vitto e Adri me seguiram, enquanto eu ia abrindo
caminho para sair logo do meio daquele mar de gente. Nós tínhamos
credenciais que nos dariam acesso à área restrita à equipe do Giants após o
jogo, então fomos até os seguranças e explicamos a situação.
— Você é a namorada do Lacox? Sophia? — indagou Phill Carter, o
técnico do time.
— Sim, sou eu.
— Ah, que bom… Ele não parava de pedir que te achássemos. — O
homem sorriu.
— O que houve com Noah? — Minha voz saiu trêmula.
— Bem, ao que tudo indica foi uma lesão muito grave. Parece ter
sido uma fratura. Ele foi levado direto ao hospital.
— Eu preciso vê-lo!
— Claro, estou indo até lá agora e levo você.
Quando estávamos saindo do estádio, meu telefone tocou. Era Anna.
— Soph, pelo amor de Deus, o que aconteceu com o meu filho? —
Ela estava praticamente berrando.
— Anna, ele foi levado ao hospital. Está consciente, mas sofreu uma
lesão grave. Estou indo para lá agora. Vitto vai passar aí para te buscar, tá? —
Tentei manter a calma.
Ela só grunhiu em resposta. Já estava chorando. Mal olhei para Vitto
e ele já assentiu com a cabeça, se despedindo de mim para ir buscar Anna. Eu
estava tão desesperada que nem sabia exatamente qual reação deveria ter. Ele
devia estar enlouquecendo, então eu precisaria manter um mínimo de calma
para ajudá-lo. Se eu bem o conhecia, àquela altura ele já estava traçando
todos os cenários possíveis na cabeça, inclusive o fim da carreira. Sim, aquele
era o tipo de mentalidade dele: enxergar e planejar todas as situações, talvez
por isso fosse um jogador tão bom.

Quando chegamos ao hospital, havia diversos membros da comissão


técnica na recepção. O clima não estava nada bom. Aquela cena me deu
calafrios.
— Ele já está em cirurgia, Phill — informou um homem que estava
com uniforme do Giants. Devia ser da equipe.
— Como assim ele está em cirurgia? Noah está fazendo uma
cirurgia? — Minha voz saiu uns três tons acima do que eu pretendia.
— Esta é a namorada do Lacox, Sophia. Este é Chris Pope, líder da
nossa equipe médica. — O técnico do Giants nos apresentou.
— O que aconteceu com ele? — Minha garganta estava seca.
— Ele fraturou o tornozelo. Uma lesão gravíssima. Para que se
recupere o quanto antes e volte a jogar, a rapidez na cirurgia é fundamental
— explicou o médico, impassível.
— Vocês só se preocupam se ele vai estar em campo novamente? —
Pus as mãos nos quadris.
— Calma, Sophia — Phill intercedeu. — Noah é sim o nosso melhor
jogador. Mas ele é um amigo para mim. Acredite que isso também é o que ele
deseja. A equipe conversou com ele antes da cirurgia.
Saí pisando duro e me joguei em uma das cadeiras da recepção. Meu
coração batia tão forte que eu tinha a impressão de que precisaria ser
internada também. Phill trouxe um copo de água para mim e depois se
afastou, indo conversar com a equipe. Todos estavam com caras tensas.
Conhecendo Noah do jeito que conhecia, eu sabia que provavelmente ele
faria tudo para entrar em campo novamente o mais rápido possível.
— Soph, meu Deus, o que aconteceu? Cadê o meu filho? — Anna
veio até mim e me abraçou.
— Ele está passando por uma cirurgia. Fraturou o tornozelo…
— Cirurgia? E ninguém pediu a minha autorização? — bufou ela.
— Noah chegou consciente ao hospital e autorizou o procedimento.
— Dio Santo, Soph! Como isso foi acontecer? — Ela despencou no
banco sem forças.
— Nick… — suspirei, puxando meu irmão para um canto mais
afastado —, você acha que essa cirurgia é simples? Estou assustada.
— Bom, Soph, eu não sei. Mas ele está com o melhor suporte médico
que alguém pode ter, tente ficar tranquila. — Meu irmão acariciou meus
cabelos.
As próximas horas foram a própria definição da tortura. Anna
alternava entre o choro e as orações com o seu velho terço em mãos. Eu
fingia uma tranquilidade que não possuía, para que a mãe de Noah não
pirasse ainda mais. Nick e Vitto também fingiam estar calmos, mas eu os
conhecia. Meu irmão andava de um lado para o outro sem parar e roía as
unhas. Vitto parecia que ia ter uma convulsão de tanto bater os pés no chão.
Em um dado momento, Nick trouxe café para nós.
— Vai ficar tudo bem, Soph… — Ele esfregou minhas costas.
— Não precisa fingir que está calmo. — Sorvi um gole de café.
Mesmo sendo ruim, daquelas máquinas de hospital, meu corpo agradecia por
uma dose de cafeína.
— Poxa, Soph, estou fazendo o meu melhor para ser a fortaleza que
você precisa — debochou ele.
O tempo parecia não passar, e de repente fiquei com medo que
estivéssemos presos neste dia para sempre, como naquele filme Feitiço do
Tempo. Phill também não havia arredado pé do hospital. Aparentemente,
Noah era mesmo importante para ele. Tinha largado o jogo na mão do
assistente e vindo acompanhar de perto a situação. Ganhou uns pontos
comigo.
A equipe médica veio conversar com o staff do Giants e meu coração
começou a saltar descontroladamente. Será que tinha ido tudo bem?
— Sophia, sra. Vicini — Phill se aproximou de nós. — A cirurgia foi
um sucesso. O nosso campeão está voltando da anestesia. Assim que ele
puder receber visitas, virão nos avisar.
Inspirei aliviada. Anna me abraçou e desabou a chorar. Não sei por
quê, mas eu não consegui derramar uma lágrima sequer. Estava tão exausta e
tensa que acho que não havia sobrado espaço para nenhuma outra emoção.
Noah acordou, e eu disse que Anna, Vitto e Nick poderiam ir vê-lo primeiro.
Eu queria ficar sozinha com ele. Adri, que estava quietinha ao meu lado, me
abraçou em sinal de conforto.
Depois de um tempo, tomei coragem e fui até o quarto. Anna pareceu
entender a minha intenção e saiu com Nick e Vitto, me deixando sozinha com
Noah. Era tão estranho ver aquele homem tão ativo prostrado numa cama de
hospital, com os olhos ainda turvos pela anestesia.
— Principessa… — disse ele num fio de voz, com um sorriso
cansado.
— Oi, meu amor, estou aqui. Como você está se sentindo? —
Acariciei-lhe os cabelos.
— Não tão mal… — Ele expirou. — Phill passou aqui e disse que
vencemos a partida. Nos classificamos para o Super Bowl.
— Ai, Noah — eu ri —, você só pensa em futebol americano?
— Não… Estou pensando em quanto tempo poderei te foder
novamente — Ele apertou de leve a minha bunda.
— Você é impossível! Estamos num hospital.
— Mas não estou morto. Nenhuma parte de mim está. — Ele piscou.
— Cala a boca. — Eu ri.
— Você ficou preocupada, principessa? — Ele acariciou minhas
mãos.
— Claro, Noah. Que pergunta…
— Soph, talvez eu não possa mais jogar no mesmo nível de antes. —
Ele tinha o olhar triste.
— Amore mio… — Beijei-lhe a testa. — Você acabou de sair de uma
cirurgia. Calma. Estão fazendo o melhor por você. Tudo vai dar certo.
— Isso, Soph, vem aqui… — Ele passou o braço em volta da minha
cintura. — Deixe esses peitos deliciosos aqui pertinho de mim.
— Noah, para! — Gargalhei. — Você é tarado.
— A culpa é sua. Tentando um pobre homem enfermo. — Ele fez um
beicinho.
— Pobrezinho do pequeno Lacox. — Baguncei seu cabelo.
— Não tem nada de pequeno aqui, Soph. — Ele soltou uma risada
fraca.
— Ah, Noah, ti amo moltissimo.[52]
— Anche io, principessa. — Ele beijou a minha mão, fechando os
olhos.
Noah adormeceu. Ele fingia estar cheio de energia, mas eu sabia que
estava tenso. Mesmo que ainda sob algum efeito dos medicamentos, eu
conhecia aquele olhar dele: medo. Com certeza, ele ainda passaria muito
tempo pensando nas consequências da lesão que sofrera. A carreira dele
estava em plena ascensão, e ele era um dos maiores atletas do país, então com
certeza haveria muitas especulações, de todos os lados. Eu só podia esperar
que ele não se deixasse consumir por isso. A despeito do que acontecesse, eu
estaria ao seu lado. Para sempre.
Uma semana. Uma semana com aquela merda de bota ortopédica e andando
com muletas. Mas eu não podia dizer que era um período de inércia. Todos
os dias fazia fisioterapia. Os médicos do time asseguraram que eu estava
evoluindo bem e logo retomaria, ainda que minimamente, minha rotina de
exercícios. Estava completamente focado em me recuperar o mais rápido
possível, mas o Super Bowl era um caso perdido.
Eu tentava não pensar muito naquilo, mas o fato é que um atleta
passa o ano inteiro se preparando para aquele momento: o Super Bowl. E
nada poderia trazer a final de volta. A imagem do momento em que sofri a
lesão passava sem parar nos canais esportivos, e todos os comentaristas
faziam a mesma pergunta: “Será que o grande quarterback Lacox vai voltar
aos campos com a mesma qualidade de antes do acidente?” Não, seus filhos
da puta. Voltarei melhor.
Enquanto estava em casa, eu via todos os jogos do adversário.
Mesmo sem poder, efetivamente, entrar em campo, estava disposto a ajudar a
minha equipe, é claro. Nós iríamos trazer o troféu Vince Lombardi para casa!
Então eu continuava a estudar jogadas e pensar em esquemas de jogos sem
parar. Parecia que estava ainda mais obsessivo com futebol.
A vigilância era cerrada. Minha mãe vinha me ver várias vezes por
dia, e Soph estava dormindo comigo todas as noites. Eu não reclamava. Era
bom ser cuidado de vez em quando.
— Oieee! — Soph entrou no meu apartamento e estava esfuziante,
como sempre. — Cheguei!
Ela tirou os sapatos e os deixou perto da porta. Tinha um grande
embrulho de papel pardo na mão. Deixou o pacote no balcão da cozinha e
veio até mim, dando-me um beijo. Bono se roçou nas pernas dela e miou
como fazia todos os dias. Ela afagou-lhe a cabeça.
— Como foi o seu dia? — perguntei.
— Cansativo. — Ela suspirou e se jogou ao meu lado no sofá. — Eu
sabia que ter um restaurante era trabalhoso, mas olha… Estou morta! Tenho
que trabalhar pesado para pagar Nick o quanto antes. Quero dar pelo menos
uma parcela do investimento logo para ele.
— Ah, tenho certeza de que a loja dele está indo muito bem. Ele não
deve estar precisando desse dinheiro já. — Esforcei-me para transparecer
naturalidade.
— Quero pagá-lo logo. Não me sinto bem nessa situação.
— O importante agora é o sucesso do Modern Pasta, Soph. Foque
nisso.
— Ok, campeão! — Ela bateu continência. — Quem quer
comidaaaa? — E deu uma risada.
— Soph, eu só fraturei o tornozelo. Você está falando como se eu
fosse criança — debochei.
— Ah, desculpe, meu bebezão! — Ela apertou minhas bochechas.
— O que você trouxe?
— Salada. E vou fazer um filé grelhado agora. — Ela levantou-se. —
Não me olhe com essa cara de decepção. Foi você quem disse que não podia
mais comer massas.
— É… não posso. Mas você cozinha tão bem. É um desperdício
comer salada quando há tantas outras possibilidades. — Apertei a bunda dela.
— Noah, você não se cansa? Não está extenuado pela fisioterapia
hoje? — Ela pôs as mãos na cintura.
— Não. Estou sempre pronto para entrar em campo com você,
principessa — declarei, rindo.
— Jesus… — Ela sorriu e revirou os olhos.
Soph foi para a cozinha preparar a carne. Sentei-me numa banqueta
próxima ao balcão que separava a sala da cozinha e fiquei observando-a.
— Noah, sei que não está de folga… — Ela abriu o pacote e pegou
pedaços de bife. — Mas você não quer me ajudar no restaurante? Suas
habilidades de administrador estão sendo requisitadas. Vamos fazer valer seu
diploma de Stanford? — Ela deu uma risada.
— Amore mio, todas as minhas habilidades estão à sua disposição. Se
você me quer no restaurante, é lá que estarei.
— Ai, homem terrível… Só estou me apaixonando ainda mais por
você. — Ela jogou um beijo para mim enquanto grelhava a carne.
— Soph — limpei a garganta —, hoje eu estava vendo uma matéria
na ESPN, e mostraram a minha lesão, para variar. Assistindo ao vídeo, vi que
realmente a coisa foi feia. E eles diziam que é difícil alguém se recuperar
totalmente de algo assim. Estou bastante focado em voltar a jogar como
antes, mas e se eu não conseguir?
— Bom, aí você vai ter mais tempo para ficar comigo e administrar o
restaurante. Talvez seja um bom negócio para mim — zombou ela.
— Estou falando sério.
— Noah, eu já disse no outro dia e vou dizer de novo: não vai fazer
diferença. Não para mim. Mas sei o quanto voltar a jogar é importante para
você. E você está fazendo tudo da melhor maneira possível. Nunca conheci
ninguém tão dedicado ou focado quanto Noah Vicini Lacox. Você vai
superar isso. Estou aqui para te ajudar. — Ela se aproximou do outro lado do
balcão e pegou minhas mãos.
— Só o fato de você estar aqui e eu poder te olhar me ajuda. —
Beijei suas mãos.
— Isso foi tão romântico — suspirou ela.
— Tenho os meus momentos. — Dei de ombros. — Soph, eu estava
pensando…
— Você pensa muito, ao contrário do que dizem por aí sobre os
atletas. — Ela gargalhou.
— Mulher debochada… Só não corro até aí porque essa merda de
bota ortopédica me impede. Vem cá.
— Tenho que servir a comida. A carne vai ficar fria…
— Já, já. Vem cá um pouquinho, principessa.
— Chamando assim, como vou resistir? — Ela deu um sorriso
malicioso.
Soph me abraçou, posicionando-se entre as minhas pernas.
— Golpe baixo! Tenho uma coisa importante a dizer e você fica
esfregando esses peitos deliciosos na minha cara.
— Só estou em pé na sua frente, Noah. Não tenho culpa se você é
tarado. — Ela fingiu inocência.
— Não tenho culpa se você é tão gostosa. — Apertei a bunda dela.
— Ah, Noah, você quer realmente falar algo ou só me bolinar?
— As duas coisas. — Ri. — Soph, não faz mais sentido a gente ficar
separado, você não acha?
— Mas a gente está junto. Do que você está falando?
— Soph, você quer vir morar comigo?
— Tipo me mudar para cá? — Ela arregalou os olhos.
— Sim, tipo se mudar para cá.
— Uau!
— Você acha que fui precipitado? Se não quiser, entendo…
— Precipitado? — Ela riu. — Não há nada precipitado na nossa
história. Eu só não estava esperando.
— Não quero mais que você vá embora. Quero dormir todos os dias
ao seu lado e pensei em te chamar para se mudar para cá, já que meu
apartamento é maior. Mas, se preferir, podemos repensar e…
— Shh… — Ela pôs os dedos nos meus lábios. — Me mudo para cá.
Mas tenho uma condição.
— Qualquer coisa, principessa.
— Quero colocar meu pôster de Dirty Dancing ali, ao lado daquele
do U2! — Ela apontou para a parede atrás do sofá.
— Faço qualquer sacrifício por você! — Levei as mãos ao peito.
— Bom, vamos comer agora.
— E quando eu vou te comer? — Segurei firme os quadris dela.
— Meu Deus, Noah, pense com a cabeça de cima um pouco. — Ela
riu e deu um tapa nas minhas mãos.
— Você é uma tentação ambulante, Sophia…

