Logística
Logística
O INTERIOR
desbravado
Como o Grupo Martins se
tornou o maior atacadista
do país na distribuição de
mercadorias a milhares de
pequenos comerciantes,
enfrentando o caos
logístico e tributário
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MARCELO SAKATE
P
roduzir uma mercadoria, com a
tecnologia e as máquinas mo-
dernas, muitas vezes é uma ope-
ração banal. Complexo mesmo,
sobretudo em um país como o Brasil, é
fazer com que os produtos cheguem
ao consumidor. Os gastos com a logís-
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Logística e Supply Chain (Ilos). Sobres-
sair nessa atividade não é nada ordiná-
rio. Mais notável é ultrapassar os limites
regionais e realizar entregas em todos
os estados. É o que faz uma rede ataca-
dista mineira, o Grupo Martins. Trata-­
se da maior empresa brasileira desse
setor, com faturamento anual próximo
de 5 bilhões de reais.
O Martins, cuja sede fica em Uber-
lândia, atua essencialmente como dis-
tribuidor e revendedor. Os números im-
pressionam. Seus entregadores chegam
a praticamente todos os 5 600 municí-
pios brasileiros, atendendo a mais de 2
milhões de pedidos ao ano. É o maior
revendedor das Havaianas no mundo,
comercializando 110 000 pares diaria-
mente. Para alcançar tantas localida-
des, o grupo leva a cabo uma operação
minuciosamente planejada. Sua espinha
dorsal é manter fiéis os pequenos e mé-
dios varejistas, seus maiores clientes.
São essencialmente donos de mercados
de bairro fora das grandes cidades, em
lojas que têm, em média, até 500 me-
tros quadrados. A cada semana são rea-
lizadas 49 000 entregas, por meio de
uma frota de 1 600 veículos próprios e
história  200 terceirizados, de caminhões de
O fundador, Alair Martins grande porte que cruzam o país a fur-
(no centro), com os gões e motos que são acionadas nos
executivos Walter Faria centros urbanos, onde a circulação é
(no caminhão) e João restrita. A inteligência se faz presente
Ayres Rabello, do na interpretação das informações cole-
Tribanco. Abaixo, uma tadas regularmente em 480 000 pontos
lailson santos
cena dos anos 90 — de venda. As ferramentas de análise de
comum ainda hoje Big Data permitem ao Grupo Martins
ter condições de saber com antecedên-
cia quando e qual será o pedido de um
tica, como é conhecido o processo dono de mercado. “Com essa inteligên-
que inclui a compra de produtos da in- cia, antecipamos encomendas à indús-
dústria, a armazenagem em centros de tria e evitamos ser pegos despreveni-
distribuição e o transporte até o cliente, dos, sem mercadoria no estoque”, diz
consomem 8,7% da receita líquida das Walter Faria, presidente do grupo.
empresas. Nos Estados Unidos, essa fa- O Big Data também possibilita a
tia é de 7,4%. A infraestrutura deficien- cobrança de até 240 preços para um
te, com estradas em mau estado de con- mesmo produto, de acordo com variá-
servação, trânsito crescente nos centros veis como a distância da entrega, a in-
urbanos e necessidade de investimento cidência de tributos ou os valores pra-
elevado em tecnologia para montar ticados pela concorrência na região.
operações eficientes, dificulta o proces- Outro diferencial no objetivo de fideli-
so para as empresas. “É um setor de zar o cliente é a entrega fracionada: o
margens baixas. No transporte de ali- Martins encomenda à indústria uma
mentos, ela não passa de 2%. É difícil caixa com 24 embalagens de sabão em
divulgação
ganhar dinheiro se não houver excelên- pó e aceita mandar só três unidades
cia na execução do serviço”, diz Paulo para uma loja no interior do Tocan-
Fleury, diretor executivo do Instituto de tins, por exemplo, junto com cinco de-
Logística
EFICIÊNCIA  Centro de
distribuição em Uberlândia:
5 600 municípios atendidos e
2 milhões de pedidos ao ano
sodorantes, seis sabonetes e outros
itens. Explica Paulo Fleury, do Ilos: “É
um lojista sem recursos para enco-
mendar caixas inteiras nem a necessi-
dade de adquirir grande quantidade. O
Martins não cobra o preço mais baixo,
mas viabiliza o comércio nas cidades
onde a indústria não chega”.
