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Cachoeira, Agosto/2017
MATEUS SANTOS RIBEIRO
Cachoeira, Agosto/2017.
MATEUS SANTOS RIBEIRO
BANCA EXAMINADORA
__________________________________________________________________
Profa. Mestra Marina Mapurunga de Miranda Ferreira (CAHL/UFRB) – Orientadora
Cachoeira, Agosto/2017.
RESUMO
Este trabalho teve por finalidade realizar uma cartografia sonora de pontos culturais
onde há manifestações sonoras de variados estilos e estruturas diferentes na cidade
de Cachoeira, localizada no Recôncavo Baiano, nos meses de Junho a Setembro de
2017. Neste período aconteceram as festas juninas, festas de caboclo em terreiros
de Candomblé, procissões religiosas festivas, cortejos e andanças pela cidade, as
quais foram captadas com um gravador de campo. Todo este material será
arquivado e compartilhado virtualmente através de plataformas específicas
(archive.org e umap) que buscam ilustrar e interagir com o material sonoro captado,
através de um mapa virtual interativo da cidade. Para a realização dessa cartografia,
abordamos neste trabalho as paisagens sonoras de alguns patrimônios imateriais da
cidade, tendo como foco as filarmônicas, sambas de roda e terreiros de candomblé.
APRESENTAÇÃO........................................................................................06
2-TRAJETÓRIA ACADÊMICA......................................................................08
3-CARTOGRAFIA SONORA EM CACHOEIRA............................................11
4-USO DE PLATAFORMAS LIVRES E DE COMPARTILHAMENTO..........14
5-DIÁRIOS DE PESQUISA DE CAMPO.......................................................17
CONCLUSÕES.............................................................................................33
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................35
ANEXO..........................................................................................................37
APRESENTAÇÃO
1-TRAJETÓRIA ACADÊMICA
O gravador Tascam DR-40 foi um dos mais utilizados por mim no período seguinte,
tanto em exercícios concedidos pela faculdade, quanto em captação juntamente a
mesa de som em eventos culturais pela cidade de Cachoeira. Por ser leve, com
compartimento para 4 pilhas, metade do que era o Tascam HDP2, e a
disponibilidade de duas entradas combo XLR/P10 onde poderíamos executar uma
gravação mono, no caso de uma entrevista simples para um exercício documental,
ou estéreo captando a ambiência e a voz do personagem ao mesmo tempo, em
diferentes níveis de volume, um para cada ocasião.
Com esse Tascam DR-40, foi executada a maior parte de meus trabalhos
acadêmicos, sempre com a ajuda de microfones e os lapelas com e sem fio que a
Universidade disponibilizava no período em que eu estava em curso.
Os microfones externos disponíveis eram o MKH70 e o MKH-50 da
Sennheiser que utilizei para a captação de diálogos com mais de uma pessoa no
quadro fílmico, de algumas ambiências e de foleys. São bons microfones, tendo eu,
uma preferência a este último, MKH-50 que trabalhei grande parte dos curta-
metragens e documentários realizados. Os microfones de lapelas com fio da Sony e
os sem fio, da Sennheiser foram também elementos externos que junto ao Tascam
DR-40 proporcionou uma qualidade nas captações muito satisfatórias. Estes eram
uma espécie de porto seguro nas captações quando os ruídos externos insistiam em
aparecer ocasionando um som não satisfatório para aquela ocasião.
Minhas experiências com captação com esses aparelhos foram diversas,
participando de alguns documentários na cidade de Salvador, e arredores, captando
entrevistas e ambiências em variados tipos de lugares, desde a salas pequenas e
com teto baixo, até áreas super abertas, como ruas, avenidas e até beira-mar.
Também captei som em outras localidades pertencentes ao Recôncavo
Baiano, com o mesmo gênero documental, que mais tarde se tornaria o tipo de
trabalho preferido deste que vos escreve.