Jantamos e Soph contava com entusiasmo sobre cada nova receita


que testava e cada ideia inovadora que tinha. Ela estava muito realizada e
feliz, e eu contente demais por ela. A única coisa que me incomodava era o
desconforto dela com o suposto empréstimo de Nick. Eu queria muito contar
para ela que não deveria se preocupar, que o dinheiro não estava me fazendo
falta, mas ainda não era o momento. Quando o restaurante estivesse mais
firme, eu iria dizer. Não queria o dinheiro de volta. Sabia que ela iria
espernear no começo, mas eu teria que arrumar uma maneira de dizer a ela.
— Ei, você fica sentado aí. Deixa que recolho a louça. Tem que
descansar esse pé! — ralhou ela quando tentei juntar os pratos da mesa.
— Sabe, Soph… posso me acostumar a ser servido.
— É temporário, campeão! Não se acostume! — Ela deu uma risada.
— Já não está na hora de botarmos mais gelo nesse pé?
Assenti com a cabeça e fui com a muleta até o sofá. Para uma pessoa
tão ativa como eu, essa dificuldade na locomoção era extremamente irritante,
mas Soph domava o meu temperamento. Com ela por perto, eu quase
esquecia dessa merda de tornozelo. Soph veio com a bolsinha de gelo. Abri
aquela bota ortopédica e era um alívio sentir o pé respirar. Elevei-o num
banquinho à minha frente. Ela pôs o gelo no meu tornozelo e sentou-se ao
meu lado. Entrelacei meus dedos nos dela.
— Te amo tanto, principessa. Desde sempre — Beijei-lhe os nós dos
dedos.
— Também te amo, amore mio. — Ela acariciou meu rosto.
— Noah, ouço a trilha sonora de Dirty Dancing pelo menos uma vez
por semana. Você vai aguentar isso? — Ela arqueou as sobrancelhas.
— Soph, você está falando com um atleta de alto nível. Sei que as
melhores conquistas requerem os maiores sacrifícios.
— Que bom que você é tão altruísta, meu amor. — Ela beijou o meu
pescoço.
— Soph, a única coisa gelada em mim agora é o tornozelo. — Mordi
o lóbulo da orelha dela.
— Ah, é? E o que você quer fazer a respeito disso? — debochou ela.
— Só você pode me ajudar, principessa!
— É mesmo? Como posso ajudá-lo?
— Tire a roupa, Soph… — declarei entredentes.
— Tudo para ajudar na sua recuperação.
Soph levantou-se e lentamente começou a se despir. Com os olhos
fixos em mim, ela sabia me provocar. Ah, sim, aquela mulher sabia como
deixar o meu pau duro. Ainda sentado no sofá, tirei a camiseta. Quando eu ia
tirar as calças, ela veio até mim, só de calcinha e sutiã.
— Deixa eu te ajudar com isso… — Ela ajoelhou-se na minha frente,
puxou a minha calça pelas pernas e depois a cueca. — Adoro um soldado que
sempre está pronto para o combate. — Ela riu, olhando para a minha ereção.
Nem deu tempo de falar nada, porque logo aquela boca quente e
deliciosa já estava me abocanhando e… caralho! Como era gostoso sentir
aquela sucção, aquela língua me lambendo… E, enquanto ela me tinha
naquela boca deliciosa e carnuda, olhava fixamente para mim. Se existia uma
visão que me desse mais tesão do que aquela eu desconhecia.
— Soph, para… Assim vou gozar, e eu preciso te comer!
Ela parou, mas ainda ficou me encarando. Lentamente, ficou de pé,
desabotoou o sutiã, jogando-o para longe. Depois, tirou a calcinha e jogou no
meu rosto. Cheirei-a e sorri para ela. Soph foi até o quarto e eu quase gritei de
tão duro e desesperado, mas ela tinha ido buscar uma camisinha. Com um
sorriso diabólico, desenrolou o preservativo no meu pau, e eu já estava
desesperado demais por ela.
Soph sentou-se no meu colo, agarrei-a pela bunda e ela deslizou
contra a minha ereção, tão molhada e tão entregue que, nem que quisesse, eu
poderia ir devagar. Ela começou a cavalgar e, para me deixar ir mais fundo,
agarrou o encosto do sofá. Enfiei a cara naqueles peitos deliciosos que
balançavam diante de mim, abocanhando-os, sugando-os, saboreando-os…
Ah, Soph era gostosa pra cacete.
— Você me enlouquece, principessa. Todos os dias eu durmo e
acordo pensando em te foder de uma maneira diferente.
— Que bom… — Ela ofegou. — Porque todos os dias eu durmo e
acordo pensando em ser fodida de uma maneira diferente.
Soph se entregar tão completamente ao sexo, sem amarras, sem
nenhum pudor, me dava ainda mais tesão. Aquela mulher era a própria
expressão do desejo que pulsava em mim, descontrolado, ardente…
— Principessa… — Posicionei meu dedo no clitóris dela,
friccionando mais e mais conforme ela rebolava. — Goze para mim.
Eu precisava que ela gozasse, pois não sabia por quanto tempo ainda
poderia me segurar. Quando ela cravou as unhas nos meus ombros e
entreabriu os lábios, eu sabia que ela estava chegando lá.
— Ah, Noah… — gritou ela.
Bom, aí, meus amigos, era game over. Fui derrotado. Não dava mais.
Sentindo que ela se apertava contra mim, gozei também.
— Você é tão gostosa, Soph, cacete… — grunhi no ouvido dela.
Ela sorriu, passou as mãos nos meus cabelos e saiu de cima do meu
colo, sentando-se ao meu lado.
— Será que a gente devia estar transando tanto? Desde que você
chegou em casa, temos feito sexo todos os dias… — Ela tinha uma expressão
preocupada.
— O médico do time disse que sexo é extremamente benéfico para o
meu caso.
— É mesmo? — Ela arregalou os olhos.
— Não. — Eu ri.
— Idiota! — Ela deu um tapinha no meu braço. — Estou falando
sério.
— Soph, não há nenhuma restrição ao sexo. Quebrei o tornozelo, não
o pau.
— Fico preocupada de estarmos prejudicando a sua recuperação.
— A única coisa que vai prejudicar a minha recuperação é ter você
assim, tão deliciosa, perto de mim e não poder fazer nada. Você está
ajudando um pobre homem enfermo, é um ato de caridade.
— Como você joga baixo fora de campo, Noah — zombou ela.
— Está sendo assim tão ruim transar comigo todos os dias?
— Oh, um sacrifício terrível! — Ela levou o antebraço à testa, de
modo dramático.
— Sinto muito por exigir tanto de você. — Mordi-lhe o queixo.
— Se pudesse, eu não faria outra coisa na minha vida — disse ela,
soltando uma risada.
— Pronta para o segundo tempo? — Eu a desafiei.
— Sempre. — Ela sorriu.
Ah, Soph… eu já estava viciado em você…
Eraarmadilha
uma emboscada. Cilada, sabem? Pois bem, era naquele tipo de
que Noah e eu havíamos caído. Achávamos que iríamos jantar
com Anna, mas ao entrarmos na Cantina da Mamma lá estavam os meus pais
e meus irmãos, além da nonna Violetta. Isso não me cheirava nada bem…
— É impressão minha ou estamos sendo encurralados? — disse
Noah entredentes.
— É o que parece… — Dei uma risada nervosa.
— É uma festa e ninguém nos contou? — Noah se dirigiu à mesa,
com as muletas, sorrindo.
— Venha, sente aqui. — Anna puxou uma cadeira para ele. — É
apenas uma reunião familiar.
— A verdade é que vocês não podem mais continuar vivendo em
pecado — repreendeu nonna Violetta.
— Mamma! — ralhou Anna.
— Mas a verdade é essa, Anna! Eles precisam viver uma relação
decente, cáspita! — Nonna bateu na mesa.
— Alguém pode nos explicar o que está acontecendo aqui? —
Sentei-me ao lado de Noah na cadeira indicada pela mãe dele.
— Bambina, vocês estão morando juntos há dois meses e nem sequer
me pediram permissão! — Meu pai estava exasperado.
— Babbo… — suspirei —, fomos jantar com você logo que
começamos o namoro. Noah e eu comunicamos a você e à mamma. Não
estou entendendo.
— Namoro é cada um na sua casa, Soph! Isso não é namoro! Vocês
precisam se casar! — retrucou babbo.
Nick estava gargalhando. Cretino! Divertindo-se às nossas custas!
— Quais são as suas intenções com a Soph? — perguntou Angelo,
meu irmão mais velho, com cara de poucos amigos.
— Angelo, isso não pode ser sério! — Noah deu uma risada
debochada. — Qual é a minha intenção com a Soph? Caramba, nós estamos
morando juntos! A minha intenção é ter Soph na minha vida!
— Então faça dela uma mulher honesta! — exigiu nonna Violetta.
— Ei, nonna, calma aí! — Noah tocou suavemente no braço da avó.
— Soph é uma mulher honesta. E maravilhosa. Não há nada de desonesto no
que estamos fazendo.
— É pecado! — rebateu a nonna.
Dio santo! A noite seria longa…
— Se você está tão coberto de boas intenções, por que não se casa
logo com ela? — Angelo colocou um pedaço de crostata na boca.
— Ei! — interrompi. — O que vocês pensam que estão fazendo? O
meu relacionamento com Noah é um assunto particular! Não temos que ficar
discutindo nada em público!
— A partir do momento em que ele escolheu te desonrar, isso se
reflete em toda a família! — resmungou Angelo.
— Por favor, continuem. Isso está parecendo uma refilmagem de O
Poderoso Chefão! — Nick deu uma gargalhada.
— Nicolas! Pare de deboche! A vida da sua irmã está em jogo! —
ralhou babbo.
— Francamente! Vocês acham que eu era uma donzela indefesa e
que fui deflorada por Noah quando me mudei para a casa dele? Isso é
ridículo! — declarei, num tom irritado.
— Soph, vocês precisam se casar e…
— Luiggi, chega! — gritou mamma.
Todos na mesa ficaram em silêncio e com os olhos arregalados.
Claudia Di Lucca se alterava poucas vezes, mas quando aquilo acontecia
todos abaixavam a cabeça.
— Deixem de ser ridículos! Luiggi me disse que era um jantar de
família, e é isso o que vamos fazer. Noah está se recuperando de uma lesão
grave, não precisa de mais estresse! Soph é uma mulher adulta e
independente. Ela escolhe fazer o que quiser da própria vida. Não há pecado
nenhum em duas pessoas que se amam ficarem juntas. Vamos jantar em paz
— sentenciou minha mãe.
— Tudo bem, mamma — concordou Lorenzo, meu irmão. — Mas,
se você fizer qualquer coisa para magoar a Soph, quebraremos seu outro
tornozelo! — Ele apontou para Noah.
— Anotado, Lorenzo. Pode deixar — zombou meu namorado.
— Mas ainda acho que vocês precisam oficializar isso… — Babbo
tinha um tom de decepção.
— Luiggi… — Minha mãe lançou-lhe um olhar de censura.
— O padre Rossi vai ficar arrasado. Ele batizou vocês, fez a primeira
comunhão… — queixou-se nonna Violetta.
— Nonna… — Noah pegou a mão da avó. — Nós vamos nos casar.
Na igreja, com tudo a que Soph tem direito. No momento certo.
— Só espero que eu ainda esteja viva! — Nonna deixou os ombros
caírem em posição de derrota.
— Vamos nos casar, é? Na igreja e com tudo a que eu tenho direito?
— sussurrei no ouvido de Noah.
— Você não quer se casar na igreja? — Com os olhos azuis
arregalados, Noah parecia assustado.
— Quero. Só não sabia que você também desejava isso.
— Sim. Farei de você uma mulher honesta — caçoou ele.
— Ridículo! — Dei um tapa na perna dele.
— Soph — Anna sentou-se a meu lado —, desculpe, realmente não
imaginei que o nosso jantar ia se transformar neste circo. — Ela deu uma
risada cansada.
— Conheço bem o meu pai e os meus irmãos, Anna. Fique tranquila.
— Afaguei as mãos dela.
Finalmente os ânimos se acalmaram. Anna foi para a cozinha
preparar pizzas e decidi ajudá-la. Além disso, precisava falar com ela. Havia
algo me agoniando e eu queria compartilhar. Acreditava que ela saberia a
coisa certa a fazer.
— Anna… — chamei-a enquanto colocava a touca na cabeça,
entrando na cozinha.
— Oi, Soph. Você não precisa me ajudar hoje, cara mia. Fique com
a sua família. — Ela sorriu.
— Não, na verdade é bom poder respirar um pouco. E também
preciso falar com você.
— Está tudo bem? Por que essa carinha? — Ela acariciou minha
bochecha.
— Sim, eu só… Eu tinha me inscrito há um tempo para um curso de
gastronomia na Toscana… e havia até esquecido, na verdade. Mas recebi
uma carta esta semana dizendo que fui aprovada. O curso é no mês que vem.
— Mas isso é maravilhoso, Soph! Parabéns! — Ela me abraçou.
— É, mas Noah ainda está em recuperação e…
— Ah, bambina, nem pense nisso! Noah está em franca melhora!
Todos estão muito confiantes de que logo ele voltará a jogar. E ele vem
lidando muito bem com a situação. Além do mais, meu filho detestaria que
você se privasse de fazer alguma coisa por causa dele.
— Você acha mesmo? Eu não queria deixá-lo neste momento.
— Soph, tenho certeza do que estou falando! Você merece fazer o
curso. Noah está bem cuidado. Vou levar comida todos os dias enquanto você
estiver fora, fique tranquila.
— Ah, Anna, nós o mimamos tanto… — Eu ri. — Mas ele merece.
— Sim, e você também. Faça o seu curso e traga receitas
maravilhosas para nós. — Ela beijou a minha testa.

Chegamos em casa e decidi que, sim, Anna estava certa. Mas me


doía o coração dizer para Noah que justamente naquele momento ficaria
longe dele por um mês. Parecia que eu não conseguiria mais ficar um dia
sequer distante dele.
— Noah, precisamos conversar…
— Ah, meu Deus, eu fiz alguma coisa? — As sobrancelhas dele se
uniram até quase virarem uma só.
— Não. — Eu ri.
— Ufa! Achei que tinha falado alguma merda durante o jantar. —
Ele agora se movia com bastante desenvoltura com as muletas.
— Você foi perfeito, como sempre. A sua calma me impressiona. —
Sentei-me ao lado dele no sofá.
— Muito treinamento, Soph. Futebol americano também exige
estratégia e paciência. — Ele sorriu.
— Noah, eu me inscrevi há algum tempo em um curso de culinária
na Toscana, com uma chef maravilhosa de lá, a Antonella Maggiore. E fui
aprovada.
— Parabéns, Soph! Isso é sensacional! — Ele abriu um grande
sorriso.
— Você ouviu o que eu disse? O curso é na Toscana.
— Maravilhoso, Soph! Onde mais aprender sobre culinária italiana,
senão na Itália?
— O curso é no mês que vem, e eu ficaria um mês fora. Não queria
te deixar neste momento, com a sua recuperação…
— Alto lá, signorina! — Ele pegou minha mão e beijou a palma. —
Eu estou bem, Soph. Nem imaginava que me recuperaria tão rápido. Todos
ficaram impressionados, estou confiante. E devo muito disso a você. Ao fato
de estar aqui nos últimos dois meses. Você me tranquilizou. Ser amado todos
os dias é o que me deixou mais forte. Não posso permitir que você abra mão
do que quer que seja por minha causa. A sua felicidade é a minha felicidade,
principessa.
— Jura? Você não vai ficar chateado?
— Não. Vou sentir muitas saudades, vou dormir cheirando suas
calcinhas. Contar cada um desses trinta dias com ansiedade, mas ficarei
muito feliz por você dar mais um passo importante na sua carreira. — Ele
pegou meu rosto entre as mãos e me deu um beijo.
— Ah, Noah, come ti amo…[53]
— Anche io, principessa.
— Noah?
— Diga, amore mio…
— Você realmente quer se casar comigo na igreja?
— Quero. Sonho com o dia em que te verei vestida de noiva. E sonho
mais ainda com a noite de núpcias.
— Você é tarado! — Bati no braço dele.
— Você me deixa assim, bella mia. A culpa é sua! — Noah me
beijou.
— Nem viajei ainda e já estou com saudades…
— Eu também, Soph, mas seu curso vai me beneficiar muito. Você
terá novas receitas — Ele riu.
Nas últimas semanas, eu estava trabalhando como uma louca e Noah
vinha se exercitando religiosamente nas dependências do Giants. Ele se
dedicava como se fosse entrar em campo no Super Bowl, que ocorreria dali a
alguns dias. Eu sabia que ele estava chateado por não poder jogar, mas ele
não se lamentava, não reclamava. Noah era tão determinado e se mantinha
tão otimista que minha admiração só crescia. A cada dia que passávamos
juntos, conseguia me apaixonar ainda mais.
E qual não foi a minha surpresa ao ver que eu não tinha preparado
nada para Noah no Dia dos Namorados! Havia corações e flores por todos os
lados em Nova York, e no meu restaurante não era diferente. O Modern Pasta
vinha fazendo cada vez mais sucesso, mas as demandas do negócio, somadas
à minha viagem, estavam me deixando louca. Fiquei muito triste por não ter
conseguido preparar nada especial para Noah.
— Que cara é essa, Soph? — Adri se aproximou do balcão.
— Sou uma péssima namorada! Não preparei nada especial para
Noah! Que droga!
— Ah, Soph, você está trabalhando tanto… Ele vai entender. E, com
o fogo que vocês têm, só ponha uma boa lingerie e ele ficará mais do que
satisfeito — debochou ela.
— Ridícula! — Eu ri. — E o que você e Nick vão fazer?
— Seu irmão disse que vai cozinhar para mim. Devo ficar com
medo?
— Não. Nick é um cozinheiro decente. E tenho certeza de que ele vai
se esforçar mais ainda hoje. — Pisquei para ela.
Eu ainda me sentia mal por ser tão relapsa quando fechei o
restaurante. Não tinha conseguido parar para sequer comprar um bombom.
Então separei alguns ingredientes na cozinha para fazer spaghetti alla
carbonara, o prato favorito de Noah. Pelo menos um bom jantar e um bom
vinho nós teríamos.
Quando abri a porta do apartamento, estava tudo escuro e Bono veio
me receber. Estranho… Noah já deveria ter chegado. Quando eu ia acender as
luzes, várias pequenas lâmpadas em formato de coração se iluminaram nas
paredes.
— Feliz Dia dos Namorados, principessa! — Ele estendeu um buquê
de peônias. — Sabe, eu iria até você, mas as muletas não facilitam.
Enquanto andava até ele, vi que havia um caminho com pétalas de
rosas no chão.
— Meu Deus, Noah! — Eu o abracei apertado. — É tão lindo…
Nem sei o que dizer.
— Só diga que vai me amar para sempre, principessa. — Ele beijou
o meu pescoço.
— Eu te amo desde sempre e te amarei por toda a eternidade, dolce
principe.[54] — Dei uma mordida suave em seu lábio inferior.
— Não vai ser a experiência completa, porque eu queria te servir,
mas hoje eu cozinhei. — Ele tinha um ar satisfeito.
— Ah, é? E o que você fez? — Fui até a cozinha, ele vinha atrás com
as muletas.
— A única coisa que sei fazer bem: pizza. — Ele riu. — Mas fiz uma
diferente.
— Meu Deus, que coisa fofa! — gritei ao abrir o forno. — Você fez
uma pizza em formato de coração?
— Sim. Pepperoni.
— Minha favorita! — Bati palmas.
— Eu sei.
— Ah, Noah, estou me sentindo tão mal… Não preparei nada. Ia
fazer spaghetti alla carbonara para você. Mas você já pensou em tudo —
suspirei.
— Principessa… — sussurrou ele no meu ouvido, e aquele simples
contato, a voz grave e baixa, era suficiente para causar arrepios por todo o
meu corpo. — Você é o meu presente, especialmente pelada na minha cama.
— Ah, um homem tão fácil de satisfazer… — trocei.
Noah me puxou para ele, largando as muletas no chão.
— Eu te disse: você é gostosa demais e cozinha bem. Não preciso de
mais nada, Soph. — Ele mordeu o meu queixo. E eu sentia a ereção dele
contra mim.
Noah enganchou as mãos no meu cabelo e me beijou com desejo,
como sempre. Sua língua me invadia — ele era um atacante, afinal. E aquela
sensação era sempre tão maravilhosa. Aquela língua aveludada, quente,
exigente, explorando cada espaço. Depois ele deslizou com a boca pelo meu
pescoço e quase me fez esquecer que ainda se recuperava de uma lesão, me
agarrando com aqueles braços fortes, tatuados…
O calor dele me inebriava, o cheiro dele me enlouquecia. Levantei a
camiseta dele e passei as mãos por aquele abdômen trincado por horas de
treinamento, explorei pela milésima vez cada um daqueles desenhos… Ele
agarrou a minha bunda e eu sabia que o jantar ficaria para depois.
Ah, Noah… seria um inferno ficar um mês sem você…
Ogrande dia havia chegado. O Super Bowl. Agora era tudo ou nada.
Mesmo sem poder entrar em campo, obviamente eu estaria no banco para
apoiar o meu time. O jogo seria na casa do New England Patriots, nosso
adversário. Ali, no banco do Gillette Stadium, em Massachusetts, eu estava
mais tenso do que em todas as vezes que havia disputado grandes partidas.
Eu era responsável por aquele time, afinal, não importava a posição em que
estivesse naquele momento.
O jogo começou e senti um nervosismo na equipe em campo. Mesmo
que eu estivesse fora do campeonato, Phill confiava plenamente em mim e
me ouvia bastante em relação às jogadas. Ele sabia que o time me respeitava
e entendeu que era importante que eu estivesse ali com a equipe.
— Você faz falta em campo. O grupo está visivelmente desestruturado
— constatou o treinador.
— Calma, ainda tem muito jogo pela frente. Vamos recuperar. — Dei
um tapinha no ombro dele.
Mas a verdade é que o tempo passava, e o time não encontrava seu
rumo no jogo. Não estávamos sendo atropelados, mas tínhamos muita
dificuldade. O Patriots estava jogando redondo, e a nossa equipe não
conseguia finalizar bem os passes. Stevens estava puto, porque mesmo
quando ficava livre, nosso quarterback, Edward Kern, não conseguia dar
bons passes. Por mais que eu o tivesse orientado, parecia lhe faltar visão de
jogo.
— Kern está nos fodendo nesse jogo! — gritou Phill e jogou o boné no
chão.
O treinador novamente pediu tempo. A torcida do Giants, presente na
casa do adversário, gritava o meu nome. Eu tinha visto vários cartazes com
inscrições do tipo “Sentimos sua falta, Lacox”, mas fingi que não tinha
percebido.
— Puta que pariu! — Stevens veio em minha direção, segurando um
isotônico. — Eu sabia que Kern era ruim, mas não sabia que era péssimo!
Como que contratam um jogador desses?
— Calma, mano! Vocês têm que jogar juntos. Depois quebrem o pau.
Mas agora temos que tentar resolver.
— Como vou resolver com um quarterback que não acerta a porra dos
passes? — rugiu Stevens.
Eu queria ter algo a dizer para ele, mas a verdade é que também não
entendia como podiam ter comprado um jogador tão ruim. O desnível dele
para Tom Brady, que por um acaso era o quarterback do time adversário, me
dava vontade de chorar. E eu queria tanto enfrentá-lo. Brady era um ídolo.
Seria uma honra entrar em campo contra ele, mas enfim…
Perder não é legal para ninguém. Perder um Super Bowl era terrível.
Ver a derrota se desenhando diante de você e não poder fazer nada é
inexplicável. Nem sequer consegui ficar puto. Eu estava triste. Tudo aquilo
pelo que lutamos estava ali escorrendo por entre nossos dedos. E aí era isso.
Acabou. Fodeu-se. Perdemos.
— Nem que eu tenha que colocar essa porra de tornozelo de volta na
marretada, meu irmão, você vai voltar na temporada que vem! — Stevens
saiu gritando de campo.
— Estarei de volta. O prognóstico é bom. E vou voltar para levarmos o
Super Bowl. Não aceito menos do que isso. — Dei tapas nas costas dele.
— É o mínimo que espero! — Ele retribuiu com um sorriso sem graça.
Pegamos o voo de volta para Nova York no mesmo dia, em silêncio. O
que mais havia para dizer? Nada.
— Lacox… — uma voz vinha do assento de trás —, está dormindo?
— Não.
Kern levantou-se e sentou ao meu lado.
— Cara, eu sinto muito. Tentei, mas não consegui, não sei o que me
deu… — Ele estava visivelmente transtornado.
— Kern, já foi. Não tem por que ficar se lamentando. Perdemos. É
uma merda. Mas já foi. Nos esforçaremos mais no ano que vem.
— Sabe, eu consigo entender por que você é o líder do time… Não é
só a sua habilidade em campo. Eu jamais conseguiria ter a calma que você
tem.
— Sempre penso que, enquanto posso lutar, vou dar o máximo que
tenho. Enquanto existir a mínima possibilidade, eu vou lutar. Ninguém jamais
vai me ver desistir. Mas, se a derrota já se consumou, não há mais nada a
fazer a não ser levantar e se preparar para a próxima batalha. Então, Kern,
levante-se. Teremos muito trabalho para a próxima temporada. — Dei um
tapa no braço dele.
— Valeu, Lacox. Pensei que você faria eu me sentir um merda por ter
assumido sua posição e não ter conseguido responder à altura.
— Eu não agiria assim. Não sou esse tipo de pessoa. — Tranquilizei-o.
— Agora eu sei. Obrigado. — Ele voltou para a poltrona atrás de mim.
Aquela conversa me fez lembrar do dia em que fui selecionado pelo
Philadelphia Eagles para iniciar minha carreira profissional. Fui fechando os
olhos, sonolento, e a imagem daquele dia logo veio à mente.

