Você está na página 1de 15

Antes, o glossário:

Levitas – eram especificamente os filhos de Levi (o terceiro filho de


Jacó) que eram os levitas, imagine isso como um sobrenome, como “Silva” por
exemplo, agora imagine que todos homens da família Silva do Brasil fossem
obrigados por lei a serem pastores, pregadores, teólogos, ou músicos gospel,
os levitas haviam sido separados para que todos os homens que nascessem
dessa família fossem sacerdotes, então eles não podiam ter posses materiais,
e tinham que ser sustentado pelas ofertas das outras tribos, como não podiam
ter terras, os levitas foram espalhados em todo o território de Israel.

Quando chegaram em Israel eram muito numerosos, havia muito mais


homens do que era necessário para manter o tabernáculo funcionando, logo no
começo da separação das terras uma porção de sacerdotes se dividiu
juntamente com as tribos a fim de fundarem e viverem nas cidades de Israel,
a principal função desses homens descendentes de Levi era de ensinar a lei de
Moisés e vigiar para que o povo não se desviasse dela, eles deveriam
participar dos julgamentos dos anciões e serem um testemunho vivo da lei,
todas as outras tribos eram obrigadas por lei a ofertar da sua produção para
o mantimento dos levitas, primeiro da sua cidade, depois em Jerusalém.

Concubina – não é o mesmo que esposa, era na verdade uma “amante


legalizada”, não era reconhecida como esposa com direitos de filhos que
herdassem o que era de seu pai, era “coptada” com o fim de satisfação dos
desejos sexuais de um homem, não poderia se casar com outro homem, seus
filhos não herdavam nada, mas ela tinha alguns direitos como mantimento e
salário.

As doze tribos – Rubenitas, Simeonitas, Levitas, Judeus, Danitas,


Naftalitas, Gaditas, Aseritas, Issacaritas, Zebulemitas, a meia tribo
Manasses e a meia tribo de Efraim, e os Benjamitas eram descendentes de
11 filhos de Jacó, são eles Rubem, Simeão, Levi, Judá, Dã, Naftali, Gade,
Aser, Issacar, Zebulom, Benjamin, e em vez de ser contado José, foi
contado seus dois filhos Manassés, Efraim.
Para nós aqui no Brasil é difícil de entender o que significam essas
“tribos” visto que não são “índios”, e não se tratavam de cidades com esses
nomes pra dizer que alguém era natural de Gade pra chamar de gadita como
fazemos no caso de alguém que nasce por exemplo em Brasília, é Brasiliense.
Aqui o “pertencimento” de um descendente de Jacó não é de uma localidade,
mas da “família”, algo que lembra o modelo de sociedade bárbara dos
nórdicos, (agora famoso por causa de séries como Vikings e Game Of
Thrones), no entanto, neste período da história das terras bíblicas em que
ocorre a história da concubina e do levita, os descendentes dos filhos e netos
de Jacó já haviam recebido a demarcação das terras que deveriam conquistar,
algumas conseguiram tomar pela guerra esses lugares, outras tribos fizeram
acordos e se misturaram com os povos da terra (o que Deus não havia se
agradado), e outros se tornaram escravos.

Então, apenas para rápida compreensão, podemos tomar essas tribos


como se formassem os “estados” do “país de Israel”, estados formados por
pessoas que são parentes, e que descendem dos mesmos patriarcas.

Contexto

A Política – essas tribos (estados) não tinham “um” governador, ou um


“rei”, o sistema de governo que eles possuíam havia sido recebido por Moisés,
de Deus, quando recebeu as tábuas da lei, e Moisés repassou isso a Josué,
que organizou o povo depois de ter vencido 33 reis e cidades estados em sua
campanha militar para tomar posse daquilo que hoje conhecemos por Israel. O
sistema legal deles deveria funcionar em partes, havia o “estatuto” que era a
lei mosaica, do mesmo jeito que temos a constituição brasileira. Em cada
cidade deveria haver o conselho de anciãos, onde deveriam se reunir os idosos
mais sábios e respeitáveis da cidade juntamente com os “príncipes” das
famílias da cidade, e sacerdotes levíticos para deliberar e julgar os casos,
como homicídios, se eram culposos ou dolosos, adultério, divórcio, herança e
disputa de terras entre irmãos.

