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Direito Do Trabalho
Direito Do Trabalho
Vol. 9
Organizadores
Coordenadores
DIREITO DO TRABALHO
2014
2014 Curitiba
Curitiba
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE
D597
Direito do trabalho
Nossos Contatos Coleção Conpedi/Unicuritiba.
Organizadores : Orides Mezzaroba / Raymundo Juliano
São Paulo Rego Feitosa / Vladmir Oliveira da Silveira
Rua José Bonifácio, n. 209, / Viviane Coêlho Séllos-Knoerr.
Coordenadores : Grasiele Augusta Ferreira Nascimento
cj. 603, Centro, São Paulo – SP /Mirta Gladys Lerena Manzo de Misailidi / Eduardo
CEP: 01.003-001 Milléo Baracat.
Título independente - Curitiba - PR . : vol.9 - 1ª ed.
Clássica Editora, 2014.
Acesse: www. editoraclassica.com.br 527p. :
Redes Sociais ISBN 978-85-99651-97-1
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1. Direito coletivo do trabalhador. 2. Integridade
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EDITORA CLÁSSICA
Conselho Editorial
Allessandra Neves Ferreira Luiz Eduardo Gunther
Alexandre Walmott Borges Luisa Moura
Daniel Ferreira Mara Darcanchy
Elizabeth Accioly Massako Shirai
Everton Gonçalves Mateus Eduardo Nunes Bertoncini
Fernando Knoerr Nilson Araújo de Souza
Francisco Cardozo de Oliveira Norma Padilha
Francisval Mendes Paulo Ricardo Opuszka
Ilton Garcia da Costa Roberto Genofre
Ivan Motta Salim Reis
Ivo Dantas Valesca Raizer Borges Moschen
Jonathan Barros Vita Vanessa Caporlingua
José Edmilson Lima Viviane Coelho de Séllos-Knoerr
Juliana Cristina Busnardo de Araujo Vladmir Silveira
Lafayete Pozzoli Wagner Ginotti
Leonardo Rabelo Wagner Menezes
Lívia Gaigher Bósio Campello Willians Franklin Lira dos Santos
Lucimeiry Galvão
Equipe Editorial
MEMBROS DA DIRETORIA
Vladmir Oliveira da Silveira
Presidente
Cesar Augusto de Castro Fiuza
Vice-Presidente
Aires José Rover
Secretário Executivo
Gina Vidal Marcílio Pompeu
Secretário-Adjunto
Conselho Fiscal
Valesca Borges Raizer Moschen
Maria Luiza Pereira de Alencar Mayer Feitosa
João Marcelo Assafim
Antonio Carlos Diniz Murta (suplente)
Felipe Chiarello de Souza Pinto (suplente)
Representante Discente
Ilton Norberto Robl Filho (titular)
Pablo Malheiros da Cunha Frota (suplente)
Colaboradores
Elisangela Pruencio
Graduanda em Administração - Faculdade Decisão
Maria Eduarda Basilio de Araujo Oliveira
Graduada em Administração - UFSC
Rafaela Goulart de Andrade
Graduanda em Ciências da Computação – UFSC
Diagramador
Marcus Souza Rodrigues
Sumário
APRESENTAÇÃO ........................................................................................................................................ 14
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................ 17
CONCLUSÃO .............................................................................................................................................. 32
REFERÊNCIAS ............................................................................................................................................ 33
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................... 36
REFERÊNCIAS ............................................................................................................................................ 56
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................ 58
ESTÉTICA ................................................................................................................................................... 64
REFERÊNCIAS ............................................................................................................................................ 81
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................ 85
A EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS COMO OBJETIVO DO ESTADO DEMOCRÁTICO ....... 125
A CONCRETIZAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS E O NOVO PAPEL DAS ORGANIZAÇÕES ......................... 263
COPA DO MUNDO 2014 E COPA DAS CONFEDERAÇÕES 2013: MEGAEVENTOS ESPORTIVOS ............ 353
O LEGADO SOCIOLABORAL DA COPA DO MUNDO 2014 E DA COPA DAS CONFEDERAÇÕES 2013 ...... 371
INTERPRETAÇÃO DA LEI 12.619 DE 2012 À LUZ DOS PRECEITOS CONSTITUCIONAIS ......................... 436
Caríssimo(a) Associado(a),
O evento propôs uma análise da atual Constituição brasileira e ocorreu num ambiente
de balanço dos programas, dada a iminência da trienal CAPES-MEC. Passados quase 25 anos
da promulgação da Carta Magna de 1988, a chamada Constituição Cidadã necessita uma
reavaliação. Desde seus objetivos e desafios até novos mecanismos e concepções do direito,
nossa Constituição demanda reflexões. Se o acesso à Justiça foi conquistado por parcela
tradicionalmente excluída da cidadania, esses e outros brasileiros exigem hoje o ponto final do
processo. Para tanto, basta observar as recorrentes emendas e consequentes novos
parcelamentos das dívidas dos entes federativos, bem como o julgamento da chamada ADIN
do calote dos precatórios. Cito apenas um dentre inúmeros casos que expõem os limites da
Constituição de 1988. Sem dúvida, muitos debates e mesas realizados no XXII Encontro
Nacional já antecipavam demandas que semanas mais tarde levariam milhões às ruas.
Por outro lado, com o crescimento do número de artigos, surgem novos desafios a
enfrentar, como o de (1) estudar novos modelos de apresentação dos trabalhos e o de (2)
aumentar o número de avaliadores, comprometidos e pontuais. Nesse passo, quero agradecer a
todos os 186 avaliadores que participaram deste processo e que, com competência, permitiram-
nos entregar no prazo a avaliação aos associados. Também gostaria de parabenizar os autores
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COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
selecionados para apresentar seus trabalhos nos 36 GTs, pois a cada evento a escolha tem sido
mais difícil.
Nosso PUBLICA DIREITO é uma ferramenta importante que vem sendo aperfeiçoada
em pleno funcionamento, haja vista os raros momentos de que dispomos, ao longo do ano, para
seu desenvolvimento. Não obstante, já está em fase de testes uma nova versão, melhorada, e
que possibilitará sua utilização por nossos associados institucionais, tanto para revistas quanto
para eventos.
O INDEXA é outra solução que será muito útil no futuro, na medida em que nosso
comitê de área na CAPES/MEC já sinaliza a relevância do impacto nos critérios da trienal de
2016, assim como do Qualis 2013/2015. Sendo assim, seus benefícios para os programas serão
sentidos já nesta avaliação, uma vez que implicará maior pontuação aos programas que
inserirem seus dados.
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Com relação ao IPEA, cumpre ainda ressaltar que participamos, em Brasília, da III
Conferência do Desenvolvimento (CODE), na qual o CONPEDI promoveu uma Mesa sobre o
estado da arte do Direito e Desenvolvimento, além da apresentação de artigos de pesquisadores
do Direito, criteriosamente selecionados. Sendo assim, em São Paulo lançaremos um novo
livro com o resultado deste projeto, além de prosseguir o diálogo com o IPEA para futuras
parcerias e editais para a área do Direito.
Não poderia concluir sem destacar o grande esforço da professora Viviane Coêlho de
Séllos Knoerr e da equipe de organização do programa de Mestrado em Direito do
UNICURITIBA, que por mais de um ano planejaram e executaram um grandioso encontro.
Não foram poucos os desafios enfrentados e vencidos para a realização de um evento que
agregou tantas pessoas em um cenário de tão elevado padrão de qualidade e sofisticada
logística – e isso tudo sempre com enorme simpatia e procurando avançar ainda mais.
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Apresentação
Nesse sentido, considerando que boa parte dos artigos publicados são de mestrandos,
devemos levar em conta o apoio à publicação de tais trabalhos, sob a supervisão de
professores, aponta para uma oportunidade de revelação de talentos de jovens pesquisadores,
com trabalhos inéditos e significativos no contexto da difusão da produção científica.
Somos cientes que o Direito do Trabalho não é uma rama da ciência jurídica imune às
questões ideológicas ou políticas, das quais decorrem fortes emoções, especialmente naqueles
temas que são propícios para o debate, suscitando calorosas discussões, porém em um clima
de cordialidade, transformando esse acontecimento o esperado encontro de amigos e colegas
que, o CONPEDI nos proporciona.
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O importante número e a excelente qualidade dos artigos que integram esta obra,
representam o compromisso que todos têm assumido para dar aos Grupos de Trabalho do
CONPEDI o brilho que seus organizadores merecem.
É uma obra científica e acadêmica, mas também revelando afetos, valores e princípios
humanos.
Nota-se, ainda, significativa atenção dos autores em relação à efetividade dos direitos
fundamentais contra o trabalho degradante, a proteção à intimidade e à privacidade no
ambiente de trabalho, assim como à proteção ao trabalho da mulher, em relação à tutela laboral
no ordenamento jurídico brasileiro e também em relação à maternidade.
No que se refere ao Direito Coletivo do Trabalho, a obra apresenta cinco artigos que
abordam temas sobre os direitos fundamentais, sindicais e coletivos, negociação coletiva,
reflexões sobre a inconstitucionalidade do art. 522 da CLT, e o impacto jurídico das atividades
esportivas de 2013 e 2014 no direito coletivo brasileiro.
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Desta forma, é com grande prazer que apresentamos os artigos do GT: Direito do
Trabalho do XXII do Encontro Nacional do CONPEDI realizado no Centro Universitário
Curitiba (UNICURITIBA), na cidade de Curitiba, nos dias 29 de maio a 01 de junho de 2013.
Com a esperança de que os artigos possam contribuir para a reflexão sobre temas atuais e de
extrema relevância para a o Direito do Trabalho, desejamos a todos uma boa leitura.
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RESUMO
O artigo trata da aplicação da cláusula geral da função social dos contratos nas relações de
trabalho e sua operabilidade no sistema jurídico, a partir da análise da natureza jurídica dos
contratos de trabalho e seus princípios norteadores. Destaca a importância do trabalhador no
contexto da atividade empresária e do mercado, ressaltando a vinculação dos contratos aos
princípios da solidariedade social e da dignidade da pessoa humana. E, ao final, apresenta
estudos de casos que revelam como se dá a funcionalização da cláusula geral da função social,
o que evidencia a importância de sua efetivação, tanto para os trabalhadores, como para toda a
sociedade.
PALAVRAS-CHAVE: Função Social dos Contratos; Relações de Trabalho;
Funcionalização.
ABSTRACT
The article deals about the application of the general clause of the social function of the
contracts in employment relationships and their operability in the legal system, from the
analysis of the legal nature of contracts and its guiding principles. Stresses the importance of
the worker in the context of the activity and the entrepreneur market, highlighting the binding
of contracts to the principles of social solidarity and the dignity of the human person. And,
finally, presents case studies that show how is the functionalization of the general clause of
the social function, which highlights the importance of its implementation, both for workers
and for the whole society.
KEYWORDS: Social Function of Contracts, Labor Relations; Functionalization.
1 INTRODUÇÃO
1
Advogada, Professora Universitária (Fundação Municipal Centro Universitário de União da Vitória – UNIUV),
Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Anhanguera (2010), Mestranda em Direito
Empresarial e Cidadania do Centro Universitário Curitiba – UNICURITIBA.
2
Membro do Grupo de Pesquisa “Direito Empresarial e Cidadania no Século XXI”, liderado pela Profª. Dra.
Viviane Coêlho de Séllos Knoerr, registrado no CNPQ.
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A teoria anticontratualista defende que não existe relação contratual entre empregado
e empregador, já que o trabalhador entraria na empresa e começaria a prestar serviços,
inexistindo a discussão em torno das cláusulas do contrato de trabalho. (MARTINS, 2006)
3
CLT, art. 442: “Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de
emprego.”
4
MARTINS, Sérgio Pinto. op. cit., p. 85.
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o lucro. Tal pensamento não perdurou, eis que evidenciado que empregado e empregador não
buscavam a mesma finalidade. (GONÇALVES, Odonel Urbano, 2003)
Maurício Godinho Delgado, citado por André Luis Paes de Almeida (2008, p. 26),
ensina que princípios são proposições gerais inferidas na cultura e ordenamento jurídicos que
conformam a criação, revelação, interpretação e aplicação do direito.
A seguir serão apresentados os princípios basilares do direito do trabalho.
O Direito do Trabalho é ramo do direito que tem função precípua de tornar iguais os
desiguais. Sabe-se que empregado e empregador possuem desigualdades. Geralmente, essa
deficiência é encontrada na área econômica e muitas vezes também na escolaridade. Diante
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disso, o Direito do Trabalho tem como objetivo equilibrar a situação amparando o lado mais
fraco da relação trabalhista: o empregado, na maioria das vezes, hipossuficiente.
Odonel Urbano Gonçalves, destaca que é preciso implantar políticas de proteção
àqueles mais carentes, com normas que estabeleçam mínimos direitos, fazendo emergir o
sentido do princípio da proteção social (2003, p. 28). Sérgio Pinto Martins, citado por André
Luiz Paes de Almeida (2008, p. 27), manifesta-se no sentido de que se deve proporcionar uma
forma de compensar a superioridade econômica do empregador em relação ao empregado,
dando a este último uma superioridade jurídica.
Do princípio da proteção emergem o princípio in dubio pro operário, o princípio da
norma mais favorável e o princípio da condição mais benéfica.
O princípio in dubio pro operario consiste na prevalência da escolha de interpretação
mais favorável ao obreiro.
Esse princípio da proteção se cristaliza com o princípio da norma mais favorável ao
empregado. Assim, quando temos duas normas aplicáveis ao empregado, optamos por aquela
mais benéfica.
O princípio da condição mais benéfica implica na prevalência de condições mais
vantajosas para o obreiro, fixadas no respectivo contrato de trabalho.
Rodriguez, citado por Eduardo de Olivera Campos (2009, p. 04), define o princípio
como:
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Dessa forma, mesmo que um empregado declare expressamente que não pretende
receber, por exemplo, décimo terceiro salário, tal fato não se consubstanciará. Isso
porque, caso venha a propor uma reclamação trabalhista pleiteando o direito
renunciado, deverá adquiri-lo, pois, como mencionado, a regra, que comporta
exceções, [...], é que a renúncia feita pelo empregado não será aceita pelo julgador.
Devemos entender que esse princípio não se aplica em audiência, quando o
empregado poderá, se assim desejar, renunciar direitos. Vale frisar que não devemos
confundir renúncia com transação. Esta última é ato bilateral, enquanto a primeira é
ato unilateral. Destacamos esse fato para deixar claro que um acordo homologado
em juízo não se trata de parcelas renunciáveis, mas si, em transação, conciliação.
Segundo Amauri Mascaro Nascimento, citado por Gonçalves (2003, 31), o princípio
da continuidade
Princípio muito utilizado na prática trabalhista, segundo o qual os fatos reais são
muito mais importantes do que os documentos.
Arnaldo Sussekind, citado por André Luiz Paes de Almeida (2008, p. 30), ensina que
este princípio consiste na supremacia dos fatos em razão dos quais a relação objetiva
evidenciada pelos fatos define a verdadeira relação jurídica estipulado pelos contratantes,
ainda que sob capa simulada não correspondente à realidade.
Significa que o cotidiano vivido pelo empregado e pelo empregador deve ser
considerado, quando houver discordância entre o aspecto formal e a realidade. Isto é, deve-se
dar precedência àquilo que ocorre no dia-a-dia, relegada a plano secundário a formalidade. É
a primazia dos fatos sobre as formas.
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Fábio Konder Comparato assinala que a dignidade da pessoa humana não consiste
apenas no fato de ser ela, diferentemente das coisas, um ser considerado e tratado
como um fim em si e nunca como um meio para a consecução de determinado
resultado. Ela resulta também do fato de que, pela sua vontade racional, só a pessoa
vive em condições de autonomia, isto é, como ser capaz de guiar-se pelas leis que
ele próprio edita. Daí decorre, como assinalou o filósofo, que todo homem tem
dignidade e não um preço, como as coisas.
José Afonso da Silva citado por Sidney Guerra e Lilian Márcia Balmant Emerique
(2006, p. 385) assevera que a dignidade da pessoa humana encontra-se no epicentro da ordem
jurídica brasileira tendo em vista que concebe a valorização da pessoa humana como sendo
razão fundamental para a estrutura de organização do Estado e para o Direito.
O princípio da dignidade da pessoa humana impõe um dever de abstenção e de
condutas positivas tendentes a efetivar e proteger a pessoa humana.
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Capital e trabalho são a base da economia, sendo que um depende do outro. O capital
propicia o trabalho, já o trabalho é a base da sustentabilidade do capital.
Desta interação nasce a produção que tem como alvo consumidor, o Trabalho.Como
sem consumo a produção perde a sua razão de existir, e o consumidor é o Trabalho,
conclui-se que o Trabalho tem de comprar a produção para que o Capital lhe dê
trabalho, constatação esta que leva ainda concluir que o Trabalho produz para ele
mesmo, ficando o valor acrescentado à produção para o Capital, como mais valia do
seu investimento.Valendo-se da sua influência e chantagem econômica, o Capital é
quem dita as regras da interação.
De acordo com Marx, citado por Cabral (2012, p. 01), capital e trabalho apresentam
um movimento constituído de três momentos fundamentais: Primeiro, “a unidade imediata e
mediata de ambos”; significa que num primeiro momento estão unidos, separam-se depois e
tornam-se estranhos um ao outro, mas sustentando-se reciprocamente e promovendo-se um ao
outro como condições positivas; Em segundo lugar, “a oposição de ambos”, já que se excluem
reciprocamente e o operário conhece o capitalista como a negação da sua existência e vice-
versa; Em terceiro e último lugar, “a oposição de cada um contra si mesmo”, já que o capital é
simultaneamente ele próprio e o seu oposto contraditório, sendo trabalho (acumulado); e o
trabalho, por sua vez, é ele próprio e o seu oposto contraditório, sendo mercadoria, isto é,
capital.
O capital, para aumentar seus lucros, faz o pagamento de salários o mais baixo
possível aos trabalhadores e impõe aos consumidores preços que lhe ofereçam maior lucro, o
que leva ao empobrecimento do trabalho e ao enriquecimento do capital.
A competição de mercado faz com que o capital, em busca do lucro e de espaço no
mercado de consumo, reduza os custos da produção. Porém esta redução acontece da forma
mais cruel possível, pois quem paga a conta é o trabalhador, que acaba tendo violado seus
direitos trabalhistas, com a informalidade na contratação (falta de anotação do contrato de
trabalho na Carteira de Trabalho), a não concessão de adicionais, entre outros direitos
assegurados pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Assim, o capital se desonera dos
encargos trabalhistas em prejuízo do trabalhador.