Minha mãe corria de um lado para o outro e tinha um grande sorriso


estampado no rosto. A Cantina da Mamma estava cheia de amigos,
comemorando o fato de eu ter sido selecionado para jogar profissionalmente
pela NFL.
— Mamma, você acredita que o meu pai estaria orgulhoso? —
questionei, entrando na cozinha, onde ela assava mais uma fornada de pizzas.
— Orgulhoso? Ele não caberia em si…
— Fui selecionado logo pelo Eagles, o maior adversário do Giants.
— Meu filho, seu pai não só entenderia como te daria total apoio. E
tenho certeza de que ele torceria por você, ainda que isso significasse torcer
contra o Giants. Noah, você é o nosso maior tesouro. O homem que você se
tornou era exatamente o homem que o seu pai sonhava que você se tornasse.
— Ela me deu um beijo na bochecha.
— Vou trabalhar duro, mamma. Para deixá-la sempre orgulhosa e
honrar a memória do meu pai.
— Eu sei disso, amore mio. Você já me orgulha demais. É só continuar
sendo quem você é. Lembra do que eu te disse no primeiro dia em que você
foi treinar futebol? — disse ela, sorrindo.
— Lembro. — Sorri de volta. — E sigo sempre os seus conselhos.
— Ótimo. Lembre-se sempre disso, figlio mio: se quiser vencer em
qualquer coisa na vida, precisa se esforçar, trabalhar duro, batalhar. Mas
jamais, em hipótese alguma, passe por cima de alguém. Nunca seja
desonesto, nunca faça mal a ninguém. Sempre ajude quem precisar. E a
recompensa virá. — Ela ficou na ponta dos pés e eu abaixei para que ela
pudesse beijar a minha testa.

O solavanco do avião pousando me despertou. Ainda era madrugada


quando chegamos. Eu estava muito cansado, como se tivesse jogado. No
ônibus da equipe, todos estavam em silêncio. Me despedi rapidamente dos
companheiros de time, e Stevens me ajudou a descer em frente ao meu
prédio. Eu já vinha me virando bem, mas ainda era uma merda ficar de
muletas e bota ortopédica.
Como era esperado, Soph ainda estava dormindo. Bono veio correndo
e se esfregou nas minhas pernas.
— É, Bono… Se você tivesse entrado em campo hoje, as coisas teriam
sido diferentes. — Com algum esforço, coordenando as muletas, abaixei para
afagar-lhe a cabeça.
Larguei a bagagem na sala e fui até o quarto. Soph desacordada era a
própria visão da paz. Mas ver aquela bunda deliciosa me despertava muitos
pensamentos, nenhum deles exatamente pacífico. Tirei a roupa e me deitei ao
lado dela.
— Noah? — Ela bocejou. — Você está bem, dolce principe? — Ela
abriu os olhos, enevoados de sono, e acariciou meu rosto.
— Melhor agora, ao seu lado. — Beijei sua testa.
— Eu sinto muito mesmo pela derrota. Puxa vida…
— Eu sei, principessa. Mas passou. Agora é só lutar para voltar a jogar
o quanto antes.
— O time não é nada sem você. — Ela deu um meio sorriso.
— Não é bem assim, principessa. Mas vou aceitar essa massagem no
ego — brinquei.
— Senti sua falta… — murmurou ela com a voz sonolenta.
— Eu também… Vem cá. — Abri os braços e ela se acomodou em
meu peito.
Ter Soph tão perto de mim, sentir seu calor e seu cheiro, fazia com que
eu acreditasse que tudo ficaria bem. Com ela ao meu lado, tudo se acertaria.
Ela adormeceu e fiquei acariciando seus cabelos. Eu estava muito cansado,
mas não conseguia pregar os olhos. Peguei o celular e logo vi que tinha sido
um erro. Todos os sites esportivos obviamente falavam sobre o Super Bowl,
mas com isso vinham muitas especulações sobre o meu futuro — se eu
poderia jogar novamente no mesmo nível.
Confesso que vinha tentando me manter otimista e me esforçando ao
máximo para não dar brecha a pensamentos idiotas. Mas às vezes a
insegurança batia. Eu também não tinha como saber de que maneira ocorreria
o meu retorno aos campos. Estava indo bem, com a recuperação acima da
média, mas como seria o meu retorno? Isso só o tempo diria.
O importante era que, naquele momento, eu tinha tudo de que
precisava: dinheiro jamais iria me faltar. Eu gastava pouco e já tinha ganhado
muito mais do que sequer sonhava na vida. A mulher que eu amava estava
bem ali, aninhada nos meus braços. O gato mais legal do mundo dormia aos
meus pés. E aquele era mais um momento para seguir mais uma das lições do
infindável poço de sabedoria que era a minha mãe: antes de qualquer coisa,
seja grato. E era isso o que eu faria. Seria grato pelo que tinha conquistado
até ali. Não tinha como controlar o futuro, apenas desfrutar do presente.
Noah estava muito chateado, mas ele fazia um excelente trabalho em
esconder a própria frustração. Mesmo com o peso da derrota no Super
Bowl, continuava treinando todos os dias, totalmente focado na recuperação.
Ele se cobrava muito, e eu sabia que estava carregando o peso da derrota nos
próprios ombros. Noah sentia culpa, mesmo sem ter entrado em campo, ou
justamente por isso.
A minha viagem estava se aproximando, então me esforcei para
deixar as coisas em ordem no restaurante, ao mesmo tempo que queria passar
mais tempo com o meu namorado. Não era uma equação muito fácil de
resolver, mas vínhamos nos ajustando. Quando eu chegava à noite, ele já
estava em casa, esperando por mim. Todos os dias ele tinha um sorriso no
rosto, não importava quanto estivesse sendo bombardeado pela mídia. Havia
especulações por todos os lados sobre se o reinado de Noah Lacox havia
chegado ao fim. Se fosse com qualquer outra pessoa, poderia ser uma
devastação. Para ele, era apenas mais gasolina jogada em sua fogueira de
motivação. Ele queria provar que voltaria melhor do que antes.
Naquela tarde, resolvi sair mais cedo do restaurante. Adri tomaria
conta de tudo. Fui para casa disposta a fazer uma surpresa para Noah —
ainda me sentia mal por não ter conseguido preparar nada especial no Dia dos
Namorados. Tomei banho, pus a minha melhor lingerie e fui para a cozinha.
Ele sempre brincava que sexo e comida eram as coisas que mais o faziam
feliz. Que bom que eu podia proporcionar as duas. Enquanto cozinhava e
cantava embalada pela trilha de Dirty Dancing, ouvi o som da notificação de
mensagens no meu celular. Era o meu irmão.
Nick: Soph, você está bem?
Franzi o cenho. Que estranho…
Eu: Estou ótima, Nick. Por quê?
Nick: Você não viu as notícias, então?
Eu: Que notícias? Aconteceu algo com Noah?
Nick: Não. Soph, desculpe… A essa altura pensei que você já tinha
visto. Não ligue para nada que estão dizendo.
Meu coração gelou. Peguei o celular e digitei Noah Lacox no
navegador. O motivo da preocupação de Nick logo veio à tona. Várias e
várias manchetes sobre a recuperação dele apareceram. As pessoas,
maldosamente, questionavam diversos aspectos do treinamento e da vida
particular dele. E um dos alvos não tinha nada a ver com a fisioterapia ou os
exercícios. Eu estava na mira.
“A decadência também fora dos campos. Como o quarterback do
Giants Noah Lacox foi disso para isso?” Uma das reportagens estampava essa
manchete e trazia fotos de modelos com as quais Noah havia tido algum tipo
de relacionamento e ao lado imagens minhas como comparação. De onde as
pessoas tinham tirado aquelas fotos? Estavam me perseguindo? Segundo a
matéria, estar comigo era um retrocesso na vida dele. O site me identificava
como uma amiga de infância rechonchuda.
“A recuperação de Lacox: será que o jogador está cuidando da
dieta?” Já essa outra matéria fazia várias especulações sobre o nosso cardápio
e estilo de vida. Todas elas falsas. Aquelas pessoas sequer me conheciam,
mas faziam questão de falar sobre mim. Diziam que eu era mais conhecida
por ter ganhado um reality show abusando de massas e comidas calóricas.
Que aquela vitória me rendeu um bem-sucedido restaurante, mas que as
minhas escolhas alimentares poderiam prejudicar a carreira de Noah. Oi?
“Na dor, buscando o conforto da infância.” Já essa aqui dizia que era
natural que, num momento em que Noah se sentia fracassado, ele buscasse
conforto nos braços de uma figura familiar, e faziam uma análise: “Quando
ele se recuperar e retornar às festas que frequentava, provavelmente voltará a
circular com as modelos com as quais saía antes. Sophia Di Lucca é uma
mulher muito bonita, à sua maneira. Mas os padrões dos atletas são altos.”
Quem eram aquelas pessoas? Por que estavam fazendo aquilo? Por
que queriam me agredir? Por que me comparavam a mulheres que eu sequer
conhecia? Qual era o problema em estar fora dos chamados padrões? Eu ser
dona de um restaurante italiano e gostar de comer interferia na recuperação
de Noah? Estava ficando difícil respirar. Me joguei no sofá e fiquei
encarando o celular, incrédula. Comecei a chorar. Eu estava me sentindo tão
humilhada… Simplesmente não entedia como pessoas desconhecidas podiam
ser tão cruéis. Bono sentou-se a meu lado e esfregou a cabeça na minha
perna.
— Sabe, Bono… — eu soluçava —, às vezes as pessoas são umas
filhas da puta!
E, ali, sentada e chorando, fiquei pensando se aquelas pessoas teriam
alguma razão. Noah era um homem lindo. Com todos os músculos nos
lugares certos. Ele era rico, bem-sucedido. Eu estava começando a construir
minha carreira e para os padrões dominantes era gorda. Na minha família,
isso nunca foi problema. Minha mãe sempre me disse que eu era uma mulher
linda e, quando alguém fazia algum tipo de piada na escola, ela me defendia.
Noah também. Mas será que ele realmente me achava bonita? Ou será que
confundia a nossa história, a nossa amizade, com desejo e amor? Chorei mais
ainda e me deitei no sofá, derrotada. Algumas palavras tinham o dom de
perfurar a nossa alma, mesmo que viessem de desconhecidos. Não era a
primeira vez que me machucavam por causa da minha aparência. Aqueles
jornais trouxeram uma lembrança não muito agradável, do ensino médio.

Abri o meu armário para pegar os livros da aula seguinte. Um papel


caiu no chão. Mais um bilhete. Eu já havia perdido as contas de quantos
tinham deixado para mim…
Se você não comesse tanto, talvez Noah fosse mais do que apenas um
amigo. Mas, com essa aparência, ele nunca vai querer nada com você.
Eram sempre anônimos. Mas eu sabia que vinham do grupo de
Regina Atkins. Que ódio! Por que não me deixavam em paz? Desde que
souberam que Noah havia me convidado para o baile, nunca mais tive
sossego. Eu estava cansada demais. Fingia não me importar, mas a verdade é
que ser alvo de tantas piadas, tantos cochichos e comentários maldosos estava
sendo difícil demais para mim. Não aguentei segurar mais e chorei. Bati a
porta do armário e fui correndo em direção ao banheiro.
— Soph! — Aquela voz. Não, agora não.
Apertei o passo. Não queria que ele me visse.
— Soph, espere! — Noah segurou o meu braço.
— O que foi? — Eu o encarei irritada.
— Você está chorando? O que houve?
— Nada, não aconteceu nada…
— Alguém fez alguma coisa? Me conte. — Ele segurou a minha
mão, que estava fechada. — O que é isso aqui? — Então pegou o papel
amassado e leu o humilhante bilhete. Que raiva!
— Não quero conversar agora. Está todo mundo me olhando. —
Chorei mais.
— Ei, Soph… — Ele secou as minhas lágrimas com o polegar. —
Você é linda.
— Você me convidou para o baile por causa disso, não foi? Porque
ficou com pena.
— Claro que não. Quero ir com você, Soph. Não há mais ninguém
que eu quisesse convidar.
— Por que, Noah? Elas são mais bonitas do que eu…
— Quem disse isso? — Ele arqueou as sobrancelhas.
— Todo mundo…
— Sabe, Soph… É como minha mãe diz: eu não sou todo mundo.
Eu ri. Ele sempre sabia como fazer eu me sentir melhor.
— Elas me odeiam. Não entendo o motivo.
— Inveja. Você é melhor que todas elas juntas. Mais bonita, mais
inteligente e mais feliz. Por isso você é tão especial. — Ele beijou a minha
testa.
— Obrigada, Noah.
— Sempre estarei ao seu lado, Soph. Não vou deixar ninguém te
machucar. — Ele me abraçou e saímos juntos, pelo corredor, observados por
vários olhares curiosos.

O barulho na fechadura me trouxe de volta daquelas lembranças


dolorosas. Ah, droga, Noah já tinha voltado e ia me ver naquele estado!
— Olha só, que cheiro bom… — A voz dele estava animada.
Pensei se deveria sair correndo e me trancar no banheiro ou afundar
mais ainda no sofá. Bom, não adiantaria nada. Eu teria que encará-lo.
— Bom, na verdade, eu tinha planejado fazer um jantar, mas… —
Ah, não. Lágrimas e mais lágrimas. Por que eu não conseguia me segurar?
— O que houve, principessa? — Ele veio apressado, com as muletas,
até o sofá.
— Nada. Só estou triste.
— Por que você está triste? — Ele acariciou os meus cabelos.
— Tenho vergonha de falar.
— Nunca tenha vergonha de mim, Soph, por favor. Me conte o que
aconteceu.
Estendi o celular para ele. Ele pegou o aparelho das minhas mãos e
ficou rolando a tela, com uma ruga no meio da testa. Entortou os lábios,
numa expressão que eu conhecia bem: estava puto.
— Vou descobrir quem escreveu essas merdas. Vou processar todos
esses filhos da puta, Soph!
— Sempre vai ter alguém para me chamar de gorda. Você não pode
processar todo mundo.
— Posso. Vou processar quem fizer mal a você. Ou processo ou
enfio a porrada, mas alguma coisa vou fazer — bufou ele.
— Noah… será que o que você sente por mim não é conforto? Será
que você não está tão acostumado comigo que confundiu as coisas?
— Ah, não! Essa não, Sophia! — Ele me encarou.
— Sei quanto o seu coração é bom. Talvez você esteja…
— Não, Soph… Eu não vou ouvir isso. Desculpe. Sei que você está
magoada com todas essas merdas que disseram, e tem todo o direito. Mas
você me conhece. E não conhece nenhum desses imbecis. Você vai preferir
confiar neles a confiar em mim, principessa? Não sou um moleque confuso,
Soph. Sou um homem. E sei o que desejo. Você é a mulher que eu quero.
Foda-se o que qualquer pessoa diga. Eu te amo. Essa é a verdade.
— Meu Deus do céu, eu sou ridícula! Como posso ter permitido que
isso me desestabilize dessa maneira? — Enterrei a cabeça no peito dele.
— Porque você é feita de carne e osso, assim como eu. Você acha
que não fico chateado todas as vezes que leio as pessoas especulando se vou
voltar? Falando coisas maldosas a meu respeito? Fico chateado pra cacete! —
Ele me abraçou e beijou o topo da minha cabeça.
— Mas não consigo entender o motivo de tantos comentários
maldosos a meu respeito. Só porque estou acima do peso…
— Você não está acima do peso. Você é muito gostosa… — Ele
beijou o meu pescoço.
— Noah…. — eu ri —, você sabe que para os padrões eu sou gorda.
— Padrões de quem? Para mim, você é perfeita. Adoro a maneira
como as suas coxas macias me prendem bem no meio das suas pernas… Amo
olhar pra sua bunda maravilhosa todos os dias. Você é linda demais,
principessa.
— Ah, amore mio… — Dei uma risada.
— Inclusive estou bem disposto para ficar preso no meio das suas
pernas agora —sussurrou ele no meu ouvido. E eu senti meu corpo incendiar.
— Noah, assim eu não termino o jantar…
— Não importa. Agora eu só quero comer você — gracejou ele.
E só de ver a maneira como ele olhava para mim estremeci. E vi, no
fundo daqueles olhos azuis que eu conhecia a vida toda, que, sim, ele me
queria, ele me achava linda. Por que era tão difícil acreditar naquilo? Por que
as outras pessoas questionavam a nossa relação só por causa da minha
aparência? Não importava. Naquele momento, eu só queria sentir aquele
homem me consumindo.
Meu doce e selvagem Noah.
— Ei, saia da minha cozinha! — Noah deu um tapinha na minha
bunda.
— Só estou tentando ajudar…
— Você já devia saber que ninguém mete a mão na minha massa!
— Não mesmo? — Me posicionei atrás dele e comecei a acariciar
aquela barriga maravilhosa, cheia de gominhos, por baixo da camiseta.
— Sophia Di Lucca — ele pegou as minhas mãos e beijou —, se
você continuar fazendo isso, não vamos ter jantar. E eu quero muito te foder
ali em cima daquela mesa na sala.
— Bom, campeão, a sacanagem vai ter que esperar, já que você
convidou Nick e Adri para jantarem aqui. Além disso, fez questão de dizer
que o jantar era por sua conta.
— Sou ousado, Soph. — Ele sorriu. — Sei que você e Adri são
excelentes chefs, mas confio no meu taco.
— Eu também superconfio no seu taco… — Eu o acariciei por cima
das calças e beijei seu pescoço.
— Soph… — repreendeu ele.
— Ok, vou deixar o pizzaiollo trabalhar! — Ergui os braços em sinal
de rendição.
— E outra coisa: ponha uma calça. Ficar olhando para essa sua bunda
gostosa, nessa calcinha pequena, está me deixando de pau duro. E é horrível
cozinhar nestas condições, sabe? — Ele fez um beicinho.
Resolvi atendê-lo e fui vestir uma calça de pijama. Geralmente, eu
ficava só com uma camiseta velha em casa, mas qualquer argumento era
válido para a chama da sacanagem nos consumir. Nossa relação não era só
carnal, obviamente, mas o fogo que crepitava entre nós era intenso. Noah era
gostoso demais, muito habilidoso na cama e estava sempre a postos. Por que
não aproveitar? E o meu corpo parecia responder a ele automaticamente, era
impressionante.
Eu nunca tive amarras com o sexo, apesar de ser uma mulher
considerada “fora dos padrões”. É claro que muitas coisas me magoaram ao
longo da minha vida, aquela bosta das matérias maldosas dos jornais foi só
mais uma cereja naquele bolo. Mas, perto do que muitas mulheres
enfrentavam, podia me considerar privilegiada. Saí com muitos caras legais,
que estavam a fim de mim e me fizeram sentir desejada. Também houve
outros, como Nuno, que me derrubaram. Mas sempre levantei a cabeça e
segui adiante.
O único que me afetava, de verdade, era Noah. E tinha que ser justa
com ele: em todos os momentos, aquele homem afirmava quanto me desejava
e quanto eu era linda. Desde a adolescência, mesmo quando não tínhamos
nada além da amizade. Muitas vezes, pensei que ele fazia isso por bondade.
Eu sempre o achei tão lindo que tinha dificuldades para aceitar que eu era
linda para ele. Agora não restavam mais dúvidas. Eu sabia que ele me amava
e me queria.
— Melhor assim, senhor? — Dei uma voltinha para mostrar que
estava de calças.
— Não, mas é mais seguro. — Ele me beijou.
— Você acha que esse fogo entre nós vai durar para sempre? —
Sentei-me no balcão que dividia a cozinha e a sala. Ele se virou para me
olhar.
— Tenho certeza que sim, principessa… — E abriu um sorriso
maravilhoso.
— As pessoas sempre dizem que, com o tempo, a paixão esfria…
— Acredito que seja assim em alguns casos. Mas, veja, eu vivi na
mesma casa que meus avós. E até onde meu avô teve saúde presenciei a
paixão que existia entre eles. Claro, a idade chega. Vai ter uma hora em que
não vamos mais transar todos os dias. Vai haver um momento em que eu não
vou mais ter forças para te comer contra uma parede. Mas a sua bunda
sempre vai ser deliciosa para mim. Seus peitos sempre vão me hipnotizar,
mesmo quando não estiverem tão firmes quanto agora. E mais uma coisa: eu
sempre vou te amar, Soph. Como sempre te amei. Mesmo quando o meu pau
não subir mais.
— Você consegue levar um momento completamente romântico para
a mais pura baixaria. — Dei uma gargalhada. — Mas eu te amo mesmo
assim. E sempre vou te amar também. Mesmo quando o seu pau não subir
mais.
— Isso é muito reconfortante. E sempre haverá os dedos e a língua.
— Ele se aproximou de mim, se alojou entre minhas pernas e me deu um
beijo apaixonado.
— Noah… Lacox Jr. está se manifestando.
— É culpa sua. Pare de me atentar, sua diaba! — Ele riu e voltou à
pia.