O sistema legal dos israelitas não previa “cumprimento de pena em


prisão”, assim quando se decidia que alguém era culpado de algo, em caso de
ser julgado culposo (sem a intenção de fazer mal), o condenado tinha de pagar
indenizações, e até ter que deixar a cidade, caso fosse julgado como doloso,
o condenado era morto, mas a execução deveria, além de ser pública,
participativa, as pessoas da cidade teriam que participar do “apedrejamento”.
Isso tudo tinha um objetivo claro para eles, o cidadão que tomava a
pedra para apedrejar, ao jogá-la no condenado, estava assumindo que “aquele
que quebrar a lei é merecedor de tal pena”, e além disso, assumindo que se
ele mesmo quebrar a lei da mesma maneira, também merece tal sina. Isso
tinha o objetivo de crivar um conceito na mente dos filhos de Israel: “Eu não
quero essa morte pra mim, então não quebrarei a lei.”

Por conta da lei ser dura assim, não havia “polícia”, quem deveria
desempenhar o papel legal eram os levitas, mas de forma muito diferente do
poder ostensivo da polícia, quem tinha obrigação de se controlar e arcar com
as decisões legais era o “cidadão”, e a “força militar” de Israel, era
diretamente todos os homens que não fossem da descendência de Levi. Não
existia uma organização militar, um “corpo” militar, ou algo assim, era
obrigação de cada “cidadão” saber seu dever, e estar preparado para
defender sua terra, sua família, e seus irmãos.

Haviam também os Juízes, homens que deveriam julgar o povo segundo


a lei, fazer o povo levar a lei a cabo, e liderar o povo em batalhas para
conquista de território e defesa do território já conquistado, esses juízes
narrados na bíblia tiveram os mais distintos surgimentos, de homens chamados
por Deus através de uma experiência direta como Gideão, até homens
chamados pelo povo, por necessidade como Jefté, e homens escolhidos antes
de estarem no ventre de suas mães como Sansão e Samuel.

Haviam cidades principais em toda Israel onde se concentravam os


principais sacerdotes, príncipes de Israel por região e sábios anciões, eles
deveriam se reunir para deliberar a respeito de assuntos mais graves, que
refletissem na política de toda a nação, como por exemplo, julgar uma tribo
inteira se ela deveria ser apagada do meio das 12 tribos por ter se desviado
da lei mosaica, caso fosse decidido apagá-la, então seria sorteado as tribos
que iriam atacar a região da tribo que deveria ser apagada, e eles entrariam,
matariam e pilhariam todos os homens, mulheres, crianças, e animais e
passariam fogo em todos os bens, demoliriam as casas e jogariam sal sobre
elas, o território seria confiscado para “os filhos de Israel” e então o
conselho e os sacerdotes deveriam sortear a divisão desse território.
Caso contrário, se provasse ser apenas um mal entendido, então se
faria uma festa e se celebraria a lei de Deus.

*Obs: Isso tudo nunca se cumpriu na sua literalidade, o povo, como um


todo, nunca conseguiu obedecer a lei na sua completude, nem com Moisés, nem
com os Josué, nem com Juízes, nem com os Reis, nem com os profetas
maiores e menores, no entanto, mesmo que nunca se tenha cumprido, o padrão
de certo e errado, de justo e injusto, para a cultura hebraica vinha da lei de
Deus, das palavras de Moisés, das histórias dos patriarcas, logo, assim como
acontece com o Brasileiro, o hebreu sabia o que era certo e o que era errado,
e continuava fazendo o errado, se sentindo todo errado, como hoje alguém se
sente, assistindo filme pirata, consumindo pornografia, flertando e mentindo
na internet, digo, é o errado que “todo mundo faz” e fica por isso mesmo. Ou
seja, não muda o padrão de certo e errado, porque todo mundo faz errado. O
levita e a concubina sabiam que viviam de maneira totalmente aquém do que
Deus havia determinado, mesmo que todo mundo vivesse errado.

