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Por que a Mosa Lisa irá para o céu

Cultura de acordo com Deus

por

Greg Johnson

“E viu Deus que era bom... e Deus lhes disse... enchei a terra, e
sujeitai-a” (Gênesis 1.25,28)

Uma das primeiras passagens bíblicas que memorizei quando


me tornei cristão foi a Grande Comissão (Mt 28.18-20). Estas
eram as ordens finais do Senhor para suas tropas antes de
ascender aos céus. O Rei Jesus havia prometido que o Espírito
Santo daria poder capaz de mudar o mundo para todo cristão.
Então, ele nos instruiu a fazer discípulos de todas as nações.
Ele nos mandou ir até as pessoas, batizá-las em nome da
Trindade e ensiná-las a obedecer tudo que o Senhor ordena.
Aqui nós temos um grande retrato para a igreja. Todas as
pequenas coisas que a igreja faz são parte desta grande missão
de ensinar as nações.

A Primeira Grande Comissão – O Mandato Cultural

O que poucos sabem, no entanto, é que existem duas grandes


comissões na Bíblia. A mais familiar está em Mateus 28. Mas
uma grande comissão anterior foi dada à toda humanidade. No
princípio, Deus falou aos nossos primeiros pais:

E Deus os abençoou, e Deus lhes disse: Frutificai e multiplicai-


vos, e enchei a terra, e sujeitai-a; e dominai sobre os peixes do
mar e sobre as aves dos céus, e sobre todo o animal que se
move sobre a terra (Gênesis 1.28).

É fácil esquecer-se da importância dessas palavras. Estas são


as instruções de Deus para a raça humana, sua visão de vida
para nós. É um chamado para estabelecer a sociedade humana
sobre a terra. O Senhor nos designou para encher a terra e
sujeitá-la. Fomos criados para reger a Criação, para deixar
nossa marca sobre a terra. Fomos criados para criar,
planejados para planejar. Esta é a primeira grande comissão, o
fundamento para a civilização humana. É chamado de mandato
cultural.

Domínio + Natureza = Civilização

A sociedade ocidental tem se tornado tão especializada que nós


nos esquecemos do fato simples de que domínio e cultura
andam lado a lado. Freqüentemente pensamos na natureza
num sentido romântico de matas virgens. Mas neste exato
momento em que digito, estou sentado em uma parte da mata –
uma cadeira. É uma daquelas velhas cadeiras de madeira, fora
de moda. Cadeiras assim, em última análise, não vêm de uma
fábrica, mas de árvores.

Duas coisas são necessárias para que eu tenha minha cadeira:


árvores e domínio humano (incluindo criatividade humana). O
homem sujeita a terra para pegar a madeira, e então, como
imagem de Deus, imprime sobre a árvore seu poder criativo,
gerando uma bonita cadeira, mesmo que ela pareça cimento.

As ordens de Deus para humanidade? Fazer cadeiras, construir


casas, plantar orquídeas, barrar rios, controlar eletricidade,
extrair pigmentos e fibras e pintar Mona Lisas, transformar o
silício nas praias em microchips, transformar raízes em batatas
fritas.

A industrialização e a crise do meio-ambiente que a acompanha


nos têm dado uma imagem negativa do domínio, divorciada de
nosso chamado dado por Deus. Domínio significa mais que
esvaizar minas e causar poluição. Domínio não significa abuso
e pilhagem. Significa que o mundo de Deus está incompleto sem
a humanidade em seu devido lugar.

Como discutido no último capítulo, Deus estabeleceu certas


instituições, como governo e família, para estruturar a ordem
social. É importante notar, entretanto, que a própria cultura foi
o que Deus nos ordenou que criássemos. A sociedade humana
não é algo neutro. Deus não regula simplesmente a cultura
humana; ele a estabelece. Ele é o caule de onde os vários ramos
da civilização humana crescem e se espalham.