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recurso à função social e também à boa-fé – que tem uma base marcadamente ética e
outra solidarista – instrumentaliza o Código agora aprovado a diretriz constitucional
da solidariedade social, posta como um dos "objetivos fundamentais da República.
(PAES, 2011, p. 01)
5 o
Constituição Federal. Art. 3. , I.
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"Art. 421: a função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil,
não elimina o princípio da autonomia contratual, mas atenua ou reduz o alcance
desse princípio quando presentes interesses metaindividuais ou interesse individual
relativo à dignidade da pessoa humana".
É certo de que se trata de um contrato sob novas roupagens, distante daquele modelo
clássico (...). Por conseguinte, neste momento histórico, não podemos afirmar que o
contrato esteja em crise, estritamente, nem que a crise seja do direito privado. A
crise situa-se na própria evolução da sociedade, nas transformações sociais que
exigem do jurista respostas mais rápidas. O sectarismo do direito das obrigações
tradicional é colocado em choque. O novo direito privado exige do jurista e do juiz
soluções prontas e adequadas aos novos desafios da sociedade. Daí por que se torna
importante a referência ao interesse social no contrato. E o direito das obrigações, e
em especial o direito dos contratos, que durante séculos se manteve avesso a
modificações de seus princípios está a exigir reflexões que refogem aos dogmas
clássicos. Nesse cenário, o presente Código procura inserir o contrato como mais um
6
Código Civil. Artigo 2.035, parágrafo único: “nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos de
ordem pública, tais como os estabelecidos por este Código para assegurara a função social dos contratos.”
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elemento de eficácia social, trazendo a idéia básica de que o contrato deve ser
cumprido não unicamente em prol do credor, mas como benefício da sociedade. De
fato, qualquer obrigação descumprida representa uma moléstia social e não prejudica
unicamente o credor ou o contratante isolado, mas toda uma comunidade.
O Código Civil enuncia em seu art. 421 que a liberdade de contratar será exercida
em razão e nos limites da função social do contrato. Logo, o contrato é visto pelo prisma da
utilidade social e não mais apenas pelo interesse individual.
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COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
5.2 A FUNCIONALIZAÇÃO
“os atos em geral devem ser interpretados de acordo com os princípios da eticidade,
socialidade e operabilidade. Funda-se o direito, pois, no valor da pessoa humana
como fonte de todos os demais valores, priorizando a eqüidade, a boa-fé, a justa
causa e demais critérios éticos. Deste princípio decorrem, entre outros, os artigos
113 e 422 do Código Civil, pelos quais "Os negócios jurídicos devem ser
interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração" e "Os
contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua
execução, os princípios de probidade e boa-fé". Com essas razões de decidir,
concluiu "que a manutenção do plano de saúde e alimentação do empregado, durante
o período de suspensão do contrato de trabalho, por enfermidade, constitui medida
que se coaduna com o ordenamento jurídico vigente, mesmo porque o obreiro
encontra-se em momento que mais necessita de tais benefícios (01567-2006-011-02-
00-0, 12ª Turma, julg. 10/10/2008, Rel. VANIA PARANHOS).” (PAES, 2006, p.
04)
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6 CONCLUSÃO
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cláusula geral da função social do contrato tenha aplicação e operabilidade, a fim de garantir
uma relação equilibrada para as partes envolvidas e para a coletividade de pessoas que
possam, eventualmente, ser atingidas, de algum modo, por àquela contratação.
Ademais, o papel do trabalhador é fundamental para o desenvolvimento da atividade
empresária e do mercado de consumo, pois sem o trabalhador nada acontece, daí a
necessidade de se respeitar a função social advinda do contrato de trabalho.
Por conseguinte, com fundamento na solidariedade social e na dignidade da pessoa
humana, é imprescindível que o empregador, ao celebrar o contrato de trabalho com o
empregado, observe a função social que reflete da pactuação, para que efetivamente os
direitos sociais do trabalhador sejam garantidos, assim como o bem-estar de toda a sociedade.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, André Luiz Paes de. Direito do Trabalho – Material, Processual e Legislação
Especial. 5.a ed. São Paulo: Rideel, 2008.
FERNANDES, Claudio Roberto. A função social do contrato. In: Âmbito Jurídico, Rio
Grande, XV, n. 99, abr 2012. Disponível em: <http://www.ambito-
juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11407&revista_caderno=7>.
Acesso em jan 2013.
GONÇALVES. Odonel Urbano. Direito do Trabalho para Concursos. 2.a ed. São Paulo:
Atlas, 2003.
33
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 22.a ed. São Paulo:Atlas, 2006.
PAES, Arnaldo Boson. A função social do contrato e sua aplicação nas relações de
trabalho. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2934, 14 jul. 2011 . Disponível
em: <http://jus.com.br/revista/texto/19545>. Acesso em: 16 jan. 2013.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 1999.
34
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
RESUMO: O hodierno estudo tem por finalidade abordar os aspectos relacionados à crise
econômica mundial, mais especificamente, europeia e francesa, com os preceitos de
flexibilização do Direito do Trabalho. Considerando toda a conjuntura de globalização da
economia e das relações laborais, bem como suas transformações. Atendo-se, mais
precisamente, à análise da flexibilização e da flexissegurança no direito laboral francês.
Contrapondo com as situações de sobrevivência econômica das organizações em tempos de
crise financeira com o respeito às garantias mínimas imperativas à dignidade humana dos
trabalhadores.
PALAVRAS-CHAVE: Crise econômica europeia. Transformações na organização do
trabalho. Flexibilização. Flexissegurança. Negociação coletiva. Convenção 154 da OIT.
Direito do Trabalho francês.
ABSTRACT: The today's study aims to address aspects of the global economic crisis, more
specifically, European and French, with the precepts of flexibility of labor law. Considering
all the circumstances of economic globalization and industrial relations as well as their
transformations. Sticking more precisely, the analysis of flexibility and flexicurity in French
labor law. Contrasting with situations of economic survival of organizations in times of
financial crisis with respect to the mandatory minimum guarantees human dignity of workers.
KEY-WORDS: European economic crisis. Changes in work organization. Flexibility.
1
Mestranda em Direito Empresarial e Cidadania pelo Centro Universitário Curitiba – Unicuritiba. Especialista
em Direito e Processo do Trabalho do Centro Universitário Curitiba – Unicuritiba. Graduada em Direito pelo
Centro Universitário Curitiba – Unicuritiba. Graduada em Administração pela Universidade Federal do Paraná -
UFPR. Advogada. Administradora. Curitiba-PR. E-mail: naraferbor@gmail.com.
2
Mestranda em Direito, linha: Estado, Atividade Econômica e Desenvolvimento Sustentável, pela Pontifícia
Universidade Católica do Paraná – PUC/PR. Graduação em Direito pelo Centro Universitário Curitiba –
Unicuritiba. Especialista em Direito Civil pela Escola da Magistratura do Paraná. Advogada concursada da
Caixa Econômica Federal e membro da Comissão de Advogados Empregados na Administração Pública,
Indireta e Regimes Especiais, Gestão 2010/2012.
35
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Flexicurity. Collective bargaining. Convention 154 of the ILO. French labor law.
1. INTRODUÇÃO
O mundo contemporâneo passa por uma crise econômica que acarreta uma transição
gerada pela necessidade de adequação das corporações a métodos eficientes de concorrência
envolta em uma situação de revolução tecnológica geradora de mudanças na organização da
produção e do trabalho.
Nessa conjuntura, brota a discussão acerca da necessidade de flexibilização das
relações laborais para o enfrentamento de dificuldades mercadológicas e econômicas.
Isto porque há uma polêmica entre o Estado Social e o Estado Liberal, pois,
enquanto os liberais pregam a omissão do Estado, permitindo a desregulamentação da
legislação trabalhista para que as condições de trabalho sejam ditadas pelas leis do mercado;
os defensores do Estado Social advogam a intervenção do Estado nas relações laborais para a
efetivação dos princípios da justiça social e da preservação da dignidade humana. Impera o
conflito entre estas diferentes formas de atuação estatal na atividade econômica mundial.
A flexibilização das normas trabalhistas visa assegurar um conjunto de regras
mínimas ao trabalhador e, em contrapartida, garantir a sobrevivência da empresa, por meio da
modificação de comandos legais, de modo a outorgar aos trabalhadores certos direitos
mínimos e ao empregador a possibilidade de adaptação de seu negócio, mormente em épocas
de crise econômica.
Toda esta transformação e preocupação se iniciaram com o advento da Revolução
Industrial, tendo em vista que a sociedade vislumbrou a exploração do trabalho por meio de
baixos salários e excessivas jornadas que desencadearam muitos acidentes, alguns inclusive
fatais.
Como resposta aos problemas sociais ocasionados, o Estado passou a intervir na
regulamentação do trabalho mediante normas dotadas de princípios próprios, não encontrados
na legislação civil, tais como o da proteção ao trabalhador e o da irrenunciabilidade, surgindo,
36
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Toda a crise econômica mundial iniciou-se no ano de 2001 com a chamada "bolha
37
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
3
“A Grande Recessão tem seu histórico em 2001 quando a ‘bolha da internet’ estourou. A bolha da internet foi
um fenômeno em que empresas abriram o mercado na internet e causaram uma supervalorização de suas cotas na
bolsa de valores NASDAQ. Houve, então, um aumento de investimentos em um mercado especulativo, que
ampliou a curva de valorização destas empresas na NASDAQ. Imediatamente, o mesmo índice que subira a
5000 pontos, despencou a 2000, sofrendo uma desvalorização de 150%, em questão de dias”. AFONSO,
Jaqueline Ganzert. BRICS e o rumo de uma liderança inexistente. Conjuntura Global, Curitiba, Vol. 2, n.1,
jan./mar., 2013, p. 19‐23.
4
“A partir de 2001, com taxas de juros baixas, houve a expansão no setor imobiliário nos EUA. O clima de
euforia era contagiante. O FED (o Banco Central americano), em 2003, fixou os juros em 1% ao ano - menor
taxa desde o fim dos anos 50”. FABIANO, Isabela Márcia de Alcântara; RENAULT, Luiz Otávio Linhares.
Crise financeira mundial: tempo de socializar prejuízos e ganhos. Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo
Horizonte, v.48, n.78, p.195-217, jul./dez.2008.
5
KRUGMAN, Paul; WELLS, Robin. Introdução à economia. Trad. de Helga Hoffmann. 2 ed. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2011, p. 711.
6
Ibidem, p. 712.
38
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
endividamento.
Os instrumentos financeiros ficaram tão complexos que as autoridades
governamentais foram incapazes de avaliar os riscos e passaram a utilizar os sistemas de
administração de riscos dos bancos privados.
As empresas de análise de crédito se fundamentavam nas mesmas informações o que
gerou uma enorme crise, pois a análise foi feita erroneamente.
Assim, diante da globalização e do mercado de ações estrangeiros, verifica-se que a
crise econômica europeia é uma consequência da crise americana que se iniciou em 2008 e se
estende até o presente momento gerada pela quebra de instituições financeiras no processo
chamado de "crise dos subprimes".7
Tal crise é também chamada de Grande Recessão, tendo em vista ser um
desdobramento da crise financeira internacional oriunda da falência do banco de investimento
estadunidense Lehman Brothers seguida pela quebra da maior seguradora americana,
American International Group (AIG).
Desta feita, torna-se claro que a presente crise gira em torno do crédito concedido a
quem não deveria e, desde 2008, levou à falência muitas instituições financeiras não só nos
EUA, mas em diversos países da Europa.
A crise é consequência da confiança na capacidade de auto-regulação dos mercados,
de Adam Smith, e na falta de controle das atividades de agentes financeiros.8 Afetou todos os
países europeus gerando impacto social significativo, com a falência de diversas
organizações, aumento do desemprego e da pobreza.
Em síntese, o início da crise ocorreu com os empréstimos de créditos “subprime” de
bancos americanos, tendo em vista que havia tanto excedente de numerário e pretensão de
maximização de lucro que os bancos passaram a adotar uma política arrojada de oferta de
empréstimo pessoal. Seguindo-se a isto, o consumidor estava empolgado em assumir
empréstimos diante da flexibilização das garantias e fianças, incentivada pelo Estado
7
“As bolhas especulativas no mercado imobiliário e nas bolsas de valores, uma regulamentação financeira quase
inexistente e uma pletora de inovações financeiras conspiraram para criar uma grande bolha que, ao estourar,
preparou o cenário para o quase colapso do sistema financeiro em Wall Street, uma diminuição brutal na
atividade econômica e uma recessão mundial. As muitas e estranhas semelhanças entre a crise atual e a
catástrofe da primeira metade do século XX não são coincidência: as mesmas forças que propiciaram a Grande
Depressão estiveram em ação nos anos que levaram à nossa própria ‘Grande Recessão’.” ROUBINI, Nouriel;
MIHM, Stephen. A economia das crises: um curso-relâmpago sobre o futuro do sistema financeiro
internacional. Trad. de Carlos Araújo. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2010, p. 22.
8
PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. A crise financeira global e depois: um novo capitalismo? Disponível em
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-33002010000100003> Acesso em: 19 dez.
2012.
39
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Neoliberal.9
Tal situação acarretou uma crise de confiança, tendo em vista que as empresas
deixaram de expandir; os lucros caíram e as dispensas coletivas de empregados tornaram-se a
alternativa para baixar custos.
Assim, o aumento de desempregados gerou uma diminuição do consumo, o que
refletiu negativamente no PIB (Produto Interno Bruto) e despencou os preços das ações.
As causas da crise foram o endividamento público elevado e a falta de coordenação
política da União Europeia para resolver questões de endividamento das nações do bloco.
Dentre as consequências da crise pode-se apontar o escoamento de capitais de investidores; a
insuficiência de crédito; a elevação da taxa de desemprego; a insurgência popular contra as
medidas de redução de gastos adotadas pelos países na tentativa de combater a crise,
decréscimo de “ratings” e, ainda, reflexos negativos no PIB (Produto Interno Bruto). 10
Frente a tal crise, diversas medidas foram tomadas pela União Europeia, como por
exemplo a implementação de um pacote econômico anticrise; a maior participação do FMI e
do Banco Central Europeu; a ajuda financeira aos países com mais dificuldades econômicas e
a definição de um Pacto Fiscal.
Tendo em vista que o Direito do Trabalho tem sua condição de possibilidade
indexada à economia, verifica-se que as conquistas trabalhistas dependem de ambientes
econômicos com excedentes, ou seja, um ambiente econômico favorecido possui maior
possibilidade de ter mais direitos sociais, mas tal assertiva não é uma regra.
Uma exceção pode ser vislumbrada com o crescimento econômico do primeiro
período da Revolução Industrial trouxe poucos benefícios sociais e muita pobreza, situação
que impôs ao Direito do Trabalho uma posição defensiva com rigidez legal para proteção de
direitos mínimos.
Mas diante da crise, importante se fez a tentativa de adaptação à nova realidade, com
a transformação das regras laborais, de modo que as necessidades de natureza econômica
acabam por explicar a postergação de alguns dos direitos dos trabalhadores.
9
DALLEGRAVE NETO, José Affonso. O Direito do Trabalho em tempos de crise econômica. Disponível
em <http://www.conjur.com.br/2009-jun-03/desafios-direito-trabalho-tempos-crise-economica> Acesso em: 19
dez. 2012.
10
ALEGRÍA, Felipe. A Europa e a crise econômica mundial. Trad. de Cecília Toledo. Marxismo Vivo - Nº
20 – 2009, p. 52-66.
40
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
11
BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 6ª ed., 2010, p. 87.
12
CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. Niterói: Impetus, 5. ed., 2011, p. 33.
41
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Assim, referido modelo que progride na Europa desde 1990, almeja a conciliação de
interesses antagônicos entre Estado, trabalhadores e empresários,
[...] já que estes clamam pela necessidade de redução dos custos da mão de obra e
reclamam do excesso de proteção legal ou coletiva (instrumentos coletivos) aos
trabalhadores, que prejudicou o crescimento econômico de alguns países, garantindo
ao trabalhador, em troca, acolhimento social público, tanto no que diz respeito à
percepção de um seguro-desemprego por longo tempo, como o preparo e
profissionalização para nova colocação no mercado.13
13
Ibidem, p. 33.
14
Ibidem, p. 33.
15
SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. “A supersubordinação - invertendo a lógica do jogo”. Revista do Tribunal
Regional do Trabalho da 3ª Região, Belo Horizonte, v.48, n.78, p.157-193, jul./dez.2008, p. 161.
16
VILLATORE, Marco Antônio César. Flexibilização do Direito do Trabalho - Novidades na União Europeia.
Disponível em <http://www.trt9.jus.br/apej/artigos_doutrina_macv_05.asp> Acesso em: 19 dez. 2012.
42
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
O alto custo que hoje representa um empregado a qualquer empregador acaba por
resultar em aspectos efetivamente negativos ao trabalhador, tais como:
a) alto índice de desemprego, pois as empresas diligentes acabam preferindo manter
reduzido o seu quadro de empregados e buscar outros meios de aumento da
produtividade – automação, por exemplo;
b) baixos salários, pois os empregadores, dentro de seu orçamento, acabam
reservando valores para eventual necessidade de novas contratações e, considerada a
questão do direito à equiparação salarial, não pagam o que poderiam pagar aos seus
empregados, pois sabem que, quando da necessidade de novas contratações, terão
que arcar com o mesmo custo no que tange aos novos empregados.18
17
MAGALHÃES, Maria Lúcia Cardoso de. Um novo olhar sobre o TTP - trabalho a tempo parcial Disponível
em <http://www.trt3.jus.br/escola/download/revista/rev_76/Maria_Magalhaes.pdf> Acesso em: 19 dez. 2012.
18
MAISTRO JUNIOR, Gilberto Carlos; CASTRO, José Antonio Fernandes. ”A flexibilização dos direitos
trabalhistas como forma de combate ao desemprego”. Revista BONIJURIS, ano XV, nº 474, Maio/2003, p.
10.
19
CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. Niterói: Impetus, 5. ed., 2011, p. 35/36.
43
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
empregados.
Nesse arriscado contexto e pairando a incerteza de retorno ao mercado, o
trabalhador, representado pelo sindicato, conscientemente optaria por sacrificar alguns
direitos com a finalidade de se manter empregado.
A negociação coletiva possibilita as empresas e aos empregados um modo
alternativo de fixação das condições de trabalho, porém, para complementar o ordenamento
jurídico e para adaptar as normas às especificidades da região e do setor econômico
envolvidos, pois necessária a intervenção do Estado, mesmo que seja para instituir direitos
mínimos e normas gerais sem as quais não há trabalho digno.