Sociedade – me referindo apenas ao que é narrado ao longo de Juízes,


podemos observar que haviam muitos levitas espalhados por toda Israel, em
uma época que quase a metade do território ainda não estava tomado, não era
“dos hebreus”, a sociedade hebraica não havia se estabelecido com sucesso, e
uma boa parcela da população não viu grandes problemas em sair adicionando
ao seu hol de “deuses” a serem adorados, os deuses dos povos que habitavam
a terra, com tanto hebreu abandonando a tradição, e lei mosaica, não era
possível sustentar todos os levitas em todos os lugares, então para viverem
com alguma condição, muitos levitas passaram de sacerdotes do Único Deus, a
sacerdotes de muitos deuses, conforme a demanda, pois assim, as famílias
ricas iriam sustentar o que era chamado de “sacerdote do lar”, um homem da
família de Levi, que era sacerdote de qualquer deus local (terafim) que lhe
pagassem para ser. Logo isso proveu para muitos levitas um meio de vida pelo
qual poderiam “progredir”, e assim “ter posses”.

São muitos os motivos para esses sincretismos, como o fato de que a


humanidade pensava de forma mística: havia um pensamento comum e
corrente, de que para tomar posse de uma terra, ou apenas para habitar em
uma terra que não se conhecesse, era necessário que se descobrisse primeiro
quem eram os deuses e espíritos que habitavam na terra, para lhes prestar
culto e oferendas, para ter paz com esses espíritos e deidades para se poder
morar e produzir na terra. Mesmo com Moisés execrando tal pensamento
místico, era um pensamento empírico de todo ser humano na época.

Com levitas abrindo o portfólio de culto aos mais variados deuses,


também se proliferou um entendimento místico de que levitas é que são “bons
sacerdotes”, de qualquer deus, eram uma raça eleita para serviços espirituais,
como se fossem uma linhagem de pessoas com poderes espirituais como as que
se vê nos contos orientais modernizados nas HQs, ou mesmo em fantasias
como Harry Potter, onde quem não nasce “bruxo” é “trouxa” e por isso não
pode usar “magia”, neste caso quem não nasceu levita era um “trouxa” e por
isso não teria acesso ao mundo espiritual como um levita sangue puro.

Logo eles passaram a ter uma capa mística de admiração, respeito e


temor de boa parte dos homens, exceto dos homens verdadeiramente maus,
os assassinos tomadores. Fazer mal diretamente a um levita era requerer
maldições sobre sua própria cabeça e de sua família por gerações.

O relato

Leia Juízes 19:1-30 e depois 20:1-48 e 21:1-25 clicando na referência.

Resumo do texto bíblico:

Neste capítulo é onde se narra o acontecimento de um levita que tinha


uma concubina que lhe fugiu, e voltou para casa de seu pai, e passado quatro
meses e vai em busca dela. O pai da concubina tenta fazer o Levita ficar em
sua casa o máximo de tempo possível, não o deixando sair em viagem de volta
para sua casa em Efraim. Quando o Levita consegue se desvencilhar do sogro,
levando a concubina, já é tarde e eles tem que pousar na cidade mais
próxima, o Levita escolhe passar a noite em Gibeá que é terra dos
Benjamitas, em vez de ficar em Jebus (é Jebus antes de ser Jerusalém, ela
só foi tomada para ser Jerusalém muito tempo depois com o rei Davi) porque
eles não são do povo Hebreu. Ficando na praça até tarde, um senhor de idade
(que não era benjamita, era um efraimita) o coloca para dentro de sua casa a
fim de tirá-lo da praça. Mais tarde os homens benjamitas de Gibeá cercam a
casa em busca do levita, para o tirar para fora e o estuprar, o dono da casa
pede que isso não seja feito ao Levita, em troca daria a esses homens sua
filha virgem e a concubina do Levita para se satisfazerem, o levita põe a
concubina para fora, e tranca a porta, os homens abusam dela a noite toda,
ao amanhecer ela cai morta à porta da casa. O levita pega o corpo, leva para
sua casa em Efraim e esquarteja em 12 pedaços o corpo dela, e envia para a
capital de cada tribo do povo hebreu causando terror na nação.