Um passo para cativar os clientes
foi a decisão de criar um banco (o Tri-
banco) para financiar o varejista e uma
instituição (a Universidade Martins do
Varejo) para dar treinamento aos clien-
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tes em cursos como gestão de negócios
e redução de perdas nas lojas. “Somos o
elo entre a produção e o consumo na
maior parte do país. Temos uma expe-
riência de décadas na entrega de pro-
dutos ao pequeno varejista e construí-
mos uma reputação que nos diferencia”,
diz Alair Martins do Nascimento, o
fundador do grupo, em 1953, à época
um pequeno armazém de secos e mo-
lhados em Uberlândia, no Triângulo
Mineiro. A visão de empreendedor ex-
plicou a migração do varejo para o ata-
cado: no início dos anos 60, ele fez uma
encomenda de pasta de dentes à indús-
tria para vender na sua loja. Com cai-
xas em excesso, decidiu oferecê-las a
outros lojistas com uma margem pe-
quena de lucro, para recuperar o di-
nheiro gasto. Não demorou para enxer-
gar ali uma oportunidade de negócio.
Mais recentemente, em 2009, seu
Alair, como é conhecido, contratou um
executivo de fora da família para profis-
sionalizar a administração (Walter Fa-
ria), mas se mantém envolvido nos ne-
gócios como presidente do conselho de
administração.
Em um país campeão mundial em
complexidade tributária e que convive
com uma guerra fiscal entre os estados,
a capacidade de se antecipar às exigên-
cias da lei se mostra outra qualidade
fundamental: o Martins mantém em
diferentes estados equipes de advoga-
dos que acompanham todas as normas
E NÃO RECLAMAM 
Os pequenos robôs
lailson santos
da Amazon carregam
as prateleiras com
agilidade e presteza
Garantia. Duas décadas mais tarde,
importou 2 000 notebooks, para facili-
tar e organizar a coleta de informações
pela equipe de vendas, quando eles
ainda nem eram vendidos no Brasil.
Tornou-se o maior cliente da IBM no
país e deu um salto de produtividade.
Apesar do enfraquecimento da eco-
nomia e da desaceleração recente das
vendas do comércio, o Martins cresceu
15% em 2013 e deve se expandir 9%
neste ano, já descontada a inflação. Nes-
sa base de comparação, as vendas reais
no varejo nacional subiram 5% no ano
lailson santos
passado e se estabilizaram em 2014. É
um crescimento que poderia ser acele-
rado se as condições permitissem, uma
vez que todo o transporte de carga da
vigentes e estão atentos a todas as mu- empresa se dá por rodovias. Mas 87 em
danças na legislação. Somente em 2013 cada 100 quilômetros de estradas na-
ocorreram 8 100 alterações, uma mé- cionais são de pistas simples. Em um
dia de trinta por dia útil. “É como se trecho de 600 quilômetros, distância
houvesse 27 países dentro do Brasil”, diz equivalente à que separa São Paulo de
Faria. Em última instância, o objetivo é Uberlândia, o tempo de viagem cai uma
evitar que caminhões sejam retidos nos hora quando uma rodovia tem pista du-
postos de fiscalização e, consequente- pla. Além dessa economia imediata e do
mente, que as mercadorias não che- menor consumo de combustível, há ou-
guem ao seu destino dentro do prazo tros ganhos. A diminuição do gasto com
previsto. Outro alicerce histórico do a manutenção do caminhão, como a ne-
grupo é estar atento a inovações tanto cessidade de troca de pneus e de outras
na tecnologia como na gestão. O Gru- peças, é um deles. São uma lembrança
po Martins instituiu a distribuição de de como as empresas brasileiras, e co-
bônus atrelado aos resultados em mea- mo consequência todo o país, poderiam
dos da década de 70, na mesma época avançar em uma velocidade mais acele-
em que o empresário Jorge Paulo Le- rada caso as barreiras ao desenvolvi-
mann adotou tais práticas no Banco mento fossem diminuídas. ƒ
Os elfos-robôs
Personagens mitológicos, os elfos
são conhecidos por auxiliar o Pa-
pai Noel a conferir e empacotar
os presentes antes de serem dis-
tribuídos na noite de Natal. Maior
empresa do mundo do comércio
eletrônico, a Amazon também se
vale da ajuda sobre-humana para
conseguir entregar os pedidos no
fim de ano, ocasião em que rece-
be 426 encomendas por segundo.
Ela pôs para trabalhar 15 000 robôs
em dez de seus depósitos nos
Estados Unidos. Fabricados pela
Kiva, empresa adquirida há dois
anos por 775 milhões de dólares,
eles são acionados por controle
remoto e fazem a tarefa pesada:
reposicionam prateleiras carrega-
das e transportam os produtos
até as esteiras, onde funcionários
(humanos) processam os pedi-
dos, colocando-os em caixas e
despachando-­os para a entrega.
Os elfos robóticos são ágeis, tra-
balham ininterruptamente, am-
pliam a capacidade de atendi-
mento simultâneo de pedidos e
ocupam um espaço menor que o
de um homem entre as pratelei-
ras, o que dispensa a necessida-
de de corredores largos. Um mes-
mo depósito agora pode armaze-
nar 50% a mais de produtos.