Captações de Grupos musicais, folclóricos e rodas de poesia são exemplos
dos tantos outros trabalhos que proporcionaram uma sensibilidade tanto técnica
quanto artística para que o graduando pudesse concluir com uma bagagem inicial de
experiência que demonstra ser satisfatória.
Um dos principais trabalhos que se pode destacar ao longo desses anos foi
a participação como diretor de som do documentário Odu (2013), do diretor Evandro
de Freitas em parceria com o grupo de pesquisa Cineclube Mário Gusmão, onde é
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relatada a vida do ator baiano Mário Gusmão. Neste mesmo grupo de pesquisa,
pude experimentar uma relação entre cineclubismo e trabalho técnico, inicialmente
como auxiliar de técnico de som e projeção, passando para técnico de som, até o
período final no grupo, onde atuava como técnico de som e de projeção.
Assim, pode-se ter uma relação de afinação do ouvido quanto a questões
técnicas dentro de um ambiente acústico, inicialmente no auditório da Universidade,
regulando as caixas de som, afinando a mesa de acordo com cada filme, pois cada
um vinha com volumes e projetos sonoros diferentes.
Outro trabalho importante foi a participação como um dos microfonistas no
primeiro longa-metragem realizado por graduandos do curso de Cinema e
Audiovisual da Universidade Federal do Recôncavo Baiano, intitulado Café com
Canela. Neste pude ter contato com diferentes tipos de equipamentos e diferentes
locações, onde mesmo na madrugada o barulho externo da cidade insistia em
aparecer. Mas o período de pouco mais de um mês e meio, com uma rotina de
trabalho diário, seguido de uma forma profissional por todos os integrantes da
equipe, acabou proporcionando uma carga de experiência excelente para um fim de
ciclo no curso de Cinema, onde levarei comigo para as atividades que virão a seguir
depois da conclusão do curso.
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Imagem 01: trecho de uma página archive.org do projeto Cartografias Sonoras. Ao lado direito está o quadro que
mostra as opções de diferentes formatos de arquivo para download.
poderão ser realizadas por diferentes pessoas, bastando somente enviar os arquivos
para o e-mail que será deixado nos créditos do mapa virtual.
A plataforma virtual umap foi criada utilizando os mapas já criados pela rede
de contribuidores openstreetmap, onde se tem feito uma constante atualização nos
mapas de todo o mundo colaborativamente e sem fins comerciais. Assim como o
archive.org, o umap também permite a criação de licenças Creative Commons e
desta forma contribui para que todo o corpo deste projeto seja creditado para as
instituições a que pertencem os áudios. No nosso caso os sambas, terreiros e
filarmônicas.
Os módulos oferecidos pela Creative Commons podem resultar em licenças
que vão desde uma abdicação quase total, pelo licenciante, dos seus direitos
patrimoniais, até opções mais restritivas, que vedam a possibilidade de criação de
obras derivadas ou o uso comercial dos materiais licenciados.
A interface do umap é de fácil acesso, tendo a sua versão em português,
permite que qualquer pessoa que já tenha um cadastro no openstreetmap possa
criar o seu próprio mapa, com diversas cores, links de imagens, áudios e vídeos e
posicioná-los em seus pontos geográficos específicos. Abaixo, o mapa cartográfico
de cachoeira em fase final (imagem 02), sendo um projeto que visa futuras
contribuições sonoras.
Imagem 02: página virtual do umap onde foi criado uma cartografia sonora da cidade de Cachoeira com seus
respectivos pontos culturais.
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Como se pode observar na imagem 02, o mapa foi preenchido por linhas e
pontos de localização sinalizados com as cores verdes para os samba de roda,
amarelo para as filarmônicas e vermelhas para os terreiros. Através do mapa
também se pode analisar a geografia dos terreiros, estes localizados mais acima e
afastados do centro, enquanto que as filarmônicas presentes no centro da cidade e
os sambas de roda em pontos variados.