Desta forma, importante destacar que para evitar afronta ao princípio da dignidade
humana, devem ser estabelecidos limites à flexibilização.
Se a flexibilização for admitida como recurso imprescindível para a continuidade da
empresa, há que se verificar se a crise econômica de fato está causando efetivo prejuízo ao
empreendimento, ao ponto de impossibilitar sua continuidade ou de desencadear sucessivas
dispensas, ou se o caso se trata apenas de aumento da margem do lucro já existente.
20
Ibidem, p. 34.
21
ERCOLE FILHO, Roggi Attilio. A tutela constitucional dos direitos dos trabalhadores como instrumento do
bem-estar. In HASSON, Roland. Direitos dos trabalhadores & direitos fundamentais, Curitiba: Juruá, 2009,
p. 165.
44
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
22
GODINHO, Mauricio Delgado. Curso de direito do trabalho. 7. ed. São Paulo: LTr, 2008, p. 122/123.
45
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
46
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23
GUNTHER, Luiz Eduardo. A OIT e o direito do trabalho no Brasil. Curitiba: Juruá, 2011, p. 13.
24
Ibidem, p. 26.
47
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Membro, pois inclusive expõe que a adoção de medidas de incentivo à negociação coletiva
devem ser adequadas às condições nacionais.
Ademais, em razão da diversidade de Estados Membros componentes da OIT, sua
linguagem costuma ser diplomática e plástica.25 Sob este aspecto, não é possível afirmar
categoricamente que a mencionada Convenção, para o cumprimento das suas disposições,
pugna pela diminuição das garantias aos trabalhadores.
Defensores da corrente do neoliberalismo sustentam que o ordenamento jurídico
trabalhista dificulta a gestão empresarial e pode obstar o crescimento econômico.
25
Ibidem, p. 13.
26
SILVA, Elisa Maria Nunes da. Flexibilização das normas trabalhistas em meio de crise econômica
mundial. Disponível em <http://www.ambito-
juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=8458> Acesso em: 20 dez. 2012.
48
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
49
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
31
LAULOM, Sylvaine. II diritto del lavoro francese di fronte alla crisi. In: LOY, Gianni (Org.). Diritto del
lavoro e crisi economica - misure contro l’emergenza ed evoluzione legislativa in Italia, Spagna e Francia.
Roma: EDIESSE, 2011, p. 141.
32
“Assim, segundo o documento de orientação, o mercado de trabalho francês seria caracterizado por uma
mobilidade crescente de trabalhadores, que alternam períodos de atividade e inatividade, mobilidade esta que
vem acompanhada de uma dificuldade de inserção de certas categorias (jovens, desempregados há muito tempo),
enquanto alguns setores da economia encontram dificuldade de recrutamento. ‘Esta profunda transformação do
mercado de trabalho não se traduz, todavia em uma grande modernização das nossas disposições tanto
legislativas quanto contratuais’. O remédio proposto é ‘a profunda modernização do nosso mercado de trabalho
para garantir um novo equilíbrio suscetível de conciliar ao mesmo tempo o desenvolvimento da empresa, a
mobilidade do trabalho, inerente às mudanças econômicas, e a segurança dos trabalhadores”. Ibidem, p. 144.
50
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
33
“A lei de 25 de junho de 2008 sobre a modernização do mercado de trabalho, retoma os conteúdos de um
Acordo Nacional Intercategorias (L’ANI) assinado pelas principais organizações sindicais, com exceção da
CGT, em 11 de janeiro de 2008. O Acordo ANI de janeiro de 2008 é fruto de um novo método legislativo
previsto na lei de 31 de janeiro de 2007 sobre a modernização do diálogo social”. Ibidem, p. 142.
34
“A modernização consiste, neste caso, no envolvimento explícito das partes sociais no processo legislativo. De
modo muito simbólico é através deste novo procedimento que se abre hoje o próprio Code du Travail. Segundo
seu artigo, o governo deve convidar as partes sociais para negociar cada projeto de reforma proposto que foque
em relações individuais e coletivas de trabalho, a ocupação e a formação profissional. Para fins de negociação o
governo deve apresentar às partes sociais um documento de orientação que apresente os elementos de
diagnóstico, os objetivos a serem atingidos e as principais opções. A formalização do papel das partes sociais,
que as definem, segundo a linguagem do projeto de lei, ‘no coração da elaboração das reformas que se referem
ao direito do trabalho’, não está evidentemente separado o papel reconhecido das partes sociais do direito
comunitário”. Ibidem, p. 143.
51
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
concertazione.35
Consoante Sylvaine Laulom, são adotadas ainda outras medidas, como a edição da
Lei de 20 de agosto de 2008, que alarga o âmbito da negociação coletiva. Na França apenas os
sindicatos representativos eram investidos do poder de negociar e celebrar instrumentos
coletivos e, com o advento da citada Lei, são redefinidos os atores sociais com direito a
negociar.
35
“O governo conserva, todavia, uma importante margem de manobra. De um lado pode sempre alegar urgência
para poder adorar medidas legislativas ou regulamentais sem ter de passar por esse percurso de concentração e,
de outro lado, o Parlamento permanece evidentemente livre para adotar as leis sem estar vinculado a esse
procedimento. Atualmente está em discussão no Parlamento um projeto de lei que estende este procedimento de
conciliação aos textos de origem parlamentar”. Ibidem, p. 143.
36
“A lei, que mais uma vez apresenta-se como portadora de uma ‘modernização’, neste caso das relações
industriais, intervém em um momento onde existe um relativo consenso sobre a necessidade de reformar as
condições da representatividade, que na França permite o acesso à contratação coletiva. Na França, além de
algumas exceções, somente os sindicatos representativos têm o poder de negociar e concluir contratos e acordos
coletivos. (...) A posição comum define o objetivo destas novas regras: trata-se de reforçar a legitimidade dos
acordos fechados pelas organizações sindicais dos trabalhadores no quadro da ampliação do papel atribuído à
contratação coletiva. É, portanto realmente a relação contratação coletiva/lei que está em jogo na redefinição dos
atores legitimados a negociar. (...) O objetivo declarado é o de assegurar uma maior legitimidade aos acordos
sindicais conclusivos. Com o tempo a lei poderia influenciar o cenário sindical francês, cujo objetivo seria
aproximar-se de algumas organizações sindicais. A lei contribui, além disso, para uma aproximação com as
diversas estruturas de representação dos trabalhadores na empresa: os representantes eleitos e os representantes
sindicais. Ao longo do tempo haverá inclusive a mesma distinção entre representante eleito e sindical que poderá
ser afetado”. Ibidem, p. 151-153.
52
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
coletiva que facilita as relações de trabalho, como remuneração, normas públicas e acordos
coletivos”.37
Assim, observa-se que a crise econômica desencadeou a reforma trabalhista na
França, destacando a relevância da negociação coletiva para a solução de conflitos, a fim de
possibilitar a manutenção de postos de trabalho em meio à crise.
Nesses casos o trabalhador, de modo consciente e representado pelo sindicato,
optaria por sacrificar alguns direitos trabalhistas com a finalidade de se manter empregado,
em prol da harmonização de interesses tendo em vista a difícil situação enfrentada pela
empresa, concernente a ameaça à continuidade do negócio e consequente eliminação de
postos de trabalho.
Isto porque, a flexibilização, por meio da negociação coletiva, dever ser um
mecanismo aplicado somente a situações em que houver convergência, no caso concreto,
entre os reais interesses de empregadores e empregados, para afastar a drástica perda da renda
e repentina diminuição do padrão de vida de empregados.
Frente as dificuldades econômicas, necessário se fez repensar os métodos de
produção e de organização laboral. As alterações legislativas partiram do pressuposto de que
na França a legislação trabalhista não estava adequada para a realidade econômica e social
envolta pela crise, de modo que se considerou o Direito do Trabalho economicamente
ineficiente e coadjuvante do baixo crescimento econômico, fazendo com que as autoridades
públicas passassem a utilizá-lo como instrumento para limitar os resultados da crise.
Segundo Sylvaine Laulom, as medidas em resposta à explicitada crise no mercado
de trabalho foram várias e objetivaram permitir o crescimento econômico da França baseado
na flexissegurança e no diálogo social, ou seja, a flexibilidade em relação às empresas e a
segurança e estabilidade dos trabalhadores, bem como o envolvimento de todas as entidades
sociais no processo de legislação da França para o enfrentamento da crise. Desse modo, na
França o Direito do Trabalho passa a ser visto como uma ferramenta para combater a crise.
Conforme exposto, surgiram duas leis, a de 25 de junho de 2008 que versava sobre a
atualização do mercado de trabalho e a 20 de agosto do mesmo ano e que possuía duas partes,
a primeira relacionada ao tempo de trabalho e a segunda referente à renovação da democracia
social.
As mudanças foram diversas e baseadas na criação de um novo modo de cessação do
37
In MARTINS, Geiza. Flexibilidade e estabilidades são incompatíveis. Disponível em
<http://www.conjur.com.br/2010-mar-13/flexibilidade-empresa-seguranca-funcionario-sao-incompativeis>
Acesso em: 23 ago. 2012.
53
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38
INSEE - Instituto Nacional de Estatística francês, FMI, OFCE e Ministério do Trabalho Francês - Publicado
em 7/02/12 - jornal “Le Monde” – PARIS.
54
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6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
55
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
7. REFERÊNCIAS
BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 6. ed., 2010.
ERCOLE FILHO, Roggi Attilio. A tutela constitucional dos direitos dos trabalhadores como
instrumento do bem-estar. In HASSON, Roland. Direitos dos trabalhadores & direitos
fundamentais, Curitiba: Juruá, 2009.
FABIANO, Isabela Márcia de Alcântara; RENAULT, Luiz Otávio Linhares. Crise financeira
mundial: tempo de socializar prejuízos e ganhos. Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo
Horizonte, v.48, n.78, p.195-217, jul./dez.2008.
GODINHO, Mauício Delgado. Curso de direito do traballho. 7. ed. São Paulo: LTr, 2008.
56
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
GUNTHER, Luiz Eduardo. A OIT e o direito do trabalho no Brasil. Curitiba: Juruá, 2011.
LAULOM, Sylvaine. II diritto del lavoro francese di fronte alla crisi. In: LOY, Gianni (Org.).
Diritto del lavoro e crisi economica - misure contro l’emergenza ed evoluzione legislativa in
Italia, Spagna e Francia. Roma: EDIESSE, 2011.
MAGALHÃES, Maria Lúcia Cardoso de. Um novo olhar sobre o TTP - trabalho a tempo
parcial Disponível em
<http://www.trt3.jus.br/escola/download/revista/rev_76/Maria_Magalhaes.pdf> Acesso em:
19 dez. 2012.
PEREIRA, Luiz Carlos Bresser. A crise financeira global e depois: um novo capitalismo?
Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-
3002010000100003> Acesso em: 19 dez. 2012.
SILVA, Elisa Maria Nunes da. Flexibilização das normas trabalhistas em meio de crise
econômica mundial. Disponível em <http://www.ambito-
juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=8458> Acesso em:
20 dez. 2012.
SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. A supersubordinação - invertendo a lógica do jogo. Rev. Trib.
Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 48, n. 78, p. 157-193, jul./dez. 2008.
57
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Resumo
O presente estudo objetiva analisar os limites do poder de direção do empregador e a
discriminação estética na relação de emprego. Embora a Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT) estabeleça o “poder de direção” do empregador na relação laboral, os
direitos e garantias individuais previstos na Constituição Federal deverão ser
preservados, os quais encobrem os direitos de personalidade do trabalhador; cujos
direitos constituem extensão da dignidade da pessoa humana, princípio-regra que deve
nortear as relações trabalhistas. Nesse sentido, a discriminação estética viola as normas
internacionais de proteção ao trabalho, bem como a ordem jurídica constitucional e as
normas infraconstitucionais que tutelam os direitos da personalidade, engendrando,
como consequência jurídica, a reparação do dano moral decorrente da conduta
discriminatória.
Abstract:
The present study aims to analyze the limits of power of the employer’s direction and
aesthetic discrimination in the employment relationship. Although the Consolidation of
Labor Laws (CLT) provides the “power steering” of the employer in the employment
relationship, the individual rights and guarantees provided in the Constitution should be
preserved, which conceal the personality rights of the worker; whose rights are
extension of human dignity, rule-principle that should guide labor relations. In this
sense, aesthetic discrimination violates international standards of labor protection, as
well as the legal and constitutional norms that protect infra personality rights,
engendering, as a legal consequence, compensation for moral damage resulting from
discriminatory conduct.
Introdução
58
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
1 Princípios Constitucionais
1.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana
59
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
atribuídos à condição humana, como valor e atributo inerente à pessoa não se confunde
com direito, na verdade, como valor absoluto, transcende a escala de Direitos do
Homem.
A dignidade da pessoa humana representa o início e o fim de todo ordenamento
jurídico, é o “alfa e omega” das liberdades constitucionais e dos direitos fundamentais
(SARLET, 2003, p. 77), é o valor fundamental que norteou a positivação dos direitos do
homem, enfim, é fruto do direito natural, aquele que antecede aos direitos ditados e
escritos pelos homens.
Nesse sentido, pode-se afirmar que a dignidade humana como atributo natural e
individual não é valorável ou substituível, seu valor é intrínseco e absoluto, tem sua
base no direito natural, portanto, eleva a pessoa como valor fonte, razão pela qual possui
direitos inerentes à condição humana, tais como a vida, a liberdade, a igualdade, direitos
esses inseparáveis da condição humana.
Ao tratar da evolução histórica da conquista dos direitos humanos,
Fábio Konder Comparato entendeu que:
[...]o ser humano passa a ser considerado, em sua igualdade essencial,
como ser dotado de liberdade e razão, não obstante as múltiplas
diferenças de sexo, raça, religião ou costumes sociais. Lançavam-se,
assim, os fundamentos intelectuais para a compreensão da pessoa
humana e para a afirmação da existência de direitos universais, porque
a ela inerentes. (COMPARATO, 2003, p.11).
60
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
61
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
A CF/88, art. 5º., caput, ao prescrever que “todos são iguais perante a lei”,
consagrou a igualdade formal, meio de limitação do poder do Estado Liberal, todavia, a
evolução histórica da humanidade e as necessidades emergentes do convívio social
demonstraram que o valor da igualdade deve ser repensado, a fim de que as
especificidades e diferenças dos sujeitos titulares de direitos sejam observadas e
respeitadas, pois há necessidade de “transitar-se da igualdade formal para a igualdade
material ou substantiva.” (PIOVESAN, 2010, p. 241).
Segundo Flávia Piovesan, igualdade material se desdobra e no primeiro plano
“corresponde ao ideal de justiça social e distributiva (igualdade orientada pelo critério
sócio-econômico)”, no segundo plano “corresponde ao ideal de justiça enquanto
reconhecimento de identidades (igualdade orientada pelos critérios de gênero,
orientação sexual, idade, raça, etnia e demais critérios).” (PIOVESAN, 2010, p. 49 ).
A igualdade é posta como princípio, todavia, tanto o ordenamento
jurídico interno como internacional elevou o princípio da igualdade à categoria de
direito fundamental positivado e, uma vez violado, viola, por extensão, a dignidade da
62
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
pessoa humana. Portanto, correto referir-se a direito à igualdade, cujo direito ao lado da
liberdade, intimidade, privacidade etc constitui direito atrelado à personalidade de cada
indivíduo, ou seja, integra e essência existencial de cada pessoa.
Efetivar o direito à igualdade implica aceitar e respeitar as diferenças,
pois os seres humanos são diferentes entre si, ninguém é igual a ninguém, homens
diferem entre si e de mulheres, crianças de adultos, negros de brancos etc. Ser diferente
não implica desigualdade de tratamento.
Nesse sentido, somente se promove a igualdade material a partir do
momento em que as diferenças são respeitadas, ou seja, a partir do momento que se
reconhece o direito de ser diferente. Logo, pode-se afirmar que a igualdade deve
reconhecer a diferença e a diferença não deve produzir desigualdades. “O
reconhecimento de identidades e o direito à diferença é que conduzirão a uma
plataforma emancipatória igualitária.” (SARMENTO; IKAWA; PIOVESAN, 2010, p. 50).
A igualdade e o reconhecimento da diferença impõem como dever de
abstenção a não-discriminação. A não-discriminação é um desdobramento do princípio
da igualdade, sendo certo que somente através da igualdade e da não-discriminação é
que se possibilitará transmudar da igualdade formal, abstrata e geral para a igualdade
material e substancial, permitindo a plena afirmação da dignidade da pessoa humana e
o pleno exercício dos direitos e potencialidades humanas.
Na visão Aristotélica, a igualdade de tratamento significa tratar os iguais de
forma igual e os desiguais de forma desigual. Portanto, o conceito de igualdade implica,
necessariamente, o reconhecimento das diferenças.
Na verdade, o que é vedado pela ordem jurídica é o tratamento desigual a
situações iguais, logo, o princípio constitucional da igualdade não exige que haja uma
equivalência real entre indivíduos, mas que seja atribuída igualdade de tratamento para
situação de fato semelhante.
Nesse sentido, para efetivação do princípio da igualdade, a ordem jurídica
veda discriminações ou desigualdades injustificadas, vedando, dessa forma, a chamada
discriminação negativa. Imperioso destacar a ordem jurídica constitucional inserida no
art. 3º.: “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: ... IV –
promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e
quaisquer outras formas de discriminação.” (Constituição Federal).
Os princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade e não-
discriminação são absolutos, sobrepõem-se aos interesses do próprio Estado impondo-
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2 Estética
2.1 Conceito
O conceito de estética está diretamente relacionado com o conceito de beleza.
Entende-se por estética “a ciência que tem por objeto o juízo de apreciação,
determinante do belo nas produções artísticas. Trata-se da ciência do belo ou da
filosofia da arte”. (DINIZ, 2010)
Desta forma, os padrões são definidos com base no que é considerado “belo” ou
“feio”, conceitos absolutamente subjetivos e que variam em virtude da cultura e do
período histórico.
Em relação à beleza feminina, por exemplo, “nos séculos XV a XVII, o padrão
era ventres grandes; no século XIX, o padrão para uma mulher bonita e saudável era
possuir formas arredondadas (ombros e rostos), não podendo ser magra, conforme bem
demonstrou Renoir; no século XX, coxas e quadris ondulantes” (MARQUES, 2002).