Era a primeira vez que jantaríamos os quatro juntos: Noah, Nick,


Adri e eu. Eu estava animada!
— É, não se pode dizer que você não é um homem corajoso — Adri
me entregou um vinho enquanto passava pela porta em direção a Noah —,
cozinhar para duas chefs requer bravura.
— Minha cara chef, não tenho medo de uma boa batalha. Sou movido
a desafios — brincou Noah.
— Adri, não dê corda, ou teremos que lidar com o ego de Noah pelo
resto da noite — debochou Nick.
— Confio nas minhas origens, nos ensinamentos da minha mãe e
também nas dicas da minha Soph…
— Que gracinha os dois apaixonadinhos… — zombou Nick. —
Sempre soube que isso ia acontecer.
— Como assim? — Arqueei a sobrancelha.
— Ah, por favor, Soph… Quem não sabia que vocês eram a fim um
do outro? Só vocês mesmo! — Nick deu uma gargalhada.
— Você sabia esse tempo todo, seu sacana? — Noah deu um tapa no
braço do meu irmão.
— Claro! E joguei várias indiretas ao longo de todos esses anos, mas
vocês são burros demais, pelo amor de Deus!
— Nick! — gritei. — Não acredito.
— Todo mundo sabia: os meus pais, a sua mãe… — Nick apontou
para Noah. — Todo mundo em Little Italy. Se bobear, até o padre Rossi.
Menos vocês, que ficavam nessa merda de ai, somos só amigos — retrucou
meu irmão.
— Enfim, o bom é que a paixão platônica se resolveu, não é mesmo?
— Adri riu. — E eu não vou fazer rodeios: estou doida para provar essa tão
famosa pizza!
— Vamos nessa, então! — Noah apontou para a mesa de jantar, que
já estava arrumada.
Dizer que Noah e eu éramos exagerados com comida seria uma
redundância, já que éramos de famílias italianas. Mas ele conseguia ser pior
que eu. Fez cinco pizzas! CINCO! Para quatro pessoas comerem. Era
inacreditável! Durante o jantar, lutamos bravamente, mas não conseguimos
acabar com a comida, apesar do incrível esforço do meu namorado.
— Parcimônia não é algo que vemos por aqui — caçoou Adri.
— Sim, talvez eu tenha exagerado — observou Noah, acariciando a
própria barriga.
— Mas, olha, devo admitir: foram as melhores pizzas que já comi na
vida. — Adri riu.
— Fico feliz por isso, mas agora só penso que estou derrotado. —
Noah franziu o cenho.
— Cara, como pode alguém comer tanto? — debochou Nick.
— Já estou com uma rotina pesada de treinos agora que me livrei das
muletas, viu? Mas, ok, talvez eu não devesse ter comido dez fatias… — Noah
olhava para a taça de vinho à sua frente como se estivesse hipnotizado.
— O vinho também é ótimo, Nick. — Levantei a taça em direção ao
meu irmão.
— Estamos com um excelente fornecedor da Califórnia, Soph.
— Nick conseguiu um bom empréstimo no banco, e isso viabilizou o
contrato com esse fornecedor maravilhoso de vinhos orgânicos — contou
Adri, animada.
— Você pegou outro empréstimo, Nick? — questionei, quase
zangada.
— Como assim outro empréstimo? — Adri olhou para o meu irmão.
— Ai, cacete… — Nick suspirou.
Olhei para Noah e ele parecia congelado. Ele e meu irmão se
encaravam.
— O que está acontecendo aqui? — Eu tinha um mau
pressentimento.
— Soph, nós precisamos conversar… — Noah estava com os olhos
arregalados.
— Ai, meu Deus, eu falei alguma coisa errada? — Adri parecia
preocupada.
— Não, mas acho melhor deixarmos os dois sozinhos… —
murmurou Nick.
— Vocês estão me deixando preocupada. O que está acontecendo?
Alguém pode me explicar? — Eu já estava alterando o tom de voz.
— Soph, é melhor você e Noah conversarem… — afirmou Nick.
— Você não vai embora! Você está com algum problema financeiro
por causa do meu restaurante? Eu sabia que não devia ter feito aquele
empréstimo, eu falei…
— Soph, pare de tagarelar por um minuto! — Meu irmão aumentou o
tom de voz. — Eu não fiz empréstimo nenhum.
— Como assim, Nick? E o dinheiro que você me deu para abrir o
restaurante? — Coloquei as mãos na cintura.
Noah continuava em silêncio. Meu irmão e ele trocavam olhares
cúmplices e assustados.
— Ah, meu Deus… — Levei as mãos à boca. — Foi você, Noah! O
dinheiro era seu! Como fui tonta! — Eu estava quase gritando.
— É, realmente acho que devemos ir embora… — comentou Adri.
— Vocês dois me enganaram! — grunhi, furiosa.
— Calma, principessa, não é bem assim. — Finalmente Noah se
dignou a dizer alguma coisa.
Nick e Adri saíram de fininho, me deixando sozinha com Noah. Eu
sentia o meu sangue ferver.
— Você mentiu para mim, Noah?
— Eu queria te ajudar, Soph. Não consegui suportar a sua tristeza. E
também sabia que você jamais aceitaria o meu dinheiro — explicou ele
baixinho.
— E aí você pensou que a melhor maneira de resolver tudo era me
enganando? Com a cumplicidade de Nick? — urrei.
— Soph, não é assim… Eu só queria que você pudesse realizar o seu
sonho. Só quis te ajudar, principessa.
— Para de me chamar de principessa! Estou com muita raiva de
você, Noah!
— Não faz assim, Soph, por favor. Me deixa explicar… — Ele tinha
uma expressão triste.
— Você me enganou! Estou morando aqui com você há meses,
Noah! E iria continuar sendo feita de idiota para sempre? — Senti um nó
queimando em minha garganta.
— Foi errado mentir? Foi. Mas faço de tudo por você, entenda isso,
Dio Santo!
— Não quero isso! Não quero uma pessoa que mente para mim, me
engana. Você não tinha esse direito!
— Soph, me desculpe. Por favor, principessa… — Ele tentou me
abraçar e eu bati nas mãos dele.
Saí pisando duro em direção ao quarto. Eu já tinha duas malas
arrumadas para a viagem que faria para a Toscana dali a dois dias. Abri outra
bolsa de viagem e comecei a despejar furiosamente dentro da sacola as
minhas peças de roupa que ainda estavam no armário.
— O que você está fazendo, Soph? Vamos conversar. — Noah estava
parado na porta do quarto, apoiado no batente.
— Vou para a casa dos meus pais! — rosnei.
— Principessa — ele passou as mãos pelos cabelos —, não faça isso
comigo.
— Não fazer isso com você, Noah? — Gargalhei. — Foi você quem
mentiu aqui, meu chapa. Lembre-se disso.
— Eu sei, Soph, cazzo![55] — Ele deu um soco no batente da porta. —
O que você quer que eu faça? Que eu me ajoelhe? Você viaja daqui a dois
dias. Pelo amor de Deus, não faça isso comigo! — Noah começou a chorar.
Ao vê-lo tão descontrolado e perdido, quase me rendi e me atirei
naqueles braços tatuados. Mas eu não podia. Estava magoada demais. Ele
tinha me enganado. E isso eu não podia suportar. Ele tinha se jogado no chão
e estava com a cabeça entre os joelhos, bloqueando a porta.
— Me dá licença, Noah — exigi.
— Principessa — ele agarrou minhas pernas —, não me deixe assim,
por favor.
— Eu vou te pagar, Noah… cada centavo — respondi, entredentes.
— Tudo bem, Soph. Me pague com juros, do jeito que você quiser,
só não me deixe.
— Eu não consigo ficar aqui olhando para você agora, Noah. Estou
com muita raiva.
— Você está terminando tudo o que temos por causa de um erro
meu? Por causa de algo que fiz com o único intuito de te ajudar? — Ele
soltou minhas pernas e se levantou.
— Preciso de um tempo.
— Que tempo, Soph? Você viaja em dois dias.
— Não consigo falar com você agora. — As primeiras lágrimas
começaram a rolar.
— Então deixe as suas coisas aqui. Se você quer realmente ir para os
seus pais, eu entendo. Mas posso levar suas malas amanhã.
— Não. Vou levar o que consigo agora — retruquei, irritada.
— É o seu orgulho que está destruindo tudo, Soph! Caralho! É só
dinheiro! — bradou ele, passando as mãos pelos cabelos.
— Ah, é o meu orgulho que está destruindo tudo, e não a sua
mentira? — gritei.
— Principessa, não vá embora assim, por favor! — suplicou ele.
— Eu preciso ir. — Passei por ele com as duas malas e a sacola.
Assim que bati a porta do apartamento, desabei. Talvez eu estivesse
exagerando, mas a dor de ter sido enganada por Noah e pelo meu irmão
estava grande demais. Me senti humilhada, traída, feita de trouxa. Estava
furiosa. Eu não estava terminando com ele, mas precisava de um tempo.
Naquela noite, simplesmente não conseguiria dormir ao lado dele e fingir que
estava tudo bem.

Na manhã da viagem, eu estava me preparando para ir ao aeroporto.


Noah tinha mandado algumas mensagens desde a noite em que saí cuspindo
fogo do apartamento dele, mas não consegui responder. Iria passar hoje na
casa dele para me despedir, mas eu ainda estava muito magoada, confesso.
— Soph — minha mãe bateu na porta —, Noah está aí. Por favor,
não o mande embora, minha filha. Ele está com uma aparência horrível.
Deixe de ser orgulhosa.
— Você também vai defendê-lo? — Senti minhas sobrancelhas
automaticamente se unirem.
— Não. Ele errou. Mas foi apenas com o intuito de te ajudar.
— Ah, sim, claro… Os fins justificam os meios — debochei.
— Não foi isso o que eu disse, Sophia Di Lucca. E ele está na sala te
esperando. Deixe de ser idiota. Ele te ama. — Minha mãe fechou a porta.
Quando cheguei na sala, vi Noah de costas. Ele estava com um
agasalho do Giants e as mãos no bolso.
— Oi… — eu disse.
— Oi, principessa. — Ele deu um sorriso cansado. — Você ia viajar
sem se despedir de mim?
— Eu ia passar no seu apartamento antes de ir para o aeroporto.
— Nosso apartamento, Soph…
Eu apenas o encarei, em silêncio.
— Trouxe isso para você. — Ele estendeu a mão na minha direção.
Peguei um pingente dos dedos dele.
— O que é isso?
— Um cipresso.[56] É um dos símbolos da Toscana. Para a sua
pulseira. Você ainda está usando?
— Estou. Obrigada, Noah. Vou colocar o pingente já. — Tirei a
pulseira e ele tinha os olhos fixos em mim, sem dizer nada.
— Posso te ajudar a colocar a pulseira de volta? — pediu ele, num
tom de voz triste.
Assenti com a cabeça e estiquei meu braço para ele.
— Boa viagem, Soph. — Ele beijou a palma da minha mão. —
Estarei aqui, te esperando. Como sempre.
— Noah — olhei para aqueles olhos tão azuis, agora tristes —, eu te
amo, mas estou muito magoada. Preciso desse tempo para acalmar o meu
coração. Não estou terminando com você.
— Principessa — ele abriu um sorriso —, obrigado.
Noah me puxou para ele, com uma mão na minha lombar e a outra
enganchada em meus cabelos. Ele me beijou com tanta paixão que eu quase
fiquei sem ar. Sentir a língua quente e macia dele contra a minha foi
reconfortante, mesmo que eu ainda estivesse muito magoada. Eu o amava
muito, demais. Mas estava com o orgulho ferido também. No fim das contas,
achava que minha viagem para a Toscana foi o melhor que podia ter
acontecido. Assim, eu teria tempo de colocar minhas ideias em ordem.
Fazia uma semana que Soph tinha viajado. E eu estava me sentindo um
morto-vivo. A única coisa que ainda mantinha a minha sanidade era o
esporte. Agora eu estava mais focado do que nunca em me recuperar e voltar.
A lesão havia evoluído melhor do que todos pensavam. Eu já estava sem a
bota ortopédica e as muletas, mas fazia fisioterapia e me exercitava todos os
dias. Uma rotina puxada, mas que estava me mantendo no prumo. Era quase
certo que estaria de volta para a próxima temporada.
Todos os dias quando chegava em casa e via uma lembrança de Soph,
eu tinha vontade de desabar. Estávamos trocando mensagens, e a ira de Soph
já tinha esfriado, mas nossas conversas estavam num limbo. Não eram tão
neutras quanto antes, nem tão calorosas quanto as que namorados
apaixonados trocariam.
Não tocamos mais no assunto do empréstimo, mas eu sabia que
aquele era um elefante branco que teria que ser expulso da sala em algum
momento. Não poderíamos passar a vida toda evitando essa conversa. Juro
que entendia ela ter ficado com raiva, se sentir enganada e tudo mais. Mas eu
não conseguia compreender a atitude dela. Era tão fácil assim me deixar para
trás? Para ela estava sendo tranquilo ficar sem mim? Eu tinha vontade de
perguntar, mas a coragem me faltava.
— Cara, você está péssimo! — debochou Nick ao entrar na pizzaria
da minha mãe. Eu estava ajudando no caixa.
— Estou mesmo — grunhi.
— Vocês vão se entender. Soph é teimosa como uma mula, mas ela
te ama.
— Será?
— Como assim será? Ficou maluco? — Nick franziu o cenho.
— Para ela foi tão fácil me descartar. Sair de casa e pronto…
— Noah, não é bem assim. Tente entender o lado dela. Ela ficou
magoada, se sentiu traída… E você sabe como ela é barraqueira. — Nick riu.
— Sei. — Sorri em resposta.
— Ela também está puta comigo. Mandou uma mensagem só. Uma
foto de um vinho e um lembrei de você. Nós a conhecemos, né? A Soph
habitual já teria me mandado quinhentas mensagens sobre todas as coisas que
ela está vendo e descobrindo. Ela está magoada com você e comigo, mas vai
passar.
— Mas isso é um bom lembrete…
— Do quê? — Nick me fitou com uma expressão curiosa.
— De nunca deixar a Soph irritada. — Eu ri.
— Como ficaria a sua reputação na NFL se soubessem que você tem
tando medo da Soph, hein? — zombou Nick.
— Cara, não quero nem saber. Não há nada que eu tema mais do que
a ira da sua irmã. E quem brincar com isso é porque não conhece a fúria do
sangue italiano.
— É… Sabemos disso. — Ele me deu um tapinha reconfortador no
ombro.

