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Explorando o Sentido
de Número Irracional
no Ensino Fundamental1
Thais de Oliveira
Dario Fiorentini
Algumas considerações
sobre números irracionais
O número irracional gerava medo no passado, medo do
inexprimível ou daquilo que não tem forma. A descoberta da
incomensurabilidade foi muito perturbadora e provocou a primeira
crise nos fundamentos da matemática da Escola Pitagórica
(Miguel, 1993). A descoberta de que a diagonal de um quadrado
não é comensurável com seu lado (ou que a diagonal e o lado de um
quadrado não admitem uma unidade de medida comum) derrubou
um dos pressupostos dessa escola – que todas as grandezas
geométricas de mesma espécie eram comensuráveis (Eves, 2007).
136 Thais de Oliveira e Dario Fiorentini
A tarefa exploratório-investigativa
Fiorentini (2006) tem conceituado uma aula exploratório-
investigativa como aquela que mobiliza atividades abertas,
exploratórias e não diretivas do pensamento do aluno e que
apresentam múltiplas possibilidades de alternativa de tratamento e
significação. Essas aulas servem, geralmente, para introduzir um novo
tema de estudo ou para problematizar e produzir significados a um
conceito matemático. O desenvolvimento da atividade
exploratório-investigativa pode favorecer o surgimento de um cenário
de investigação (Skovmose, 2000) no qual os estudantes podem
desenvolver uma investigação matemática (IM) (Ponte; Brocado;
Oliveira, 2003), especialmente se formularem questões ou conjecturas
em torno das quais realizam testes e tentam produzir justificativas ou
provas de validação.
A seguir, narramos e analisamos a atividade desenvolvida
pelos alunos do 8º ano que teve a seguinte tarefa desencadeadora
(Ficha 1):
Planejamento da atividade
exploratório-investigativa em sala de aula
Foi negociado com o Prof. Adilson um conjunto de cinco
aulas de 50 minutos, em cada turma, para desenvolver a atividade
exploratório-investigativa. Mas havia dois problemas: um era o
número relativamente grande de alunos (quarenta em cada turma); o
outro problema é que esses alunos nunca tinham trabalhado com
tarefas exploratório-investigativas. Portanto, tínhamos de incluir em
nossa proposta um outro objetivo didático-pedagógico: familiarizar
os alunos à dinâmica exploratório-investigativa, descrevendo e
orientando o processo de trabalho cooperativo em grupo e as fases de
uma atividade exploratório-investigativa em sala de aula.
A primeira fase seria a de conhecer a dinâmica de uma atividade
investigativa e constituir um grupo de trabalho especificando a função
de cada componente. No nosso caso, cada grupo seria formado por
quatro integrantes: um coordenador, um redator (responsável pelos
registros das discussões e resoluções e pela elaboração de um pôster) e
dois seriam os relatores (que iriam socializar aos colegas seus
achados). A segunda fase seria a da exploração livre da tarefa, tentando
compreendê-la e identificar relações, regularidades e formular
possíveis conjecturas. A terceira fase seria a de construção de
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Figura 2. Tentativas de outro grupo, sem utilizar calculadora, para obter a medida
aproximada do lado de um quadrado de área 5.
Figura 6. Pôsteres colados na lousa com os registros dos alunos e a Profa. Thais
conduzindo a socialização (Foto de Denis Aparecido Silva – 05/07/2007).
Aluno: dá 1,41421356
Profa: Ponto, ponto, ponto... [Os alunos, rindo, confirmam a
necessidade dos três pontos].
Profa: Que significa estes “...”? Se eu não faço isso eu não
garanto que esse número tem infinitas casas decimais e é irracional.
Esse número existe, mas por que não serve à nossa resposta?
Aluna: Porque se você fizer “ele vezes ele” dá 1,9999999....
O momento da socialização foi fundamental, pois, além de dar
a conhecer a todos o que cada grupo produziu, representou também
um momento de síntese e sistematização do trabalho desenvolvido,
clarificando, assim, os conceitos e significados de número irracional
para a maioria dos alunos. Isso mostra que o trabalho exploratório-
investigativo com números irracionais representa uma alternativa
rica, envolvente e estimulante, conquistando a participação efetiva e
produtiva de alunos que, em geral, são pouco interessados no estudo
da matemática.
Concluindo...
Ao iniciar este estudo, tínhamos como hipótese de trabalho
que as práticas exploratório-investigativas, acerca dos números
irracionais, poderiam constituir um contexto favorável à produção
de significados de alunos do 8º ano do ensino fundamental em
relação à existência e à natureza desses números.
Os resultados obtidos, de um lado, confirmam essa hipótese e,
de outro, que esse processo, quando bem planejado, tendo o apoio de
um grupo de professores com experiência nesse campo, como foi o
GdS, representa uma alternativa didático-pedagógica altamente
instigante e mobilizadora do pensamento matemático dos alunos e de
sua atitude exploratória, questionadora e investigativa em relação às
ideias matemáticas. Cabe destacar, além disso, que as experiências
didático-pedagógicas foram desenvolvidas em uma escola pública
do estado de São Paulo e envolveram questões típicas da matemática
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