Os adornos utilizados pelas mulheres também contribuem para o conceito do que
é belo em algumas culturas. É o caso, por exemplo, do uso de argolas no pescoço
utilizadas como adorno pelas meninas de uma tribo da Birmânia (atual Mianmá). A
cada ano de vida, as meninas, a partir dos 09 (nove) anos de idade, colocam uma argola
no pescoço. Os pescoços alongados refletem a beleza da mulher daquela região.
(MARQUES, 2002).
Os homens, por sua vez, também apresentaram características diversas ao longo
da história em relação à beleza. Corpos musculosos, uso de bigodes, barbas, ternos
bem cortados e chapéus são exemplos de exigências em relação à beleza masculina.
Os conceitos de “belo” e “feio”, portanto, devem ser analisados com base no
período histórico e na cultura de cada sociedade.
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b) Tatuagem e piercing
A tatuagem ou dermopigmentação é um desenho realizado na pele . Pode ser
conceituada como a
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c) Cicatrizes
As cicatrizes são as marcas deixadas no corpo de uma pessoa, como
consequência de acidentes, cirurgias ou queimaduras.
Caso a cicatriz esteja em um lugar aparente, como o rosto, por exemplo, muitas
vezes poderá causar uma aparência antiestética, capaz de gerar incômodo entre as
pessoas.
d) Cabelo e barba
O corte de cabelo, o uso de cabelos soltos, a barba, o bigode, o cavanhaque, a
costeleta, cabelos longos ou curtos, lisos ou afro, são outros fatores estéticos que podem
gerar discriminação.
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3 Discriminação no trabalho
No âmbito das relações trabalhistas, ficará caracterizada a prática
discriminatória atentatória à dignidade e personalidade do trabalhador nas hipóteses em
que o empregador tratar de forma diferenciada seus empregados, sem razão justificada e
razoável, impedindo o desenvolvimento das atividades trabalhistas em ambiente sadio e
equilibrado, imune de atentado à dignidade e personalidade do trabalhador ou
estabelecendo desigualdades em matéria de manutenção de emprego ou de acesso ao
emprego.
O contrato de trabalho, tendo-se em conta o aspecto da pessoalidade, envolve
como obrigação pessoal o dever de respeito e consideração à pessoa do empregado, ou
seja, o empregado, à medida que entrega sua força de trabalho, tem direito a um meio
ambiente do trabalho sadio e equilibrado imune a agressões físicas e psíquicas e, dentre
as agressões psíquicas, pode-se destacar a discriminação.
Conforme relatado em linhas anteriores, a discriminação no trabalho, qualquer
que seja sua forma ou tipologia, viola a dignidade da pessoa humana e lesa os direitos e
garantias individuais do cidadão trabalhador, contrariando as normas internacionais e
nacionais de proteção à pessoa e de acesso ao trabalho e em condições dignas.
Referindo-se à discriminação nas relações de trabalho, merece destaque a
Convenção da OIT de n. 111(aprovada pelo Decreto Legislativo n. 104 de 24/11/64 e
promulgada pelo Decreto n. 2.682 de 22-7-98) que em seu artigo 1º. considera
discriminação: “toda distinção, exclusão ou preferência baseada em motivos de raça,
cor, sexo, religião, opinião política, ascendência nacional ou origem social, que tenha
como efeito anular a igualdade de oportunidades ou de tratamento em emprego ou
profissão.”
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violação à sua dignidade e aos seus direitos da personalidade (CC, arts. 10 e 11 c.c. art.
186 e 927).
A rescisão contratual baseada na discriminação estética é uma despedida
abusiva, nesse sentido, o empregador estará exorbitando o seu poder potestativo de
rescindir o contrato de trabalho, causando ao trabalhador discriminado dano trabalhista
em razão da privação do emprego e, concomitantemente, dano à sua personalidade.
Nem sempre a solução mais justa é a reparação trabalhista e civil, como meio
de compensação pecuniária pela dor psíquica e sofrimento moral padecidos pela vítima
da discriminação estética.
Dessa forma, a despedida por discriminação estética configura abuso de direito,
devendo o ato demissionário ser acoimado pela nulidade e uma vez declarado nulo
deverá possibilitar a reintegração do trabalhador discriminado, caso tenha invocado essa
obrigação de fazer. (art. 9º. CLT), sem prejuízo à reparação civil por dano moral, em
razão do atentado aos seus direitos da personalidade.
Caso opte o obreiro pela manutenção do vínculo laboral, poderá “...ingressar
com ação judicial para a empresa cessar o comportamento ilegal..”(NASIMENTO,
2011, p. 734), pleiteando a cominação de pena de multa (obrigação de não-fazer).
A Lei n. 9.029/95 veda a adoção de qualquer prática discriminatória e
limitativa para efeito de acesso à relação de emprego, ou para a sua manutenção, por
motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade; sendo certo
que não há tutela legislativa específica para o caso de discriminação estética, apenas
genérica.
Entretanto, a Lei n. 9.029/95 comporta uma interpretação extensiva, social e
sistemática, haja vista que a sua finalidade é proibir prática discriminatória no que tange
ao acesso ao emprego ou manutenção do emprego, logo, as hipóteses ali elencada não
são numerus clausus, comporta extensão para abranger toda e qualquer forma de
discriminação, inclusive, a estética, haja vista que a rescisão contratual não pode atingir
a dignidade do trabalhador.
Diante de uma dispensa abusiva fundada na discriminação estética, por
analogia, o ofendido poderá invocar a Lei 9.020/95 e reclamar, conforme disposto no
art. 4º. referida Lei, a reintegração com o ressarcimento integral de todo período de
afastamento, ou seja, salários e outros direitos adquiridos quando em curso o contrato
laboral ou optar pelo recebimento em dobro da remuneração do período de afastamento,
devidamente corrigida.
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Oportuno ponderar que o dever de boa-fé contratual (art. 422, CC) implica não apenas
a observância às cláusulas contratuais estabelecidas pelas parte ou cumprimento das obrigações
previstas em lei e instrumento normativo da categoria econômico-profissional, traz como dever
correlato o respeito e consideração à pessoa do empregado.
Por outro lado, é certo afirmar que esse dever de boa-fé que traz ínsito o dever de
respeito e consideração à pessoa do empregado é extensivo ao período pós-contratual, pois
ainda que não haja uma vinculação entre as partes através de uma relação contratual e
obrigacional, impera o dever jurídico de manutenção da paz e equilíbrio nas relações sociais, e
isso só se atinge através do respeito, preservação e promoção da dignidade da pessoa humana e
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dos seus direitos e garantias fundamentais, dentre os quais o direito e garantia de não ser
discriminado em qualquer fase ou momento da vida pessoal e profissional.
6. Competência material
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dano moral decorrente das tratativas e aquele decorrente da extinta relação laboral são
da competência da Justiça do Trabalho.
O que importa é o liame obrigacional estabelecido entre as partes e decorrentes
de uma relação jurídica contratual em curso, na tratativa ou já extinta, cujo liame
obrigação está relacionado, em primeiro plano, ao dever jurídico e legal de respeito e
consideração à pessoa do trabalhador, logo, esse argumento também reforça a assertiva
de que a competência é da Justiça do Trabalho, não importando em qual fase ocorreu o
dano moral.
Ademais, a Lei n. 9.029/95 foi editada no sentido de evitar práticas
discriminatórias não apenas na vigência da relação de trabalho, como também na fase
pré-contratual e na fase pós-contratual, pois o espírito da lei é evitar práticas que
impeçam a manutenção do emprego, o acesso ao emprego ou acesso a outra
oportunidade de emprego.
Conclusão
A discriminação nas relações trabalhistas, qualquer que seja a sua forma,
constitui-se como atentado à ordem jurídica constitucional, posto que viola a dignidade
da pessoa humana, os direitos e garantias fundamentais do cidadão, além de retirar o
valor social do trabalho e a boa-fé contratual, colocando em risco a manutenção ou
acesso ao emprego, além de gerar mazelas psíquicas irreparáveis.
A discriminação estética, como espécie do gênero discriminação nas relações
trabalhistas, é uma das espécies mais freqüentes de discriminação, cujo tipo de
discriminação pode ocorrer num ato único, ou seja, no momento prévio à contratação
(fase pré-contratual), durante a execução do contrato, hipótese na qual a discriminação
poderá ocorrer através de atitudes discriminatórias reiteradas e sistemáticas, que
conduzirão ao assédio moral discriminatório, assim como, a discriminação poderá
ocorrer após a extinção da relação laboral, no intuito de desmotivar a contratação de
determinado empregado ou empregada.
Sem dúvidas, a discriminação estética caracteriza infração ao dever jurídico
preexistente de respeito e consideração ao próximo, invadindo a seara do ato ilícito e,
como tal, afeta o patrimônio moral da pessoa, culminando com o dever de reparação
pelo dano moral perpetrado, cuja indenização é de natureza civil e visa compensar a dor
e sofrimento padecidos pela vítima da discriminação estética.
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Referências
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Tribunais, 1998.
CALIL, Léa Elisa Silingowschi. Direito do Trabalho da mulher: a questão da
igualdade jurídica ante a desigualdade fática. São Paulo: LTr, 2007.
COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos Direitos Humanos. 3. ed.
rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2003.
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RESUMO: O presente estudo busca analisar a relação existente entre assédio moral e
alteração do posto de trabalho, de modo a rechaçar a tese corrente em doutrina e
jurisprudência pela obrigatoriedade da prática de atos reiterados para configuração da conduta
discriminatória em relação ao trabalhador. Neste contexto, bastaria a realização de um único
ato, qual exponha o trabalhador à humilhação, de modo a forçá-lo a deixar o emprego. De se
ver, interessa mais a intensidade do sofrimento causado, porquanto infringe maiores danos ao
trabalhador, atingindo a sua esfera de dignidade e resultando na fixação de indenização em
patamar superior a mera agressão moral. Com isto, sustenta-se que vincular o assédio à
necessidade de repetição configura abordagem em favor do assediador, ao que se questiona
ainda o compromisso social da vítima e dos demais partícipes em um processo velado de
perpetuação do dano em denunciar a conduta ofensiva em prol de um meio ambiente de
trabalho sadio.
ABSTRACT: This study seeks to analyze the relationship between workplace bullying and
change the functions in job, so to reject the thesis in current doctrine and jurisprudence by
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mandating the practice setting for repeated acts of discriminatory conduct in relation to the
employee. In this context, it would be sufficient to carry out a single act, which expose the
worker to humiliation in order to force him to leave his job. To see, more interested in the
intensity of the suffering caused, because it infringes further damage to worker, reaching its
sphere of dignity, and resulting in fixing damages in excess of mere moral aggression. With
this, it is argued that the need to link the harassment repeat sets approach in favor of the
harasser, it is still questioned the social commitment of the victim and other participants in a
process of covert perpetuation of damage in denouncing the offensive conduct towards a
healthy work environment.
INTRODUÇÃO
1
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e
do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) III -
a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa.
2
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a
segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos
desamparados, na forma desta Constituição.
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moral e à dignidade ínsita à pessoa do trabalhador e, no limite, forçar que a vítima peça
demissão”.
Essa prática configura o chamado assédio moral, qual sempre existiu, mas que nos últimos
anos tem merecido atenção especial dos tribunais face a necessidade em definir novos
contornos ao vínculo jurídico que une empregados e empregadores. A esse respeito Thome
afirma que
Configurando o assédio moral hipótese de ameaça à saúde física e mental do empregado, por
se tratar de uma violência contra o indivíduo na forma básica de sua existência expressa na
necessidade da prática laborativa, põe em risco ainda o bom andamento da comunidade de
trabalhadores, por atingir também a dignidade dos demais, quando exige que atuem de
maneira cúmplice com o agressor de modo a assegurar a manutenção do próprio emprego.
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(2009, p. 38), que se reporta ao assédio como processo reiterado, consubstanciado na agressão
psicológica prolongada no tempo, de modo a ferir a dignidade do trabalhador.
Embora inexista alteração do contrato de trabalho, que permanece regido pelas mesmas
cláusulas originárias, dá-se uma alteração de fato através da recolocação do empregado em
novo posto, que pode ser ou não de posição inferior, razão pela qual passa a trabalhar
desmotivado, visto que não se reconhece na nova função. Dentre os objetivos propostos
destaca-se a importância da correta inserção do empregado no posto de trabalho para o qual
fora contratado, sendo que eventual alteração não pode ser fruto de ato de assédio moral, com
fins de humilhar a parte mais fraca da relação de emprego. Qualquer mudança está a depender
de concordância expressa do recolocado, exigindo ainda o devido treinamento para a prática
da nova função.
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A diferença entre agressão moral e assédio moral está na reiteração da prática que
configura esta última e no ato instantâneo que caracteriza aquela. É uma forma de
violência no trabalho que pode configurar-se de diversos modos (ex. isolamento
intencional para forçar o trabalhador a deixar o emprego, também chamado, no
direito do trabalho, de disponibilidade remunerada, o desprezo do chefe sobre tudo o
que o empregado faz, alardeado perante os demais colegas, deixando-o em uma
posição de constrangimento moral, a atribuição seguida de tarefas cuja realização é
sabidamente impossível exatamente para deixar a vítima em situação desigual à dos
demais colegas) (Nascimento, 2009, p.117).
No mesmo sentido, Lima Filho (2009, p.38-39) define o assédio como atentado reiterado à
dignidade da pessoa, na forma física ou psíquica, constituído por condutas abusivas realizadas
no local de trabalho, que ponham em perigo o emprego ou possam degradar o ambiente de
trabalho. Sobre o tema, Thome (2009, p. 26-28) identifica como um processo sem volta no
momento histórico presente, diante do atual dimensionamento do trabalho, das pressões a este
inerentes e da evidente competição não apenas entre o assediado e seu superior, mas também
e, principalmente, em relação ao grupo.
88
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No que tange à destruição física e psíquica do trabalhador, Carvalho (2009,p.61) destaca que
“a prática do assédio moral prejudica, degrada, destrói o ambiente de trabalho,
desestabilizando a vítima, provocando nesta um cansaço, um verdadeiro desgaste emocional
que pode evoluir para doenças de ordem psíquicas e físicas”, com sérios danos ao trabalhador.
Tem-se com isto que o assédio viola a dignidade da pessoa porquanto afeta sua integridade,
atingindo de tal sorte seus direitos de personalidade. Se a parte atingida não busca reverter a
situação ou questionar a conduta do agressor na Justiça, permite a perpetuação de malsinada
prática. Ou seja, não é apenas a vítima quem sai perdendo, mas toda a comunidade, qual se vê
a mercê da conduta abusiva.
A configuração do assédio moral na hipótese não exige que a recolocação configure em posto
vexatório, a exemplo de transferência para local insalubre ou atribuição de função inerente a
posição de escolaridade inferior, bastando, para tanto, que a alteração não se mostre
condizente com a formação própria do recolocado, para a qual fora contratado pela empresa.
Eventual mudança embora não seja comum na prática, pode se dar também na via inversa, de
alteração de funcionário, sem qualquer treinamento, para cargo superior, de modo a que a
recolocação configure um mal tão grave que impeça a continuidade na empresa pelo não
acompanhamento das atividades a serem desempenhadas. Tal situação afeta a saúde do
trabalhador, que se vê obrigado a recorrer à despedida indireta, posto encontrar-se
inferiorizado e ridicularizado em relação aos seus pares.
Porquanto infrinja maiores danos ao trabalhador ofendido, atingindo a esfera da sua dignidade
e dos direitos de personalidade, da intensidade do sofrimento psicológico resulta a
necessidade de fixação de indenização em patamar superior a mera agressão moral. Vincular
o assédio à necessidade de repetição configura abordagem em favor do assediador, razão pela
a análise do dano impingindo à vítima deve ser analisada sob a ótica do sofrimento a esta
causado.
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dos pares. Estes, por medo do desemprego e vergonha de serem também humilhados,
associado ao estímulo constante à competitividade, rompem os laços com o ofendido e
frequentemente reproduzem e reatualizam ações e atos do agressor no ambiente de trabalho,
instaurando o pacto da tolerância e do silêncio. Com isto, ao falar em agressor, necessário
fazer a distinção entre aqueles que colaboram com o comportamento agressivo de forma
passiva e os que praticam a agressão de forma direta, visto ser comum colegas de trabalho se
aliarem ao agressor ou se calar diante dos fatos.
No Brasil não há uma lei específica para assédio moral, mas este pode ser extraído das
condutas previstas no artigo 4833 da Consolidação das Leis do Trabalho. Apenas legislações
esparsas tratam do tema, em especial na esfera pública, como a Lei nº 12.250, de 9 de
fevereiro de 2006, do Estado de São Paulo, que veda o assédio moral no âmbito da
administração pública estadual direta, indireta e fundações públicas, bem como a Lei nº
3
Art. 483 - O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando: a)
forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao
contrato; b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo; c) correr
perigo manifesto de mal considerável; d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato; e) praticar o
empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama; f) o
empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de
outrem; g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a
importância dos salários.
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13.036, de 29 de maio de 2008, do mesmo Estado, que instituiu o dia estadual de luta contra o
assédio moral nas relações de trabalho, a ser comemorado no dia 2 de maio.
Segundo Alkimin (2008, p.30), o respeito ao meio ambiente do trabalho, local onde o
trabalhador passa boa parte de sua vida, é dever de todos, devendo ser protegido em razão do
interesse da coletividade de trabalhadores. Ainda que não haja de forma direta, o grupo
pratica o assédio com sua conduta omissiva ao compactuar no silêncio com o agressor. O
assediado passa a chegar em casa arrasado, com mágoa do seu agressor que agora se confunde
com o grupo. Sem referencial, e tendo o agressor conseguido retirar todo senso crítico da
vítima, esta perde a real noção se está agindo ou não de forma correta. O fenômeno do assédio
deteriora sensivelmente o meio ambiente do trabalho, com repercussão na produtividade e na
ocorrência de acidentes.
Depois de isolada, a vítima começa a imaginar se o problema não é realmente com ela,
momento em que o objetivo do agressor se concretiza, quando consegue que o próprio
ofendido desacredite do seu potencial. Acreditando serem responsáveis pela agressão que
sofreram, as vítimas começam a achar que o problema está com elas e isso transpassa para
todos os outros setores de sua vida, afetando seus relacionamentos e sua capacidade de
socializar-se.
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assediador deixará transparecer a intenção discriminatória”, pois a ofensiva aberta admite uma
réplica e torna conhecida sua estratégia. Por isso a primazia pela comunicação não-verbal, por
meio de sinais, boatos, ironias, sarcasmos ou de até mesmo, ignorar a vítima são técnicas
comumente utilizadas, quais não confirmam de forma veemente a prática do assédio. Em
virtude desta tática sutil e pessoal, o assédio moral pode ser caracterizado como uma violência
invisível.