Esquecer a razão pela qual Deus nos criou é denegrir os nobres


chamados que Ele deu a muitos de nós. Nenhum cristão deveria
sentir-se culpado por participar de assuntos “seculares” se isto
é o que Deus planejou para ele! A doutrina da Criação é a
grande doutrina negligenciada do Cristianismo. Centenas de
passagens bíblicas nunca aparecem em sistemas de
memorização da Bíblia. “Vai, pois, come com alegria o teu pão e
bebe com coração contente o teu vinho, pois já Deus se agrada
das tuas obras.” (Ec 9.7). Eu gostaria de colar um versículo
desses no meu escritório.

Interesses mundanos como agricultura, arquitetura e comércio


são uma perda de tempo? Deus diz que não. E qualquer coisa
que nós fazemos pela fé nesta vida permanecerá na era porvir –
seja limpar o chão ou planejar pontes. No fim desta era, quando
o pecado for erradicado e as nações andarem na luz de Deus, o
melhor da cultura humana permanecerá. Nos é dito sobre a
Cidade de Deus que “os reis da terra trarão para ela a sua glória
e honra.” (Ap 21.24). Eu duvido que Luís XIV estará lá, mas eu
devo pensar que alguns cristãos de sua corte talvez presenteem
Deus com o Palácio e os jardins de Versailles como uma oferta.

Imagine o Arco do Triunfo, a Mona Lisa, os sonetos de


Shakespeare, o Chevy ano 57, a Baker Furniture, o Taj Mahal –
todas as glórias da civilização humana, finalmente livres de
suas histórias pecaminosas, motivações confusas e
subprodutos negativos. Todos eles virão à Cidade eterna de
Deus, como ofertas à fonte de bem, da verdade e da beleza. “A
ela trarão a glória e honra das nações” (Ap 21.26)

Apesar de Gênesis 2 e Apocalipse 21-22 (o começo e o fim da


história) serem parecidos em quase todos os aspectos, o Jardim
no fim não será mais um jardim, mas uma grande cidade, os
séculos de domínio finalmente serão redimidos para estabelecer
uma civilização eternamente com Deus em seu centro. O
mandato cultural, apesar do pecado e da rebelião da
humanidade, encontrará sua plenitude.

Mas, cuidado com Babel


Ainda assim, a Escritura está cheia de avisos contra o mau uso
da cultura. O chamado para construir a civilização humana tem
sido cooptado através da história por homens e mulheres
(normalmente homens) com egos gigantes, procurando glória
para si mesmo, ao invés de glória a Deus. Quando a sociedade
humana levanta-se contra o Deus que a estabeleceu, a cultura
torna-se corrompida por sua idolatria.

Nós lemos em Gênesis 11 sobre uma torre construída por


homens que queriam fazer um nome para si mesmos (Gn 11.4).
Construída algum tempo após o grande dilúvio (Gn 6-9), a Torre
de Babel tornou-se um símbolo da civilização humana erguida
para a glória do homem, ao invés da glória de Deus. Deus
respondeu com um ataque preemptivo, espalhando a
humanidade pela Terra e confundindo nossa linguagem para
limitar nossa habilidade de cooperar com os outros em nossa
rebelião cultural contra ele.

Como o desenvolvimento cultural foi ordenado por Deus na


Criação, ele foi arbitrariamente tomado pelo pecado. Lembre-se
do orgulho de Nabucodonosor por causa do reino que
estabeleceu. Andando no topo de seu palácio, ele perguntou
“Não é esta a grande Babilônia que eu edifiquei para a casa
real, com a força do meu poder, e para glória da minha
magnificência?” (Dn 4.30). Foram sete anos de insanidade até
que este rei levantasse seus olhos para o céus e reconhecesse
que o Altíssimo é soberano (Dn 4.28-37).

Infelizmente, a arrogância é a doença comum dos mais


refinados. Jesus louvou ao Pai por esconder a verdade dos
sábios e entendidos do mundo (Mt 11.25). Dentro do mistério de
seu propósito eterno, Deus escolheu mais dos “não-são” do
mundo que dos “são”. “Vede, irmãos, a vossa vocação, que não
são muitos os sábios segundo a carne, nem muitos os
poderosos, nem muitos os nobres que são chamados”, Paulo
escreve. “Mas”, explica, “Deus escolheu as coisas loucas deste
mundo para confundir as sábias” (1 Co 1.26-27)

Minha própria experiência tem sido que os critãos altamente


educados e prósperos – aqueles que tendem mais a apreciar
artes e alta cultura – são facilmente infectados pela arrogância
que acompanha os refinados. Nós achamos muito fácil olhar
com desdém os crentes mais pobres, com seus pesos de papel
em forma de mãos orando, como se a beleza das artes fosse
para nossa glória ao invés da glória de Deus. Não há desculpa
para orgulho e julgamento. Como Deus estabeleceu a
civilização, ele não dividirá sua glória com outro (Is 48.11).