Clicando nesses pontos, abre-se uma janela lateral onde se poderão
acessar os áudios captados, além de uma imagem ilustrando a sua localização, uma
breve descrição de cada ponto cultural e um link da página web do grupo para que o
visitante possa conhecê-lo ainda melhor.
05 E 06 DE AGOSTO DE 2017
FESTA DE CABOCLO NO TERREIRO DE MÃE LÚCIA
RUA DA FEIRA, CACHOEIRA, BAHIA.
O terreiro de mãe Lúcia foi o primeiro que fiz a visita de campo, aproveitando
o momento de festa para conhecer o terreiro e os membros que prestam os
trabalhos aos orixás. Antes, fiz uma rápida visita e conversei com Gilmar, um dos
membros e filhos de Mãe Lúcia. Gilmar é quem conduziu um dos atabaques nas
festas que se seguiram. No primeiro dia de festa, dia 06 de Agosto, Fui na
companhia de um amigo, Caio Csermak, que está em Cachoeira na sua pesquisa de
doutorado. Ele havia me falado da festa e já me ajudara antes com o grupo de
samba de roda Esmola Cantada nas gravações da apresentação do grupo nas
festas juninas.
Ao chegar no terreiro, apenas conseguimos ficar no corredor, devido ao
terreiro, incrustado no alto do terreno e no meio urbano, ter um espaço limitado.
Enquanto isso várias pessoas chegavam para ouvir e ver as apresentações dos
caboclos e caboclas que já haviam começado os trabalhos. O toque dos atabaques,
do Gan (que parece uma espécie de sino largo, mas sem o badalo e tocado com
uma baqueta), ressoava por todo o terreiro impedindo qualquer intromissão de
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barulhos externos, mesmo o terreiro estando localizado ao lado de uma estrada com
muito movimento de carros.
Os cantos misturados aos toques dos atabaques eram expressivos e davam
energia para continuar noite adentro com as homenagens. Depois de um tempo,
levamos os presentes para dentro de uma sala pequena, mas toda coberta de folhas,
onde no outro dia, Mãe Lúcia receberia seus filhos de santo, abençoando-os e lhes
dando comida, bebida e charutos. Após isso, terminamos a nossa visita, mas no dia
seguinte soube que a festa adentrou a noite e durou até às 8 horas da manhã.
O Ritual seguia uma sequência de toques e cantos dos caboclos, que
ficavam próximos aos Alabês, que são os tocadores de atabaque, Cada caboclo se
aproximava discretamente dos tambores, fazia uma reverência e cantava sua
cantiga. Importante também de se destacar o número de cantigas que foram
executadas por cada um, numa noite inteira, o que demonstra a riqueza da
sabedoria oral deste povo.
No outro dia, chegamos as 15 horas da tarde e conseguimos um lugar
melhor para acompanhar o ritual. Pude sentir de perto o som das pisadas firmes e
compassadas dos caboclos dançando e cantando em homenagem aos seus orixás.
Ofereciam vinho tinto, paçoca e logo após um prato com arroz, carne e salada.
Enquanto isso, os caboclos e caboclas se revezavam em seus cantos e danças.
Os três atabaques, afinados respectivamente em tons médios, graves e
agudos, sendo eles chamados de run, rumpi e lé, davam o ritmo cadenciado em
sequências de batidas que neste terreiro são tocados com as mãos, acompanhados
pelo Gan e ainda duas tabuinhas, que eram batidas uma nas outras com as mãos,
dando ritmo as músicas. Depois de certo tempo assistindo ao ritual, resolvemos nos
despedir de Mãe Lúcia, que continuava na pequena sala recebendo seus filhos de
santo.
Neste ritual, como não tinha ainda nenhuma relação com o povo do terreiro
e em respeito as suas tradições, onde nem sempre o uso de gravadores e câmeras
são permitidos, resolvi apenas acompanhar o rito como observador.
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12 DE AGOSTO DE 2017
FESTA DE CABOCLO NO TERREIRO OGODÔ DEY
LADEIRA DA CADEIA, CACHOEIRA, BAHIA.
