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Ein Heißer Schrei
Ein Heißer Schrei
Dia I
1
Wahnsinn, “Insanidade” em alemão, trocadilho com o sobrenome de Hermann,
“Van Sinn” (N. do E.)
chamar assim, para inspirar medo em quem caísse em minhas mãos. Eu gostei
do apelido.
– Que tipo de atrocidades o senhor cometia?
– Ah, poupe-me disso. Já tive que me confessar para os padres e para
os guardas, foda-se. Sabe, o básico, assassinato, mutilação, tortura, esse tipo
de coisa que todo mundo já está cansado de ouvir que aconteceu pelas mãos
dos nazistas. – diz Hermann, cansado, olhando agora para o teto enquanto
fala. Ainda evita olhar no rosto da psiquiatra. Medo?
Ou ela é só feia demais mesmo.
– E por que você fez isso?
Hermann não responde. Continua olhando para o teto, a cabeça
recostada na cadeira. Sono.
– Responda-me, senhor Wahnsinn.
– Estou com sono. – ele vira-se para a psiquiatra – Acho que aceito
aquele café.
– Pode pegar – acena em direção a garrafa térmica, sorrindo. O velho
responde estendendo as mãos algemadas. Ela é burra?
– Não posso pegar, estou preso.
– Tenho certeza de que o senhor consegue pegar mesmo assim. – ela é
irritante. Muito irritante, e Hermann sente-se como sofrendo um abuso. Já está
acostumado, entretanto.
Não recebe bons tratamentos dos guardas.
– Eu tenho setenta e dois anos. Não estou bom dos ossos. Seja uma
boa menina e pegue uma xícara para mim, sim?
– Parece lúcido o bastante para alguém tão debilitado.
– Mas estou com sono.
– E eu, recostada.
Sente uma súbita vontade de acertar o rosto da mulher de coque com
suas algemas, mas refreia o ímpeto. Deve controlar-se. Fechou os olhos.
Por enquanto. Por enquanto.
– Responda-me, senhor Wahnsinn. Por que matava as pessoas?
Ela surpreende-se ao ouvir roncos vindos do velho à sua frente.
O filho da puta cochilou.
Dá um chute fraco na canela do prisioneiro, impaciente.
– Responda-me. – diz, servera.
– Adoraria... mas estou com sono.
– Então sirva-se de café.
Mais uma vez, o ímpeto de raiva quase domina Hermann. Não, não
pode jogar a garrafa na cabeça dela. Não, controle-se. Porra. Pelo menos um
insulto, vamos.
– Pegue o café para mim. Ou está com as mãos sujas de tanto se
masturbar, mulher?
– Não preciso disso. – ela permanece impassível. Odeia pessoas
impassíveis.
– É frígida, então?
– Mas é claro. Completamente assexual. Meus dois filhos vieram da
cegonha.
– Ah, é casada? – ele parece mais interessado. Talvez conseguisse
manter a conversa o suficiente para extrair mais alguma coisa do filho da mãe.
Vira o porta-retratos que conserva em cima da escrivaninha. Há a foto de duas
crianças, de cabelos ruivos e castanhos. Há a presença da mesma na foto e
um homem alto, ligeiramente forte, de cabelos longos e óculos. Parece um
hippie.
– Este é o seu marido? – aponta para o hippie, sorrindo.
– Sim. – ela não demonstra emoções na resposta. Hermann está ficando
realmente zangado, mas prefere não deixar transparecer. Ela terá o que
merece, pensa.
– Como se conheceram?
– Ele era o meu paciente.
– Ah, ele é louco? Isso explica muita coisa. – dá uma risada, seca e
rasgada como a sua voz prejudicada pela idade. Tosse um pouco em
decorrência do fôlego. A psiquiatra suspira, cansada.
– Certo, senhor Wahnsinn. Vou pegar o seu café.
E o faz, para a surpresa de Hermann. Enche duas xícaras de café e as
coloca nas duas extremidades da mesa, uma para si própria. O nazista pega a
sua com dificuldade e bebe. Quente e escuro, como gosta, sem açúcar ou
adoçante.
Só o puro e negro amargo.
– Agora pode me contar por que fazia o que fazia?
Suspira. Ok.
– É interessante. Já matou alguém? Digo, devagar. Elas ficam alteradas,
e é sempre diferente como reagem a perspectiva da morte iminente.... –
começa a olhar para o vazio, talvez em devaneios, fazendo pausas enquanto
fala – Algumas imploram pela morte rápida, outras pela vida. Uns começam a
gritar segredos ou desculpas para que fiquem vivos, sugerem informações das
quais não sabem, tudo para se salvar de sua execução. Um chegou a me falar
que era virgem e que eu ou poupasse. Nunca funciona, e é sempre divertido.
– O senhor é um psicopata. – diz Gertruda, anotando.
– Se você diz. – mais uma vez esta resposta. Não parece interessado.
Quer ir dormir na sua cela, arquitetar talvez um plano de fuga, ou ameaçar os
guardas de arrancar seus genitais com uma serra de pão – Já posso ir?
– Ainda não. – pausa – O senhor tem algum interesse em deixar estas
tendências de lado?
Wahnsinn encosta os cotovelos na mesa, gesticulando com o pouco
movimento que tem das mãos:
– Veja pela minha perspectiva. Não acho que tenho mais do que cinco
anos de vida, sociopata ou não. Estou condenado a umas vinte prisões
perpétuas, não sei nem como escapei da sentença de morte. Do que me
adiantaria deixar essas “tendências” de lado? Perda de tempo.
– Posso te tirar daqui quando estiver curado. Ou te mandar para a
cadeira elétrica. A escolha está nas minhas mãos dependendo do seu estado e
progresso, senhor Wahnsinn.
Os olhos do prisioneiro brilham, e a doutora finalmente parece um pouco
mais satisfeita. Pode tirá-lo dali, se ele se comportar e colaborar com calma e
treinamento. Este estilo não parece, entretanto, fazer o tipo do alemão, mas
sempre se surpreendeu com seus pacientes. Ou então, poderia apelar para um
tratamento mais violento. Não tem muita paciência, também, e o nazista parece
um homem difícil de lidar. É mais difícil quando eles são mais velhos.
Bem. Podem tentar.
Um baque metálico é ouvido. A porta está batendo, e os seguranças
altos que haviam trazido Hermann Wahnsinn estão de volta. A primeira sessão
está encerrada, constata Gertruda Letunov ao se despedir com um aceno do
velho prisioneiro, que perde o ar feliz que carregava consigo.
Até semana que vem, senhor Wahnsinn.
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15/06/1985
Idade: 72 anos
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Dia II
22/06/1985
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