Deus quer que você aproveite a Criação

Com os avisos dados, existem centenas de alimentos culturais


aqui para o nosso deleite – desde que os recebamos com
humildade e gratidão como dons de Deus. Nós somos criaturas
físicas, e nossa existência física é algo bom – Deus disse isso.
Ele nos formou de um barro físico (Gn 2.7). Ele disse que o
mundo material era bom , que era muito bom (Gn 1.31). A
carne que a Escritura nos adverte não refere-se a nossos
corpos, mas à nossa pecaminosidade e normalmente é
traduzida hoje como “natureza pecaminosa”.

Eu não tenho certeza do motivo para que alguns cristãos,


através do tempo, tenham crido que o prazer físico é ruim.
Talvez só estivessem profundamente preocupados com sua
tendência ao abuso e de tornarem-se viciados no prazer. Nós
não devemos permitir que ninguém nos domine (1Co 6.12). Mas
Deus nos deu a beleza e o prazer. Prazer é uma coisa boa.
Apesar de poder ser abusado, a correção para o mau uso do
prazer não é ignorá-lo, mas recebê-lo com alegria divina.

Jesus certamente não era libertino ou excessivo – ele nem


mesmo possuía uma casa durante seu ministério (Mt 8.20). Mas
ele apreciava comer e beber. Seus inimigos o acusaram de
bebedeira e glutonaria (Mt 11.19). Considere quão disposto
Jesus transformou água em vinho para uma festa inteira (Jo
2.1-11). Obviamente, ele não considerou a celebração algo ruim.

Apesar do risco de abuso, Jesus teve prazer e permitiu que os


outros fizessem o mesmo. E o vinho bíblico era vinho
verdadeiro. Freqüentemente era misturado com água, mas você
ainda podia ficar bêbado com ele (Ef 5.18). É por isso que a
Escritura nos avisa para sermos cuidadosos (Pv 20.1). A Bíblia
explicitamente diz que Deus é o único que dá vinho para
bebermos (ou não bebermos), da mesma forma que nos dá pão.

Faz crescer a erva para o gado,

e a verdura para o serviço do homem,


para fazer sair da terra o pão,

E o vinho que alegra o coração do homem,

e o azeite que faz reluzir o seu rosto,

e o pão que fortalece o coração do homem. (Sl 104.14,15)

O mundo de Deus vai muito além das necessidades simples.


Quando uma mulher derramou um vaso inteiro de perfume
caríssimo aos pés de Jesus, por exemplo, viu que não era
desperdício mas uma “coisa bonita” (Mc 14.3-9). Você percebeu
o julgamento estético? Jesus poderia ter dito que foi um ato
apropriada ou uma ação moral. Pelo contrário, ele a considerou
bonita. A propósito, há aproximadamente quarentas referências
a perfume na Bíblia, quase todas positivas.(1)

Deus nos deu sua boa Criação para ser usada para nossa
alegria. Prazeres servem como indicadores do Deus que é bom,
verdadeiro e belo. Outro versículo negligenciado pelas pessoas
que fazem adesivos cristãos diz “Para o homem não existe nada
melhor do que comer, beber e encontrar prazer em seu
trabalho. E vi que isso também vem da mão de Deus. E quem
aproveitou melhor as comidas e os prazeres do que eu?”. Ele
ainda adiciona uma recomendação. “Por isso recomendo que se
desfrute a vida, porque debaixo do sol não há nada melhor para
o homem do que comer, beber e alegrar-se. Sejam esses os seus
companheiros no seu duro trabalho durante todos os dias da
vida que Deus lhe der debaixo do sol!” (Ec 2.24,25; 8.15, NVI)

As palavras bíblicas mais fortes sobre o prazer, entretanto, não


vêm do autor de Eclesiastes, mas do apóstolo de Cristo, Paulo.
Normalmente pensamos nos falsos mestres como aqueles que
ultrapassam o padrão de Deus, mas os piores professores,
Paulo nos avisa, são aqueles que o diminuem, chamando de
más as coisas boas.