Com medo, na maioria das vezes as vítimas de assédio moral mantêm segredo sobre o caso, o
que acaba favorecendo o aumento dessas situações perante sua impunidade. Trata-se de um
círculo vicioso, que coloca agressor e vítima umbilicalmente ligados, vez que cada qual
depende do outro para perpetuar o assédio. Entretanto, constitui também um seu dever coibir
tais condutas, se não em seu interesse, em favor da coletividade, qual pode vir a ser vítima do
mesmo agressor. Resta claro que a conduta do assediador, após atingido o intento que é de
afastar a vítima da relação de emprego, fará com que busque novo alvo para suas investidas
discriminatórias, seja por insegurança ou autoafirmação. Disso resulta a necessidade de
mudança de comportamento não apenas do opressor, mas também do oprimido e mais, de
todo o grupo.
Em meio à organização burocrática das massas retira-se do indivíduo, com base no terror e na
ideologia, a capacidade de agir, criando-se novas formas de dominação. Alerta Freire (2012,
p. 39-43) para a ameaça sobre os oprimidos, que dificulta a execução do projeto de libertação,
preferindo adaptarem-se ao modelo instaurado que os impede de ser mais. Embora
reconheçam a realidade de opressão, preferem a modificação da realidade objetiva pela
criação de uma realidade imaginária, forjada para atender demais interesses. Desacreditar sua
importância remete ao trágico diagnóstico de desumanização, sendo certo que a negação
resulta da crença na humanidade roubada pela violência dos opressores. Ao dar ênfase à
pedagogia libertadora, o autor discorre sobre a necessidade do oprimido em restaurar sua
humanidade, compreendendo inicialmente que hospeda a visão de vida do opressor, cabendo
àquele inseri-lo no processo de retomada da sua liberdade, porquanto ambos se apresentam
intrinsecamente ligados. Libertar-se pressupõe uma ação transformadora, que não se reduz ao
mero reconhecimento da situação concreta de opressão, mas, ao contrário, em práxis autêntica
de luta, que se pode resumir em reflexão e ação pelo objetivo de libertar-se, razão pela qual
“não haveria ação humana se o homem não fosse um “projeto”, um mais além de si, capaz de
captar a sua realidade, de conhecê-la para transformá-la” (FREIRE, 2012, p. 45). O homem
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tende a ser mais na medida em que reconhece sua real vocação no mundo, o que permite a
retomada do controle sobre sua própria vida.
Segundo THOME (2009, p. 67) “o assédio moral atinge os direitos fundamentais da pessoa
humana, na medida em que o assediador atinge a própria identidade da vítima como ser
humano, ao gerar sua “desumanização”. A depender da liberdade que temos para atuar, a
vontade expressa no projeto de vida será ou não plena. A preocupação com as relações sociais
e com o trabalho e sua função na sociedade, se faz presente todo o tempo. Um dos meios de se
completar o projeto de vida decorre necessariamente da inserção da Carreira e sua realização
dentre os seus objetivos. Como suporte que se efetiva pelo ato de cooperação social, o ser que
trabalha responde ao processo de humanização qual remete à integração no foco da
subjetividade. Freire (2012, p.32-36) ao analisar a inquietude do homem frente ao
reconhecimento do pouco saber sobre si mesmo, destaca a humanização como fator central de
preocupação no atual estágio histórico. Muito embora seja apenas uma faceta das múltiplas
ações empreendidas pelo sujeito, a importância do trabalho não pode ser relegada a segundo
plano, fazendo parte do projeto de vida do indivíduo. Trabalho e vida não se distinguem,
sendo impossível dissociar um do outro. Afinal, o trabalho gera sentimento de realização às
pessoas, porquanto desenvolvem novas competências, através da resolução de problemas e
vivência de novas experiências.
Carvalho (2009, p. 99) destaca que “o trabalho não é apenas uma fonte de subsistência do ser
humano, mas também a principal fonte de reconhecimento social e realização pessoal”. Por
meio deste, o homem não apenas se identifica como pessoa, mas também se destaca
socialmente. Quando seus objetivos não se realizam, frustam-se suas expectativas,
acarretando em insatisfação no trabalho e fora dele, o que desestabiliza seu convívio com as
demais pessoas.
Conquanto sua realização seja feita por meio de socialização, ao se atribuir propósito ao
trabalho surge como exigência natural a promoção de suas potencialidades na realidade de
quem o exerce e de quem por este é atingido, consistindo em oportunidade de
93
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
O ser que trabalha, ao mesmo tempo em que transforma, é transformado pela realidade ao
redor. Lukács (2010, p.42) entende que o trabalho está no centro do processo de humanização,
já que permite o salto ontológico das formas pré-humanas para o ser social. Este deve ser
entendido em sua dinâmica de interação com os demais elementos aos quais se liga
inevitavelmente, ao que rechaça a separação entre natureza e sociedade. Não há que se falar
em separação da vida do trabalho, porquanto este constitui em condição necessária e
fundamental para que aquela subsista, não apenas em seu aspecto remuneratório, mas,
principalmente, por permitir a construção da identidade e autorrealização do sujeito. Tanto
assim que a Constituição, já no seu artigo 1º, inciso IV, 4 estabelece como fundamento da
República o valor social do trabalho. Da fundamentação lukacsiana parte-se de uma realidade
vivenciada a partir do trabalho, qual busca atingir uma finalidade específica, mediada pela
consciência do indivíduo de sua importância na construção do fim humanamente configurado.
Para Lukács, o domínio do homem pela consciência resulta na efetiva representação que faz
de si mesmo.
Segundo o autor, (LUKÁCS, 2010, p. 43-44), a ontologia do ser social resulta do pôr
teleológico, qual define a inserção no processo dinâmico de redefinição de processos causais,
haja vista a inexistência de formas de trabalho desenvolvidas em sua integralidade. Segundo
Lukács, muito embora em outras práxis sociais se verifique necessariamente a relação entre os
seres, a importância definitiva do trabalho resulta da transcendência da individualidade do
homem, como continuidade do processo de desenvolvimento social.
4
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do
Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) IV - os valores
sociais do trabalho e da livre iniciativa.
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Enquanto ser social, o homem não se resume apenas a processos biológicos de sua mera
existência, impondo-se o desenvolvimento da ação orientada para o atingimento de
determinado fim. Da práxis social resulta a relação entre causa e efeito, segundo o aspecto
subjetivo, ou seja, do ponto de vista do sujeito. Como ao homem não é possível antever todas
as possibilidades futuras, suas decisões vão depender da relação desenvolvida com o meio em
que se encontra. Tem-se, portanto que, quanto mais é permitido a este homem desenvolver
todas as suas potencialidades, maiores as chances de compreender e agir de acordo com o
melhor fim esperado. Trazendo para o objeto de estudo, eventuais limitações impostas pelo
trabalho decorrente do assédio tende a resultar em prejuízo não apenas do ser individualmente
considerado, mas de toda a coletividade. Tem-se, portanto, a humanização do sujeito a partir
da humanização do objeto de análise, qual deva ser entendido como resultado da atividade
social. Nesta abordagem, o homem deve ser entendido ao mesmo tempo em sua
particularidade e universalidade, como dois lados de uma mesma realidade.
95
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
mutuamente, razão pela qual não se deve atrelar simplesmente trabalho a dever, senão
também como espécie de prazer que emancipa quem o exerce de forma útil à sociedade. Nisto
consiste a essência do trabalho humano, não como meio de escravizar o indivíduo, mas como
forma de transformação da práxis social. Com isto, visa orientar o procedimento humano,
cabendo ao trabalho estabelecer o desenvolvimento da sociabilidade, segundo a dinâmica
orientada pela realidade social, porquanto sua essência constitui em um dado não previamente
definido, restando aberta a múltiplas possibilidades.
Desde que o ser humano sentiu necessidade de vender sua mão-de-obra, passou a conviver
com ironias, ofensas, mau humor dos chefes e até mesmo de colegas de trabalho, afetando
todo seu psicológico e transpassando as consequências deste fato para o seu dia-a-dia. Face a
complexidade da vida social, ao longo do processo o próprio caminho inicialmente previsto
pode dar ensejo a objetivos independentes e contrários. Novas situações até então não
ventiladas poderão surgir, razão pela qual não se pode permitir a submissão e estagnação do
processo de desenvolvimento, em meio à ruptura da dinâmica do trabalho. Muito embora os
anseios de satisfação do homem não estejam estabilizados e, portanto, não coincidam com o
inicialmente pensado, sua vontade deve ser livre para redesignar os rumos de suas ações
concretamente. Porquanto não se considere unicamente o trabalho como transformador da
práxis social, este constitui num medium entre os anseios baseados nos valores
predeterminados pelos indivíduos e suas atitudes voltadas para a transformação da dinâmica
social. Com isto impulsiona a atividade, permitindo ao mesmo tempo o desenvolvimento do
homem em sua cooperação com os demais seres.
96
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97
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Como forma de atribuir significado à vida resulta a realização de um projeto pessoal, em meio
a processos dinâmicos dos quais o indivíduo possua controle, de modo a conferir bem-estar
aos seus anseios e idealizações. No mais, permite conectar-se com o mundo, por conferir
sentido e materialização a suas aspirações pessoais, não somente planejando ações para o
alcance de seus objetivos, mas planejando também a pessoa que deseja ser. Ao atribuir
propósito a sua existência, permite estabelecer seu lugar no mundo, estimulando a realização
de seus ideais para transformação da realidade. De se ver, importa a coesão do projeto de vida
com as crenças e valores do indivíduo, como forma a agregar sentido para o fim visado. Neste
contexto, devem-se adequar aptidões do indivíduo com sua ocupação profissional, de modo a
atender à satisfação do projeto e contribuir para o autodesenvolvimento.
Tendo em vista que grande parte do tempo será dedicado ao trabalho, este deve se voltar para
atender às necessidades humanas de realização pessoal. Redunda em importância a comunhão
com outras pessoais com vistas a compatibilizar o bem-estar social com a concretização de
ações voltadas para o projeto pessoal vez que, atrelada à existência de um projeto pessoal,
necessária a conscientização dos indivíduos de que a gestão desse projeto faz parte de sua
responsabilidade.
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possam conduzir ao alcance de tais metas. Com boa parte da vida é gasta no exercício da
profissão, é fundamental que esta possa satisfazer as necessidades básicas, desejos e
aspirações do indivíduo, transformando o trabalho em tarefa significativa, que atribua sentido
à vida. Para que atenda ao cumprimento das necessidades humanas, compete ao homem
compreender a importância do trabalho não apenas como forma de paga pelo seu exercício,
mas principalmente pela utilidade que deste decorre. Ou seja, o trabalho é uma necessidade
existencial que resulta na satisfação das necessidades do ser humano, possuindo um forte
caráter de estruturação, tanto no âmbito pessoal, quanto social.
Ao tratar da psicologia do trabalho e das situações produzidas neste campo que ora conduzem
à sensação de prazer, ora de sofrimento, Dejours (1994, p. 21-32) buscou identificar a
fronteira dinâmica entre a relação saúde e doença, resultante das condições determinadas pelo
meio ambiente do trabalho. Mereceu destaque o estudo sobre o prazer proveniente do
trabalho, qual influencia em várias áreas do comportamento humano. Disso resulta a
importância da subjetividade, para fins de afastar o sofrimento mental proveniente da carga
psíquica imposta pelas relações de trabalho que não atendam aos anseios do trabalhador. O
autor recorre à ideia de liberdade da vontade como forma de aliviar as tensões da prática
laborativa que conduzam a um trabalho saudável, qual respeite os potenciais humanos e
reforce sua qualidade. Destaca o autor a carga psíquica acometida pelo desconforto do sujeito
ao trabalho, qual difere de pessoa para pessoa. Com isto, adverte que
Disso resulta que o ser que trabalha não exerce atos involuntários em busca de satisfação de
sua própria existência, senão visa atingir a universalidade na concretude da importância
humana conferida ao trabalho. Como ao homem não é possível prever de antemão os
resultados de suas ações, apenas possuindo pistas do que pretende, a este deve ser dada a
possibilidade de estabelecer-se no mundo de acordo com suas vontades e convicções. Ao
exercê-las livre de constrangimento, novas abordagens se instauram tanto maiores a permitir o
desenvolvimento da sociedade. Com isto, a busca de sentido à vida passa necessariamente
pela autorrealização individual e coletiva. Disso decorre a necessidade de respeito à dignidade
moral da pessoa do trabalhador e aos direitos relativos a sua personalidade.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
O tema do assédio, embora não seja novo, remonta a uma série de elementos, segundo a
doutrina e jurisprudência pátrias, quais devam ser obrigatoriamente observados para sua
configuração. Neste contexto, embora prevaleça o entendimento pela necessidade de
reiteração dos atos contrários à prática de um meio ambiente de trabalho saudável, focado que
se encontra o agressor em denegrir e diminuir a autoestima da vítima, outras formas de
assédio devem ser repensadas.
Neste sentido, importa estabelecer novos parâmetros à caracterização do assédio moral, sob
pena de, caso contrário, expor ainda mais o ofendido à perpetuação de tais práticas, visto que,
para doutrina e jurisprudência a realização de um ato isolado não teria o condão de imprimir
na alma da vítima o necessário sofrimento e humilhação suficiente à configuração do assédio.
A se entender desta forma, a aceitação social a tais condutas tenderia a ser tolerada, o que
corroboraria com a manutenção dos casos de assédio ante o resultado menor em resposta ao
gravame.
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REFERÊNCIAS
ALKIMIN, Maria Aparecida. Assédio moral na relação de trabalho. Curitiba: Juruá, 2008.
CARVALHO, Nordson Gonçalves de. Assédio moral na relação de trabalho. São Paulo:
Rideel, 2009.
LIMA FILHO, Francisco das Chagas. O assédio moral nas relações laborais e a tutela da
dignidade humana do trabalhador. São Paulo: LTr, 2009.
LUKÁCS, György. Prolegômenos para uma ontologia do ser social. São Paulo: Boitempo,
2010.
THOME, Candy Florencio. O assédio moral nas relações de emprego. São Paulo: LTr,
2009.
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RESUMO
ABSTRACT
This article discusses the emergence of the welfare state, replacing the Liberal State, its
development and difficulties, analyzing standards of social rights expressed in the
Constitution of 1988 and its achievements, with special attention to the phenomenon of
globalization which affected traditional forms trade through deep transformations in
technology, telecommunications and transport leading to an intensification of
international trade with the elimination of customs barriers giving rise to a new
condition of employment where the employee found himself unprepared for failing to
follow technological development in timely, and does not capture the changes in
mindset and behavior, thus determining an increase in the number of unemployed who
1
Mestranda em Direito Constitucional (UNIFOR), Especialista em Direito e Processo do Trabalho (UVA)
e graduada em Direito (FFB). E-mail: valeriaclv1606@gmail.com.
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fail the effective protection of unions, since they also suffer the effects of globalization.
All this context, finally raised the idea that the relaxation of labor laws would be the
ideal solution to remedy a situation that is nearing its limit. It happens, however, that
several flexibilities have been made in the Brazilian legal system, more precisely, in the
work, however, has had no such means the desired results, thus using a qualitative
research method added to bibliographic and documentary will try to expose clearly the
issue in question.
INTRODUÇÃO
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os povos. Desse modo, as ideias de Adam Smith tiveram grande influência na burguesia
europeia do seu tempo, pois atacavam a política econômica promovida pelos reis
absolutistas contestando, também, o regime de direitos feudais, ainda existente, além de
terem sido de fundamental importância para o desenvolvimento do capitalismo nos
séculos seguintes.
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este último, levado ao marco histórico da Revolução Industrial do final do século XIX e
início do século XX.
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E, ainda, no artigo 170 diz que a ordem econômica deve ser fundada na
valorização do trabalho humano e na livre iniciativa indicando como finalidade
assegurar a todos uma existência digna. Os direitos, expressos no texto constitucional,
são fartos, com tamanha abundância que formalmente resolveram, com o voto do
constituinte, todos os problemas básicos de educação, saúde, trabalho, previdência, lazer
e, de último, até mesmo a qualidade de vida, consagrando um capítulo ao meio
ambiente. Assim, constata-se que o texto constitucional de 1988 imprimiu uma
valoração sem precedentes dos direitos sociais básicos em sua substância e,
consequentemente, fez com que o Estado Social tivesse um importante avanço, após
referida constitucionalização dos direitos sociais e trabalhistas.
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Há pelo menos três correntes que falam sobre a flexibilização e seus efeitos,
são elas: a flexibilista, a antiflexibilista e a semiflexibilista. A primeira corrente entende
que o Direito do Trabalho assegura os direitos trabalhistas, mas, que este deve adaptar-
se à realidade dos fatos, onde no momento em que a economia estiver normal, aplica-se
à lei, porém, na fase das crises, haveria a flexibilização das regras trabalhistas, inclusive
podendo agravar a situação do trabalhador. A segunda corrente afirma que a
flexibilização do Direito do Trabalho é algo nocivo para os trabalhadores e vem a
eliminar certas conquistas que foram feitas nos anos, a muito custo. Logicamente iria
agravar as condições dos trabalhadores, sem que houvesse qualquer fortalecimento das
relações de trabalho. A terceira e última corrente prega a observância da autonomia
privada coletiva, onde a flexibilização seria feita pela norma coletiva, havendo uma
desregulamentação do Direito Coletivo do Trabalho, porém, não totalmente, pois
existiria uma norma legal mínima, estabelecendo regras básicas, e o restante seria
determinado através de convenções e acordos coletivos. A escolha de qual corrente
seguir, pelos países atingidos, depende muito da cultura, da maneira de administrar de
cada um, assim, não existe uma regra própria para a flexibilização, cada país utiliza os
mecanismos que melhor suportarão as consequências de sua opção.
111
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têm por objetivo reduzir o custo da produção através da redução dos direitos trabalhistas e das
condições de trabalho, ao contrário do que ocorre na Europa que visa obter uma boa margem
de lucros, porém, com o aumento da produtividade .
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decorrência, deixa de investir em ações e serviços sociais aos quais são destinados a
cumprir.
Por outro lado, existe outra vertente que não acredita ser a flexibilização a
melhor saída para todos os problemas trabalhistas existentes, pois, segundo
entendimento do jurista Arnaldo Süssekind (2004),
115
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recebendo cada um R$ 2,00 por peça fabricada, sendo a mesma comercializada na loja,
citada acima, por R$ 139,00.