Como resultado, é convocado uma assembleia do povo hebreu para


ouvirem o caso e tomarem uma atitude quanto ao que foi feito em Gibeá pelos
benjamitas. Eles decidiram matar os homens maus e foram a Gibeá pedir a
cabeça deles, em vez de Gibeá entregar os estupradores e assassinos, todos
os benjamitas decidiram ir a guerra contra Israel. 26 mil Benjamitas contra
mais de 400 mil Israelitas, eles mataram 40 mil Israelitas antes de
tombarem. Os israelitas mataram todos os animais, mulheres e crianças de
todas as cidades de Benjamin, e queimaram as cidades inteiras. Sobreviveram
600 benjamitas.

Para que a tribo de Benjamin não desaparecesse de Israel, foram


dadas 400 virgens que foram separadas na destruição de Jabes-Gileade, e as
outras 200 lhes foi dado o direito de raptá-las na festa anual do Senhor em
Siló.

Considerações do texto:

A considerar a tentativa de seu pai (da concubina) de não deixar ela


voltar para a casa de seu marido, posso pressupor que a concubina não queria
retornar mais para seu marido, e conhecendo as leis de Israel, mesmo que o
mundo estivesse uma bagunça, o marido era um levita, o que significa que ela
seria julgada pelo abandono do marido quando voltasse, em traduções mais
antigas diz que ela o abandonou porque adulterou. Levando isso em conta, ela
teria que ser apedrejada, ou, no mínimo, teria que beber água com cinzas
(alvejante) e ficar estéril e manca (se nada acontecesse com ela, era inocente
e seu marido culpado de ciúmes, teria que pagar indenização e nunca poderia
se divorciar dela). Em suma, duvido que ela quisesse voltar, e duvido que ele
tivesse intento de deixá-la impune.
Na volta para a casa do levita, eles param em uma cidade benjamita
(que segundo a tradição tinha a obrigação de acolher qualquer pessoa que
fosse das 12 tribos), onde eles conseguem ao anoitecer um lugar para dormir
na casa de um homem que não era natural de Benjamim, mas de Efraim. A
noite homens benjamitas vem até a casa do homem que lhes deu pouso, e
pedem para que lhes seja entregue o levita, porque querem estuprá-lo.

Sexo anal aqui não tem outra função além da humilhação, uma
humilhação tão severa, só se suspeita de outra nação que tivesse tal habito
fosse Sodoma e Gomorra que haviam sido riscadas da face da terra por Deus,
era algo tão terrível e inominável que o dono da casa prefere entregar as
mulheres da casa para serem estupradas em lugar do levita, porque o estupro
de um levita em uma cidade da nação hebraica poderia resultar em uma
revolta que culminaria no extermínio da tribo de Benjamin. – E ele estava
certo, foi o que aconteceu depois.

Encurralado, o levita entrega sua concubina, que é estuprada até a


morte, a julgar pela forma como tudo se deu, houve espancamento e ela
morreu de hemorragia. O levita que não poderia tocar em um corpo morto,
nem mesmo num parente, segundo a lei ou ficaria impuro para as atividades
sacerdotais, mas agora, impuro, carrega o corpo da mulher até sua casa.

Não era prudente permanecer um minuto a mais na casa onde estava,


certamente voltariam e o próximo seria ele. Mas ele poderia ter deixado o
encargo de enterrar a mulher ao dono da casa, pagando, ou simplesmente
abandonando o corpo, mesmo assim, resolveu levá-lo, e levando, poderia
enterrá-lo, em vez disso ele esquarteja em 12 partes e envia a capital de
cada tribo para expor o horror da nação.