Tais ensinamentos vêm de homens hipócritas e mentirosos, que


têm a consciência cauterizada e proíbem o casamento e o
consumo de alimentos que Deus criou para serem recebidos
com ação de graças pelos que crêem e conhecem a verdade. Pois
tudo o que Deus criou é bom, e nada deve ser rejeitado, se for
recebido com ação de graças, pois é santificado pela palavra de
Deus e pela oração. (1 Tm 4.2-5, NVI)
Os mestres que Paulo condena viam o mundo material como
uma coisa má. Pessoas espirituais, eles diziam, eram pessoas
que abriam mão de certas comidas, do casamento e de sexo.
Porém, na verdade, esta auto-punição ascética não era
espiritual, mas demoníaca e herética (1Tm 4.1). Dizer que
alguma coisa que Deus nos deu é intrisicamente má é tornar
maligna a pessoa de Deus.

Certamente é possível abrir mão de uma bênção com o objetivo


de alcançar outra – por meio de jejum, celibato ou sacrifício
financeiro. Eu já conheci muitos cristãos que abriram mão de
carreiras potencialmente lucrativas a fim de entrar no
ministério cristão. O próprio Paulo abriu mão de seu direito de
casar objetivando servir melhor a Deus (1Co 9.5,15). Mas Paulo
não afirma que o casamento era ruim; na verdade ele estava
perseguindo uma bênção diferente.

O prazer é central ao nosso relacionamento com Deus. Nós não


somos chamados simplesmente para crer em Deus; nós somos
chamados para nos deleitarmos nele. “Deleita-te também no
Senhor, e te concederá os desejos do teu coração.” (Sl 37.4). A
Bíblia refere-se a deleitar-se em Deus tanto quanto arrepender-
se. Nossas afeições são centrais para viver a vida que Deus tem
para nós. E Deus se deleita em nós. “O Senhor se agrada dos
que o temem e dos que esperam na sua misericórdia.” (Sl
147.11). Nosso deleite nele é baseado em seu deleite em nós.

Eu estou convencido de que nossa falha em ler toda a Escritura


cuidadosamente – e particularmente o Antigo Testamento – tem
empobrecido as vidas espirituais dos cristãos. Salvação torna-se
simplesmente chegar aos céus, como se nós estivéssemos
tentando escapar do mundo que Deus fez para nós. A salvação
é muito mais compreensiva. Primeira e principalmente
é reconciliação com Deus (2Co 5.18,19).

No passado existiu uma batalha com Deus em todas as áreas


de nossas vidas. Mas a salvação traz reconciliação em todas as
áreas: arte, drama, literatura, ciência, educação, engenharia,
comércio, sono, diversão. Tudo na vida é reconciliado com o
Todo-Poderoso, sob o senhorio de Jesus Cristo.

Realmente, foi Jesus quem orou para que nós estivéssemos no


mundo, mesmo não sendo deste mundo (Jo 17.16-18).
Freqüentemente, nós fazemos isso ao contrário; nos tornamos
mundanos em nosso gueto evangélico. Nos descobrimos como
mundanos, e não no mundo.

A cultura humana dentro do propósito de Deus deve apresentar


a perfeição da pessoa de Deus ao universo inteiro. Poderia
alguém ver a infinita beleza da Criação de Deus e não pensar
que nosso Deus é bom? Eu não estou falando apenas do Grand
Canyon, dos Alpes Suícos e esquilos. Eu também estou falando
da Nona Sinfonia de Beethoven.

Alta cultura e as artes de acordo com Deus

Arte é a esfera da vida que tem mais potencial para apresentar


a beleza de Deus que qualquer outra. No entanto, o termo alta
cultura não ajuda. Lembra imagens de senhoras ricas e
esnobes em bailes formais. Ainda assim, as artes
freqüentemente apresentam as maiores realizações da cultura.
Muita da verdadeira arte do mundo apresenta a excelência de
Deus, mesmo que muitos artistas não sejam cristãos.