Naquela noite, quando cheguei em casa peguei o DVD de Dirty


Dancing que Soph havia deixado para trás e decidi, finalmente, ver. O que
será que havia de tão especial naquele filme? Sentei-me no sofá e Bono pulou
ao meu lado. Desde que Soph tinha saído do apartamento, o gato estava ainda
mais apegado a mim. A companhia dele me fazia muito bem.
Eu estava com os olhos grudados na TV. Aquela Baby era muito
trouxa. Que garota sem graça! Como você pode gostar disso, Soph? Aí veio a
cena da festa no alojamento dos empregados. Patrick Swayze no estilo bad
boy rock n’roll dos anos cinquenta. Aquela dança toda sacana, todo mundo se
pegando, e a Baby ali com os olhos arregalados. Sabe de nada, inocente!
Comecei a ver o filme tentando entender as coisas que Soph amava:
um cara autoconfiante — check; um homem que sabe como conquistar uma
mulher — check; um homem que dança bem — me fodi nessa; um cara que
canta bem — é, me dei mal nessa também. Será que não tinha nenhum
daqueles filmes românticos clássicos com jogadores de futebol americano?
Já no meio do filme, eu estava fã da Baby. Muito legal a forma como
ela peitou o pai. Tudo bem, ela mentiu para o velho, mas foi para ajudar uma
pessoa que sequer conhecia direito. E também não baixou a crista quando o
pai quis menosprezar o cara que ela amava. E o Johnny? Puta batalhador! Eu
estava tão envolvido que quase não percebi meu telefone vibrando. Caralho,
uma ligação da Soph!
— Oi, Soph. Está tudo bem? — Me ajeitei no sofá.
— Sim, tudo certo…
— Que horas são aí?
— Cinco e meia da manhã. — Ela suspirou.
— E você está acordada? — Eu ri.
— Na verdade, não consegui dormir.
— Aconteceu alguma coisa?
— Aconteceu… — Ela chorou.
— Meu Deus, Soph… Alguém fez alguma coisa com você? —
Comecei a me alterar.
— Não… Só estou triste.
— Por que você está triste, principessa?
— Eu não queria ter viajado desse jeito, Noah… mas por que você
mentiu para mim? — Ela fungava.
— Soph… eu errei. E te pedi desculpas. Mas a sua reação quando
você soube mostra o motivo de eu não ter te contado sobre a minha ajuda.
Não pense que não entendo a sua chateação. Eu entendo. E me arrependo de
não ter te dito nada.
— Também preciso te pedir desculpas. Pensei muito nos últimos
dias, Noah. E sei que você fez o que fez para me ajudar. Não quero que você
minta nunca mais para mim, nem me esconda nada. Mas fui cruel com você
no momento da raiva. E isso é o que mais me tortura. Saber que te magoei
também.
— Principessa, o que seria de mim se não fosse esse sangue quente
que corre nas suas veias? Bella mia, nós dois erramos, de maneiras diferentes.
Jamais vou mentir novamente ou esconder algo de você, prometo. E eu te
perdoei no mesmo momento em que você me machucou.
— Ai, Noah, isso foi tão lindo… — Ela chorou mais.
— Não chore, Soph.
— Ainda tenho três semanas para ficar aqui. E estou morrendo de
saudades de você.
— Também estou morrendo de saudades, amore mio. Soph, você vai
voltar para o nosso apartamento?
— Vou, Noah, com certeza. Eu nunca deveria ter saído daí.
— Bono também está deprimido, sabia? Você nem imagina o que
estamos fazendo…
— Ai, meu Deus… O quê?
— Vendo Dirty Dancing!
— Não acredito! Uau, isso te deixa ainda mais sexy… — Ela
gargalhou.
— Principessa, estou dormindo agarrado com uma camiseta que você
deixou. E passo a noite sentindo o seu cheiro, é uma tortura.
— O que você está vestindo, Noah?
— Ah, menina safada… — Sorri. — Estou com uma calça de
moletom.
— Apenas?
— Apenas.
— Com aquele seu V que desce em direção à virilha à mostra?
— Exatamente.
— Ah, Noah, que tortura…
— E o que você está vestindo, principessa?
— Como sempre, uma camiseta velha e uma calcinha. Pequena. E
que está bem molhada.
— Soph, eu não vou fazer justiça com as próprias mãos hoje —
debochei. — Você sabe por quê? Porque vou guardar toda a minha energia
para quando te encontrar. E vou te foder até você não aguentar…
— Duvido muito, amore mio… — zombou ela. — Acredito que é
você quem vai pedir arrego.
— Está me desafiando?
— Pode crer que estou — provocou ela.
— Ah, principessa… você me enlouquece.
— Ti voglio bene, amore mio.
— Anche io, Soph.
— Buonanotte,[57] Noah.
— Buongiorno, Soph.
Eu me levantei do sofá com Bono no colo e comecei a dançar “Time
of My Life” com ele. O felino me olhava com ar de reprovação. Ah, Bono…
sem essa insegurança de masculinidade frágil. Podemos dançar vendo Dirty
Dancing e nossa testosterona está garantida. Bom, pelo menos a minha, já
que não fui castrado. Eu estava quase gritando pela sala. Voltamos ao jogo,
Bono! Caralho, meu coração parecia prestes a explodir. De felicidade, de
saudade, de expectativa… Ah, Soph, principessa. Você é o que há de melhor
no meu mundo e sempre será.
Confesso que eu estava muito mais aliviada após ter ligado para Noah. O
orgulho era um dos meus principais defeitos — acompanhado do meu
temperamento explosivo. Quando as duas coisas se misturavam, então… era
terrível. Eu ainda considerava que Noah e Nick haviam traído a minha
confiança. Mas depois de muito refletir, cozinhando nas belas paisagens da
Toscana, entendi que eles tinham tentado me ajudar, ainda que de uma
maneira torta.
Eu estava em Cortona, uma cidade magnífica que foi o cenário do
filme Sob o Sol da Toscana. Aliás, foi inspirado nele que decidi ir para lá,
após descobrir que a chef Antonella Maggiore dava cursos sobre a culinária
tradicional da região. Sim, eu era uma cozinheira que amava inovar, mas nem
por isso a tradição deixava de ser importante para mim, ao contrário do que o
meu pai pensava.
Naqueles dias, dei graças a Deus por meus pais serem tão ligados às
suas raízes mediterrâneas, pois meu italiano meia-boca estava me salvando.
Eu conseguia me comunicar e acompanhar as aulas com alguma dignidade.
Fiquei hospedada numa locação bem mais simples que a do filme, na
Villa Sant’Andrea, que era uma hospedaria rústica, mas tinha aquele clima
toscano: o quarto onde eu estava tinha uma cama de ferro antiga, mas
confortável, e as paredes eram naquele tom de laranja terroso tão típico da
região. Um ventilador de teto emoldurado por arabescos florais verdes
completava a decoração simples, porém acolhedora. E o melhor era que ainda
havia uma banheira. Eu me sentia a própria Sophia Loren tomando banho de
espuma.
A acomodação tinha ainda uma sacada que dava vista para uma
espetacular piscina e os campos mais verdes que eu já havia visto, decorados
por ciprestes, os longos pinheiros que eram um dos símbolos da Toscana. O
cipresso, o mesmo do pingente que Noah me dera e que estava comigo,
pendurado na pulseira que eu quase nunca deixava de usar. Só a tirava para
cozinhar.
Antonella era uma chef exigente e uma professora rigorosa, mas
tinha um sorriso superacolhedor. De imediato, me identifiquei com ela: era
uma mulher curvilínea, de uns cinquenta e poucos anos. Ela adorava comer,
genuinamente saboreava todos os ingredientes que nos apresentava e era uma
pessoa apaixonada por comida, assim como eu. As bochechas dela ficavam
ainda mais vermelhas quando estava na cozinha. Parecia que ela e seus
grandes olhos azuis se enchiam ainda mais de vida, e aquilo já era um
espetáculo à parte.
A minha aventura toscana estava sendo divertida, desafiadora e
empolgante, mas eu não conseguia me sentir completa. Aos finais de tarde,
eu sentava na sacada do meu quarto, a uma pequena e antiga mesinha de ferro
que sustentava um ombrelone branco. Eu desfrutava do sol da Toscana, na
companhia de um bom vinho, mas sempre me lembrava de Noah. Pensava
que ele iria adorar aquele lugar. Da forma dele, Noah também era bastante
ligado às nossas raízes: fazia de tudo para preservar a Cantina da Mamma e
era extremamente apegado à família, especialmente à Anna. Ele era quente e
intenso. Basicamente, fazia jus ao sangue que carregava nas veias.
Aquela era mais uma tarde em que eu me sentava na sacada, agindo
como achava que Sophia Loren agiria numa viagem à Toscana: coloquei
meus enormes óculos escuros, peguei minha bela garrafa de Chianti Rosso[58]
e sentei-me para espiar o belo pôr do sol, que era um espetáculo que toda a
humanidade deveria presenciar ao menos uma vez. Um dia eu voltaria ali
com Noah.
Comecei a ouvir as cordas de um violão ao longe. E, de repente,
começaram a cantar:
Nel cielo passano le nuvole
Che vanno verso il mare
Sembrano fazzoletti bianchi
Che salutano il nostro amore
Dio, come ti amo
Non è possibile
Avere tra le braccia
Tanta felicità[59]
Reconheci na hora aquela música! Era “Dio come ti amo”, da
Gigliola Cinquetti, uma música superantiga, que minha mãe amava. Em todas
as comemorações de Ano-Novo, ela terminava a noite dançando aquela
canção com meu pai. A composição até tinha a melodia triste, mas era
belíssima. Que feliz coincidência! Levantei-me e fiquei apoiada no parapeito
de ferro. Um senhorzinho tocava e cantava, e de repente parou bem embaixo
da minha sacada, como se estivesse fazendo uma serenata. Que fofo!
Baciare le tue labbra
Che odorano di vento
Noi due innamorati
Come nessuno al mondo
Dio, come ti amo
Mi vien da piangere
In tutta la mia vita
Non ho provato mai
Un bene così caro
Un bene così vero
Chi può fermare il fiume
Che corre verso il mare[60]
Ele continuou cantando e fiquei ali, com a minha taça de vinho,
fingindo que a serenata era para mim. Tirei os óculos escuros para observar
melhor aquela cena. A Itália era tão romântica… Tudo na Toscana exalava
romance. Ah, aquela música era tão linda! Eu ia pegar o celular para gravar
para minha mãe.
— Principessa! — gritaram embaixo da minha janela.
Não era possível… eu estava ouvindo coisas.
— Principessa, ti amo! — berrou ele, estendendo um buquê de
peônias na minha direção. — Eu queria escalar essa sacada, como Romeu,
mas acredito que ainda não devo arriscar tanto o meu tornozelo. Espero que
você entenda… — Ele abriu o sorriso mais lindo do mundo.
— Noah! — gritei. — Amore mio!
Percebi que vários hóspedes que estavam no pátio tinham sacado os
celulares e estavam filmando e fotografando aquele espetáculo. Por um
segundo, me permiti sentir vergonha, mas logo o meu coração transbordou de
felicidade e paixão. As pessoas começaram a bater palmas, e Noah fazia uma
reverência, como se estivesse agradecendo ao final de um espetáculo.
Desci correndo as escadas. Ele já estava parado à porta de entrada da
hospedaria. Meu coração batia tão forte que pulsava nos meus tímpanos.
Corri até ele e me joguei em seus braços.
— Principessa — murmurou ele em meu ouvido.
Eu tinha muitas perguntas a fazer, mas todas poderiam ficar para
depois. Dei uma mordidinha no lóbulo da orelha dele e me afundei naquele
pescoço tão quente, tão cheiroso. O calor do corpo dele me inundou com uma
felicidade que era tão nova e, ao mesmo tempo, tão nossa.
— Ti amo, dolce principe. — Beijei-o com desespero.
Noah correspondeu ao beijo, apertando-me com os braços fortes.
— Soph… acho melhor irmos para o seu quarto. — Ele riu.
Quando o soltei, vi que tínhamos mais plateia ao nosso redor. As
pessoas sorriam e exclamavam em italiano e outros idiomas. Puxei Noah pela
mão e subimos as escadas em direção ao quarto.
— Uau! É muito legal! — Ele assobiou. — Ah, principessa, suas
flores! — E estendeu o buquê para mim.
— Peônias… — Peguei as flores das mãos dele e cheirei.
— Sempre peônias, bella mia.
— Meu Deus, Noah! Estou tão feliz que você esteja aqui. Nem
acredito… E a serenata? Que coisa mais linda!
— Sabe, Soph, eu poderia cantar. Inclusive, pensei em “She’s Like
the Wind”. Mas havia dois problemas…
— Quais? — Franzi o cenho.
— Em primeiro lugar, canto muito mal — confessou ele. — Em
segundo lugar, seria difícil achar um tiozinho seresteiro na Toscana
familiarizado com a trilha sonora de Dirty Dancing. Aí apelei para um
clássico italiano, que sabia que você reconheceria.
— É, você foi muito esperto. — Eu o abracei apertado.
— Sempre fui. — Ele piscou.
— Muito obrigada. Estou tão feliz.
— Principessa — ele coçou a cabeça —, espero que você não me
ponha para fora. Não reservei um quarto e minha mala está lá embaixo.
— Ah, Noah… Nós só vamos ter um pequeno problema…
Ele me encarou com um friso de preocupação no meio da testa.
— Você chegou hoje à Toscana? — indaguei.
— Sim…
— Deve estar cansado…
— Um pouco.
— Que pena, porque não pretendo te dar descanso. — Sorri
maliciosamente.
— Vim preparado para a ação. — Ele se jogou na cama. — Me use!
— Pode deixar… — Fui até a sacada e peguei a garrafa do meu
Chianti Rosso.
— Um belo vinho toscano? — Ele sorriu, colocando os braços atrás
da cabeça.
— Sim… esse vinho é maravilhoso. — Despejei um pouco da bebida
na taça e a coloquei na boca de Noah. — Prove.
— Será possível que você consiga me deixar nesse estado só por me
dar vinho? — Ele se apoiou nos cotovelos e apontou para o meio das pernas.
Sim, havia um volume considerável ali.
Ele tomou um gole e ficou me encarando. Levei a taça de vinho
novamente à boca de Noah.
— Agora me deixe provar… — Coloquei a língua na boca dele,
sorvendo o vinho com cuidado. — Eu sabia que ia ficar melhor com o seu
gosto.
— Cacete, Soph… você me enlouquece. — Ele me virou na cama,
posicionando-me embaixo dele.
Noah pegou meus braços e levantou-os sobre a minha cabeça. Me
prendeu entre suas pernas e, com cuidado, mas firmemente, segurou os meus
pulsos. Ele começou a sugar o meu pescoço. Meu corpo inteiro se arrepiou.
Ele tinha a respiração pesada e entrecortada, próxima ao meu ouvido.
— Principessa, você está linda demais com esse vestidinho… Tão
gostosa e tão italiana… — Ele sorriu.
— Você também está lindo demais, Noah. — Eu ofeguei.
Ele passou a mão sob o vestido, levantando-o devagar. Abaixou-se e
começou a beijar minhas pernas até chegar ao interior das coxas. Ele tinha
calma, parecia estar desenhando uma estratégia de como conquistar o time
adversário. Eu estava quase dizendo que já estava entregue, ele nem
precisava se esforçar muito.
— Passei as duas últimas semanas lembrando desse teu cheiro… —
ele tirou lentamente minha calcinha — tão maravilhoso.
Ele me beijou bem ali. E sentir a língua quente dele dentro de mim já
era o suficiente para me inundar e me deixar em chamas ao mesmo tempo.
Noah desenhava círculos com a língua em meu clitóris. Depois, com os
dedos, me abria e me invadia ainda mais.
Agarrei os lençóis e pensei que ia furar o colchão, tamanha era a
pressão que eu fazia para me segurar. Noah me chupava, me mordiscava e me
lambia, parecia que tudo ao mesmo tempo, e não necessariamente nessa
ordem. Aquilo era tão bom…
— Senti falta de te ver gozando, principessa… Geme pra mim… —
Ele se levantou do meio das minhas pernas com um olhar diabólico, para
retornar aos trabalhos logo em seguida.
Ah, sim, seu pedido é uma ordem… Antes que pudesse tentar refrear
meus impulsos, eu já estava gritando. Bom, talvez a galera no pátio estivesse
mesmo esperando um complemento do show. Acho que a Toscana inteira
podia ouvir os meus gritos.
Noah levantou-se e limpou a boca com as costas das mãos. Saber que
meu gosto estava nele me deixava ainda mais louca. Ele tinha aquele ar de
campeão que venceu uma partida muito importante. Me encarava com aquela
cara de sou bom nisso, não sou?, e eu nem tinha como negar, então só dei
uma gargalhada. Ele tirou a camisa. Ah, Dio Santo, aquelas tatuagens, aquele
tanquinho maravilhoso, aquele V profundo que levava à terra prometida…
Depois ele tirou as calças e a cueca, atirando-as para longe. E rapidamente
alcançou e colocou o preservativo.
— Principessa, você sentindo prazer é a coisa mais erótica que eu já
testemunhei na minha vida. — Ele se posicionou no meio das minhas pernas,
afastando-as com cuidado.
Eu me abri ainda mais para recebê-lo e, vendo minha expressão de
sinal verde, pode vir, ele veio. Ah, sentir aquela pressão era maravilhoso.
Noah me preenchia de todas as maneiras, e não apenas daquela. Ele estava
em cima de mim, apoiado naqueles braços tatuados e fortes, e estocava, não
com desespero, mas com uma calma calculada que estava me enlouquecendo.
Ele tinha um sorriso alucinante, e gotas de suor começaram a se formar em
sua testa.
Ele me encarava, numa expressão de êxtase absoluto. E continuava
naquele movimento enlouquecedor de vai e vem, lento e profundo. Prendia
meus braços em cima da minha cabeça, agarrando meus pulsos com
suavidade, mas precisão. E, quanto mais fundo ele estocava, mais e mais eu
me sentia consumida por labaredas, eu me desmanchava e me refazia ao
redor dele.
— Você está sempre tão molhada pra mim, principessa… — disse
ele, arfando.
Eu nem conseguia acreditar naquilo. Noah e eu estávamos fazendo
amor na Toscana? Ele estava mesmo ali ou era mais um dos meus sonhos
eróticos? Trancei minhas pernas ao redor dele, para que ele viesse ainda mais
fundo, para que pudesse me ter inteiramente e para que eu pudesse tê-lo por
completo. Comecei a me mover espelhando os movimentos dele, com um
arquear das contas e um vai e vem lento e ritmado dos quadris.
— Nada no mundo é capaz de me fazer sentir assim… Quando você
está dentro de mim, Noah… é o paraíso. — Sorri.
Eu o puxei mais para mim e me contraí ao redor dele, e vi que aquilo
o estava desafiando e ele não conseguiria se segurar muito mais. Eu me
esfregava nele como se dependesse daquilo para manter a sanidade. O sentia
pulsar dentro de mim. Então ele mordeu o lábio, jogou a cabeça para trás e se
soltou. E ver o gozo dele me deu um prazer imenso também, uma felicidade
que transbordava de mim. E, então, eu explodi. Ele saiu de dentro de mim e
rolou para o meu lado.
— Soph… eu tinha planejado isso um pouco diferente… — ele
resfolegava —, mas aí, principessa, você me fez perder o juízo. — Ele me
deu um beijo na testa e se levantou.
Noah foi até a calça que estava no chão e ficou remexendo nela.
Como o corpo dele estava na frente, não pude ver o que ele fazia — e
também aquela bunda maravilhosa eclipsava qualquer outra coisa. Ele voltou
para a cama com as mãos escondidas atrás das costas.
— Sabe, ainda não consegui decidir se você é melhor de frente ou de
costas. Acho que precisarei de mais uns testes para chegar à conclusão —
provoquei.
— Tarada! — Ele levantou uma das mãos num debochado sinal de
censura. — Preciso falar sério agora.
— Sou toda ouvidos, apesar de ser muito difícil me concentrar com
você aí, pelado.
— Digo o mesmo, principessa, mas façamos um esforço — declarou
ele num fingido tom solene.
— Ok! — Fiz uma expressão séria e me sentei diante dele.
— Soph… você é o que tenho de mais importante na vida. Amo
minha profissão, sou movido a desafios, e o futebol americano me deu muito
mais em bens materiais do que eu jamais podia ter sonhado. Mas houve uma
constante em todos os momentos da minha trajetória, e sempre foi você.
Mesmo quando não tínhamos um relacionamento amoroso, eu sabia que
podia recorrer a você, que isso me traria o conforto de que eu precisava. E
também sempre estive pronto para ser tudo de que você precisasse. Passamos
muito tempo com medo, de estragar nossa amizade e tudo mais, mas só te
digo que você é, sempre foi e sempre será a minha melhor amiga. E sempre
serei o seu amigo, seu parceiro, seu amante… o que você quiser.
— É sério que você vai me fazer chorar? — Eu já estava secando os
olhos.
Ele riu.
— Não conheço nem tenho interesse em conhecer uma vida sem
você. Soph, você é tudo para mim. Case-se comigo, principessa. — Ele
estendeu a mão que escondia nas costas e me mostrou uma caixinha de
veludo preta.
— Dio Santo, estou sendo pedida em casamento na Toscana! —
gritei.
— Sim. E um pedido de casamento nudista, o que é melhor ainda —
caçoou Noah.
— Claro que eu aceito! Eu te amo demais, demais. Nunca houve um
dia em que eu não te amasse, Noah Vicini Lacox.
— Me dê sua mão, principessa — pediu ele.
Estendi a minha mão. Ele a pegou e a beijou.
— Este é o anel de noivado da minha mãe, que antes foi da nonna…
Você pode imaginar que Anna Vicini quase teve um infarto quando eu o pedi
para ela, não pode? — Ele riu.
— Posso sim. — Sorri.
Noah colocou o anel no meu dedo.
— É simples. Mas tem muito significado para mim. Se você quiser,
quando voltarmos a Nova York posso comprar outro. — Ele encarava meu
dedo com a joia.
— Noah… — Me aproximei dele e acariciei seu cabelo. — É o anel
mais lindo que eu já vi. De verdade. E saber que fui a escolhida para usá-lo é
uma honra, enche meu coração de alegria. Não preciso de mais nada. Só
preciso de você, dolce principe. Você é o melhor homem que existe. —
Beijei-lhe os lábios.
— Eu me esforço. — Ele deu de ombros zombeteiramente.
— Noah… depois que nos casarmos, podemos passar a lua de mel
aqui na Toscana, o que acha?
— Acho maravilhoso, principessa. Inclusive, podemos continuar
treinando… — Ele deu uma risadinha e me jogou na cama.
— Você é terrível, Noah. E é por isso que eu te amo.
Um ano depois