Considerando o horror do relato:

Um homem entrega a mulher com quem mantinha um relacionamento


íntimo para ser abusada e morta. O mesmo homem carrega esse corpo
deformado e sem vida por quilômetros na garupa de um jumento, processo que
levou horas, e ao chegar em casa despe o corpo, põe sobre uma mesa, e com
uma faca afiada desmembra aquela com quem mantinha relação afetiva.
O corpo, inchado, esquartejado em 12 pedaços e enviado cada pedaço
a principal cidade de cada tribo, provavelmente transportado por um servo,
num jumento, dentro de um saco, vazo, ou caixa, levando alguns dias para
chegar nas cidades mais longínquas de Israel, depois exposto em praça
pública, ao sol. O fedor de uma parte do corpo humano em decomposição
anunciava aos moradores a podridão dos seus pecados.

Reflexão:

A primeira coisa que pensamos:

“Meu Deus! Isso está na bíblia mesmo?”

A segunda:

“Ele era um covarde e um psicopata?”

Sim, está na bíblia, e não, não era um psicopata, o que ele também
não era, como qualquer levita naturalmente não era e segundo a lei levítica
não poderia ser é um guerreiro, alguém que estivesse pronto pra enfrentar a
morte, e na situação de degradação em que a lei e a cultura se encontravam,
o levita não o faria nem mesmo por alguém que se ama ou por princípios
elevados, aqui temos um homem fraco, impotente, aterrado com o medo da
morte, mais do que com qualquer outra coisa. Como um levita de posses e de
escravos, ele não poderia ser do tipo “virtuoso” já que para ter tais coisas
além de uma concubina que era uma amante legalizada, ele teria que ir
diretamente contra o motivo de existência de sua própria família, do seu
próprio ser, em razão de buscar uma boa vida financeira.
Em um primeiro momento, ele entregou a concubina por estar
encurralado, temendo a morte, esperançando que ao menos saíssem vivos,
entregou a concubina para satisfazer os desejos daqueles benjamitas. O
desejo deles no entanto não era um desejo animal sexual, era o desejo da
maldade pela maldade, do estupro como humilhação, subjugar e destruir, e é
o que eles fazem com ela em lugar dele. “

Não, em uma pessoa virtuosa, não é justificável, mas em uma pessoa


sem princípios a qual sua própria vida é o bem mais sagrado e não a dos
outros, ante o terror, entendível. Não haviam salvadores, não tem heróis
nessa história, não havia uma polícia a quem chamar, não existia exército a
recorrer, neste mundo os homens só poderiam encontrar socorro em outros
homens que também fossem contra a maldade, mas o que fazer quando a
maldade vem da maioria dos homens que se entregaram às próprias paixões
carnais e as dominações demoníacas de pensamento? A quem recorrer? Ao
Deus justo, o qual ele havia abandonado para servir outros deuses? Aos
deuses mundanos, os quais ele sabia que não eram mais do que invenções
humanas para satisfação dos desejos do próprio ventre, os quais ele mesmo
usava para ter meio de vida?

Em um pensamento obscuro e de sobrevivência própria, ele faz as


contas rapidamente: As filhas do dono da casa são ainda virgens, como tal,
são valiosas, ele sabe que o dono da casa não o quer entregar por causa dele
ser “um levita”, “um sacerdote”, e não falou em entregar a concubina por ser
“propriedade” do levita, mas ele (o levita) bem sabia que sua concubina não
era a “legítima” e no começo disso tudo, havia sido ela que havia fugido por
causa de um adultério. Pensou: que ela sofra, estamos nisso por causa dela.