Subindo a ladeira da cadeia, rua em que moro há dois anos, mas que ao
longo deste memorial já me fez conhecer mais de sua cultura e dos saberes dos
mais velhos do que todo o período em que morei, encontram-se alguns terreiros,
dentre eles, o Ogodô Dey, onde nessa data, 12 de Agosto, se celebra a festa de
Caboclo.
A rua tem esse apelido (Ladeira da Cadeia), pois o nome oficial é Benjamin
Constant, pelo fato de começar ao pé da câmara municipal da cidade, onde
antigamente era uma cadeia, e daí se sobe uma ladeira bem íngreme, assim como
praticamente quase todas as ladeiras de Cachoeira.
A festa começou em torno das 21 horas. Fui desta vez com o gravador de
campo da Universidade, numa bolsa a tira colo, e modestamente antes do início do
culto, pedi a seu Theodoro, que é o pai de santo do terreiro, juntamente com a Mãe
Raílda, para que pudesse gravar um pouco do ritual, o que foi permitido depois da
sessão inicial.
O áudio captado tem 85 minutos de duração. Este é uma mescla entre as
conversas iniciais, a chegada de pessoas, crianças, os primeiros cânticos, que logo
são abafados pelo toque dos instrumentos de percussão. Os percurssionistas
inicialmente estavam improvisando com um tambor de som agudo e dois médios, A
falta do grave (que se chama Rum), deu ao rito um toque diferenciado, onde se pode
observar depois, com sua chegada, vindo do terreiro de baixo, do filho de Theodoro,
uma mudança singular na percussão, que fez com que eu abaixasse um pouco o
volume do gravador para que o som não fosse prejudicado pelas altas frequências
emitidas. Essa parte se dá entre o meio e o fim da gravação.
O ritual tinha elementos novos, diferente da ultima festa de Caboclo que fui,
na Rua da Feira semanas atrás. O vestuário das pessoas que incorporavam o
caboclo era diferente. Na festa anterior todos estavam vestidos como caboclos
boiadeiros, com roupas de couro e nesta ocasião, estavam apenas com o chapéu,
que Mãe Railda e mais alguns usavam, e mais alguns tecidos, de variadas estampas.
Mãe Raílda dançava em círculos, acompanhada de caboclos e caboclas,
alguns com tabuinhas, acompanhando o ritmo da percussão, e ela com um pequeno
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sino, que fazia um som compassado e agudo, mas não tão alto. Este som era o
único que tinha a qualidade de percorrer toda a sala, se aproximando e se afastando
do meu gravador, criando profundidade única, diferente dos outros instrumentos de
percussão, que sempre ficavam ao fundo da sala, fixos. Quando mãe Raílda ia para
uma sala reservada, outra pessoa cuidava de tocar essa sineta, mas desta vez,
sentada na parte superior direita da sala.
Os Caboclos e Caboclas se revezavam cada vez mais. Depois de meia hora
de culto, já se tinha na chamada, gira de caboclo, mais de sete pessoas, todas
dançando e esperando a sua vez de cantar as canções que parecem infinitas, já que
a festa não tem hora para acabar.
Pelo áudio gravado, pode-se com atenção escutar alguns desses cânticos,
mas como gravei de forma muito reservada, para não desviar a atenção das
pessoas que ali estavam e em respeito ao culto, existe alguma dificuldade de ouvir
claramente. Mas o que mais abafa esse canto certamente são os instrumentos de
percussão e o toque do sino e da sineta. Pois são tocados de uma forma tão intensa
que é muito difícil de distinguir outros sons. Mas pelo registro, foi uma bela
experiência. Os terreiros costumam ter muitos atributos visuais que merecem
destaque, mas nesta ocasião, a escuta é o principal foco. As repetições do ritmo dos
tambores com o compasso da sineta e do sino dão a forma do conteúdo, permitindo
apenas algumas breves análises nos intervalos de uma cantiga ou na troca de um
tocador de percussão, ou nas pausas para beber vinho tinto, ou comer a ceia, com
frango, farofa, arroz e salada.
