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Em sua obra “O que é racismo estrutural?”, o autor faz uma análise profícua
deste fenômeno, desde suas raízes e processos históricos, passando pelas diferentes
concepções de racismo e suas dinâmicas estruturantes, através de uma observação
minuciosa das principais instâncias sociais, sejam elas: ideológica, política, jurídica e
econômica.
Isto posto, é possível verificar que negros e negras, sob impacto do racismo
estrutural e da necropolítica, apresentam os piores indicadores sociais e de saúde,
figuram os maiores índices entre pessoas com enfermidades crônicas e padecem de
doenças derivadas do estresse e sofrimento psíquico causados pelo racismo.
Para amalgamar estes dois conceitos com a atual conjuntura, a melhor maneira é
nos voltarmos novamente para os dados estatísticos, neste caso da pandemia. Em nota
técnica assinada por 14 pesquisadores do NOIS (Núcleo de Operações e Inteligência em
Saúde) da PUC-RIO, após analisar 29.933 "casos encerrados" de covid-19 (com óbito
ou recuperação), dos 8.963 pacientes negros internados, 54,8% morreram nos hospitais.
Entre os 9.988 brancos, a taxa de letalidade foi de 37,9%. A maior diferença foi entre
pessoas de 30 a 39 anos, em que negros têm 2,5 vezes mais chances de morrer em uma
internação por SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave) do que brancos internados.
O agravante de letalidade entre brancos se dá a partir dos 70 anos enquanto entre negros
isso já ocorre a partir dos 60 anos. Ainda de acordo com a nota técnica da PUC-Rio,
negros apresentam também maior índice de óbitos em todos os níveis de escolaridade,
negros sem escolaridade morrem quatro vezes mais do que brancos com nível superior.
Outro fator importante é a impossibilidade de cumprir com o devido isolamento social,
visto que negros e negras ocupam trabalhos subalternos que não podem parar,
necessitam se aglomerar no transporte público para se deslocarem ou estão
desempregados tentando ganhar a vida como autônomos em atividades nas ruas.
Já era de se esperar que uma crise global dessa proporção fosse incidir com
maior brutalidade nas camadas mais vulneráveis, que há muito vivem em situação de
emergência. Vidas negras são as que já se encontram continuamente ameaçadas, e são
essas que o Estado “deixa morrer” para que o projeto capitalista predatório siga seu
curso, mantendo o status quo. São sobre elas que Achille Mbembe se refere.
¹Para saber mais sobre filosofia africana e unidade cultural dos povos tradicionais africanos indico o autor
senegalês Cheik Anta Diop, a autora norte-americana Marimba Ani e os autores brasileiros Renato
Nogueira e Katiúsca Ribeiro.
Tais valores são latentes na nossa cultura, em nosso modo de existir. A África
está em nossa língua, em nossa arte, na dança, na intelectualidade, no futebol, na
música, na capoeira, no candomblé, no samba de roda, no maracatu, na alimentação, nos
hábitos de higiene, nos valores comunitários. Tudo isso, e muito mais, é resistência do
modo de ser e existir africano em território latino-americano. Porém, a perspectiva que
esteve por séculos na educação tradicional, e que ainda se faz presente no imaginário
brasileiro, é de que os africanos era selvagens, com hábitos primitivos, viviam sempre
em tribos que guerreavam entre si, e que graças ao homem branco pôde conhecer Deus,
a civilização e o progresso.
BENÍCIO, Jeff. Bolsonaro culpa Globo por parte das 100 mil mortes por covid.
Terra, 2020. Disponível em:
https://www.terra.com.br/diversao/tv/blog-sala-de-tv/bolsonaro-culpa-globo-por-parte-
das-100-mil-mortes-por-covid,f04cfc32283866b910e665d00750757cwhs77dvv.html.
Acesso em 10 de agosto de 2020.
BORGES, Pedro. Epistemicídio, a morte começa antes do tiro. Alma Preta, 2018.
Disponível em: https://www.almapreta.com/editorias/realidade/epistemicidio-a-morte-
comeca-antes-do-tiro. Acesso em 05 de agosto de 2020.
GRAGNANI, Juliana. Por que o coronavírus mata mais as pessoas negras e pobres
no Brasil e no Mundo. BBC News, 2020. Disponivel em:
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-53338421. Acesso em 04 de agosto de 2020.