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Reforma da saúde mental tem "efeito perverso" de aumentar

discriminação dos doentes


O psiquiatra Afonso de Albuquerque considera que as atuais reformas na saúde mental têm como “efeito
perverso final” o “aumento real” da discriminação dos doentes e “crescentes dificuldades” no tratamento dos
doentes mais graves.

“Está em vigor uma reforma da saúde mental que prevê, entre outras medidas, a redução dos internamentos
hospitalares e o encerramento dos hospitais psiquiátricos do Estado até 2016”, disse à Lusa o autor do livro “A
discriminação do doente mental no Ocidente”, que é lançado hoje no Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa.

Esta reforma, que já foi instituída em países como a Inglaterra e os Estados Unidos, privilegia o tratamento do
doente em pequenas unidades de psiquiatria e a criação de pequenas instituições para os doentes de evolução
prolongada, como lares, residências, apoio domiciliários, apoiando a sua reinserção na comunidade, explicou.

“Este ambicioso e complexo plano exige, desde o início, um aumento da capacidade financeira e de formação
de recursos humanos e modelos de avaliação e de monitorização como nunca estiveram à disposição da saúde
mental em Portugal”, afirma o psiquiatra no livro.

Para Afonso de Albuquerque, nenhum serviço deveria ser desativado até que estivesse criado o serviço que o
substitui, “o que não tem vindo a acontecer”.

O psiquiatra adiantou à Lusa que foram realizados vários estudos nos países onde ocorreram estas reformas,
que explicam o que aconteceu quando se encerraram os hospitais.

“O que tem vindo a acontecer é que, quando se encerram os hospitais psiquiátricos, não há depois por parte
dos políticos que fizeram as reformas uma dotação suficiente para substituir essas camas psiquiátricas com
vantagem”, sublinhou.

Para o especialista, esta reforma é “o mais acabado exemplo de como o poder político atual subalternizou o
poder médico (psiquiátrico) em Portugal”.

Os mais afetados são os doentes mais graves, que ficam “marginalizados e em desvantagem comparativa
perante os doentes de outras especialidades no Serviço Nacional de Saúde (SNS) para os quais os cuidados
prestados não estão felizmente a ser desmedicalizados”, afirma.

“Para os doentes em fase aguda da doença ainda há assistência prestada pelo Estado em centros hospitalares
de psiquiatria, mas na fase crónica, que às vezes é para o resto da vida, muitas vezes não têm tratamento. Isso
é que está a pesar cada vez mais nessa população”, disse à Lusa.

“As pessoas com doença mental são o elo mais fraco nas preocupações dos circuitos políticos, porque
raramente votam, muitas foram abandonadas pela família e amigos, são inválidas a longo prazo e, por isso,
dispendiosas”, acrescenta no livro.

Há anos que o Governo português gasta apenas cerca de 3,5% a 4% do orçamento da Saúde com a saúde
mental (a Inglaterra aplica 11%), “colocando Portugal no penúltimo lugar dos 19 países da área económica
europeia”, adianta.

“No rescaldo da pior crise económica desde a Primeira Guerra Mundial, o mais provável é que as já parcas
verbas para a saúde mental sejam ainda mais reduzidas (…), em especial as destinadas aos doentes mais
incapacitados e vulneráveis”, concluiu.

*Este artigo foi escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico


Doenças mentais sobem a pique com a crise

Portugal precisa de dois mil novos enfermeiros especializados na área da saúde mental para fazer face a uma
problemática que afeta 18% da população e que tende a agravar-se por causa da crise, defendeu esta sexta-feira
um especialista.

Segundo Joaquim Passos, professor da Escola Superior de Saúde do Vale do Ave, em Portugal só existem, neste
momento, mil enfermeiros especializados em saúde mental, o que fica "muito aquém" das necessidades.

"Sobretudo agora, com a crise, que vem agravar a problemática da saúde mental. As depressões estão a subir a
pique, as perturbações de ansiedade e de humor são cada vez mais", referiu.

O responsável disse que o aumento do número de enfermeiros especializados também é necessário para a
mudança de paradigma no tratamento" dos doentes preconizado no Plano Nacional de Saúde Mental 2007/2016.