O que vem a seguir é uma noite de terror, um misto dos piores medos e
sentimentos humanos, não gosta de ter decidido assim, se consola em pensar
que ao menos sairá vivo, e se tortura sobre o custo, mas não é capaz de
tomar outra atitude, coragem é uma virtude, e como tal se ela não foi
construída no passado, ela não “brota” do nada no presente, a sensação de
impotência é esmagadora, sentir-se um verme em cada célula do seu ser é
inevitável, inescapável, não tem como fugir da própria consciência.

Quando o dia finalmente amanhece, estava decidido a denunciar tudo o


que ocorreu em Gibeá a toda nação de Israel, mesmo que não houvessem
garantias de que alguém pudesse fazer alguma coisa, e se alguém podia, não
se tinha certeza de que faria, pois se a religião estava torcida, o quê se diria
da justiça? Ele entende o seu pecado, o pecado nação, a sua impotência , a
sua miséria, e a miséria da nação, pois ele não foi vitimado por “alguns
homens”, não era uma “gangue”, uma “quadrilha”, eram os homens da cidade,
uma parcela praticante, o restante conivente. Sabia que vivia errado, mas já
não importava mais, qualquer coisa que viesse de Deus agora sobre a nação
estava bem feito, se nada acontecesse a nação merecia a ruína que buscou,
se Deus os julgasse e desse a cada um segundo suas obras, haveria futuro
para Israel como nação.

Estava tão decidido a fazer a nação conhecer sua deformidade, sua


podridão, que levou a cabo uma atitude tão desumana quanto o
esquartejamento do corpo daquela com quem tinha um relacionamento íntimo,
para esfregar a podridão na cara todos os hebreus até fazê-los vomitar ao
observar a própria nojeira, para causar comoção social e trazer a convulsão
social. Se tal não acontecesse, Israel era a própria noiva morta esquartejada
e pútrida com quem ninguém se importava mais.

Não haviam profetas, os sacerdotes se perverteram, não haviam reis,


nem juízes naquele momento, o ato do levita é um chamado, uma profecia
condicional: “Este é o estado de nossa nação, se isso não te comove, se está
bom pra você, então se acostume com esse horror e com o cheiro, mas se
você não concorda com isso, se você não quer a nação destruída, venhamos a
guerra para extirpar o mau de nosso meio.”

O relato é tão brutal quanto a situação em que Israel, como nação,


estava passando. Esse relato nos ensina o que não queremos enxergar, aquilo
que não queremos admitir, aquilo que não queremos ver: “Se o justo não
clama, o mau governa.”

Só que neste texto, não há justos, o injusto terá de se arrepender, se


dispor a sofrer a justiça em si mesmo, em prol de estabelecê-la na nação.
Em outras palavras:

“Se nós não nos indignarmos com o absurdo das injustiças, e mais
importante do que isso, nos dignarmos a sujar as mãos nesse lodo, para expor
ante a face de todos a sujeira que todo mundo faz questão de ignorar, até
que a nação decida tomar as devidas providências, então não haverá
rompimento do povo com a corrupção, com a imoralidade, e com tudo que é
mau na nação.”

Fugindo totalmente das suposições sobre as questões humanas


(emocionais) envolvidas, o fato sobre esse terrível episódio em Juízes, é que o
Levita esquarteja a mulher e manda para as principais cidades das doze tribos
com o intento de convocar o conselho de Israel para julgar o caso. É isso que
está no texto, é disso que se trata, é um relato que está em juízes para
explicar o que antecedeu a destruição dos filhos de Benjamin, sobre o porquê
de terem sido destruídos pelas outras tribos, e também nos dá o contexto
sobre a família do rei Saul mais tarde, pois seu pai é descendente dos 600
que sobreviveram, quando Saul é vivo, sua tribo ainda era pequena, seus
parentes eram sincretistas, pois casaram com mulheres da terra, e elas
trouxeram seus deuses pra dentro de casa, ao passo que teve um filho a quem
deu o nome de Isbaal (Isbosete) e um neto Meribaal (Mefibosete) e sua filha
que deu em casamento a Davi tinha uma estátua Terafim em seu quarto de um
metro e setenta de altura (estimado).