Eu não tenho idéia da intenção de Beethoven quando ele


escreveu a Nona Sinfonia. Mas seu trabalho ainda assim
glorifica a Deus. O que vem daquilo – voluntariamente ou não –
é beleza que deve ser creditada somente à imagem de Deus em
Beethoven. A feiura do pecado de um artista e a beleza de sua
música podem ser distinguidos, e eu posso ser grato por uma
coisa mesmo enquanto eu me lamento pela outra.

Muitos grandes hinos são cantados em melodias que eram


originalmente canções de bar. As melodias eram boas! Mesmo
na criatividade de pagãos, a bondade, verdade e beleza de Deus
ainda nos são mostradas, uma vez que seres humanos são
criados à sua imagem.

Mesmo Paulo citou poetas pagãos gregos, incluindo um Hino a


Zeus (Atos 17.28). Vamos encarar – o apóstolo foi fã de artes.
Ele tinha uma queda pela literatura grega do século XVI a.C.
Ele faz citações sempre em momentos oportunos, para provar
alguma coisa. Obviamente, ele gastou algum tempo lendo esta
coisas – talvez fosse seu truque. Ele cita o poeta Epimênides
como evidência de que os cretenses são todos mentirosos (Tt
1.12) e retira um conselho moral sobre má companhia
corromper uma boa pessoa de uma comédia grega de Menander
(1Co 15.33).

Pessoalmente, eu prefiro a ficção científica britânica dos anos


70 a clássicos da literatura grega. Doctor Who – mesmo que
definitivamente não seja um programa cristão – tem certos
temas nobres que eu posso apreciar: amor pela paz,
reconhecimento da fraqueza humana e, algumas vezes, um
respeito dogmático pelo valor da vida humana. Talvez se Paulo
estivesse aqui, ele assistiria alguns episódios comigo.

Você já percebeu que a primeira habilidade realmente chamada


de dom do Espírito Santo foi a arte? Bezalel e Aoliabe receberam
o Espírito de Deus para capacitá-los a preparar a arte do
tabernáculo (Ex 31.1-11). Deus chamou Bezalel para trabalhar
com madeira e metais, enquanto ele concedeu a outros homens
dons para costurar. Os homens americanos podem não formar
grupos de costureiros após o culto, mas Deus não vê nada de
afeminado ou mundano nas artes.

A perfeição de Deus é o maior padrão de beleza. A única coisa


que Davi almejava era “contemplar a formosura do Senhor” (Sl
27.4). Deus é o padrão imutável de amabilidade. Por isso a
Escritura nos ensina a pensar aquilo que é amável (Fl 4.8).

Mas, enquanto a beleza pode ter um critério objetivo na beleza


de Deus, nós, como imagens de Deus, temos uma tremenda
liberdade de expressar esta beleza criativamente. Olhe para a
imensa variedade de arte na Bíblia: esculturas tridimensionais
(Ex 25.18) e cavadas (2Cr 3.7). A arte bíblica nem sempre tem
um assunto religioso. O trono de Salomão era coberto com
ouro, feito de marfim, tinha dois leões juntos ao encosto, e mais
doze leões postos nos seis degraus (1Re 10.18-20). A decoração
não tinha um conteúdo totalmente religioso.

Música cristã pode incluir uma canção de amor para a esposa,


por exemplo, e não apenas canções de amor para Jesus. O
Cântico dos Cânticos é o principal exemplo. Cântico dos
Cânticos é sobre um homem e uma mulher apaixonados. Por
que está na Bíblia? Porque Deus fez homens, mulheres, corpos,
amor, casamento, sexualidade, e o Espírito Santo escolheu
inspirar uma reflexão divina sobre uma relação envolvendo tudo
isto.
Está tudo bem se a arte é secular. Secular não quer dizer
“profana”, mas “temporal”, tomando lugar nesta época, no
tempo, do latim saeculum, significando “um longo tempo”.
Depois da Reforma Protestante, quando a vida secular foi
novamente reconhecida como um chamado de Deus, vemos a
ascenção de temas seculares na arte. De fato, nós vemos isto
primeiramente na Holanda Calvinista, onde Rembrandt pintou
arte religiosa como O Retorno do Filho Pródigo tanto quanto arte
secular, como Lição de Anatomia . A arte não precisa ter um
assunto religioso para ser cristã. Tudo na vida é dado por Deus,
e portanto é digno de contemplação.