Explicou que a mudança de paradigma passa pelo fim dos grandes hospitais psiquiátricos, outrora conhecidos
como hospícios ou manicómios, para diminuir o estigma da institucionalização, e pela aposta num tratamento "de
proximidade, mais concentrado na comunidade em que o doente está inserido, sempre que possível no seio
familiar".

Um tratamento que "terá de passar por uma monitorização e acompanhamento permanentes", para evitar que os
doentes tenham necessidade de voltar a ser institucionalizados.

Joaquim Passos sublinhou que, para isso, é "fundamental" investir na formação de enfermeiros especializados,
mas também em estruturas e em meios, para alargar a "rede de suporte" aos doentes mentais.

Lembrou que as unidades de cuidados primários de saúde "ainda não estão muito vocacionadas" para o
tratamento daquelas doenças e que os próprios enfermeiros, por norma, também não fizeram daquela área a sua
primeira opção, "até por um certo estigma em relação à saúde mental".

"É preciso investir a sério nesta área, que tem cada vez mais acuidade no contexto da sociedade ocidental", frisou.

Em toda a Europa serão necessários, até 2030, 500 mil novos enfermeiros especializados em saúde mental.

Os números mais recentes da Comissão Europeia estimam que na Europa existam perto de 80 milhões de pessoas
(cerca de 18 por cento da população) com algum tipo de doença mental.

"Em Portugal, os números também andam por aí e em alguns casos serão até superiores", garantiu Joaquim
Passos.

O especialista falava à Lusa à margem do II Workshop de Saúde Mental, que hoje decorreu na Escola Superior de
Saúde do Vale do Ave, em Famalicão.
publicado a 2012-06-22 às 17:1
Quase metade dos doentes mentais graves sem acompanhamento

Quase metade dos portugueses afetados por doenças mentais severas não são tratados nos serviços de saúde, uma
situação "sem par" noutras enfermidades, afirmou, esta terça-feira, o especialista José Miguel Caldas de Almeida.

O professor da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa (UNL) disse que "40% das pessoas com
doenças mentais severas não têm tratamentos em serviços de saúde e, nos casos de gravidade mais moderada, a
percentagem aumenta".

Caldas de Almeida, que foi coordenador do Programa Nacional da Saúde Mental, falava na apresentação da Plataforma
Gulbenkian para a Saúde Mental Global, uma iniciativa promovida pela Fundação Calouste Gulbenkian, com o apoio da
Faculdade de Ciências Médicas e da Organização Mundial de Saúde.

Embora tenha havido progressos nos últimos anos, Portugal tem uma prevalência de doenças mentais das mais elevadas
da Europa e "muitos doentes só têm acesso a serviços de saúde que não são da melhor qualidade", apontou.

O responsável transmite preocupação com os cuidados a estes pacientes, numa altura em que o país enfrenta problemas
económicos e cortes de verbas em várias áreas, incluindo na saúde.

"A crise financeira pode criar o risco de fragilizar os serviços e cuidados que temos obrigação de disponibilizar a estes
doentes", alertou Caldas de Almeida.

"Setor das doenças mentais é o mais ignorado"

O Governo "quer acudir a muitas áreas e o setor das doenças mentais é mais ignorado", tanto pelos responsáveis
políticos, como pela população e pela comunicação social, pois "há um estigma associado", referiu.

Por outro lado, "temos uma lei que é boa, mas já está desatualizada e muitos doentes são vítimas de abusos", no
contexto dos direitos humanos.

"Há muito a fazer para recuperar de uma desvantagem histórica" e com a crise "os problemas são mais prementes e há
novos problemas", resumiu Caldas de Almeida.

O presidente da comissão diretiva da Plataforma Gulbenkian para a Saúde Mental Global, Benedetto Saraceno, salientou
que a crise financeira faz subir a prevalência de doenças mentais e aumenta o consumo de álcool, de medicamentos
antidepressivos e ansiolíticos, a utilização de drogas ilícitas, problemas de sono e torna mais frequentes os casos de
violência doméstica.