No entanto os motivos humanos, sob qualquer prisma, são os mais


extremos, não importa por qual lado se olhe. Em todas as culturas religiosas
sempre existiram atos horrendos, dignos dos pesadelos mais profundos, mas
que, ainda sim, para o seu tempo e contexto, tinham algum sentido para os
que o praticam, como os indígenas brasileiros que hoje enterram filhos recém
nascidos vivos por nascerem com defeitos genéticos ou simplesmente por serem
gêmeos. Não é aceitável pra mim e pra você (eu espero), mas para eles, é
mais do que compreensível, é uma prática comum. Não sem traumas,
obviamente, porque embora as práticas culturais ditem certas atrocidades, a
natureza humana é uma só, as mães indígenas que assim fizeram com seus
filhos, vivem uma vida culpada até o fim de seus dias.
Israel era um povo mau, de duro coração, que não dobrava seu querer
à vontade de Deus, e só se importava com o próprio ventre, nem mesmo o
levita que toma essa atitude brutal poderia ser tido como justo diante da
própria lei levítica. Um levita, de acordo com a lei de Moisés, não podia ter
posses, e era desaconselhado ter “concubina”, e este tinha servos, jumentos,
uma concubina, e posses.

O cúmulo da perversão do sentido do que era pra ser um levita:


Família separada exclusivamente para ministrar culto e adoração somente ao
SENHOR (YHWH) e nem um outro Deus, e ENSINAR A LEI DE DEUS AO
POVO.

Aqueles que deveriam ser o modelo do que é correto, e mestres no


ensino dos estatutos de Deus que eram igualmente o estatuto da nação,
estavam em pecado diante de Deus. O próprio povo vivia em piores situações,
pois haviam regiões onde o sacrifício de crianças a Moloque em busca de
“bênçãos” financeiras era comum, haviam também as prostitutas e prostitutos
cultuais mulheres que se prostituíam em templos como de Azera e Astarote
tinha em todo território de Israel, uma mulher israelense jamais deveria se
prostituir, fosse em templo cultual ou por dinheiro, os homens jamais deveriam
contratar tais serviços, fosse em culto aos deuses da terra ou por satisfação
carnal. Além disso o povo “levantava altos” para adoração dos deuses da
terra, onde queimavam incenso, cereais e tomavam bebidas misturadas, que
era o equivalente ao uso de drogas, já que naquela época a droga era feita
em forma de incenso, e uma delas, feita do trigo podre, quando queimada
tinha o mesmo efeito do LSD. Os comerciantes roubavam criando seus
próprios pesos e medidas, adulterando suas balanças e metros, trabalhavam
sem guardar o sábado, cobravam juros, tomavam a capa de quem só tinha ela
para se cobrir, que é o equivalente ao comerciante que rouba porcentagem de
lucro, adultera produto, inventa promoções e liquidações falsas, não respeita
os feriados e finais de semana e as horas contratadas nominalmente do
funcionário e não paga hora extra.

Era um povo ruim.

Igual ao Brasil, sem tirar nem por.


Talvez isso te choque, talvez seu cérebro fuja da comparação com o
argumento de que aqui no Brasil não se adora Baal, não existe culto sexual,
não sacrificamos crianças, e não é todo mundo que engana o cliente e abusa
do empregado.

Mas isso é só uma fuga, algo automático da nossa natureza carnal, que
nos faz evitar de sair do nosso comodismo e tomar uma atitude, na pior das
hipóteses, talvez você, meu caro leitor, seja apenas mal informado, e neste
caso eu lhe informo:

Não adoramos nominalmente a Moloque para entregar nossos filhos em


sacrifício em um templo por bênçãos financeiras, mas o tráfico de órgãos
humanos no Brasil é imenso, tráfico que é alimentado com a vida de crianças,
algumas que são raptadas, outras são vendidas pelos seus pais por valores de
5mil a 15mil reais, e depois de levadas, (as tiverem sorte) serão sedadas,
abertas com um bisturi, seus órgãos retirados, e o os corpos queimados ou
esquartejados e jogados em rios ou no mar para serem consumidos.