Não acompanhei o restante do rito, pois pela manhã bem cedo, ali mesmo
naquela ladeira, descendo, haveria a primeira saída do grupo de samba de roda
Esmola Cantada, onde eu acompanharia o seu percurso saindo da sede do grupo
até as comunidades do Caquende e Faceira, o que abordarei um pouco mais logo
adiante.
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15 DE AGOSTO DE 2017
PROCISSÃO FESTIVA EM HOMENAGEM A NOSSA SENHORA DA GLÓRIA
FILARMÔNICA LYRA CECILIANA E MINERVA CACHOEIRANA
SAINDO DA IGREJA DA MATRIZ ATÉ A IRMANDADE DA BOA MORTE
pelo toque imponente dos metais, que são os instrumentos de sopro, posicionados a
frente de cada grupo.
Nessa caminhada, tive tempo de percorrer todas essas diferentes camadas:
os sinos no início da procissão, o burburinho das pessoas como uma camada que
preenche todo o áudio nos momentos de pausas das filarmônicas e duas partes das
mesmas filarmônicas que são os instrumentos de sopro na frente e os tambores ao
fundo. No áudio, é de se notar que os trompetes, clarinetes, saxofones, trompas e
tubas preenchem toda a camada quando me posiciono a frente do grupo. Às vezes
está presente no áudio apenas os instrumentos da bateria, como o bombo, caixas
de rufo e pratos. Essa estratégia que tive no momento da captação permite que o
ouvinte possa aproveitar mais o todo de uma filarmônica que está se movendo pelas
ruas, em fila, incapacitando uma captação de todos os instrumentos
simultaneamente e com qualidade.
Assim, a procissão já se aproxima do primeiro casarão que é a sede da Lyra
Ceciliana, localizada na Rua Monsenhor Tapiranga, ao lado do CAHL (Centro de
Artes, Humanidades e Letras). Nesse momento, o grupo faz uma parada, e
executam de quatro a cinco peças do seu repertório. O mesmo aconteceria logo
mais adiante, quando a procissão vira a esquina em direção da sede da Minerva
Cachoeirana, na rua Conselheiro Virgílio Damásio.
Finalmente a procissão chega ao seu destino, que é a sede da Irmandade
da Boa Morte, onde a própria Minerva apresenta os últimos toques que se pode
ouvir no áudio. Depois disso, o burburinho volta a dominar por um momento, mas
uma outra camada sonora, também de pessoas dentro da sede, faz com que eu
posicione meu gravador para dentro, onde é possível ouvir o padre fazendo algumas
orações e os fiéis respondendo com um “amém” que ecoa por todo o casarão. Assim
sendo, acho um momento peculiar para encerrar as gravações e me preparar para,
logo mais acompanhar a saída do Samba de Roda Suedrieck, o samba de Dona
Dalva, que teve a participação do grupo mineiro Samba de Terreiro.
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15 DE AGOSTO DE 2017
CORTEJO DO SAMBA DE DONA DALVA NA FESTA DA BOA MORTE
PARTICIPAÇÃO DO GRUPO MINEIRO SAMBA DE TERREIRO
Imagem 03: Apresentação das sambadeiras no cortejo de Dona Dalva com os baldes sonoros.
pouco mais elevado do que suas ruas vizinhas, faz com que seu som se expanda
mais facilmente, e para quem está nele, faz com que o corpo sinta a música mais
perto, sendo acolhedora.
Como morador da ladeira da cadeia, desci algumas vezes olhando para o
largo e ouvindo nitidamente o som que ali se fazia, sendo que a distância entre
esses dois locais é bem relevante.
Mais tarde, aconteceria a participação da Esmola Cantada no palco da festa
da Boa Morte nesse mesmo local, mas não consegui gravar nem participar, pela
exaustão de um dia cheio, festivo e pela falta de suporte técnico.