O especialista, que foi diretor do Departamento de Saúde Mental da Organização Mundial de Saúde, apresentou os
objetivos da Plataforma que pretende colocar na agenda mundial dos responsáveis políticos os distúrbios mentais, a par
de outras doenças não transmissíveis como as cardiovasculares, diabetes, doença pulmonar crónica ou cancro.

Os grupos de especialistas mundiais que vão participar nos trabalhos da Plataforma, projeto que tem um orçamento de
1,5 milhões de euros e se prolonga até 2015, têm a tarefa de aprofundar o conhecimento em saúde mental,
nomeadamente as suas ligações com as doenças não transmissíveis, e atualizar as leis no sentido de integrar questões
relacionadas com esta matéria.

Esta iniciativa coloca Lisboa "no centro da discussão mundial" sobre doenças mentais, como destaca Benedetto Saraceno,
e integra uma grande conferência, programada para 2015, para apresentar as principais conclusões dos trabalhos.

Segundo um estudo nacional sobre saúde mental, Portugal é dos países europeus com mais elevadas taxas de
prevalência de doença mental, sendo as perturbações mais frequentes a ansiedade e a depressão. Esta área recebe cerca
de 3,5% do orçamento para a saúde, segundo Caldas de Almeida.

publicado a 2012-04-17 às 16:25


Estudo Plano Nacional de Saúde Mental tem sido
ineficaz
Um estudo da Universidade de Coimbra (UC) concluiu que "a execução prática do Plano
Nacional de Saúde Mental" (publicado em 2007) tem sido "francamente insuficiente, sobretudo
no que diz respeito à reabilitação psicossocial de pessoas com doença mental severa".
Desenvolvido na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da UC e financiado pela Fundação para a Ciência e
Tecnologia, o estudo analisa, pela primeira vez, os serviços de reabilitação psiquiátrica em Portugal e as barreiras ao seu
desenvolvimento.

A investigação focou-se na "avaliação dos programas de reabilitação existentes para a doença mental severa,
nomeadamente para as perturbações do espetro da esquizofrenia", adianta a UC, numa nota hoje divulgada.
Desenvolvida nos últimos quatro anos, a pesquisa "abrangeu 70 instituições de todo o país a trabalhar na área e doentes
integrados em programas de reabilitação em dois hospitais psiquiátricos e duas IPSS (instituições privadas de
solidariedade social), bem como um grupo de controlo", sem "qualquer acompanhamento psicossocial".
A maioria das instituições que participaram no estudo referiram prestar atividades de reabilitação, mas "os programas
recomendados pelas diretrizes internacionais (por terem comprovada eficácia) encontram-se insuficientemente
implementados em Portugal", sublinha na mesma nota.
Além disso, "em termos de qualidade de vida e de funcionamento ocupacional e social, não foram encontradas diferenças
significativas entre pessoas com doença mental incluídas em programas de reabilitação e pessoas com doença mental sem
qualquer acompanhamento psicossocial", destaca a investigadora Carina Teixeira, cujos resultados do estudo constam na
sua tese de doutoramento, orientada por Julian Leff, cientista do King's College London, e por Eduardo Santos, investigador
da UC.
Esta situação ocorre porque "os serviços de reabilitação portugueses caracterizam-se, salvo poucas exceções, por
contextos educacionais, ocupacionais e habitacionais segregados", sustenta o estudo.
Tais modelos são "obsoletos, estando longe do que é atualmente praticado" em países como EUA e Reino Unido e "a
literatura científica mostra claramente que não favorecem a integração comunitária e impedem a recuperação dos utentes".
Outra das conclusões da pesquisa, que "propõe medidas para uma efetiva reabilitação psiquiátrica", é "o estigma em
relação à esquizofrenia, cuja taxa de prevalência em Portugal se situa na ordem dos 100 mil", segundo dados da
Organização Mundial de Saúde.
A luta contra o estigma "deve começar nos próprios profissionais, que subestimam as capacidades das pessoas com
doença mental, acabando por lhes transmitir mensagens de desesperança que afetam a sua luta pela recuperação e pelo
alcance dos objetivos pessoais", assegura a investigadora da UC.
O sistema "tem de perceber que a esquizofrenia não é uma fatalidade" e que "a reabilitação psicossocial é possível",
sustenta Carina Teixeira.
"É urgente implementar programas de educação apoiada, modelos de colocação no emprego competitivo que tenham em
conta as especificidades desta população, e programas residenciais que promovam a obtenção de habitação independente,
da escolha da pessoa em reabilitação e com apoio flexível, na comunidade", sublinha.
"A ideia, amplamente difundida, de que a recuperação na esquizofrenia não é possível é um mito", defende a investigadora,
que decidiu estudar esta temática por ter identificado "debilidades nas oportunidades de reabilitação proporcionadas a esta
população, enquanto psicóloga voluntária na Associação Recriar Caminhos" -- instituição que promove o desenvolvimento
vocacional, formação e inclusão de pessoas com esquizofrenia.
A legislação existente também foi analisada no estudo, verificando-se ser "bastante frágil e desajustada", como revelam
artigos já publicados em jornais e revistas científicas, como, por exemplo, no International Journal of Culture and Mental
Health.