Não adoramos nominalmente Azera para que os pais mandem seus filhos
e filhas para se prostituírem no templo, mas mães levam suas filhas de onze,
doze anos para se prostituírem e ficarem com o dinheiro da prostituição de
suas filhas, e pais levam seus filhos que acabaram de chegar à puberdade
para ter uma “primeira vez” com alguma prostituta, e depois compartilham
pornografia com seus filhos. Pais e mães vendem suas filhas para o tráfico de
exploração sexual infantil mundial, onde pegam brasileiras aqui e levam para
servirem em bordéis mundo a fora. Pais e mães tem introduzido seus filhos
em ideologias “Queer” e incentivado meninos a ter experiencias homossexuais
enquanto crianças, com adultos.

Não adoramos nominalmente a Baal para que dediquemos altas somas de


dinheiro nos templos aos sacerdotes como se pudéssemos comprar a
prosperidade… Bem, a gente (brasileiros) faz isso sim, do católico nos centros
de umbanda, quimbanda e candomblé, ao evangélico que faz isso na
literalidade, só que não se diz que é para Baal. A gana por dinheiro é tão
grande e cultural no brasileiro quanto é no judeu, pois dificilmente se conhece
um posto de gasolina onde não se desconfie de gasolina batizada, não
acontece uma “black Friday” onde o preço dos produtos não sejam forjados,
não tem uma promoção onde não se ofereça ao cliente a oportunidade de levar
vantagem em tudo, onde o cliente compra pra levar vantagem, mas quem leva
mesmo a vantagem é o vendedor que te fez levar algo mais caro, achando que
era mais barato. Se você falar pra alguém que “aluga filme” mesmo que seja
em plataforma streammer ou que pagou ingresso no cinema, vão rir da sua
cara porque você não foi na plataforma pirata que é de graça assistir o filme
ou a série. O brasileiro é tão louco por ganhar dinheiro sem trabalhar que os
bandidos fazem a farra com piramides, mudando o nome para plataforma
multinível, e variando, desde dinheiro mesmo, até perfume e criptomoeda, e
quando percebem o golpe e denunciam reclamam que perderam dinheiro. O
oportunismo no brasileiro é tamanho, que é do mendigo na praia que joga água
nos seus pés para você tirar a areia e o sal e depois te cobra por isso, do
mendigo que te extorque pelo estacionamento tomando como refém a pintura
do seu carro ou os pneus, até os parlamentares que usam cota parlamentar
como moeda de troca.

Você não quer ver, eu não quero ver, mas esse é o nosso Brasil, e isso
tudo vai continuar assim se não nos dignar a denunciar, expor nossa podridão
em todos os lugares que tivermos acesso, até fazer as pessoas se enojarem
de nossas próprias mazelas, não haverá rompimento no Brasil com a corrupção
e todo o resto.

Como no relato de Juízes 19, não surgirá um herói que tome a frente e
faça o que tem que ser feito, pois esse tempo em que alguém sozinho poderia
fazer algo já passou, não existe na nação um grupo de pessoas com recursos,
com condições, e com a lisura de caráter, perfeito, sem pecados, sem erros,
totalmente íntegro, para tomar a frente e mudar essa nação. Terá que ser
você, terá que ser eu, terá que ser os brasileiros comuns, os mesmos que
estão em pecado, que estão todo errados, que não estão “em dia” com Deus
ou com a própria vida, que terão que tomar essa atitude de denunciar as
injustiças e clamar pela mudança até a nação ser transformada.

Pra você, que não se sente a pessoa ideal para tomar alguma atitude,
saiba que é tempo de arrepender e se tornar a pessoa para esta missão. O
futuro da nação e da igreja está em nossas mãos, qual é o Brasil que você
quer?

Você também pode gostar