20 DE AGOSTO DE 2017
SEGUNDA SAÍDA DO GRUPO ESMOLA CANTADA
MORUMBI E ALTO DO CRUZEIRO
27 DE AGOSTO DE 2017
SAÍDAS DA ESMOLA CANTADA
LADEIRA DA CADEIA
cruz de madeira que é dado para cada dono ou dona de casa segurar enquanto se
cantam e pedem a esmola e na outra mão o gravador, captando o momento agora o
mais próximo possível, no clima onde envolveu também a emoção de estar
acompanhando o grupo e já habituado com o processo.
Depois disso o grupo subiu até o fim da ladeira, continuando até o alto da
ladeira, num momento onde já se não vê mais moradias e sim uma paisagem mais
bucólica, com uma estrada antiga de chão batido que dava acesso a comunidade de
Belém. A partir disso o grupo retorna ao caminho de volta, mas agora passando por
ruas pequenas, que não imaginava que existiam por ali, e que abrigava um povo de
devoção calorosa, em casas pequenas e aconchegantes, onde numa delas aparece
a figura de uma senhora que já começa a entoar sambas que o grupo até então não
se lembrava. Esta senhora foi parte importante da jornada nesta última saída da
Esmola Cantada, pois mostrou o quanto é rica a sabedoria oral deste povo que
sempre teve o samba de roda correndo em suas veias, mesmo que sua orientação
religiosa seja católica ou do candomblé, todos são devidamente respeitados e as
visitas do grupo não são negadas. Voltando a falar desta senhora, peço que o leitor,
ao ouvir a extensa gravação presente neste trabalho, que ouça com atenção para
que não deixe escapar a oportunidade de conhecer estas canções que oralmente
estão espalhadas pelas ruas pequenas e as vezes distantes do centro de Cachoeira.
Termino aqui este diário de campo, resumindo o quanto foi satisfatório e
enriquecedor conhecer esses movimentos e organizações sejam os sambas de roda
ou terreiros de candomblé, os seus bairros, suas ladeiras, sua geografia em geral,
em especial a sua sonoridade, e sua manutenção com a presença de jovens que
sempre acompanharam os grupos durante toda essa pesquisa.
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CONCLUSÕES
de curso, pude desenvolver um lado que ainda não tinha envolvimento pleno, que foi
o da área de pesquisa em campo. Esta me fez ter uma aproximação mais sincera
com as pessoas ao meu redor e “objeto” da minha pesquisa, já que antes, por me
situar numa área de captação sonora, seja ela de um filme de ficção ou de um
documentário, o envolvimento maior com as pessoas sempre foram pela parte dos
diretores e idealizadores dos projetos.
Assim, mais uma área do campo sonoro, a área do patrimônio imaterial
sonoro, conservada em sua grande maioria pela memória oral das pessoas, serviu-
me como uma forma também de contribuir para que esses áudios captados fossem
doados em forma de mídia física (CD ou DVD) para estes grupos, e no campo virtual,
como forma de conservação de um patrimônio que através do registro sonoro está
arquivada em campos seguros onde pessoas que não tem acesso e nem
conhecimento a tão rico patrimônio possa vir a cidade de Cachoeira e ter as suas
próprias experiências sonoras.
Termino este memorial com a esperança de que, mesmo escassos, esses
grupos ainda possam manter as suas tradições culturais para que não só a cidade
continue exalando musicalidade, como também a própria essência de cada tradição
continue ainda atraindo os jovens para que estas manifestações culturais nunca
deixem de existir.
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REFERÊNCIAS
NISENBAUM, Márcio; KÓS, José Ripper; BOAS, Naylor Barbosa Vilas. O estudo das
paisagens sonoras por meio de soundwalks: estratégias e possibilidades de
representação. Enanparq: Encontro da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-
Graduação em Arquitetura e Urbanismo, Porto Alegre, v. 4, n. 1, p.1-20, jul. 2016.
ANEXO