Ministério quer apostar no apoio ambulatório e em residências para saúde


mental
Governo pretende que o Programa de Saúde Mental consolide "os projetos piloto" em 2014
11 de fevereiro de 2014 - 15h17

O secretário de Estado Adjunto do ministro da Saúde afirmou hoje, em Coimbra, que o Ministério da Saúde quer reforçar o apoio
ambulatório, residências e unidades de cuidados continuados diferenciadas para a saúde mental.
"Queremos mais residências a dar mais apoio para resolver o problema da institucionalização prolongada e uma maior prevenção
e antecipação de problemas de saúde mental", defendeu Fernando Leal da Costa, à margem de uma visita ao serviço de
Psiquiatria do Centro Hospital e Universitário de Coimbra (CHUC).
Segundo o secretário de Estado, é "absolutamente necessário" o desenvolvimento de unidades de cuidados continuados para
"prosseguir o Programa de Saúde Mental", pretendendo um programa com "um caráter comunitário e sócio-terapêutico".
Apesar de admitir que "as verbas são sempre insuficientes", o secretário de Estado afirmou que o Ministério pretende dar "uma
atenção redobrada à saúde mental nos próximos dois anos", tendo um acréscimo de verbas, não especificando quanto.
A reforma na saúde mental tem sofrido algumas críticas, tendo o psiquiatra Afonso de Albuquerque considerado, em 2013, que as
atuais reformas na saúde mental têm como "efeito perverso final" o "aumento real" da discriminação dos doentes e "crescentes
dificuldades" no tratamento dos doentes mais graves.
Em 2014, o Governo pretende também que o Programa de Saúde Mental consolide "os projetos piloto" de intervenção
comunitária, numa ligação entre médicos especialistas e médicos de clínica geral nos centros de saúde.
Foi em torno desses mesmos projetos que foi assinado, entre a Administração Regional da Saúde do Centro, o Ministério da
Saúde e o CHUC, um protocolo para uma formalização e reforço da psiquiatria comunitária.
Esse mesmo protocolo prevê um acompanhamento dos doentes, através de uma ligação entre médicos de clínica geral nos
centros de saúde de 11 concelhos da região Centro e médicos especialistas, nomeadamente psiquiatras, do CHUC, explicou
António Reis Marques, diretor do Serviço de Psiquiatria desse mesmo centro hospitalar.

O protocolo prevê "uma facilitação do acesso dos doentes aos cuidados de saúde mental", mantendo as pessoas "junto das suas
famílias e dos seus locais de trabalho", de forma "a não serem doentes para sempre", disse.

A psiquiatria, segundo Reis Marques, "era uma especialidade médica escondida e longe dos hospitais", procurando, com este
protocolo, um melhor acompanhamento dos doentes, a partir de uma deslocação dos médicos especialistas aos centros de saúde,
quando necessária.

Desta forma, os doentes "não são estigmatizados nem isolados", permitindo um "apoio local".

SAPO Saúde com Lusa

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