Minha cabeça era só cálculos e estratégias. Meus olhos percorriam


rapidamente o campo para analisar nossas opções mais viáveis. O tempo
estava acabando. Eu precisava definir em fração de segundos qual seria a
melhor jogada. Para quem está nas arquibancadas ou na frente de um
aparelho de TV, tudo parece se resolver magicamente. Mas, para quem está
dentro de campo, aquela jogada, aquela mesma que pode definir uma partida,
começou muito tempo antes.
No meu caso, aquela mesma jogada que estava sendo transmitida
mundialmente no Super Bowl havia começado, no mínimo, um ano antes.
Talvez ela tenha começado a se desenhar na partida em que fraturei o
tornozelo. Para as pessoas ao meu redor, eu era um exemplo de positividade:
aquele cara que batalhava duro pelo que queria. E, sim, eu era essa pessoa.
Mas o que quase ninguém sabia era dos momentos de incerteza que tive no
último ano: se eu realmente voltaria à antiga forma e conseguiria ser um
atleta de ponta outra vez.
A única que de fato sabia tudo o que eu tinha enfrentado era Soph.
Foi nos braços dela que encontrei o conforto quando a confiança me faltava.
Foi no ombro dela que chorei quando pensei que tudo estava acabado. Foi no
meio das pernas dela que descobri o que era o verdadeiro êxtase. Ela era a
minha felicidade. Na maior parte do tempo eu me mantive otimista e focado.
Treinar duro e sentir dor faziam parte da minha rotina desde que comecei a
levar o esporte a sério. Mas, durante a recuperação da minha lesão, tudo isso
foi potencializado. Eu só tinha um objetivo: voltar. Mas não como antes.
Melhor.
Então aquela única jogada que você via acontecer em frações de
segundo estava rolando há muito mais tempo. Naquele pequeno instante, tudo
aquilo passou pela minha cabeça. A questão aqui era: não estava nada fácil,
ok? Estávamos perdendo. Tudo podia mudar ainda? Com certeza! E eu não ia
deixar o troféu Vince Lombardi com o Patriots de novo! Não, não e não! O
placar estava 17 a 15. Um touchdown naquele momento resolveria a minha
vida.
Vi Dwayne Stevens, meu fiel parceiro de tantos anos, muito bem
posicionado. Eu sabia que, se eu fizesse o passe certo, ele daria conta do
recado. Até porque a defesa do Patriots estava bastante preocupada em dar
espaço para o quarterback deles jogar. Nisso, eles esqueceram de Stevens.
Um grande erro. Fiz o passe, o coração palpitando nos tímpanos, o suor
gelado percorrendo a espinha. Stevens pegou a bola, correu como um louco e,
sim: fez o touchdown. Faltando um minuto para o fim do jogo! Fechamos o
placar em 21 a 17. Inacreditável. Agora era só neutralizar o ataque deles. E
foi o que fizemos. Parecia que cinco meses haviam se passado naquele um
minuto, o ponteiro do relógio nunca se moveu tão devagar.
Quando finalmente acabou, me permiti cair de joelhos no campo e
chorei. Muito. Minhas lágrimas eram por aquela vitória após muitos terem
desacreditado o meu retorno, e também eram pelo meu pai. Mark Lacox, um
fanático pelo Giants. E eu estava dando o segundo título para ele. Quando
estava lá caído, com o rosto escondido nas mãos, senti aquele calor e aquele
perfume familiares.
— Você conseguiu, Noah! — gritava Soph.
— Viu só, principessa? — Me levantei e sequei as lágrimas com as
costas das mãos.
— Com certeza Mark está muito orgulhoso de você. E Anna também,
rezando em casa. — Soph sorriu.
— E você, principessa? — Eu a peguei no colo e a girei no ar.
— Eu? Estou explodindo de orgulho do meu quarterback gostoso.
— Soph, amore mio, se não fosse pelo seu amor, eu não estaria aqui
hoje. Obrigado. — Beijei-a com toda a paixão e ainda sentindo a adrenalina
na minha corrente sanguínea.
— Ah, dolce principe… te amar é a melhor parte da minha vida. —
Ela sorriu. O sorriso mais lindo de todos.
Peguei Soph pelas mãos. O campo já havia sido invadido pela equipe
técnica do Giants e pela imprensa. Várias câmeras e microfones na minha
cara. Eu mal conseguia ver um palmo adiante, as luzes me cegando. Mas não
largava a mão de Soph. Eu mal conseguia entender as perguntas que me
faziam. Estava completamente eufórico e dava respostas genéricas: “Estou
muito feliz”, “É uma grande conquista” e coisas do gênero. Até que ouvi uma
voz no meio de todas as outras, de uma jornalista que eu não conseguia
identificar naquele mar de câmeras.
— Lacox, você já falou algumas vezes da relação do seu falecido pai
com o Giants. Você dedica essa vitória a ele?
— Com certeza. — Abri um sorriso. — E também dedico à minha
mãe, que deve estar ajoelhada rezando até agora, e à minha noiva, em breve
esposa, Sophia Di Lucca. — Levantei o braço de Soph, como se ela fosse
uma campeã, e beijei sua mão.
— O casamento será em breve, Lacox? — perguntou outra voz no
meio da confusão.
— Sim, muito em breve. O melhor casamento ítalo-americano de
todos os tempos — Eu ri.
— Noah… — disse Soph sorrindo, enquanto nos livrávamos da
horda de jornalistas. — Você precisa soltar a minha mão. Tem que receber a
premiação daqui a pouco.
— Só vou te soltar quando for absolutamente necessário, principessa.
Como agora. — Dei um tapa na bunda de Soph.
— Noah! — ela deu um gritinho. — As pessoas estão filmando!
— Deixe que filmem, amore mio. Pode bater na minha bunda
também. Eu deixo. — Pisquei para ela.
— Você é terrível. — Ela gargalhou.
— Eu sei. Por isso você me ama. — E beijei seu pescoço.

Mais uma vez ganhei o troféu de Jogador Mais Valioso da


temporada. Era, sem dúvida, um retorno em grande estilo. Exatamente o que
eu esperava. Exatamente aquilo por que tanto trabalhei. Contudo o ponto alto
da minha vida estava prestes a acontecer dali a um mês. O casamento com
Soph. Por mim, teríamos adiantado a cerimônia, mas nossas mães começaram
a falar em tantos detalhes, e Soph queria dar essa alegria a elas, então acabou
concordando que seria melhor esperarmos para ela se firmar mais no Modern
Pasta e eu ter foco na minha temporada de volta à NFL.
Vocês devem estar se perguntando: tudo muito lindo, tudo muito
bom, mas como resolveram a questão do empréstimo? Bom, meus amigos, se
eu havia aprendido uma coisa na minha vida era a não contrariar Sophia Di
Lucca. E eu não a contrariei. Ela disse que iria me devolver cada centavo e eu
concordei. Apenas chegamos ao seguinte acordo: eu não precisava daquela
grana, mas, se Soph fazia questão de me pagar, ela iria investir na Jogue pelo
Seu Futuro, a fundação que eu mantinha com meu parceiro de time, Dwayne
Stevens. Ela de cara concordou e resolvemos dois problemas com apenas
uma tacada.
Depois de todo aquele escarcéu, de quinhentas entrevistas,
premiações e tudo mais, o que eu queria fazer era ir para casa e ficar a sós
com a minha noiva. Mas eu sabia que as comemorações estavam longe do
fim. Eu tinha que ver minha mãe e sabia que tio Vitto tinha preparado a festa
surpresa menos secreta da história. Discrição não era um forte dele. Eu não
podia decepcionar todas aquelas pessoas que haviam me apoiado a vida toda.
Era, também, por causa delas que eu tinha chegado aqui.
Quando chegamos em Little Italy, foi bastante difícil entrar na
Cantina da Mamma. A rua Mulberry estava tão cheia que parecia Festa de
San Gennaro. Todo mundo querendo tirar uma foto comigo ou pedir
autógrafo. Alguns vizinhos mais velhos tinham lágrimas nos olhos. Eles me
conheciam desde criança, e a conexão que eu tinha com aquelas pessoas me
emocionava. Era um sentimento de pertencimento, de saber que elas estavam
ali não para render homenagens ao quarterback fodão do Giants. Aquelas
pessoas estavam ali para abraçar o Noah, o menino que conheciam desde
sempre, e aquilo significava o mundo para mim.
Eu podia ser, sim, marrento às vezes. Era exigente demais com o time
e com os meus companheiros. Dava o melhor e também demandava o melhor
daqueles ao meu redor, mas sem jamais perder as estribeiras. Minha mãe me
ensinou que sempre conseguimos o melhor das pessoas através do respeito, e
não do medo. Eu pautava minha vida por isso, dentro e fora dos campos.
Mas, ao mesmo tempo, eu era um cara extremamente simples, que me sentia
bem no meio daqueles que dividiam as minhas raízes, que me apoiariam não
apenas enquanto os holofotes estivessem sobre mim.
— Noah! — gritou minha mãe, vindo em nossa direção enquanto
secava as mãos no avental — Só Deus sabe quanto eu estava nervosa, figlio
mio! — Ela me abraçou.
— Eu sei, mamma. Mas deu tudo certo! — Beijei o topo de sua
cabeça.
— Ainda bem que isso tudo acabou e agora você vai poder dar mais
atenção aos preparativos do seu casamento — reclamou nonna Violetta.
— Fico muito feliz que esteja contente com a minha vitória, nonna
— brinquei.
— Eu já sabia que você ia vencer, Noah. Mas estou orgulhosa de
você, bambino. — Minha avó abriu os braços e eu a envolvi num abraço
apertado.
— Soph, aonde você está indo? — Minha mãe pôs as mãos na
cintura.
— Vou à cozinha para ajudar… Tem uma multidão aqui.
— Nada disso, mocinha. Já está quase tudo pronto. Sente-se ao lado
do seu noivo — ralhou minha mãe.
— Vem cá, principessa! — Dei batidinhas na cadeira vaga ao meu
lado.
— Você não está cansado? Estou morta. Parece que fui eu quem
entrei em campo. — Soph riu.
— Estou cansado sim. Mas ainda tenho energia para uma
comemoração mais privativa. — Pisquei para ela.
— Meu Deus, Noah — ela deu uma risada —, você nunca para de
pensar em sexo?
— Não com uma noiva tão gostosa. Está além das minhas
possibilidades. — Dei de ombros.
— Mas que bom, porque comprei uma lingerie nova. Para celebrar
sua vitória. — Ela abriu um sorriso malicioso.
— Principessa… assim você me mata…. — Dei uma mordida em seu
pescoço.
— Noah, controle-se. A nonna Violetta está nos olhando de cara feia!
— Ela sempre está de cara feia, Soph. — Eu ri.
— Isso é verdade.
— Principessa… — Beijei a mão dela.
— Sim, dolce principe? — Ela acariciou meu rosto.
— Tudo de que eu preciso para ser feliz está aqui. Nesta pizzaria.
— Mas o seu troféu não está aqui — troçou ela.
— Minha maior vitória é você.
— Ah, Noah… ti amo.
— Anche io, principessa.
Ficamos abraçados, meu coração batendo naquele ritmo confortável
da tranquilidade do amor. Tio Vitto irrompeu pela porta com um
carregamento de cannolis, minha mãe pôs música italiana a todo volume, as
vozes e gargalhadas estavam cada vez mais altas, e era assim que eu sabia o
que era importante de verdade: o amor que cultivamos. Aquele era o meu
lugar no mundo. Ao lado da mulher que eu amava desde sempre, com as
nossas raízes.
Eumeuestava zonza. Nunca tinha ouvido tanta gente falar ao mesmo tempo no
ouvido. Mamma, Anna, nonna Violetta, Adri, Nick… todos eles
querendo dar uma opinião, superfelizes, entusiasmados. Aquilo enchia o meu
coração de alegria, mas também estava me dando nos nervos.
— Soph, figlia mia… — Minha mãe enxugava o canto dos olhos. —
Você está tão linda. Meu Deus, mais bela que a Sophia Loren.
— Só posso acreditar em você, já que não consigo me ver num
espelho — resmunguei.
— Não pode, dá má sorte! — grunhiu a nonna Violetta.
Adri só revirou os olhos e sorriu em deboche.
— Adri, me dá um espelhinho — cochichei para minha amiga.
— Eu não! Pirou? Não quero ser assassinada pela nonna. — Ela riu.
— Traidora! — debochei.
— Mas você está lindíssima, Soph. Fique tranquila.
— Você também está linda, Adri.
Eu estava muito ansiosa. Queria falar com Noah, mas nos proibiram
de ter qualquer contato desde o dia anterior. Tive que dormir na casa dos
meus pais. Tudo para não brincarmos com a sorte, como minha mãe havia
me alertado. Podia parecer hipócrita, mas até que estava sendo divertido
respeitar aquelas tradições.
— Dio Santo! — Meu pai uniu as mãos diante do rosto. —
Bellissima! Soph, minha filha… — Ele começou a chorar.
— Babbo, não faça isso. — Pressionei o canto do olho com o nó do
dedo. — Assim vou chorar antes de chegar à igreja.
— Estou muito feliz por você, minha filha! Noah é um rapaz
maravilhoso, é como nosso filho. E você é uma mulher especial. Estou muito
orgulhoso. — Ele beijou o topo da minha cabeça.
Com seu caminhar seguro, Anna se aproximou de mim com um
sorriso.
— Noah sempre foi um menino especial. Desde criança eu via o
cuidado que ele tinha comigo, com a avó… e sempre vi o carinho que ele
tinha por você, bambina. — Ela acariciou meu rosto. — Vocês sempre
estiveram destinados a serem um do outro. Rezei muito para que
enxergassem isso. — Ela abriu a bolsinha que carregava. — Quero te dar
isso. Foi da minha avó, da minha mãe, depois meu e agora é seu.
— Anna, é muito lindo! — Peguei o broche em forma de flor,
incrustado de pequenas pedras. — Ah, meu Deus, eu realmente vou chorar
antes de entrar na igreja!
— Você sempre foi como uma filha para mim. Obrigada por fazer o
meu menino tão feliz. — Ela pegou o broche das minhas mãos e pregou no
corpete do vestido. — Gostou?
— Amei, Anna. E vou guardá-lo como um tesouro, pode ter certeza.
— Beijei a mão dela. — E eu que agradeço por você ter educado Noah do
jeito que fez. Você é uma mulher forte, especial e um exemplo para mim.
— Ah, assim eu é que vou chorar… — Ela me abraçou.
— Filha! — Minha mãe entrou no quarto quase gritando. — Olha o
seu buquê, que coisa mais linda! — Ela estendeu as flores para mim.
Peônias! Sempre elas. Ah, Noah, você só acertava! Na tradição dos
casamentos italianos, o buquê era um presente do noivo. Eu achava aquela
uma das coisas mais bonitas da cerimônia, então decidimos também seguir o
costume. E meu noivo, claro, não decepcionou. Eram peônias em diferentes
tons de rosa e branco. Eu queria tanto ver Noah. Estava ansiosa.
— Pronta, Soph? — Minha mãe sorriu.
— Sim. — Respirei fundo.
— Ainda bem que não precisamos ter aquela conversa sobre o que
você deve esperar da noite de núpcias…
— Mamma! — Dei uma risada.
— Como sua pele anda sempre viçosa, sei que está satisfeita, e isso
me deixa muito feliz, porque o sexo é uma parte importante do casamento. —
Ela piscou para mim.
— Vamos realmente falar sobre isso? — Senti minhas bochechas
esquentando.
— Eu só queria dizer que, já que estão praticando bastante, espero
que logo venha um neto.
— Dio Santo, mamma, nem casei ainda!
— Mas vocês já vivem juntos. Têm uma vida estável. Não esperem
muito. Daqui a pouco estarão velhos e…
— Você está parecendo a nonna Violetta — zombei.
— Desculpe! É a ansiedade de uma mãe casando sua única filha.
Estou tão feliz. — Ela me abraçou.
— Eu também, mamma. — Beijei-lhe a bochecha.
— Todos preparados? — Babbo bateu palmas, empolgado. — Já
arrumei o carro!
Meu pai tinha um Bel Air 1955, branco e vermelho, que nunca tirava
da garagem. Havia sido do pai dele e era tratado como uma relíquia. A igreja
era a uma quadra da casa dos meus pais, mas eu não podia ir andando vestida
de noiva. Babbo fez questão de que usássemos o antigo automóvel, o que me
deixou extremamente comovida. Eu sabia quanto aquilo era importante para
ele.
O carro estava decorado com diversas flores no para-choque frontal.
Era outra tradição italiana. Significava que estávamos abrindo caminho para
uma dolce vita.[61] Babbo abriu a porta para mim. Fui no banco traseiro e ele
de motorista. Meu pai jamais deixaria nenhuma outra pessoa conduzir aquele
carro.
A volta de carro durou uns quinze minutos em boa parte por causa da
lenta velocidade do automóvel.
— Chegamos! — Babbo abriu um sorriso animado.
— Ainda não acredito que não pude me olhar nem no retrovisor do
carro! — reclamei.
Meu pai saiu do carro e abriu a porta traseira para mim.
— Você está linda, confie no seu pai. — Babbo pousou a mão no
meu rosto.
— Uma opinião um tanto parcial, você não acha? — Ergui as
sobrancelhas.
— Você é a noiva mais linda que já vi, Soph. — Ele estendeu a mão
para mim.
A porta da igreja estava fechada e havia uma fita pendurada do lado
de fora. Mais uma tradição italiana. Eu sorri. Servia para avisar que estava
ocorrendo um casamento. Meu sorriso só foi interrompido quando vi que
havia jornalistas ali. Me esperando. Claro, Noah era uma celebridade, havia
acabado de vencer o Super Bowl e estava em alta. Eu ainda era relativamente
conhecida por causa do reality show e o restaurante também ia muito bem.
Minha garganta ficou seca quando me lembrei de todos os
comentários maldosos sobre o meu peso que a imprensa já tinha feito, as
matérias sensacionalistas que não entendiam o que um homem como ele
podia ver numa mulher como eu. Mas hoje não! Hoje era o meu dia. Eu
estava me sentindo maravilhosa, uma diva — me sentia a representação da
italiana poderosa. Iria sair daquele carro como uma encarnação de Sophia
Loren. Levantei o queixo, decidida a brilhar. Eu era linda sendo curvilínea.
Eu era desejada. Eu era feliz.
— Pronta? — Meu pai sorriu.
— Prontíssima! — Enganchei meu braço no dele.
Passei pelos jornalistas e não dei uma palavra, apenas sorrisos. Vejam
como estou feliz. O que eles iam escrever nos tabloides pouco me importava.
Eu não iria ler.
Quando as portas da igreja se abriram, vi Adri na lateral, me
esperando. Ela era minha dama de honra. Nick, o padrinho de Noah.
Foi preciso muita paciência e uma alta dose de convencimento para
que o padre Rossi me deixasse entrar na igreja com a música que eu havia
escolhido. Nada de “Marcha nupcial”. Nada de “Ave Maria”. Escolhi fazer
minha caminhada ao som de “All I Want Is You”, do U2, para homenagear
Noah.
Quando os acordes iniciais começaram a soar pela igreja, eu o vi no
altar, com um sorriso tão grande que parecia ofuscar tudo ao redor. Ele
balançava a cabeça como se tivesse aprovado a minha escolha. Pensei que ia
chorar. Mas eu estava tão feliz que não conseguia fazer outra coisa que não
fosse sorrir.
Aquela cerimônia não mudaria nada para nós, mas era muito bom
celebrar o nosso amor cercados por aquelas pessoas que faziam parte da
nossa história, que nos viram crescer. Até nonna Violetta estava sorrindo, e,
acreditem, não era nada fácil ver aquela cena!
Meu pai deu um beijo na minha testa e entregou minha mão para
Noah.
— Principessa, o que é isso? Assim meu coração não aguenta! — Ele
beijou minha mão. — Você é a coisa mais linda que eu já vi na vida.
— Que bom, dolce principe. Porque ninguém me deixou olhar no
espelho — sussurrei. — E você está a coisa mais gostosa nesse terno.
O padre Rossi pigarreou. Droga, ele deve ter ouvido o que falei.
Noah deu uma risada debochada.
A cerimônia transcorreu como de costume. O padre Rossi falou tanto
que parecia que estávamos na catequese novamente. Noah tentava conter um
bocejo. Eu já estava com vontade de rir. Nossas mães choravam. Até Vitto
estava chorando! Finalmente, a hora de trocar as alianças havia chegado.
Nick entregou a caixa ao padre, ele as abençoou e entregou a Noah a minha
aliança. O padre Rossi foi falando e Noah foi repetindo as palavras:
— Eu, Noah Vicini Lacox, recebo a ti, Sophia Di Lucca, como minha
legítima esposa. Prometo ser fiel, amar-te e respeitar-te, na alegria e na
tristeza, na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza, por todos os dias da
nossa vida. — Ele sorriu.
Quando eu ia pegar a aliança das mãos do padre, Noah pediu a
palavra.
— Só preciso falar mais algumas coisas. Hoje é o dia mais feliz da
minha vida, por poder celebrar com todas as nossas pessoas queridas o fato
de eu ter como esposa a minha melhor amiga. Sei que é um privilégio amar
uma pessoa como Soph e ser amado de volta. Sempre serei o seu melhor
amigo, o seu companheiro, farei qualquer coisa para te ver feliz, principessa.
Eu te amo demais, e ter você ao meu lado é o que dá sentido à minha vida.
Fiquei com a boca aberta segurando a aliança. Se eu pensei que não
iria chorar foi aí que caí do cavalo. Fiz os votos tradicionais em meio a
lágrimas, coloquei a aliança no dedo dele e também decidi que precisava
dizer algumas palavras.
— Noah, todo mundo que te conhece sabe que você é a melhor
pessoa que existe. Então, dolce principe, o privilégio é meu por te amar e ser
amada de volta. Muito obrigada por ser o melhor companheiro de vida e me
fazer feliz todos os dias. Ti amo, amore mio.
Os convidados choravam. Posamos para algumas fotos e estávamos
prontos para deixar a Igreja. Lá fora, um cortejo nos esperava para a
tradicional chuva de arroz.
— Auguri![62] — gritavam nossos familiares e amigos enquanto
jogavam arroz.