3. OS SINDICATOS
No Brasil, assim como na Europa, houve uma luta sindical, que passou por
várias fases, como o pluralismo de sindicatos da Constituição de 1934, que ao não
receber a devida regulamentação tornou-se letra morta, ao sindicato único da
Constituição de 1937, onde era permitida a intervenção estatal nos sindicatos, mas a
greve era proibida e tida como crime. As Constituições de 1946 e 1969 passaram a
reconhecer o direito de greve, porém, com ressalvas. Somente com o advento da
Constituição de 1988, em seu art. 8º, foi consagrada a autonomia das entidades
sindicais, mas, também foram impostos limites a esta autonomia, uma vez que seus
incisos condicionam o exercício do citado direito.
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CONCLUSÃO
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flexibilização foram feitas em muitos países, dentre eles França e Alemanha, mas os
resultados não foram os esperados. No Brasil, as flexibilizações já acontecem desde
1994, com a Lei 8949/94, que criou as Cooperativas profissionais, seguidas de várias
outras, como: banco de horas, liberação do trabalho aos domingos, trabalho temporário, etc.
Mas, o desemprego não diminuiu. Constata-se, sem receio, que é falso o argumento de que
a redução de direitos gera empregos e, somente com políticas públicas somadas ao
desenvolvimento econômico voltado para a capacitação dos trabalhadores conseguirá
reduzir o desemprego, pois trabalhadores empregados são futuros consumidores que, ao
consumir, aquecem o mercado levando ao equilíbrio e desenvolvimento da economia.
Portanto, deve existir um grau enorme de ponderação e bom senso ao se falar em
flexibilização das leis trabalhistas para que não haja retrocesso de direitos e muito
menos estagnação do desenvolvimento.
REFERÊNCIAS
MARTINS, Sérgio Pinto. Flexibilização das condições de trabalho. São Paulo: Atlas,
2000.
NUNES, Avelãs. Uma leitura crítica ad actual crise do capitalismo. Coimbra: Ed.
Coimbra, 2011.
120
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ROMITA, Arion Sayão. Direitos fundamentais nas relações de trabalho. 2ª ed. São
Paulo: LTr, 2007.
Roupas da Zara são fabricadas com mão de obra escrava. 16/08/2011. Disponível em:
<http// www.reporterbrasil.org.br>
121
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RESUMO: O estudo é uma análise sobre os preceitos fundamentais no direito do trabalho demais
normas sobre a efetividade do trabalho decente e sua interface aos preceitos relativos à dignidade da
pessoa, A pesquisa é documental, cujo campo de investigação dá-se inicialmente em análise da
doutrina e posteriormente em tratados internacionais e no ordenamento jurídico local, à luz de uma
abordagem qualitativa. O referencial teórico dá-se através da inferência de doutrinas especializadas
com fulcro nos fatos sociais pertinentes ao trabalho decente. No que tange à discussão entende-se que
o trabalho decente contemporâneo atinge o seu ápice, na discussão que se faz contemporânea à cadeia
econômica das relações de trabalho, enfatizando-se na pesquisa a grande concentração de renda
somada às desigualdades sociais torna o Brasil propício para o fenômeno do trabalho degradante
assinalado pelos fatores da ilegalidade e baixo custo da mão-de-obra. Faltando ao indivíduo a
aplicabilidade das garantias sociais mínimas na ordem constitucional brasileira, ao Estado deve tomar
medidas para que o problema seja erradicado porque fere as relações da dignidade da pessoa,
principalmente, em face da desigualdade econômica e social. Com efeito, assinala-se um ordenamento
de direitos fundamentais globalizado, cujas interações interferem nas culturas locais que caminham
para o êxito do trabalho decente e o fim do trabalho degradante, cabendo combater essa atividade
exploratória do ser humano, que retira a importância do ser enquanto pessoa.
PALAVRAS-CHAVE: Direitos fundamentais; Dignidade da pessoa humana; Trabalho
degradante.
ABSTRACT: The study is an analysis of the fundamental right to work in other standards on the
effectiveness of decent work and its interface to the precepts concerning the dignity of research is
documentary, whose field of research is given initially and later analysis dourine international treaties
and legal place, the light of a qualitative approach. The theoretical occurs through inference with core
doctrines specialized in social facts relevant to decent work. Regarding the discussion means that
decent work contemporary reaches its apex in contemporary discussion that makes the economic chain
of labor relations, emphasizing research in the vast concentration of wealth plus social inequality
makes Brazil friendly to the phenomenon of labor degrading factors noted by the illegality and low
cost of labor-intensive. Missing the individual the applicability of minimum social guarantees in the
Brazilian constitutional order, the state must take steps to ensure that the problem is eradicated
because it hurts the dignity of relations, especially in the face of economic and social inequality.
Indeed, it is noted an ordering of fundamental rights globalized, whose interactions interfere in local
cultures that walk to the success of decent work and end the degrading work, fitting, then, that all
combat exploratory activity of the human being, which removes the importance of being as a person.
KEYWORDS: Fundamental rights; Human dignity; Degrading work
1
Marcus Mauricius Holanda é mestrando em Direito Constitucional pela UNIFOR. É especialista em Direito do
Trabalho e Processual Trabalhista pela Faculdade Christus. Bacharel em Direito pela Universidade de Fortaleza -
UNIFOR
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INTRODUÇÃO
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Nesse sentido Perez Luño (2007) em sua obra Los Derechos fundamentales, realiza a
diferença dos termos direitos humanos e direitos fundamentais, onde direitos humanos seriam
entendidos como um conjunto de faculdades e instituições que em cada momento histórico
realizam a concretização das exigências da dignidade, onde os direitos fundamentais seriam
os direitos garantidos pela constituição e legislação, senão vejamos:
Por sua vez Lopes (2001a, p. 35) indica que os direitos fundamentais podem ser
definidos como “os princípios jurídica e positivamente vigentes em uma ordem constitucional
125
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A Constituição Federal não deixa margem à dúvida de seu plano teórico do pensamento
constitucional brasileiro. Todavia, no plano pragmático, a efetividade dos direitos
Fundamentais carece de melhor aplicação por aqueles que promovem o direito em sociedade.
Não que haja um retrocesso na positivação desses direitos, mas é que, no mecanismo de
democratização constitucional brasileira, a evolução dos direitos sociais trabalhistas pode não
ter merecido a devida proteção de que necessitam (SARLET, 2006).
Conforme nos ensina Lopes (2001, p.174), os direitos fundamentais tiveram o seu
surgimento com o Estado Constitucional no Séc. XIX, derivados da própria evolução humana,
como resultado de um complexo de eventos. Ensina, ainda que como normas principiológicas
que legitimam o Estado, os direitos fundamentais devem refletir o sistema de valores do
homem e sua dignidade e não mais transparecer que a dignidade da pessoa está associada a
uma essência pelo simples fato de ser humano, o Estado tem a obrigação de satisfazer as
necessidades de todos os membros, como forma de garantir efetividade dos direitos
constitucionais.
126
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127
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realização dos direitos fundamentais do homem em todas as suas dimensões (SILVA, 2007, p.
369-370).
Como princípio fundamental, José Afonso da Silva (2003) mostra que a dignidade da
pessoa é dotada de um valor supremo na Constituição e que rege toda a ordem constitucional,
de forma que todos os outros princípios são atraídos e tomam-no como fundamento de sua
aplicação2. O conteúdo mínimo essencial refere-se a uma correlação imediata ao princípio da
dignidade, porquanto nele se observa um substancial capital de liberdades como o conteúdo
mínimo existencial e por consequência as condições mínimas para o trabalho.
Brito Filho (2004, p. 51) assevera que o trabalho tem de comportar o conjunto mínimo
de direitos que permitam ao ser humano viver com dignidade, pois com o reconhecimento do
mínimo essencial é que se pode falar que o trabalho dignifica o homem 3. É importante a
vinculação entre o princípio de proteção ao trabalho e à dignidade da pessoa, lembrando que
proteção ao trabalho implica condições de trabalho, ter um ambiente salutar, ou no mínimo
dentro do estabelecido pelas normas trabalhistas, entre outros princípios que estabeleçam
critérios de igualdade e respeito dos trabalhadores. Não sendo estabelecidas essas condições
mínimas, certamente o princípio da dignidade da pessoa não estará sendo aplicado e o
trabalhador ficará submetido a formas degradantes de trabalho4.
2
Conforme ainda Silva (1998, p. 92): “A dignidade da pessoa humana é tal dotada ao mesmo tempo da natureza
de valor supremo, princípio constitucional e geral que inspiram à ordem jurídica. Mas a verdade é que a
Constituição lhe dá mais do que isso, quando a põe como fundamento (grifo do autor) da República Federativa
do Brasil constituída em Estado Democrático de Direito. Se é fundamento (grifo do autor) é porque se constitui
num valor supremo, num valor fundante da República, da Federação, do País, da Democracia e do direito.
Portanto, não é apenas um princípio da ordem jurídica, mas o é também da ordem política, social, econômica e
cultural. Daí sua natureza de valor supremo, porque está na base de toda a vida nacional [...]. A dignidade da
pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o
direito à vida.”
3
Brito Filho (2004, p. 51), observa, outrossim, que o “conjunto mínimo é composto do direito ao trabalho,
principal meio de sobrevivência daqueles que, despossuídos de capital, vendem a sua força de trabalho; da
liberdade de escolha de trabalho e, uma vez obtido o emprego, do direito de nele encontrar condições justas,
tanto no tocante à remuneração como no que diz respeito ao limite de horas trabalhadas e períodos de repouso.
Garante ainda o direito dos trabalhadores de se unirem com objetivos de defender seus interesses”.
4
Brito Filho (2004, p. 69): “De todas as formas de superexploração do trabalho, com certeza, as duas vertentes
do trabalho em condições análogas ao escravo – o trabalho forçado e o trabalho em condições degradantes – são
as mais graves; a primeira mais ainda. Propor a sua análise é, com certeza, enveredar por seara onde a dignidade,
a igualdade, a liberdade e a legalidade são princípios ignorados, esquecidos. Mais: é tratar do mais alto grau de
exploração da miséria e das necessidades do homem”.
128
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BONAVIDES (1989) assevera que os preceitos constitucionais que têm relação com os
direitos econômicos culturais e sociais implicam em uma garantia que possa dar estabilidade
às situações jurídicas criados pelo legislador. Assevera, ainda, que essa garantia deva abranger
um mínimo e esse mínimo assegure a dignidade da pessoa. Importa salientar que a proibição
do retrocesso é um mecanismo de defesa e garantia do mínimo existencial ou núcleo essencial
dos direitos fundamentais, abrangendo tudo que esse núcleo assegura para a certeza de uma
vida digna.
Em análise das características dos direitos fundamentais, podemos dizer que dentre
outras tem uma função dignificadora, Lopes (2001a) afirma que o principal objetivo dos
direitos fundamentais é proteger a dignidade humana, contra possíveis ingerências ao
desenvolvimento humano, vejamos:
129
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Sarlet (2004, p. 35), diz que: “o respeito e a proteção à dignidade da pessoa (de cada
uma e de todas as pessoas) constituem-se (ou, ao menos, assim o deveriam) em meta
permanente da humanidade, do Estado e do Direito”. Na mesma linha de entendimento,
assevera Emmanuel Furtado (2004, p. 34), “a dignidade é um princípio absoluto enquanto se
finca no fato de a pessoa ser um minimum invulnerável, o qual todo estatuto deve assegurar”.
A dignidade da pessoa será atingida de forma negativa sempre que a pessoa for
rebaixada a objeto, a um mero instrumento, tratada como uma coisa, que ela venha a ser
destratada e não considerada como sujeito de direitos. Vemos então, que, se não existir
respeito pela vida, pela integridade física e moral do homem, onde as condições mínimas para
que se possa ter uma existência honrada de vida não forem garantidos, certamente abusos e
grande desesperança irão ocorrer, vejamos o que Sarlet (2004, p 59), nos mostra sobre isso:
5
“[...] E assim também a tortura e toda sorte e toda sorte de desrespeito à pessoa humana praticados sob o
regime militar levaram o Constituinte brasileiro a incluir a dignidade da pessoa humana (grifo original) como
um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito em que se constitui a República Federativa do Brasil,
conforme disposto no inciso III do art. 1º da Constituição de 1988. [...]”. (SILVA, 1998).
130
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131
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Lopes (2001a), afirma que a positivação dos direitos fundamentais vem a ser o
resultado das lutas e a conquistas, afirma, ainda, a grande importância que os direitos
conquistados sejam elencados como fundamentais como forma e proteger o indivíduo e a
sociedade que o desenvolveu, vejamos:
132
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a objeto, a um mero instrumento, tratada como uma coisa, que ela venha a ser destratada e não
considerada como sujeito de direitos. Vemos então, que se não existir respeito pela vida, pela
integridade física e moral do homem, onde as condições mínimas para que possamos ter uma
existência honrada de vida não forem garantidas, Sarlet (2004, p. 59) nos mostra a respeito:
Se as condições mínimas de para uma existência digna não forem asseguradas, onde
não houver limitação do poder, enfim onde a liberdade e a autonomia, a igualdade
(em direitos e dignidade) e os direitos fundamentais não forem reconhecidos e
minimamente assegurados, não haverá espaço para a dignidade da pessoa humana e
esta (a pessoa), por sua vez, poderá não passar de mero objeto de arbítrio e
injustiças. Tudo, portanto, converge no sentido de que também para a ordem
jurídico-constitucional a concepção de homem-objeto (ou homem-instrumento), com
todas as suas conseqüências que daí podem e devem ser extraídas, constitui
justamente a antítese da nação de dignidade da pessoa, embora esta, à evidência,
não possa ser, por sua vez exclusivamente formulada no sentido negativo (de
exclusão de atos degradantes e desumanos), já que assim se estaria a restringir
demasiadamente o âmbito de proteção da dignidade.
Romita (2005, p. 187), observa que a Constituição Federal teve o cuidado de prever a
proteção do meio ambiente do trabalho, constituindo, portanto um direito fundamental do
trabalhador. O Brasil ratificou a Convenção n. 155, da Organização Internacional do
Trabalho, promulgando-a pelo Decreto n. 1.254, de 29 de setembro de 1994. Em virtude dessa
ratificação, por força do disposto no art. 4º, parágrafo 1º, da Convenção, conforme explica
Romita (2005, p. 186), o Brasil é obrigado a formular, colocar em prática e reexaminar
constantemente uma política nacional coerente em matéria de segurança e saúde dos
trabalhadores e o meio ambiente de trabalho. Dessa forma o art. 3º, alínea e, da Convenção,
que o termo saúde, com relação ao trabalho, abrange não só a ausência de afecções ou de
doenças, mas também os elementos físicos e mentais que afetam à saúde e estão diretamente
ligados com a segurança e a higiene no trabalho.
6
Constituição da República Federativa do Brasil, Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito
à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: X - são invioláveis a
133
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A Constituição Federal no Art. 7, XXII, trás a previsão para a redução dos riscos
inerentes ao trabalho como forma de prover direito fundamental e garantir a sua dignidade e
sua segurança por meio de normas7. Destarte, para darmos aos nossos trabalhadores a
dignidade no trabalho, faz-se necessário que cumpramos todas as regras estabelecidas em
nosso ordenamento jurídico, por exemplo, as regras do direito do trabalho, criando condições
a qual o trabalhador possa exercer uma ocupação que lhe permita juntamente com a sua
família subsistir com dignidade. Nesse contexto Dallari (1998, p. 20), expressa:
Para um trabalho digno e decente, o empregador deve oferecer condições ideais para
o labor. A preservação da saúde do trabalhador, da sua dignidade e de sua vida são fatores
importantes que devem ser observados e aplicados, é uma justa troca. O empregador tem a
execução de suas atividades e o trabalhador a sua dignidade.
Negar o trabalho nas condições mínimas exigidas pela legislação, é negar os direitos
fundamentais do trabalhador. Não há justificativa para, em face de uma maior lucratividade e
de produção mais eficiente, aceitar a eliminação da qualidade de vidas das pessoas, tornado
mais rígida a fiscalização contra as formas de exploração do ser humano.
intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano
material ou moral decorrente de sua violação;
7
Constituição da República Federativa do Brasil, Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além
de outros que visem à melhoria de sua condição social: XXII - redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio
de normas de saúde, higiene e segurança;
134
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Por fim conforme ensinamento de Brito Filho (2004), não há trabalho decente sem
que existam as condições adequadas à preservação da vida e da saúde do trabalhador, não há
trabalho decente sem justas condições para o trabalho, e com não há trabalho decente se o
Estado não tomar todas as medidas de proteção e fiscalização em benefício do trabalhador.
(BRITO FILHO, 2004, p. 61).
A atuação dos tribunais cria-se um debate a respeito das funções do Estado na proteção
aos direitos fundamentais em relação a sua real concretização. Será que A atuação de órgão
jurisdicional na proteção dos direitos fundamentais está em sintonia com Estado na busca da
proteção dos direitos fundamentais?
8
De todas as formas de superexploração do trabalho, com certeza, as duas vertentes do trabalho em condições
análogas ao escravo: o trabalho forçado e o trabalho em condições degradantes são as mais graves; a primeira
mais ainda. Propor a sua análise é, com certeza enveredar por seara onde a dignidade, a igualdade, a liberdade e
a legalidade são princípios ignorados, esquecidos. Mais é tratar do mais alto grau de exploração da miséria e das
necessidades do homem [BRITO FILHO, 2004, p 69.]
135
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Los derechos fundamentales constituyen La principal garantia com que cuentan los
ciudadanos de um Estado de Derecho de que El sistema jurídico y político em su
conjunto se orientará hacia El respeto y la promocion de La persona humana; em su
estricta dinensión individual, o conjugado esta com La exigência de solidarida,
corolário de La componente social y colectiva de La vida humana(Estado Social de
Derecho) (LUÑO, 2007, p. 20) .
O Estado vem cumprindo o seu dever fiscalizador, seja através da atuação dos auditores
Fiscais do Trabalho9, seja através do Ministério público do Trabalho10 seja através do próprio
9
No Ceará, em 2006, foi verificado violação aos direitos fundamentais do ser humano, com trabalhadores rurais
vivendo em situação análoga ao trabalho escravo, onde eram privados das condições mínimas de existência. O
jornal “O Povo” publicou as condições subumanas em que estavam vivendo os trabalhadores até serem
libertados, de tal sorte que estes passavam várias noites em estábulos sem o mínimo essencial: Na quinta-feira,
fiscais da Delegacia Regional do Trabalho (DRT) e Ministério Público do Trabalho constataram o primeiro caso
de trabalho escravo no Ceará, na localidade de Caioca, município de Sobral. Um total de 24 pessoas estavam
alojadas em condições subumanas, nos estábulos dos animais e tinham de pagar R$ 15,00 por equipamentos
como foice, o que os forçava a se endividarem no chamado sistema de barracão.
