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História de amor: idoso atropelado

em SC tinha escrito carta para


esposa falecida
07/12/2021

Seu Ari imprimiu texto direcionado à esposa


pouco antes de morrer

Divulgação

52 anos, 7 meses e uma semana. Seu Ari da Cunha, 72 anos, sabia de cór até os
segundos vividos ao lado de sua grande paixão, Marlete. A esposa, falecida em janeiro,
continuava presente na memória e no coração do idoso que, na tarde da última segunda-
feira (6), se dirigiu à Câmara de Vereadores de Joinville para, entre outras reivindicações,
imprimir a história do casal e uma carta direcionada ao amor de sua vida, escrita dias
antes.

Na volta para casa, no entanto, seu Ari, que estava de bicicleta, foi atingido por um carro
desgovernado e morreu no local do acidente. Na carta de poucas linhas, Ari narra a dor
que carrega pela falta da esposa que, por mais de 10 anos, lutou contra depressão.
Ele também destaca “a riqueza de amor” que cultivava em sua relação de mais de cinco
décadas. Nos últimos 11 meses longe de Marlete, no entanto, seu Ari se sentia pobre.

Confira o texto na íntegra:

“Marlete,

Quando eu tinha você ao meu lado, me sentia mais forte. Hoje, me sinto muito fraco e
sozinho, pois olho por todos os cômodos da casa e vejo tudo muito vazio sem a sua
presença. Como eu sinto sua falta, meu coração sofre com a saudade. Sem você tem sido
muito difícil viver e será assim até o fim da minha vida.

Não penso em mais nada além de você. Quando eu precisei de ti, sempre esteve presente
ao meu lado e quando você precisou de mim, eu também estava. Estive ao lado da
cabeceira da nossa cama procurando te acalmar muitas vezes, pois a dor que você sentia
também doía em mim, pois juntos, formávamos um só corpo. Muitas lágrimas derramei por
você nestes tempos difíceis.

Começamos nossa vida conjugal sem nada, mas, com a sua ajuda, conseguimos
conquistar muitas vitórias e eu sentia que tínhamos muita riqueza de amor. Hoje, me sinto
muito pobre. Você foi minha protetora, acolhedora, ajudadora e a segunda mãe.
Permanecemos juntos por 52 anos, 7 meses e 1 semana que é igual 640 meses, 19.213
dias, 461.112 horas, 27.666.720 minutos ou 1.660.003.200 segundos. Aqui, nossas mãos
se encontram para construir uma história.”

A rua Petrópolis

Natural de José Boiteux, seu Ari foi ainda criança morar com a família em Guaramirim e,
na juventude, vendeu um porco da criação e resolveu se aventurar sozinho em Joinville.
Desde então, sempre se locomoveu com bicicleta e, da zona Sul da cidade, ia até à
fundição Tupy para trabalhar.

E foi na rua Petrópolis, justamente onde ocorreu a fatalidade que tirou sua vida, que Ari
conheceu a esposa Marlete, na década de 1960. Em menos de um ano, o casal noivou e
casou. E, por 51 anos, 2 meses e 13 dias, até o falecimento de Marlete, a rua Petrópolis
também foi o palco desta grande história de amor relatada por Ari.

“No dia 21 de junho de 1968 uma rosa sem espinho nasceu no fundo do meu coração,
onde permaneceu até a data de 29 de janeiro de 2021, quando, com muito pesar, veio a
falecer, aos 74 anos de idade. Nos deixando a saudade, mas também o prazer e o
privilégio de termos convivido com esse exemplo de ser humano, de mulher, de mãe e de
avó. No meu coração será sempre como se você não tivesse partido, pois não há dor
maior do que nos despedir do nosso próprio coração. Da morte só espero que se traga paz
e o reencontro com as pessoas amadas que já se foram. Quem parte para o descanso
eterno, deixa lágrimas de saudades e lembranças imortais”, finazou Ari em seu texto.

Líder comunitário, pai e avô

O aposentado, que também era líder comunitário, dedicou sua vida ao bem comum.
Inclusive, na tarde de segunda-feira, visitou gabinete por gabinete para pedir melhorias à
comunidade.

Ari morava no coração do bairro Petrópolis, próximo à Escola Municipal Doutor Abdon


Baptista, tinha uma filha e três netos. Sem carteira de motorista, ele rodava pela cidade de
bicicleta ou de ônibus para pedir segurança no trânsito, nas ruas ou qualquer demanda
que chegasse até ele.

Além da Tupy, atuou também na Schulz, em um posto de gasolina e até na prefeitura de


Joinville, onde se aposentou, em 1996. Neste período, chegou, inclusive, a ser presidente
do Conselho de Segurança (Conseg) da região onde morava e foi ali que passou a ter
mais contato com os parlamentares da cidade.

Levi Rioschi, seu amigo pessoal e ex-vereador de Joinville, conta que seu Ari era um
exímio frequentador de seu gabinete e andava com o livro do Estatuto do Idoso e a
Constituição Federal sempre debaixo do braço.

— Nos conhecemos desde os 15 anos. Ele abria mão de muitas coisas pelo bem comum.
Um exemplo de cidadão. Viveu pela comunidade até nos últimos dias de sua vida. Estou
muito abalado — conta Rioschi, em lágrimas.

Despedida

Nas redes sociais, outros vereadores que costumavam receber a visita ilustre do
aposentado também lamentaram sua morte.

– Aparecia para conversar, aparecia para opinar, aparecia para ajudar. Até bolo nosso
gabinete ganhou. Vai fazer falta. Seu Ari, descanse em paz. Obrigado pela amizade –
escreveu o vereador Brandel Ramos.

– A vida nos prega umas peças que nos faz pensar muito, quem imaginaria que ontem
seria a última vez que nos falariamos, seu Ari? Grande líder comunitário do bairro
Petrópolis, batalhandor incansável pelas causas dos idosos, cruzava nossa cidade com
sua bicicleta, indo a câmara de vereadores, visitando os gabinetes sempre conversando e
trazendo suas reivindicações de sua comunidade. Ontem ainda estave em meu gabinete,
conversamos bastante, mas infelizmente quando estava voltando pra casa, aconteceu
essa fatalidade – destacou o vereador Cláudio Aragão.

Ari está sendo velado na casa da família, na rua Petrópolis, e será enterrado às 16h desta
segunda-feira, no Cemitério Nossa Senhora de Fátima, no bairro João Costa.

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