A festa de casamento foi realizada no Modern Pasta. Adaptamos o


ambiente para que tivesse uma pista de dança e pudesse abrigar os
convidados. Para a nossa primeira dança, Noah não quis combinar comigo
qual seria a música, o que tinha me deixado um pouco tensa. Vi Noah se
aproximando do técnico de som com um sorriso. Era hora da dança. Dio
Santo.
— Noah, por favor, não me diga que você vai querer reproduzir a
coreografia final de Dirty Dancing? — Arregalei os olhos.
— Você não confia nas minhas habilidades de dançarino? — Ele
arqueou as sobrancelhas.
— Não. Nem nas minhas — confessei.
— Achei melhor deixar essa opção para as bodas de ouro. Assim
temos bastante tempo para praticar. — Ele piscou para mim.
E aí ouvi os acordes iniciais de “True”, do Spandau Ballet. Respirei
aliviada.
— A gente dançou essa música no baile de formatura, lembra? — Ele
segurou com firmeza a minha cintura.
— Claro! Jamais esquecerei.
— Queria ter feito tantas coisas com você naquele dia, Soph… —
sussurrou ele no meu ouvido.
— Acho melhor você parar, campeão. — Apertei seus ombros.
— Está ficando excitada, esposa? — caçoou ele.
— Você sabe que sim, marido. — Dei uma risada.
— Mal posso esperar por essa noite de núpcias, mas ainda temos que
cortar o bolo, distribuir as amêndoas confeitadas… No entanto, se a gente
sumir por alguns instantes ninguém vai notar. — Ele sorriu diabolicamente.
E aí nosso momento romântico foi interrompido pela tarantella.[63]
Obviamente não podia faltar. Todos os convidados formaram uma roda. Eu e
Noah estávamos no meio. A roda ia para um lado e para o outro. Chegava um
momento em que o círculo se desfazia, todos começavam a bater palmas e
trocar os pares. Uma das melhores partes foi ver os jogadores do Giants,
companheiros de time de Noah, tentando acompanhar os passos. O ciclo
continuou por um tempo, até que voltei aos braços de Noah, com as
bochechas quentes e meio ofegante pelo esforço.
— Estou me sentindo naquela cena do casamento da Connie, em O
Poderoso Chefão. — Noah riu.
— Você é o meu italiano favorito. Não preciso de mafiosos. —
Acariciei seu rosto.
— Ainda bem, Soph. Sou péssimo com esse lance de matar
pessoas…
— Obrigada, Noah! — Dei-lhe um beijo apaixonado.
— Pelo quê, principessa? — As sobrancelhas dele se uniram.
— Por ser quem você é.
— Essa é a melhor declaração de amor que você já fez, sabia? — Ele
beijou o meu pescoço e me girou no ar.
E bem ali, no meio daquela confusão tão familiar para nós, eu sabia
que estava em casa. Nos braços de Noah eu tinha o meu lar. Desde sempre.
Para sempre.
— Noah, não é por aí. Eu disse para você virar antes! — cobrava
Soph.
— Mas eu tinha certeza de que era para entrar exatamente nesta rua!
— Cocei a cabeça.
— O que você tem contra a tecnologia? — grunhiu a minha esposa.
— Nada. Por quê?
— Então qual é o motivo de não usar o GPS?
— Pensei que seria desnecessário… — Tentei me justificar.
— Obviamente estamos vendo que o GPS tem bastante utilidade. —
Ela deu uma risada debochada.
— Ok, principessa, vamos ligar essa joça. — Ri enquanto conectava
o GPS do celular, que estava preso ao vidro frontal do carro.
Soph e eu estávamos na Toscana, como ela havia me requisitado
quando a pedi em casamento, aqui mesmo, um ano antes. Tudo bem,
estávamos perdidos, mas nada abalava o meu bom humor. Eu tinha tudo de
que precisava para ser feliz, reclamando bem ali ao meu lado. Bom, ela tinha
razão. Foi só ligar o GPS e percebi que estávamos muito perto da Villa
Laura, em Cortona, onde iríamos nos hospedar. Era uma surpresa para a
minha sposa.[64] Quando estacionei em frente à enorme propriedade revestida
de pedras claras, vi a expressão de espanto de Soph.
— Meu Deus, Noah… — Ela levou as mãos à boca. — É a Villa
Laura? A casa do filme Sob o Sol da Toscana?
— A própria! — Sorri.
— Você é louco!
— Louco por você, principessa! — Dei-lhe um beijo apaixonado. —
Vamos ver a casa?
Nem precisei falar duas vezes. Soph saltou do carro com a maior
empolgação.
— É tão lindo, estou sem palavras! — Ela batia palmas, empolgada.
— Olha esse cheiro… Tem jasmins e lavandas. Que coisa linda! — Ela
apontou para o jardim na entrada.
— Principessa, fique paradinha aqui — instruí e abri a porta. Peguei-
a no colo e cruzei a entrada com ela em meus braços.
— Sou pesada para ser carregada assim — debochou ela.
— Quieta, mulher. Não estrague o momento.
Ela deu outra risada e escondeu o rosto em meu ombro.
— É muito melhor do que no filme! Eles reformaram tudo.
— O que você quer ver primeiro? — Beijei seu pescoço.
— A cozinha!
— Então vamos lá!
Soltei-a na porta do aposento.
— Meu Deus, Noah! — Ela deu um grito. — Olha essa cozinha!
Soph começou a vasculhar o cômodo, forrado por móveis brancos.
Tinha um fogão enorme, industrial, digno de grandes banquetes. Uma ampla
janela dava para o jardim traseiro, onde havia uma piscina cercada por
espreguiçadeiras.
— Olha esse fogão! Dá para fazer muitas coisas maravilhosas aqui!
— Ela se empolgou.
— Você está de folga, Soph. Não precisa cozinhar.
— Claro que preciso! Como estar na Toscana e não fazer nenhuma
refeição para nós? Impossível! — Ela me envolveu num abraço e me deu um
beijo. — Cadê as outras pessoas?
— Que pessoas?
— Os outros hóspedes — respondeu ela, tranquilamente.
— Não tem outros hóspedes, Soph. Somos só nós.
— Você alugou esta casa enorme apenas para nós dois? — Ela
franziu o nariz.
— Claro, amore mio. Privacidade total. Somos um jovem casal em
lua de mel. Precisamos ficar sozinhos, você não acha? — Dei uma risada.
— Você é louco! Deve ter custado uma fortuna.
— Para você sempre o melhor, principessa.
— O mínimo que posso fazer é preparar algumas belas refeições
toscanas para nós.
— Só tenho fome de você. — Mordi o queixo dela.
— Dolce principe, não podemos vir para a Toscana e ficar só no
quarto — falou ela num tom manhoso.
— Ah, não? — Mordi-lhe o lóbulo da orelha.
— Noah… Quero explorar os arredores… — Ela parecia derreter nos
meus braços.
— Eu só quero explorar você — sussurrei no ouvido dela.
Dessa vez minha competição pela atenção daquela mulher tinha uma
séria concorrente: a Toscana. De fato, aquela casa era cinematográfica
mesmo, sem nenhum trocadilho. Soph foi até o jardim que ficava nos fundos
da propriedade, tirou as sandálias e mergulhou um dos pés na piscina. Depois
se sentou na borda e mergulhou as pernas até a panturrilha. Fui até ela,
sentei-me ao seu lado e também mergulhei os pés na água. Ela pegou a minha
mão e a beijou.
— Você está feliz, Noah? — Ela me encarou com seus grandes olhos
castanhos.
— Felicidade é pouco, Soph. Não consigo encontrar palavras para
traduzir o que estou sentindo. — Acariciei seu rosto.
— Sempre tive esperanças de que ficaríamos juntos. Mas tive medo
também. Porque eu não conseguia aceitar que você me enxergava como algo
além de amiga, sabe?
— Por que não?
— Eu conhecia o seu coração, Noah. Sempre soube que você era
uma pessoa maravilhosa, mas eu realmente não acreditava que você se
sentiria fisicamente atraído por mim.
— Principessa… eu não sou atraído fisicamente por você. Sou louco,
arriado por você. Por cada parte sua, Soph. Por essa sua mente tão
complicada e inteligente e por cada curva que faz parte do seu corpo. Amo
tudo a seu respeito. Desde sempre.
— Eu sei. Hoje eu sei. Mas sempre te vi malhando tanto, ganhando
músculos, ficando gostoso… Imaginei que você iria procurar alguém mais
parecido com você. — Ela deu um meio sorriso.
— Mais parecido? Tipo outro jogador? Não… Passo bastante tempo
com eles, nos treinamentos e nos vestiários. Já deu para sacar que não é a
minha — zombei.
— Não, seu tonto! — Ela pegou um pouco de água da piscina e
jogou no meu rosto. — Você entendeu o que eu quis dizer.
— Entendi, Soph. Mas o problema é que você pensava que conhecia
os meus padrões. O meu padrão de beleza é você, principessa. Sempre foi e
sempre será. E eu só faço tantos exercícios por causa da profissão. Gosto de
atividades físicas, mas meu nível de treinamento hoje é uma exigência
profissional.
— Isso quer dizer que você vai ficar barrigudo quando se aposentar?
— Ela fez beicinho, zombeteiramente.
— Com você cozinhando do jeito que cozinha é um risco… Mas
acredito que se intensificarmos nossa atividade física na cama estaremos
bem. — Pisquei para ela.
— Eu te amo desde que você era banguela. — Ela sorriu. — Uma
barriguinha não fará mal a ninguém. O que eu mais amo é o que está aqui. —
Ela pousou a mão no meu coração.
— Principessa… te amo demais, minha vida.
— Como você imagina a nossa família? — Ela deitou a cabeça no
meu ombro.
— Grande, barulhenta… — Sorri.
— Você quer filhos, Noah?
— Muitos.
— Muitos? — Ela levantou a cabeça e me olhou com um ar de
preocupação.
— Pelo menos uns três — respondi, tranquilamente.
— Vamos ter que negociar isso aí, campeão… — Ela sorriu.
— Soph, não quero que nosso filho se sinta sozinho. Eu só não fui
solitário porque tinha você e o Nick.
— Um filho só eu também não quero. Mas dois está de bom
tamanho, você não acha?
— Não. Mas temos bastante tempo para discutir e praticar. — Lancei
um sorriso malicioso. — O que me lembra que ainda não vimos o nosso
quarto, principessa.
— É mesmo! Vamos lá! — Ela se levantou num pulo.
Subimos as escadas e, quando Soph pôs a mão na maçaneta para
abrir a porta, segurei levemente o seu braço para impedi-la.
— Vamos manter algumas tradições, certo? — Eu a peguei no colo
outra vez e entramos no cômodo.
— Noaaaah — gritou ela —, o quarto está forrado por peônias. Vou
chorar.
— Não chore, principessa. — Eu a coloquei delicadamente sobre a
cama. — Para você, sempre peônias.
— Dolce principe, isso tudo é um sonho. Você é demais. Obrigada!
— Ela pousou a mão quente no meu rosto.
— Sempre farei o que estiver ao meu alcance para te ver feliz, Soph.
Até treinar para fazer a coreografia de Dirty Dancing nas nossas bodas de
ouro.
— Eu também, Noah… sempre farei o possível para te fazer feliz.
— Você já faz, principessa. Sexo e comida. Lembre-se disso. — Dei
uma gargalhada.
— Ah, um homem tão simples de ser satisfeito.
— Só preciso de você, Soph. Só isso.
— Sabe, Noah… do seu jeito, você é bem romântico.
— Eu me esforço.
— Vou explodir de tanto amor! — Ela apertou minhas bochechas.
— Vem cá, Soph. — Eu a puxei para ficar em cima de mim.
— Você é o meu esteio, Noah… — Ela espalmou as mãos sobre o
meu peito por cima da camiseta.
— Já estamos vivendo juntos há mais de um ano, Soph. Cada dia ao
seu lado só me dá mais certeza de que a melhor decisão da minha vida foi ter
entrado em campo para te conquistar.
— Meu campeão! — Ela riu.
— Lembra que você perguntou se a nossa paixão ia esfriar?
— Sim. Mas estou sentindo bem aqui embaixo da minha bunda que
não.
— Você me deixa louco, principessa — falei, derrubando-a ao meu
lado na cama.
— Noah… — Ela virou o rosto para o lado, quase grudando o nariz
no meu. — Se você quer pelo menos três filhos, o que ainda precisamos
negociar, temos que agilizar a produção.
— É pra já, principessa! Estou pronto para entrar em campo! —
Esfreguei as mãos.
— Noah, tu sei il mio mondo.[65] — Ela deu um beijo no meu nariz.
— Io ti amo, bella mia.[66] Nossa história está só começando.
Soph se posicionou em cima de mim outra vez. Lentamente, tirou o
vestido que usava, com o olhar fixo no meu e um sorriso malicioso e
delicioso nos lábios. Ela tinha total domínio do meu corpo, da minha mente,
do meu coração… Então se curvou, me deu um beijo no pescoço e mordeu
suavemente o lóbulo da minha orelha.
— Estou pronta para o meu campeão — murmurou ela em meu
ouvido.
Ah, se eu já estava duro antes, depois disso parecia que ia explodir.
Agarrei-a por aquela bunda deliciosa e a levantei, para que ela me deixasse
tirar a minha bermuda. Lendo meus pensamentos, como sempre, ela levou as
mãos ao fecho da roupa e a tirou rapidamente, com a cueca. E lá estava
Lacox Jr. prontinho para a ação.
— Gostou da lingerie nova? — provocou ela apontando para o
conjunto criminoso de calcinha e sutiã vermelhos.
— Adorei tanto que estou me segurando para não rasgar tudo com os
dentes — grunhi.
— Ah, dolce principe, vamos tirar essa camiseta. — Ela puxou a
peça pela minha cabeça.
— Adoro como você é macia e arredondada nos lugares certos. —
Acariciei as laterais das coxas dela até chegar naquela bunda maravilhosa,
apertando-a.
— Você ama uma bunda, né? — Soph soltou uma risada.
— Não. Eu amo a sua bunda. — Sorri. — Amo seus peitos também.
Seus olhos. E essa boca que sabe me deixar louco de todas as formas. —
Acariciei os lábios dela com o polegar.
— Você quer que eu te deixe louco agora, amore mio? — Ela me
encarou enrolando uma mecha de cabelo com o dedo. Ah, bandida!
— Me enlouqueça, principessa, como só você sabe fazer… —
declarei num tom de voz baixo e predatório.
Soph apenas sorriu em resposta e me deu um beijo selvagem, depois
mordeu o meu lábio inferior. Ela foi depositando beijos em meu pescoço e
descendo pelo meu peito, beijando pacientemente cada tatuagem. Chegou à
minha barriga e levantou a cabeça para me olhar. Eu já estava respirando
mais profundamente com a expectativa.
Ela posicionou os joelhos entre as minhas pernas e abocanhou meu
pau com fome, com vontade. Ah, eu adorava ver Soph me chupando daquela
maneira. Parecia que ela curtia tanto quanto eu, e aquilo me dava ainda mais
tesão.
— Ah, Noah — ronronou ela —, eu amo o seu sabor. Você é tão
gostoso. — E me lançou um olhar selvagem. Eu podia gozar só com aquilo.
Dio Santo!
Soph aprofundou a sucção e me tinha quase todo dentro dela. Aquela
boca quente e aveludada me levava à beira do precipício. Minha esposa era
tão habilidosa com a língua, puta que pariu! Ela raspava os dentes na medida
certa, na cabeça, e aquilo me provocava descargas de adrenalina e prazer. Ela
chupava, mordiscava e lambia e eu quase perdia o controle.
— Principessa — falei, com a respiração entrecortada. — Você está
me levando ao limite. Não vou aguentar.
— Esse é o objetivo — Ela sorriu maliciosamente, levantando-se
apenas por um instante para me encarar.
— Ah, Soph… vou gozar dentro de você. Senta em mim — rugi.
Ela se levantou, tirou a minúscula calcinha e jogou a peça longe.
Sentando-se em cima de mim, me olhou com aquela cara safada que eu tanto
adorava. Levou as mãos às costas e tirou o sutiã. Soph se posicionou na
minha ereção e se deixou deslizar pelo meu pau. Senti-la por dentro, naquela
fricção enlouquecedora, era demais para mim. A melhor sensação que eu já
havia experimentado.
— Rebola pra mim, Soph… Vem… — Dei um tapinha na bunda
dela.
— Assim está bom, campeão? — Ela espalmou as mãos no meu
peito e deu uma risada marota.
— Ah, principessa. — Agarrei-a pela bunda e ergui os quadris,
dando-lhe estocadas rápidas e profundas. Quase a levantei completamente da
cama.
— Ah, Noah… — ela começou a gemer e mordeu os lábios.
Fui metendo mais e mais, totalmente enterrado nela. Com o polegar,
fazia movimentos circulares no clitóris dela. Levantei-me para abocanhar
aqueles peitos deliciosos. Ia alternando entre eles, sugando e mordiscando
aqueles mamilos que sempre estavam em alerta para mim. Agora nós dois
estávamos sentados, encaixados e ondulávamos espelhando um o movimento
do outro. Ah, Soph, você vai gritar.
Ela cravou as unhas nas minhas costas. Eu ainda estava com a cara
enterrada naqueles peitos maravilhosos. O cheiro dela era como um
entorpecente para mim, sempre me levava a lugares nunca explorados e eu
jamais me saciava.
— Você é minha, principessa. Toda minha. — Mordi-lhe o pescoço
e me enterrei nela até a base.
— Ah, dolce principe — falou ela, ofegante, e então gemeu e gritou,
berrou e ganiu. Eu adorava todos os sons que a minha mulher fazia.
Me sentindo um campeão por ter conseguido me segurar tanto, me
derramei inteiro nela, enquanto Soph ainda tremia e me apertava dentro dela.
— Você é a coisa mais gostosa que existe. — Dei-lhe um chupão no
pescoço.
— Você que é, meu campeão. Eu te amo tanto, Noah.
— Eu também principessa, mais do que tudo.
Ficamos ali, sentados, ainda unidos ouvindo a respiração um do
outro. Soph abriu o sorriso mais lindo do mundo, aquele que me enfeitiçava
desde que eu me entendia por gente. Ela era a imagem da felicidade, com as
bochechas coradas, o brilho nos olhos. Nos braços daquela mulher eu tinha
paz.
Pode parecer bobeira, mas de alguma forma, mesmo com toda a
nossa teimosia, eu sabia, desde aquela Festa de San Gennaro, quando beijei
Soph aos onze anos, que ela era o meu destino. Durante algum tempo, um
bom tempo, fui aquilo que se pode chamar de um mulherengo, mas estava
solteiro e achava que Soph só me via como um amigo. No momento em que
tive um vislumbre de esperança de que ela podia me querer tanto quanto eu a
queria, decidi entrar em campo para valer, lutando por ela.
Enfrentaríamos dificuldades, teríamos altos e baixos, mas quando se
tinha o privilégio de ser casado com a sua melhor amiga nenhum obstáculo
seria páreo para o amor que eu sentia por ela. Soph era a minha família, era a
minha melhor amiga, a minha mulher. E eu era o homem mais feliz do
mundo por ter o seu coração e ter entregado o meu a ela. Aquela era a minha
verdadeira vitória.
FIM
Uma surpresinha para vocês: algumas receitas da Soph. O tão famoso cannoli
não poderia faltar, é claro! Elas foram elaboradas com todo o carinho e
cuidado, pelo chef Giovani Vivan, e são exclusivas para Jogo à italiana.
Espero que se divirtam cozinhando. Tirem fotos e me marquem no Insta.
Levain
O levain é o fermento natural do qual Soph tanto gosta. Vamos à receita?
Ingredientes:
30g de farinha de trigo
20g de farinha de trigo integral
50ml de água
Modo de preparo:
O levain é um preparo simples, mas é preciso cuidar muito bem dele, já que é
a alma dos pães de fermentação natural.
Misture os 30g de farinha de trigo aos 20g de farinha de trigo integral e 50ml
de água. Misturar muito bem os ingredientes e deixar 24 horas em
temperatura ambiente.
Depois dessas 24 horas repetir o processo, só que desta vez, tente utilizar 50g
de farinha de trigo integral e 50ml de água. A farinha integral tem micro-
organismos que alimentam o levain e ajudam o fermento a crescer.
Novamente, espere as 24 horas e repita o processo.
O levain vai criar uma aparência esponjosa. Para saber se está pronto para ser
usado, pegue um copo de água e coloque uma colher de levain. Se o fermento
boiar, está pronto para uso. Caso afunde, precisa descansar por mais um
tempo, fermentando.
Com o levain pronto, é hora de partir para o preparo das pizzas.
Massa de pizza:
Ingredientes:
310g de farinha de trigo
100g de levain
6g de sal
18ml de água
Importante: é preciso alimentar o levain 12h antes de utilizá-lo. Como você
vai alimentá-lo? Adicione 75g de farinha e 75ml de água. Faça a mistura e
deixe fermentar novamente. Para saber se o levain está estruturado para uso,
encha um copo de água, e coloque uma colher de levain dentro do copo. Se
flutuar, está pronto para ser utilizado.
Preparo da Massa:
Misture o levain à água, depois adicione a farinha de trigo. Quando estiver
uma mistura homogênea, acrescente o sal, e misture bem. Cubra a massa e
deixe-a descansar por 40 minutos. Após o descanso, sove delicadamente a
massa para ela ficar uniforme. Pegue um pote e unte com azeite. Acomode a
massa nesse recipiente e leve à geladeira.
A cada 1 hora é preciso dobrar a massa. Como fazer isso? Segure bem no
meio e puxe a massa para cima e dobre nela mesma. Repetir o procedimento
por quatro vezes e devolver à geladeira.
O processo de dobrar a massa será repetido por quatro vezes, ou seja, irão se
passar quatro horas. Depois, é preciso deixar a massa descansar na geladeira
por 12 horas.
Essa receita rende duas massas de 280g. Então, separe a massa nessas duas
porções e leve à geladeira por mais 12 horas para descansar. Depois deste
processo, a massa está pronta para uso. Agora vamos às pizzas?
Pizza de pepperoni:
A massa nós já temos. Então, vamos ao molho.
Molho de tomate:
Ingredientes:
800g de tomate.
150g de cebola.
30g de alho.
50g de cenoura
50g de alho poró.
30g de salsão.
3 folhas de louro.
Sal a gosto
Modo de preparo:
Em uma panela grande, ponha água para ferver e cozinhar os tomates.
Na extremidade dos tomates, faça um X com a faca, mas com cuidado. Não
pode ser muito fundo.
Quando a água estiver fervendo, coloque os tomates aos poucos. Coloque de
3 em 3, isso pode variar com o tamanho da sua panela, mas o grande segredo
é que em nenhum momento a água pode parar de ferver.
Deixe o tomate cerca de 40 segundos na panela. Depois desse tempo, retire-
os da panela e deixe-os descansando.
Corte a cebola, o alho-poró e a cenoura em cubos. Eles serão refogados na
seguinte ordem: as cenouras com manteiga até elas ficarem douradas em
volta e começar a sair um aroma adocicado da panela. Depois, coloque a
cebola e espere ela caramelizar, o mesmo processo da cenoura. Ambas devem
estar em um dourado brilhante. Esse é um molho para fazer devagar, assim
aproveitando o açúcar dos legumes. Depois, acrescente o alho, o salsão, o
alho-poró e as folhas de louro, e repetir o processo: espere os legumes
caramelizarem novamente.
Ao final deste processo, acrescente todos os ingredientes, inclusive os
tomates, numa panela e deixe o molho ferver por 40 minutos.
Você pode ter o molho mais rústico, deixando alguns pedaços de tomate mais
grossos para outros pratos, mas para a pizza bata esse molho no liquidificador
e depois peneire para ficar bem liso.
Ao final do processo, experimente para checar se falta sal e pode moer
pimenta na hora de utilizar.
Agora que o molho está pronto, vamos à pizza?
Em uma bancada, polvilhe um pouco de farinha para abrir a massa. Pegue
umas das partes da massa e faça uma bolinha. Pressione-a levemente até virar
um disco. Este disco pode variar de tamanho. Se você gosta de massa fina,
pode abrir até 30cm de diâmetro.
Pré-aqueça seu forno em 180ºC.
Após abrir a massa deixe, aproximadamente, de 2 a 3cm de borda, então
coloque o molho de tomate. Cubra com 120g de queijo muçarela e depois
distribua cerca de 130g de pepperoni fatiado por cima, lembrando de respeitar
a borda.
Leve ao forno até dourar o recheio.
Pizza de morango e chocolate branco:
Ingredientes:
100g de creme de leite
10ml de leite
150g de chocolate branco
80g de morango.
Modo de preparo:
Coloque o leite e o creme de leite em uma panela e deixe em fogo baixo. Não
pode ferver, somente aquecer. Depois que a mistura ficar quente, desligue o
fogo, acrescente o chocolate e misture bem até ficar um creme homogêneo.
Depois de higienizar os morangos, corte-os ao meio.
Abra a massa e leve-a ao forno. Deixe por 5 minutos para que fique pré-
assada. Retire a massa do forno e cubra com o creme de chocolate branco e
coloque os morangos. Leve de volta ao forno e deixe até a massa ficar
dourada.
Cannoli:
Massa:
Ingredientes:
200g de farinha de trigo
10g de cacau em pó
50g de açúcar
5g de canela em pó
5g de sal
60ml de vinho branco
70g de manteiga
20ml de vinagre de vinho branco.
Modo de preparo:
Em uma tigela, misture a farinha, o cacau em pó, o açúcar, a canela e o sal.
Misture bem. Depois, adicione o restante dos ingredientes, até ficar uma
massa bem homogênea e deixe descansar por 30 minutos.
Depois do descanso da massa, use um rolo ou uma masseira, e abra a massa
até ficar com 3mm de espessura.
Use um molde redondo de 10cm e corte as massas em discos.
Atenção: Em algumas lojas de confeitaria, são vendidos canudos de alumínio
para cannolis, usar o de 12cm.
Com um pouco de óleo, unte o canudo de alumínio e prenda a massa a massa
em volta dele. Para não soltar durante a fritura, passe um pouco de clara de
ovo nas bordas.
Recheios:
Creme de ricota:
Ingredientes:
5g de açúcar
300g de ricota
40ml de suco de laranja
80 g de chocolate meio amargo
Raspas de laranja
Modo de preparo:
Rale o chocolate meio amargo ou corte em pequenos pedaços.
Raspe toda a casca da laranja sem a parte a branca e esprema o suco. Misture
o suco da laranja e o açúcar e leve ao fogo somente para dissolver o açúcar,
não pode ferver.
Misture todos os ingredientes até ficar uma massa homogênea.
Deixe o recheio descansando por 20 minutos na geladeira. Depois, já está
pronto para rechear o cannoli.
Creme de ricota e frutas:
Ingredientes:
6g de açúcar
300g de ricota
Raspas de 1 limão
Raspas de 1 laranja
15g de damasco
15g de ameixa
15g de uva-passa preta
15g de uva-passa branca
Modo de preparo:
Misture a ricota com o açúcar e bata na batedeira, somente para incorporar o
açúcar na ricota.
Raspe somente a casca do limão e da laranja. E reserve. Corte o damasco e a
ameixa em cubos pequenos, no mesmo tamanho das passas. Misture todos os
ingredientes e deixe 20 minutos na geladeira. Depois, recheie os cannolis.
Mousse de chocolate:
Ingredientes:
45g de açúcar
30ml de água
150g de chocolate 70%
200g de creme de leite
60g de gema
50g de ovos
Modo de preparo:
Sim, isso mesmo que você leu! 60g de gema e 50g de ovo! Para conseguir os
50g de ovo, quebre o ovo e bata com auxílio de fouet até ficar uma mistura
homogênea. Depois, separe as 50g de ovo.
Em um bowl, coloque a gema, açúcar, água e o ovo, leve ao fogo em banho-
maria até todo o açúcar dissolver.
Leve essa mistura até a batedeira, e bata até esfriar, ela vai dobrar de tamanho
e ficar em uma cor esbranquiçada. Assim que estiver pronto, reserve.
Derreta o chocolate em banho-maria ou no micro-ondas. Depois,
delicadamente, despeje o chocolate no creme de ovos.
Bata o creme de leite até ficar firme, cuidado para não bater demais e virar
manteiga!
Misture o creme de leite batido no creme já preparado com muito cuidado
para não perder aeração da massa.
Dica: deixe o mousse em uma bisnaga ou manga de confeiteiro, assim fica
mais fácil para rechear o cannoli. Como é um mousse bastante aerado, depois
de pronto mexer o menos possível para manter a textura.
Panetone red velvet:
O preparo começa pelo menos 8 horas antes do preparo da massa do
panetone.
O primeiro passo é alimentar nosso levain, lembra dele? Mas não é um
panetone 100% levain!
Coloque 25g do levain (bem estruturado), acrescente 100g de farinha de trigo
e 100ml de água e deixe descansar por 8 horas.
O outro preparo que deve começar antes é o da essência do panetone.
Ingredientes:
¼ de fava de baunilha
Raspas de 1 laranja
Raspas de 1 limão siciliano
150ml de conhaque
Modo de preparo:
Em uma panela, coloque a água e o conhaque e deixe ferver por 10 minutos.
Desligue o fogo e deixe esfriar um pouco.
Depois, acrescente as raspas de laranja e limão, a fava de baunilha (separe as
sementes da fava, pois vamos utilizá-las mais à frente, então coloque-as em
um pote e deixe na geladeira. Coloque a fava sem as sementes na mistura.
Depois de esfriar, coloque a essência de panetone em um vidro e deixe na
geladeira.
Massa do panetone:
Ingredientes:
200g de farinha de trigo
125g de levain
125g de gema
7g de fermento seco
3g de sal
60g de açúcar
3g de mel
60g de manteiga
¼ de fava de baunilha
80g de essência de panetone
125g de chocolate branco
200g de recheio (receita a seguir)
Corante vermelho
Modo de preparo:
Em uma tigela vamos misturar a farinha de trigo, o levain que ficou
fermentando por 8 horas, o mel, a gema (de preferência gelada) e o fermento
seco.
Comece a trabalhar a massa até ela ficar macia e elástica. Pegue 2 colheres de
chá de corante vermelho, misture com a essência de panetone e acrescente à
massa.
Quando a massa estiver bem macia e elástica, acrescente aos poucos o açúcar
(para ficar mais fácil, divida a quantidade de açúcar em 6 partes).
Acrescente a manteiga (de preferência, refrigerada) e faça o mesmo processo
do açúcar, colocando a manteiga em partes. Esse momento é bem delicado, a
massa, por causa da manteiga, vai estar mais mole, mas não se preocupe: não
coloque mais farinha, esse é o processo do panetone mesmo.
Depois de incorporar tudo, acrescente as gotas de chocolate e misture
delicadamente. Outra etapa muito delicada é a primeira fermentação. O
tempo da primeira fermentação pode variar de acordo com a região em que
você mora. Em cidades mais quentes, pode ser mais rápido e em cidades mais
frias pode levar um pouco mais de tempo.
O grande segredo é esperar a massa dobrar de tamanho. Cuidado para não
exagerar muito, pois pode mudar o resultado final do panetone (esse processo
pode levar em média 6 horas).
Quando terminar a primeira fermentação, passe um pouquinho de óleo na
massa e dobre a massa sobre ela mesma e faça uma bolinha.
Depois desse processo, coloque na forma de panetone, e espere a massa
dobrar de tamanho novamente.
Pré-aqueça o forno a 170°C.
Antes de levar ao forno, com uma tesoura, faça um X no topo do panetone,
acrescente um cubo de manteiga e pincele uma gema por cima.
Tempo de forno: em média de 35-40min. Caso comece a dourar muito
rápido, abaixe o fogo.
Recheio do panetone:
Ingredientes:
80g de açúcar de confeiteiro
8g de cream cheese
1 ovo
Modo de preparo:
Peneire o açúcar. Em uma batedeira, coloque o suco de um limão siciliano o
cream cheese, o açúcar peneirado e os ovos. Bata até virar um creme
homogêneo.
Após o panetone sair do formo, faça um processo que se chama deixar o
panetone para morcegar. Coloque espetos de churrasco na base do panetone e
o deixe esfriar de ponta cabeça.
Depois que o panetone esfriar, faça pequenos buracos na tampa e coloque o
recheio. Prontinho, agora é só saborear o panetone com o qual Soph
conquistou a produção da Cozinha do Nuno!
Vivian Lemos nasceu no Rio de Janeiro, é jornalista e escritora e apaixonada
por histórias, sejam elas reais ou fictícias. É professora universitária,
doutoranda em Comunicação e mestre em Direitos Humanos e Políticas
Públicas. Adora romances de tirar o fôlego, mocinhas empoderadas e
mocinhos apaixonantes.
Mora em Curitiba com o marido e três gatos, sendo os felinos seus mais
implacáveis críticos. Despedaçados, seu romance de estreia, tornou-se best-
seller na Amazon.
Confira Despedaçados aqui.