136
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
judiciário, mesmo que não consiga afastar todas as situações de desobediência as normas
fundamentais, vem atuando de forma que minimizem os seus danos e quando não conseguem
eliminar por meio da fiscalização surge o poder judiciário como membro do Estado para realizar a
avaliação e proferir a sua reparação se for configurado o dano.
Entendemos, portanto que o poder judiciário vem cumprido sim o seu papel e suas
decisões estão em sintonia com as normas fundamentais, mas se observa é que os direitos
fundamentais estão bem delineados em nosso ordenamento, onde princípio da dignidade da
pessoa humana para a sua efetivação pressupõe a efetivação dos direitos fundamentais, a
legislação pátria fornece todo o aparato para garantir, mas para a verdadeira efetividade dos
direitos fundamentais deve partir da consciência da pessoa, o Estado é responsável pela a
observância das normas, mas o limite de controle externo é o próprio respeito aos direitos
fundamentais pelos cidadãos.
5. CONCLUSÃO
A dificuldade econômica que muitos estão vivendo, aliada à falta de instrução, saúde,
entre tantas outras necessidades é um facilitador para os que aliciam utilizando-se de falsas
promessas de empregos bem remunerados em troca do trabalho dessas pessoas.
10
O Ministério Público do Trabalho, através do sistema judiciário, ajuizou uma ação de danos morais coletivo,
que teve acolhida pela Justiça do Trabalho, senão veja o texto do referido acórdão: ACÓRDÃO TRT/1ª T./RO
5309/2002 - DANO MORAL COLETIVO – POSSIBILIDADE – Uma vez configurado que a ré violou direito
transindividual de ordem coletiva, infringindo normas de ordem pública que regem a saúde, segurança, higiene e
meio ambiente do trabalho e do trabalhador, é devida a indenização por dano moral coletivo, pois tal atitude da
ré abala o sentimento de dignidade, falta de apreço e consideração, tendo reflexos na coletividade e causando
grandes prejuízos à sociedade.
137
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
As pessoas que se submetem a esse tipo de trabalho são pessoas com toda a ordem
de necessidades. Pessoas que abandonam seus lares e suas famílias em busca de garantir boas
condições de vida às suas famílias.
O Estado não pode ficar ausente nessa questão, deve agir dentro dos permissivos
legais para fiscalizar e punir os responsáveis pela degradação das condições ideais para o
exercício do trabalho. Deve-se respeitar a condição humana, deve-se proteger o homem e sua
família, deve-se proteger a sociedade, deve-se proteger toda a nação, contra os abusos
cometidos.
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Democracia. Rio de Janeiro: Forense, 2007.
139
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Resumo
O objetivo deste artigo é discutir a interação entre Direito do Trabalho e atividade empresarial
em tempos de globalização, partindo-se do fenômeno da globalização, na forma conhecida no
século XX. Ganhou destaque a abordagem da flexibilização nas relações de trabalho como
forma de introduzir a dinâmica necessária frente às mudanças promovidas pelas novas formas
de gerenciamento empresarial, em consequência, principalmente, do crescimento da
competitividade, que extrapolou o plano regional. Partindo-se de princípios insculpidos na
Constituição Federal, foi realizado um estudo crítico sobre a existência de limites normativos
que precisam ser respeitados para que ocorra a flexibilização das normas trabalhistas à luz do
novo papel que a Empresa possui na sociedade contemporânea. Nesse contexto, foi atendido o
requisito interdisciplinaridade, tomando-se como ponto central para o estudo o Art. 170 da
Constituição Federal de 1988, que possibilitou buscar um ponto de equilíbrio entre os
interesses empresariais e a manutenção da valorização do trabalho humano, compreendendo-
se que a mudança, no sentido de redução dos direitos dos trabalhadores, não se faz compatível
com a própria ordem econômica. Diante desse entrave, o presente estudo ampliou o próprio
conceito de flexibilização, entendendo-o como a criação de um ambiente empresarial que
possa comportar, ao mesmo tempo, a valorização do trabalho humano e a construção de
incentivos para o desenvolvimento industrial. Para tanto, apropriou-se do método dedutivo,
principalmente com pesquisas bibliográficas.
Abstract
The aim of this article is to discuss the interaction between work right and business activity at
globalization time from the globalization phenomenon on the 20th century known way. The
flexibility on work relations gained emphasis as a manner of introducing the necessary
dynamic on the changings promoted by the new business management ways, mainly as the
increasing on the competitivity that surpassed the regional plan. From the principles inserted
on the Federal Constitution , a study was done about the existence of normative limits that
need to be respected so that the flexibilisation on work rules occur to the new role that the
business has in the contemporaneous society. Within this context the interdisciplinarity
1
Mestrando em direito pela Universidade de Marília - UNIMAR. Pós-graduado em direito do Estado, com
concentração em direito administrativo pela Universidade Estadual de Londrina - UEL. Graduado em Direito
pela Universidade Eurípides de Marília - UNIVEM. Advogado.
2
Doutor em Direito das Relações Sociais (PUC-SP). Docente da Universidade Estadual de Londrina. Docente do
Programa de Mestrado em Direito. Docente e Coordenador de Curso da FACCAR. Advogado.
140
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requirement was met, becoming as central point for studying the Art.170 of the Federal
Constitution of 1988, that made it possible to search a balance point among the business
interests and the maintenance of human work value getting the changing in the sense of
reducing the worker rights, it is not compatible with the own economical order. Facing that
barrier the present study amplified its own concept of flexibilisation getting it as a creation of
a business environment that can have at the same time the human work value and the
construction of incentives to the industrial development. It appropriated the deductive method
with mainly literature searches.
Introdução
141
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142
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
(OLIVEIRA, 2009, p. 80), em decorrência do mercado globalizado em que está inserida, fato
que vem acarretando profundas mudanças no ordenamento jurídico, tendo em vista que
algumas normas representam um custo para a atividade empresarial, conforme sintetizou
Fábio Ulhoa Coelho:
3
Federação das Indústrias do Estado de São Paulo - FIESP. barreiras para o crescimento da indústria paulista.
Disponível em: <http://www.fiesp.com.br/indices-pesquisas-e-publicacoes/entraves-ao-desenvolvimento-da-
industria-brasileira/>. Acesso em: 25 fev. 2013.
143
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(COELHO, 2003, p. 7), principalmente através de uma legislação trabalhista que possibilite a
desoneração do empregador e, consequentemente, obtenha uma maior exploração do
empregado, conforme pontuou Lourival José de Oliveira:
Assim sendo, sob o ponto de vista jurídico, não pode ser esquecido que, a partir de
uma teoria jurídica do desenvolvimento econômico, a atividade empresarial não está adstrita
apenas à racionalidade estratégica e peculiar da economia, "pois deixa de ser mero
instrumento lucrativo para assumir a responsabilidade de promover uma sociedade mais justa"
144
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145
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Dessa forma, fica evidente que tanto o Direito Empresarial como o Direito do
Trabalho, "em sua concepção moderna, são instrumentos de síntese dos interesses comuns ao
capital e ao trabalho" (ROBORTELLA, 2011, p. 239).
Diante dessa realidade, não se concebe mais, no Estado Brasileiro, uma atividade
empresarial juridicamente livre, pois o seu domínio passa a sofrer limitações por meio de um
projeto material vinculativo (PIOVESAN, 2003, p. 40), evidenciando na Constituição Federal
um documento jurídico que estabelece programas e define fins a serem perseguidos pelos
empresários para que se estabeleça uma transformação social (LEARDINI, 2010, p. 74),
surgindo uma visão mais complexa e mais rica de articulação do Estado, da Empresa e da
Sociedade Civil em torno dos objetivos, simultaneamente, sociais, econômicos e ambientais.
Portanto, os poderes econômico, político e jurídico atribuídos à empresa,
indubitavelmente, implicam responsabilidade ética e jurídica (BERTONCINI; MULLER,
146
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
2012, 466) ao associá-la aos preceitos do Art. 170 da Constituição Federal, ou seja, há
fundamento jurídico para atribuir à empresa uma função social, nos termos que:
Entretanto, essa nova concepção jurídica traçada pela Constituição Federal para as
atividades empresariais contraria a concepção econômica do Empresário, que deseja, por meio
de uma política neoliberal, o exercício de uma atividade econômica totalmente livre, tentando
impor uma alteração na agenda jurídica do Estado para determinar que sua atuação deva ser
pautada apenas para estabelecer a segurança e a ordem para a atividade econômica (OLSSON,
2002, p. 77), em razão da complexidade da sociedade moderna, ensejando, portanto, certa
dose de flexibilização do direito pátrio em razão dos padrões de competição global.
Dentro dessa linha de raciocínio, prevalece no Empresariado brasileiro o paradigma
jurídico do rule of law, no qual as transações privadas, a garantia jurídica e a retração do
estado ensejam, por si só, o desenvolvimento econômico.
Com isso, no sistema econômico pátrio, não competiria à atividade empresarial os
deveres de prestação social, mas apenas de produção de lucro (OLIVEIRA, 2006, 172),
"sendo de competência do mercado a resolução do problema da justiça social via liberdade,
ou seja, dissolver a questão na racionalidade econômica" (RODRIGUEZ, 2010, p. 8),
pugnando pela redução do intervencionismo econômico estatal, a fim de que se eliminem os
custos do processo econômico, devendo o mercado reger naturalmente as relações de justiça
social (FONSECA, 2004, p. 129).
Contudo, é preciso destacar que a liberdade pregada pela atividade empresarial é
movida pela política econômica neoliberal de hegemonia dos valores economistas,
acarretando severo quadro de exclusão humana e social (FONSECA, 2004, p. 127),
perspectiva puramente econômica da empresa, voltada unicamente para a expansão do
capitalismo e para a obtenção de maiores lucros (OLSSON, 2002, p. 75), mostrando-se
totalmente equivocada à luz dos preceitos constitucionais econômicos, conforme ponderou
Adyr Garcia Ferreira Netto:
147
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Dessa forma, embora não seja possível questionar o fim lucrativo da atividade
empresarial, pois se um empresário desviar-se do intuito lucrativo certamente entrará em
bancarrota, desaparecendo do mercado, (FERREIRA NETTO, 2007, p. 80), também não é
possível descuidar da importância que referida atividade econômica enseja para o campo
social, devendo ser exercida dentro do limite jurídico imposto pela Constituição Federal e por
suas pautas axiológicas, fazendo-a legítima e regular (FERREIRA, 2005, p. 70), como
destacou Rosana Maria Fecchio:
Assim, ainda que a atividade lucrativa da empresa faça parte dos seus objetivos,
exige-se que os seus meios de produção sejam destinados a uma finalidade social,
isto é, que tenha por objetivo principal, ao lado da obtenção de lucro, a melhora da
qualidade de vida da população (FECCHIO, 2007, p. 11).
148
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contra o bem comum da coletividade, tendo em vista que a nova ordem constitucional obriga
os Empresários a assumirem responsabilidade perante os princípios preambulares previstos na
Constituição Federal (FERREIRA NETTO, 2007, p. 86), surgindo assim uma atividade
empresarial "mais humanizada e voltada não somente ao interesse econômico, mas também
aos interesses sociais e éticos" (FERREIRA, 2005, p. 83).
"À empresa, por sua vez, cabe contribuir para o desenvolvimento econômico, gerar
lucros aos seus acionistas, propiciar qualidade de vida aos trabalhadores e promover a
150
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Por isso, o sistema de proteção ao trabalhador vem, cada vez mais, sendo apontado
como um entrave ao livre desenvolvimento da atividade empresarial (OLIVEIRA et al, 2002,
p. 53), pois implica uma limitação dos ganhos do empresário por representar um custo para
atividade empresarial (SOARES JUNIOR, 2008, p. 20). A partir desse contexto, a atividade
empresarial, fundamentada na política neoliberal de garantir maior rentabilidade e
competitividade no mercado globalizado, busca a ampliação da margem de negociação com o
trabalhador, com a supressão de regras imperativas no contrato de trabalho, flexibilizando e
até certo ponto desregulando o Direito do Trabalho, a fim de atender às necessidades de
adaptação conjuntural da atividade empresarial na economia (PAIVA, 2012).
Portanto, o presente tópico gira em torno do princípio da livre iniciativa versus
princípio do valor social do trabalho, tendo em vista o impasse existente entre redução de
custo e aumento da produtividade, além da garantia e da prevalência dos direitos sociais
alcançados pelos trabalhadores como mecanismo protetivo de uma relação laboral mais digna
(MEDEIROS, 2009, p. 459), pois a legislação trabalhista em bloco consiste, de fato, num
conjunto articulado de restrições à autonomia da vontade, sobretudo àquela contratual
(GUERRA, 2012, p. 4), "surgindo dessa contraposição a seguinte indagação: Como se
valoriza o trabalho humano?" (OLIVEIRA, 2009, p. 85)
151
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Para responder à questão de forma didática e objetiva, é imperioso destacar que será
enfocado o que parece ser essencial no trabalho: a forma de compatibilizar o princípio do
valor social do trabalho com o princípio da livre iniciativa, enquanto:
Nessa perspectiva, a resposta à presente questão gira em torno dos direitos e das
garantias fundamentais do trabalhador na relação de trabalho, e dos critérios para proibir e
coibir a exploração do trabalho humano na atividade empresarial (OLSSON, 2002, p. 78),
tendo em vista que, no contrato de trabalho, "o objeto da venda é uma parcela da existência do
Empregado, que implica utilização dirigida de seu corpo e de sua mente" (RODRIGUEZ,
2010, p. 6), mostrando-se imprescindível à intervenção do estado para a proteção da
dignidade da pessoa humana nas relações de trabalho (LEARDINI, 2010, p. 69).
Dessa forma, quando se trata de geração de empregos, não mais se compreende como
a ocupação pura e simples de mão de obra, mas envereda-se pelo consagrado postulado do
emprego digno (JUCÁ, 2011, p. 484), "no qual, acima da globalização, do interesse em
aumentar a eficiência produtiva e de reduzir custos, está a dignidade humana" (GOMES,
2003, 127).
Sendo assim, em uma perspectiva puramente jurídica, o princípio do valor social do
trabalho consubstancia-se em compatibilizar a livre iniciativa com os direitos trabalhistas
contidos na Constituição Federal, promovendo ao máximo um ambiente de trabalho
adequado, decente, no qual a dignidade do trabalhador esteja presente, com a plena aplicação
do binômio dignidade e produtividade (SILVA, 2008, p. 216), conforme justificou Lourival
José de Oliveira:
152
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
pois o Direito do Trabalho foi elaborado para a proteção do trabalhador. "Tal princípio
continua sendo fundamental, mas, dogmaticamente, revisto em face das realidades dos
processos produtivos" (GHERA apud ROBORTELLA, 2011, P. 234). À luz desse fato, é
possível concluir que não se pode flexibilizar a legislação trabalhista em quatro campos
básicos, quais sejam: (i) Direito ao emprego; (ii) Direito à associação sindical. (iii) Direito à
segurança e saúde no trabalho e (iv) direito à justa retribuição, uma vez que:
Dessa forma, embora tais direitos não possam ser flexibilizados, pois caracterizam
uma forma de valorizar o trabalho humano, ensejando uma condição mais digna ao
trabalhador, defende-se que o valor social do trabalho não pode "obstar o processo criativo de
construção de novos modelos de relação jurídico-laborais destinadas a oferecer respostas mais
condizentes com os novos desafios da contemporaneidade" (PAULA, 2011, p. 226), tais
como: (i) Trabalho em tempo parcial, introduzido pela MP 1.709/08, que acrescentou o Art.
58-A na CLT; (ii) Contrato de trabalho provisório, instituído pela Lei 9.608/98; (iii) Programa
empresa cidadã, albergada pela Lei 11.770/2008, e (iv) suspensão de contrato de trabalho para
qualificação profissional, também previsto na MP 1.709/98, com introdução do Art. 476-A na
CLT.
Nesse quadro, o valor social do trabalho não pode representar uma restrição ao
desenvolvimento de novos padrões de proteção, pois o direito do trabalho tem estreita
correlação com a econômia (CAEN apud ROBORTELLA, 2011, p. 238), que "depende de
um espaço de liberdade substantiva" (MELLO, 2006, p. 62). Dessa forma, a ordem social não
pode e nem deve significar a inversão da ideia base da liberdade de iniciativa empresarial,
como consagrada constitucionalmente, sob pena de se anular ou inutilizar o conteúdo mínimo
do princípio da livre iniciativa (TAVARES, 2011, p. 238), já que "o empresário, com seus
153
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154
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Sendo assim, entende-se que o valor social do trabalho tem por principal objetivo
promover a proteção jurídica do trabalhador, minimizando sua fragilidade diante do poder
econômico das Empresas, através da regulamentação dos direitos trabalhistas (SOARES
JUNIOR, 2008, p 21), pois o trabalho humano não é uma mercadoria, mas um meio de
inserção do homem na vida social (COLNAGO, 2007, p. 8), enquanto o emprego, "ocupando
a mão de obra existente, incorpora os indivíduos ao processo produtivo com utilidade social,
inserindo-o na sociedade, valorizando e construindo a cidadania através do trabalho,
atribuindo significado de valorização da pessoa humana" (JUCÁ, 2011, p. 483).
Portanto, o dirigismo contratual e a manutenção de alguns direitos previstos na
Constituição consistem em uma forma de se valorizar o trabalho humano, pois impõe à
atividade empresarial a obrigação de assegurar um patamar mínimo apto a consagrar a
dignidade humana, estabelecendo um modelo de proteção social capaz de tutelar um trabalho
livre e digno.
Como conclusão parcial do presente tópico, é possível afirmar que os limites de
flexibilização das relações de trabalho encontram-se em parte na realização ou não da
finalidade maior da valorização do trabalho humano, que é a produção de um trabalho com
dignidade. Dessa forma, torna-se possível, dentro do plano finalístico, primeiramente buscar
saber que tipo de trabalho será produzido, considerando as mudanças ou propostas
flexibilizadoras que se pretende inserir em determinada unidade produtiva. Em outras
palavras, as mudanças não podem ser vistas isoladamente e genericamente. Devem ser
analisadas levando-se em conta o caso concreto, ou seja, a função desempenhada, as
condições oferecidas no ambiente de trabalho e as particularidades do setor empresarial.