Além disso, a arte não precisa ser funcional para agradar a


Deus. Muito dos ornamentos do templo não tinha qualquer
função além de decoração – “Recobriu de pinho o átrio
principal, revestiu-o de ouro puro e o decorou com desenhos de
tamareiras e correntes. Ornamentou o templo com pedras
preciosas. O ouro utilizado era de Parvaim. Também revestiu de
ouro as vigas do forro, os batentes, as paredes e as portas do
templo, e esculpiu querubins nas paredes” (2Cr 3.5-7). Sua
função era beleza. Beleza é um fim nobre. E as romãs azuis nas
vestes sacerdotais (Ex 28.33) provam que a arte cristã não
precisa ser realista; romãs não são azuis na natureza.

Também podemos ver dança nas Escrituras (Ex 15.20), música


instrumental com uma orquestra de instrumentos (Sl 150.3-5),
uma sinfonia com quatro mil instrumentos, divididos em três
partes (1Cr 23.5-6), e mesmo uma pequena peça teatral (Ez 4.1-
3). O que me chama atenção é que nenhum autor bíblico
defende qualquer dessas expressões artísticas. Eles
simplesmente assumem que artes são dignas aos olhos de
Deus.

Não seja um “miserável por Cristo”

Existem cristãos que vêem feiúra como uma marca de


espiritualidade – algo que um amigo meu chama de “miseráveis
por Cristo”. Talvez eles estejam apenas reagindo a uma cultura
materialista, mas falham em perceber a excelência e a beleza da
Criação (Gn 1.31). Quando uma igreja constrói uma belo templo
para adoração, normalmente eles são os primeiros a criticar.
Eu não estou dizendo que as igrejas devem gastar cegamente
seu dinheiro em construções. O dízimo, por exemplo, foi
designado para os levitas (os sacerdotes) no Antigo Testamento
e deveria ir para pastores cristãos e missionários hoje (Nm
18.21). Seria um crime roubar o Apóstolo Pedro para pagar
Frank Lloyd Wright (2). Mas se os crentes querem sacrificar
além disso para construir um prédio cuja beleza eleve suas
mentes a Deus, que sejam fortalecidos. Pode ser uma coisa
maravilhosa quando o desejo é trazer honra a Deus, e não
apenas colocar uma igreja no bairro.

Cristo não nos pede para sermos miseráveis por ele. Pelo
contrário, Deus não aceita uma oferta nossa em que falte
qualidade (Ml 1.6-14). Esse é um chamado bíblico para a
excelência.

Há algum tempo atrás, fui a um shopping local a fim de


investigar o estado atual da cultura cristã. Eu gastei algum
tempo em uma loja de brinquedos secular e encontrei algumas
coisas boas por menos que dois dólares – um chaveiro que era
um Traço Mágico em miniatura e um pião que solta luzes
coloridas quando rodava. Eles também vendiam doces.

Depois fui até a loja cristã. Os brinquedos lá eram bem mais


caros. E francamente, eram sem graça e usavam o nome de
Deus em vão. Encontrei um pião que custava mais, não soltava
luzes ou algo assim, e dizia “Deus é dez”. Meu estômago revirou.
Ao invés de um chaveiro de Traço Mágico, haviam apontadores
com as manjadas mãos orando grudadas neles. Eles também
vendiam doces – pastilhas cristãs, chocolates cristãos e
biscoitos da sorte cristãos – e o doce era caro também. É isto
que a cultura cristã é? Um clone de pior qualidade e mais caro
daquilo que o mundo está fazendo, mas como o nome de Deus
colado em tudo?

É claro que há objetivos mais nobres que apenas a beleza física.