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[1]
Bairro tradicional de imigrantes italianos, em Manhattan, Nova York.
[2]
Quarterback é uma posição do futebol americano. Jogadores de tal posição são membros da equipe
ofensiva do time e alinham-se logo atrás da linha central, no meio da linha ofensiva. Sua função é dar início às jogadas
e fazer passes.

[3]
Cannoli é uma sobremesa proveniente da Sicília, que consiste em uma massa doce frita, em formato de
tubo, recheada com um creme de ricota.
[4]
“Meu filho”, em italiano.
[5]
“Vovó”, em italiano.

[6]
“Senhorita”, em italiano.
[7]
Super Bowl é o jogo final do campeonato da NFL, a principal liga de futebol americano dos Estados
Unidos, que decide o campeão da temporada.

[8]
“Papai”, em italiano.
[9]
“Minha querida”, em italiano.
[10]
“Meu amor”, em italiano.
[11]
Throwback thursday (TBT) é uma gíria popular que traduzida significa “Quinta-feira do retorno” ou
“Quinta-feira da nostalgia”. Costuma ser incluída em legendas para fotos antigas que os usuários publicam às quintas-
feiras no Instagram.

[12]
“Linda mulher!”, em italiano.

[13]
A National Football League é a liga esportiva profissional de futebol americano dos Estados Unidos.
[14]
Wide receiver é uma posição ofensiva do futebol americano. É o jogador chave na maioria das
jogadas para pontuações.

[15]
“Caramba”, em italiano.
[16]
Porque eu tive os melhores momentos da minha vida/ Não, eu nunca me senti assim/ Sim, eu juro, é
verdade/ E devo tudo a você.
[17]
“Bom dia, menina”, em italiano.

[18]
“Santo Deus”, em italiano.

[19]
O prêmio de Jogador Mais Valioso da Liga Nacional de Futebol Americano (MVP da NFL) é um prêmio
concedido por várias entidades ao jogador de futebol americano que é considerado o mais valioso da NFL durante a
temporada regular.
[20]
A National Football Conference (NFC) é uma das duas conferências da NFL. A conferência foi criada
em 1970, quando houve a fusão das ligas NFL e AFL (American Football League). A NFC era composta por treze das
dezesseis equipes da NFL existentes na época — as outras três foram colocadas na AFC (American Football
Conference). Desde então, três novas equipes se integraram, por meio de expansão e mudanças nas divisões, sendo que
atualmente a NFC é composta por dezesseis equipes.

[21]
Área de dez jardas no final de cada lado do campo e o objetivo principal de cada time. Para marcar
um touchdown, as equipes têm que chegar nessa área.

[22]
Touchdown é uma pontuação do futebol americano e do futebol canadense. Ele vale seis pontos e é
conseguido com o jogador cruzando a linha de gol sem ser obstruído.

[23]
Jogada que ocorre quando algum jogador consegue passar pela linha ofensiva e derrubar o
quarterback ainda com a bola na mão.

[24]
Formação na qual a linha ofensiva diminui os espaços entre si para proteger melhor o quarterback,
utilizada em situações de passe.
[25]
Um field goal (gol de campo) é uma forma de pontuar no futebol americano, na qual, em vez de se
passar a bola para um quarterback, ela é passada para um placeholder, que a segura junto ao chão de forma que um
kicker possa executar o chute, fazendo-a passar entre os postes do gol (por vezes conhecidos como uprights). O acerto
vale três pontos no placar.

[26]
Uniforme profissional de chefs de cozinha.
[27]
“Querido”, em italiano.

[28]
Jogos em que as equipes de cada divisão de uma das conferências da NFL disputam. A NFC é uma dessas
conferências, e o New York Giants pertence a ela.
[29]
NFL Scouting Combine é uma espécie de laboratório de observação para futuros jogadores da NFL,
que poderão ser escolhidos no próximos Drafts. Trata-se de um dos períodos mais importantes para o recrutamento
universitário da liga profissional de futebol americano, onde as promessas universitárias são avaliadas pelos
departamentos de estatísticas dos 32 times da NFL.

[30]
Onde você for, eu irei/ Onde você ficar, eu ficarei/ Quando você se mover, eu me moverei/ Eu seguirei.
[31]
“Obrigado, senhorita”, em italiano.
[32]
Arranjo floral, que é tradição, especialmente nos bailes de formatura nos Estados Unidos. As mulheres
geralmente o utilizam no pulso.
[33]
Gentrificação (do inglês gentrification) é o fenômeno que afeta uma região ou bairro pela alteração
das dinâmicas da composição do local, tal como novos pontos comerciais ou construção de novos edifícios, valorizando
a região e afetando a população de baixa renda local. Tal valorização é seguida de um aumento de custos de bens e
serviços, dificultando a permanência de antigos moradores de renda insuficiente para sua manutenção no local cuja
realidade foi alterada.

[34]
Doce italiano feito de amêndoas.
[35]
Sigla para se referir a quarterback.
[36]
“Minha linda”, em italiano.
[37]
É o tipo de comida que se pode comer com as mãos sem que seja necessário sentar-se à mesa e usar
pratos e talheres. É servida em porções em miniatura.

[38]
Tão longe… tão perto…
[39]
No futebol americano, tackle significa interceptar o avanço do jogador adversário, derrubando-o no
chão.

[40]
“Que mulher bonita”, em italiano.
[41]
“Meu tesouro”, em italiano.
[42]
“Minha menina”, em italiano.
[43]
“Princesa”, em italiano.

[44]
“Bom dia, princesa”, em italiano.

[45]
“Bom dia, meu amor”, em italiano.

[46]
Bisteca fiorentina, um prato típico italiano.
[47]
“Eu te amo tanto, meu amor”, em italiano.
[48]
“Eu também”, em italiano.
[49]
Tipo de jogada defensiva em que os linebackers e/ou safeties e cornerbacks avançam para tentar
pegar o quarterback adversário.
[50]
Quando o jogador que tem posse da bola a solta antes de a jogada ser interrompida pelos juízes. Se o
time adversário recuperar a bola e correr até a endzone, anota um touchdown. Se receber um tackle antes, a jogada é
paralisada, e o time do jogador começará o próximo ataque naquele local do campo. Se a bola é recuperada pelo mesmo
time que perdeu, o mesmo acontece: o jogador pode avançar e a próxima jogada começará onde ele for derrubado.
[51]
Esse é um dos grandes momentos da defesa. Ocorre quando algum jogador consegue passar pela linha
ofensiva e derrubar o quarterback ainda com a bola na mão.

[52]
“Te amo muitíssimo”, em italiano.
[53]
“Como te amo”, em italiano.

[54]
“Doce príncipe”, em italiano.
[55]
Xingamento em italiano, “porra”.

[56]
Um dos símbolos da Toscana é o cipreste, o pinheiro longo que geralmente é colocado em fila para marcar
o caminho de entrada de uma propriedade.
[57]
“Boa noite”, em italiano.
[58]
Vinho famoso da região da Toscana.
[59]
No céu passam as nuvens/ Que voam ao encontro do mar/ Lembram lenços brancos/ Que saúdam o
nosso amor/ Deus, como te amo/ Não é possível/ Ter entre teus braços/ Tanta felicidade.

[60]
Beijar os teus lábios/ Com perfume de vento/ Nós dois apaixonados/ Como ninguém no mundo/ Deus,
como te amo/ Tenho vontade de chorar/ Em toda a minha vida/ Nunca senti isso/ Algo tão amável/ Algo tão verdadeiro/
Quem pode deter um rio/ Que corre para ao mar
[61]
“Vida doce”, em italiano.
[62]
“Felicidade”, em italiano.

[63]
Tradicional dança italiana.
[64]
“Esposa”, em italiano.
[65]
“Você é o meu mundo”, em italiano.
[66]
“Eu te amo, minha linda”, em italiano.

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