A beleza interior é o chamado mais alto de Deus. A Escritura
nos diz para não julgar as pessoas por sua aparência externa e
não tentar impressionar os outros com jóias e riquezas, mas a
desenvolver a beleza interior de uma personalidade piedosa (1Pe
3.3-4). Algumas vezes, as coisas mais bonitas são as mais
simples, autênticas e sem adornos – como uma personalidade
piedosa, um ato sincero de amor ou uma conversa franca com
uma pessoa aberta e honesta. A beleza aos olhos de Deus não
está limitada ao extravagante, sofisticado ou caro.

Nossos corações deveriam desejar fortemente ver a beleza de


Deus refletida em tudo que dizemos e fazemos, seja beleza
simples ou beleza elaborada. É claro, uma vez que tendemos ver
a beleza como uma forma de nos exaltar, precisamos checar
constantemente nossas atitudes por causa do orgulho. O
problema não está na beleza, mas em nós.

Existem momentos em que todos nós precisamos abrir mão de


coisas boas porque elas se tornaram ídolos para nós. No
deserto, por exemplo, Deus mandou que os israelitas olhassem
para a serpente de bronze, para serem curados (Nm 21.4-9),
mas logo o povo começou a adorar a serpente, e Deus mandou
que ela fosse destruída (2Re 18.4). O autor de Hebreus nos
manda lançar fora tudo que nos atrasa – mesmo coisas boas
(Hb 12.1). Alguns cristãos tem de abrir mão dos esportes
porque isso os deixa irados. Outros devem abrir mão de certas
comidas porque eles não podem comer elas responsavelmente.
A Bíblia não nos instrui a abandonar todas as coisas boas deste
mundo, mas nos previne a não nos tornarmos abusivos (1Co
7.31). Se nos deleitarmos mais nos dons de Deus que no
próprio Deus, pode ser o momento de abrir mão desta coisa boa
a fim de receber seus dons com um coração reto.

Nós nunca devemos julgar outras pessoas por não abrir mão


das coisas boas, entretanto. Esta é marca de um legalista. “Pois
por que há de a minha liberdade ser julgada pela consciência de
outrem?” (1Co 10.29). Mesmo Paulo abriu mão de certas
bênçãos de Deus, como o direito de se casar, receber dinheiro
pelo seu ministério, e às vezes o direito de comer certas
comidas. Ele não fez isso porque estas coisas eram más, mas
porque ele sentia que poderia pregar o evangelho melhor sem
elas (1Co 9.4,5,15,27).

Deus não pára apenas com o básico, mas “abundantemente nos


dá todas as coisas para delas gozarmos” (1Tm 6.17). Ele não
tinha de nos criar com a capacidade de ver cores ou cheirar
flores. Isso foi um bônus da parte de Deus. De fato, o céu é
retratado como uma festa em mais de uma ocasião (Lc 13.29).
Nós precisamos de discernimento ao ter prazer por causa de
problemas conosco, não com as coisas. Se for recebido de forma
correta, mesmo a mais opulenta das riquezas culturais do
mundo pode ser uma fonte de deleite pessoal e ação de graças a
Deus.

Cultura, domínio e meio-ambiente

Com toda esta conversa sobre a beleza na Criação de Deus,


como fica a visão bíblica da cultura humana, com sua ênfase no
domínio sobre a natureza, que nos leva a atuar sobre o meio-
ambiente? O cristianismo tem sido atacado por promover a
irresponsabilidade ecológica – um ataque que considero sem
base. Não há nada de errado com o conceito de domínio em si
mesmo. Qualquer ação que trate de curar o meio-ambiente
requer o exercício do domínio humano sobre a natureza, seja
cuidando de espécies ameaçadas ou removendo poluentes do
céu.

Trabalhar na terra não é anti-natural. Quando as formigas


furam o solo, criando túneis e destruindo um terreno, nós não
achamos que há algo de errado com elas. Elas fazem
formigueiros por natureza! A princípio, pelo menos, as cidades
humanas não são tão diferentes de formigueiros – homens
constroem civilizações por natureza, embora, como portadores
da imagem de Deus, carreguemos uma responsabilidade
especial sobre comoconstruimos.

É nosso chamado de Deus interagir criativamente com a


natureza. A natureza encontra sua plenitude quando as
pessoas vivem dentro dela. A questão não é dominar ou não
dominar. A questão certa é como deveríamos exercer nossa
influência sobre a natureza.

Primeiramente, precisamos manter nosso domínio em uma


perspectiva bíblica. Embora tenhamos domínio, continuamos
sendo criaturas. Nós não somos Deus. Ao mesmo tempo em que
estamos acima da Criação em relação à natureza, estamos no
mesmo nível da natureza em relação a Deus. Nós somos
criaturas humanas, pó animado (Sl 103.14). A aliança que Deus
estabeleceu com Noé não foi feita meramente com a
humanidade. Foi um acordo solene entre Deus e os pássaros,
gado e animais selvagens (Gn 9.9,10). Nosso Pai Celestial
alimenta os pássaros da mesma forma que nos alimenta (Mt
6.26). Nós somos todos criaturas derivadas e dependentes.
E lembre-se que fomos colocados no Jardim com a ordem de “o
lavrar e o guardar” (Gn 2.15). Nossa liderança da natureza é
uma gerência. Nós cuidamos da Criação de Deus para ele. As
criaturas são criaturas de Deus (Sl 104.24), sua obra, em que
ele se deleita (Sl 104.31).

E o domínio que Deus nos dá não é auto-regulado Nós o


exercemos debaixo da Lei do amor de Deus, por ele e pelo
próximo. O mandamento de amar a Deus inclui dentro dele o
chamado para amar o que ele ama – incluindo sua Criação.
Mesma na legislação mosaica, Deus deu a Israel proteções para
animais, a fim de prevenir a extinção das espécies (Dt 22.6,7).

Similarmente, Deus protegeu os bois de terem a boca atada


enquanto estivessem trilhando (Dt 25.4). Se nós iremos usar
um boi para fazer nosso trabalho, então não devemos privar o
animal de comer enquanto trabalha. Embora nosso domínio
sobre os animais – pelo menos desde o dilúvio – nos dê a
liberdade de comê-los (Gn 9.3), Deus nos proíbe de ser cruéis
com eles. O pecado humano é o problema real por trás da crise
ecológica de nossos dias – particulamente a ganância, raíz de
todos os males (1Tm 6.10).

A própria Criação nos chama a considerar o nobre chamado


que Deus a deu. Os animais, árvores, e mesmo a atmosfera tem
o mesmo chamado que a humanidade: “Os céus declaram a
glória de Deus e o firmamento anuncia a obra das suas mãos”
(Sl 19.1). Se a natureza faz isso, então destruir a natureza é um
crime muito sério – um pecado que Deus julgará – “tempo de
destruíres os que destroem a terra” (Ap 11.18). As Escrituras
nos dizem que todas as criaturas louvam ao santo nome de
Deus (Sl 145.21), e Deus chamou os animais para
multiplicarem-se e encherem a Terra também (Gn 1.22). Se
cada uma das milhões de espécies na Terra tem um chamado
de Deus para cumprir, então todas as espécies que
exterminamos é diminuição da glória de Deus. Preocupação
com o meio-ambiente é uma prioridade teológica.

Deus nos chama para estabelecar a civilização humana para


sua glória, não para a nossa. Ele também nos chama para
servir o resto de sua Criação, permitindo que ela o glorifique
também. Nós não podemos fazer uma coisa ao custo da outra.
O mandato cultural nos dá a perspectiva de Deus sobre a
sociedade humana – a civilização de acordo com Deus.
Certalmente, a cultura pode ser manipulada como uma forma
de pecaminosidade. No entanto, o Mandato Cultural nos dá
uma direção divina a todas as gerações para estabelecer a
civilização humana na Terra, e fazer isto para manifestar a
bondade, a verdade e a beleza de Deus.

Capítulo 5 do livro The World According to God: A Biblical View


of Culture, Work, Science, Sex & Everything Else , por Greg
Johnson

Notas

(1) - N.T.: A maioria das versões em português trazem Jesus


falando que foi uma “boa ação”. Para não perdermos o
raciocínio do autor, preferimos traduzir a versão dele, que
diz “beautiful thing” para “boa ação”.

(2) - Um famoso e talentoso arquiteto

Traduzido por: Josaías Cardoso

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