155
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Art. 1º, inciso IV, reconhece a existência de um verdadeiro mutualismo entre os respectivos
princípios. Sendo assim:
Não é o Estado liberal, que se omite ante a conduta individual, nem o Estado
socialista, que suprime a iniciativa particular. É o Estado orientador e incentivador
da conduta individual no sentido do bem estar social. Para atingir esse objetivo, o
Estado do bem estar intervém na propriedade e no domínio econômico, quando
utilizados contra o bem comum da coletividade (MEIRELES, 1984, p. 497).
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escopo de impedir que a liberdade e o anseio pela lucratividade solapem patamares mínimos
de proteção ao trabalhador, como pontuou Alcídio Soares Junior:
Diante desse embate, previsto no Art. 1º, inciso IV, e no Art. 170 da Constituição
Federal, que consagrou o valor social do trabalho como forma de impor um conjunto de
condições mínimas para o contrato de trabalho, objetivando a dignidade do trabalhador e o
direito à liberdade e lucratividade da atividade empresarial, constata-se que o Direito do
Trabalho à luz da Constituição Federal encontra-se no "centro de uma colisão de valores e
direitos fundamentais" (GUERRA, 2012, p. 4), pois o contrato de trabalho é parte constitutiva
das relações econômicas empresariais, assumindo no sistema econômico capitalista uma
importância ímpar quanto à forma de criação de direitos subjetivos socialmente conhecidos
(MELLO, 2006, p. 62) na busca de justiça social, ao reconhecermos que:
O custo dos encargos sociais em nosso país remonta a 103,49% do valor do salário
pago ao trabalhador, o que inviabiliza as contratações. Propõe, então que sejam
flexibilizados e desregulamentados os direitos trabalhistas para que se possam
negociar férias, décimo terceiro salário, aviso prévio, reduzindo, assim, o valor dos
encargos sociais em prol da empregabilidade (FONSECA, 2004, p. 132).
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"Mas, sem descurar das transformações das realidades política, social e econômica
produzidas pela globalização, e da necessidade de ampla defesa da atividade empresarial"
(LEARDINI, 2010, p. 63), tem-se que a questão da flexibilização da legislação trabalhista
deve ser analisada à luz da função social da Empresa e do princípio do valor social do
trabalho, pois a Constituição Federal apresenta um aspecto econômico e outro social para o
valor trabalho (AMORIM, 2009, p. 83), envolvendo uma questão existencial do homem em
contraposição ao interesse patrimonial da empresa, faltando à questão da flexibilização dos
direitos trabalhistas a localização do homem nesse contexto (OLIVEIRA, 2007, p. 145), pois:
Assim, fica claro que o contrato de trabalho diferencia-se dos demais contratos
estabelecidos pelo empresário, pois o trabalhador "não está vendendo, em troca de dinheiro,
uma bicicleta, um sofá, uma torta de palmito ou um sanduíche de presunto, mas sua força
física e inteligência, ou seja, parcela de sua existência em favor da produção e dos serviços"
(RODRIGUEZ, 2010, p. 6), mostrando-se ilegal à luz dos preceitos constitucionais "o
processo de mercantilização e coisificação do trabalho humano, com um preço de venda, de
acordo com as leis de mercado" (OLIVEIRA, 2007, p. 152), pois os Arts. 1º, 5º, XIII; 6º; 7º;
8º e 170 da Constituição Federal projetam o valor dignidade humana no contrato de trabalho
ao regular as relações de trabalho, definindo condições humanitárias aptas a lhes conferir
dignidade, enquanto:
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"baseadas na orientação filosófica de que todo trabalho digno deve ser efetivamente protegido
pelo direito do trabalho" (DELGADO, 2006, p. 74), com a fixação de "patamares mínimos à
dignidade humana, cujo valor está fora do comércio" (FONSECA, 2004, p. 126), para que:
Possa-se efetivamente criar um substrato possível de construir uma outra lógica, não
mais a lógica racional do lucro pelo lucro e sim a lógica do bem estar, do convívio
social, da redução da pobreza, da conquista por meio do trabalho, da busca da
dignidade perdida pela racionalidade liberal, que trouxe como consequência mais
devastadora, a coisificação do trabalhador (OLIVEIRA, 2007, p. 170).
Por trás das tentativas de superar os desafios que se apresentam, a busca pela
sobrevivência, por parte das empresas, vem se mostrando uma motivação básica e,
em geral, desarticulada de considerações sobre outros agentes e recursos que devem
continuar existindo para que essa sobrevivência seja possível. Competentes em
responder a ameaças intrínsecas ao seu ambiente operacional, no qual diz respeito à
produção e à comercialização de bens e serviços, as empresas tem-se mostrado
negligentes quanto aos fatores que dão sustentação a esse mesmo ambiente
(VERGARA; BRANCO, 2001, p. 22).
A crise da empregabilidade não deve ser atribuída aos valores pagos aos
trabalhadores. Como se viu, a capacidade de consumo é imprescindível à reprodução
do capital e o custo social da informalidade é, sem dúvida, muito mais intenso que
qualquer atribuição legal que se possa exigir concernente ao emprego. Trata-se de
atributo inerente à função social da livre iniciativa e da propriedade dos bens de
produção, princípios constitucionais basilares (FONSECA, 2004, p. 133).
160
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
161
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Com isso, não é possível taxar a legislação trabalhista como a vilã da baixa
competitividade das empresas brasileiras, mas sim todo o conjunto de entraves burocráticos
que tornam hostil o ambiente de negócios no Brasil e que são necessários para as empresas
prosperarem e se tornarem competitivas no mercado global.
Exposta essa perversidade, de forma inversa ao que é defendido pelo pensamento
liberal, o Direito do Trabalho contribui, na verdade, para sustentar padrões econômicos no
mercado interno brasileiro, estimulando a formação de um mercado consumidor, de forma a
construir novos padrões como, por exemplo, a melhoria da qualidade da Educação, da
prestação de serviços na área de Saúde, da qualificação profissional, promovendo ações
consideradas inovadoras no plano tecnológico e organizacional, concretizando o exercício da
4
Banco Mundial. Facilidade para fazer negócios (entre 185 economias) e a classificação por tópico.
Disponível em: <http://portugues.doingbusiness.org/data/exploreeconomies/brazil>. Acesso em 24 fev. 2013.
162
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Não há mais lugar para a utopia que marcou a dogmática trabalhista. A proteção ao
empregado continua, mas tem ao seu lado outros valores, ou seja: a) aumentar o
nível de emprego ou de ocupações; b) incluir os informais; c) estimular o
investimento; d) propiciar o desenvolvimento econômico; e) favorecer a
governabilidade. (ROBORTELLA, 2011, p. 243).
163
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Conclusões
164
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
associação sindical, (iii) Direito à segurança e à saúde no trabalho e (iv) Direito à justa
retribuição.
5. Dessa forma, é possível afirmar que o Art. 170 da Constituição Federal, ao
albergar o princípio do valor social do trabalho em conjunto com o princípio da livre
iniciativa, mostrou-se um verdadeiro instrumento de conexão entre os interesses comuns ao
capital e ao trabalho. Com isso, albergou a possibilidade de flexibilização dos direitos
trabalhistas apenas quando estiver motivada na diretriz constitucional de proteção do
trabalhador, conectando a atividade empresarial a outros valores, como: (i) aumento do nível
de emprego; (ii) inclusão dos informais; (iii) estímulo ao investimento e desenvolvimento
econômico; (iv) favorecimento da governabilidade. Somente assim será possível amplificar a
unidade do direito, garantindo uma nova forma de compatibilizar o exercício da atividade
empresarial com a valorização do trabalho humano, ao ser consagrado um valor
compartilhado para o atendimento de interesses divergentes, mas que, no fundo, possuem o
mesmo objetivo: garantir o desenvolvimento nacional.
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169
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
RESUMO
RESUMEN
*Doutora em Direito do Trabalho e Previdência Social pela Universidade de Valencia / Espanha; Professora da
Universidade Estadual da Paraíba – UEPB e do Centro Universitário de João Pessoa – UNIPÊ. E-mail:
flaviadepaiva@hotmail.com
** Doutora em Direito do Trabalho e Previdência Social pela Universidade de Valencia / Espanha; Professora
da Universidade Estadual da Paraíba – UEPB e do Centro Universitário de João Pessoa – UNIPÊ. E-mail:
paulla.newton@gmail.com
170
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Introdução
171
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Esse mercado de trabalho, historicamente patriarcal, requer uma ampla e eficaz tutela
legal para que, a mulher possa, igualitariamente, inserir-se e nele desenvolver suas habilidades e
competências. Por essa razão, o art. 7º, XXX, da Carta Magna Brasileira vigente reconheceu
como direito fundamental a necessidade de proteger, por lei específica, o mercado de trabalho da
mulher.
No presente artigo, pretendemos analisar as disposições legais, atinentes ao tema, a fim
de verificar se, depois de 25 (vinte e cinco) anos dessa mudança de paradigma constitucional, a
nossa legislação avançou nessa proteção.
172
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
La igualdad material supondría el critério adecuado para que todos pudiesen llegar
em igualdade de condiciones a esse ejercicio de la libertad protectora y de la libertad
de participación, y sería el critério material para realizar la libertad promocional.
173
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Por essa razão, existe uma necessidade de alcançar a igualdade através das
desigualdades. E, no que concerne às desigualdades em razão de sexo, não se pode buscar um
critério universal e homogêneo para alcançar a igualdade real, mas um fator dinâmico e contínuo
que considere os aspectos sociais que marcam cada um dos grupos coletivos de mulheres, tendo
como norte a maior ou menor intensidade da opressão (TREVISO, 2009, p. 6).
174
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Art. 375. Mulher nenhuma poderá ter o seu horário de trabalho prorrogado,
sem que esteja para isso autorizada por atestado médico oficial, constante de
sua carteira profissional.
Parágrafo único. Nas localidades em que não houver serviço médico oficial,
valerá para os efeitos legais o atestado firmado por médicos particulares em
documento em separado.
175
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Art. 380 - Para o trabalho a que se refere a alínea "c" do artigo anterior,
torna-se obrigatória, além da fixação dos salários por parte dos
empregadores, a apresentação à autoridade competente dos documentos
seguintes:
176
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Art. 376 - Somente em casos excepcionais, por motivo de força maior, poderá
a duração do trabalho diurno elevar-se além do limite legal ou convencionado,
até o máximo de 12 (doze) horas, e o salário-hora será, pelo menos, 25% (vinte
e cinco) superior ao da hora normal.
Após a CF/88, uma prática discriminatória que ganhou vulto foi a de exigir da mulher,
como critério para sua admissão, atestado negativo de gravidez ou a comprovação de
esterilização, tanto para as empregadas que postulassem o acesso a um posto de trabalho, como
daquelas que já se encontravam empregadas para serem mantidas nos seus respectivos postos de
trabalhos. Essa prática tornou-se corriqueira, porque a Constituição vigente ampliou o prazo de
licença maternidade e concedeu estabilidade à mulher gestante até cinco meses após o parto (art.
10, II, "b", do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias).
Nesse sentido, a Lei nº 9.029/1995 criminalizou a conduta do empregador pessoa física ou
pessoa jurídica, de direito público ou privado, que exija teste, exame, perícia, laudo, atestado,
declaração ou qualquer outro procedimento relativo à esterilização ou a estado de gravidez.
A citada Lei também considerou como crime a adoção de qualquer medida indutiva ou
instigadora à esterilização genética ou promoção de controle de natalidade, exceto, nesse último
caso, os serviços de aconselhamento ou planejamento familiar, realizado através de instituições
públicas ou privadas, submetidas às normas do Sistema Único de Saúde (SUS).
As proibições contidas na Lei comentada são criticadas doutrinariamente, sob a alegação
177
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Com a entrada em vigor da nova ordem constitucional, foram promulgadas algumas leis,
nas quais foram asseguradas às mulheres direitos específicos, resultando na revogação de alguns
dispositivos do Capítulo III da CLT.
No entanto, impende salientar que outras prescrições legais do referido Capítulo
continuam vigorando. Embora o citado Capítulo se divida em 5 (cinco) seções, neste momento,
efetuar-se-á uma análise apenas dos dispositivos celetistas que tratam, ou de maneira direta ou de
forma indireta, do acesso da mulher ao mercado de trabalho.
A primeira disposição celetista que trata do acesso da mulher ao mercado de trabalho,
introduzida pela Lei nº 9.799, de 26 de maio de 1999, é a contida no art. 373-A, que proíbe a
adoção de determinadas práticas, tidas como discriminatórias. Da análise do citado texto legal,
depreende-se que tais práticas vedadas podem ser divididas em 2 (dois) grandes grupos. No
primeiro, estariam incluídas as condutas proibidas no momento da contratação, quais sejam:
178
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
publicamente incompatível;
3. Considerar o sexo, a idade, a cor ou situação familiar como variável
determinante para fins de remuneração, formação profissional e
oportunidades de ascensão profissional;
4. Exigir atestado ou exame, de qualquer natureza, para comprovação de
esterilidade ou gravidez, na admissão do emprego;
5. Impedir o acesso ou adotar critérios subjetivos para deferimento de
inscrição ou aprovação em concursos, em empresas privadas, em razão de
sexo, idade, cor, situação familiar ou estado de gravidez.
Do segundo grupo, insere-se o preceito que tem por finalidade evitar a discriminação
durante o contrato de trabalho, qual seja, o de proibir que o empregador faça revistas íntimas nas
empregadas.
O artigo comentado, apesar de proibir o trato discriminatório entre homens e mulheres,
tanto no momento da contratação, quanto durante a manutenção do vínculo contratual, admite a
adoção de medidas de ação afirmativa, tomadas no próprio estabelecimento, que se destinem a
corrigir desigualdades na formação profissional e no acesso ao emprego. Nesse sentido,
importante mecanismo para o estabelecimento dessas medidas de ação afirmativa é o acordo
coletivo de trabalho, bem como a convenção coletiva de trabalho, que poderão disciplinar
normas corretivas específicas para cada categoria profissional e, em caráter temporário, como
preceitua o art. 373-A, parágrafo único. O mais importante da disposição comentada é que ela
proíbe a discriminação da mulher, que poderá vir atrelada a outro tipo de fatos discriminatório,
como a raça, a cor da pele ou a idade2.
Importante, ainda, anotar que o art. 377, da CLT reconhece que é matéria de ordem
pública a adoção de medidas que tenham por finalidade proteger o mercado de trabalho da
mulher, de tal maneira que elas não poderão implicar, em nenhuma hipótese, a redução de
salário. Essa norma deve ser interpretada juntamente com o art. 373-A já comentado. Da análise
conjunta desses dispositivos legais, decorre que tais normas funcionam como importantes limites
para a negociação coletiva, com relação as normas protetivas do mercado de trabalho da mulher,
obstaculizando a negociação de pactos coletivos que, sob a alegação de incentivar o ingresso da
empregada no mercado de trabalho, acarretem reduções salariais.
Ainda no que concerne ao acesso da mulher ao mercado de trabalho, e também sob o
influxo da Lei nº 9.799/1999, foi introduzida a disposição contida no art. 390-B, da CLT,
consoante a qual as vagas dos cursos de formação de mão de obra deverão ser oferecidas aos
2 Para uma melhor análise das medidas discriminatórias vide RUBERT, Maria Belén Cardona. Protección de la
trabajadora embarazada: tutela preventiva y tutela antidiscriminatoria. Pamplona:Aranzadi, 2002.
179
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
trabalhadores de ambos os sexos. A intenção do legislador foi a de garantir que tanto o acesso da
mulher ao mercado de trabalho se dará de forma igualitária, quanto a sua manutenção nesse
mercado atenderá ao princípio da igualdade, na medida em que o empregador não deverá utilizar
o fator sexo como critério determinante para escolher os trabalhadores que participarão dos
cursos de formação profissional. Em outras palavras, a legislação busca que a formação
profissional ocorra de forma igualitária.
Omitiu-se o legislador no art. 390-B quando não deixou dito que as vagas destinadas à
formação profissional deverão ser ofertadas, em caráter paritário, aos empregados de ambos os
sexos. Ao não dispor dessa forma, deixa margem para que a diferenciação ocorra no momento
em que o empregador vai distribuir o número de vagas entre os seus empregados, podendo
privilegiar mais homens do que mulheres.
No que concerne à proteção da maternidade, a CLT consagra, em seu art. 391, que nem o
fato de haver contraído matrimônio ou de se encontrar em estado de gravidez constitui motivo
justificador para o término do contrato de trabalho.
É sabido que, em razão da gravidez as condições físicas da mulher se alteram, de sorte
que poderá ficar impossibilitada para a prática de determinadas atribuições inerentes ao pacto de
emprego. No entanto, esse fato, por si só, não justifica a rescisão do vínculo empregatício. Ao
contrário, com vistas a permitir que a gravidez se desenvolva em condições seguras, bem com a
assegurar a manutenção do emprego da gestante, a CLT, no seu art. 392, parágrafo 4º, assegura à
mulher a transferência de função, quando exigido por condições de saúde, como também
considera como motivo de interrupção do contrato de trabalho o afastamento da trabalhadora
grávida para a realização de exames pré-natais por no mínimo 6 (seis) consultas médicas durante
o período de gravidez. Na situação de transferência de função, fica assegurado à mãe o direito de
voltar a ocupar a função anteriormente exercida logo após o seu retorno ao trabalho.
A licença maternidade privilegia não apenas a mãe biológica, como também a mãe
adotiva e a que obtém guarda judicial, nos termos do art. 392-A, da CLT, introduzido pela Lei nº
10.421, de 15 de abril de 2002. Esse benefício é assegurado também à mulher em caso de aborto
não criminoso, atestado por médico oficial. Nessa hipótese, a trabalhadora terá direito a um
repouso remunerado de 2 (duas) semana.
Com respeito ao prazo de licença maternidade, tanto a Constituição, quanto a CLT,
asseguram o prazo de 120 (cento e vinte) dias, que poderá ocorrer entre o 28º(vigésimo oitavo)
180
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
dia antes do parto e a sua ocorrência. Cumpre salientar que, de acordo com a Lei nº 11.770/2008,
esse prazo foi ampliado, em caráter facultativo, para 6 (seis) meses. As empresas que optarem
pela ampliação terão incentivos fiscais consistente na dedução integral do imposto de renda do
valor correspondentes aos 60 (sessentas) dias de remuneração pagos ao empregador.
Cumpre destacar que a dedução de imposto que beneficiará o empregador se limita ao
período de acréscimo, porque, no âmbito do atual ordenamento jurídico brasileiro, o valor pago
pela empresa à trabalhadora durante o seu período de licença maternidade é compensado com os
recolhimentos previdenciários feitos à Previdência Social (arts. 72 e 73, da Lei nº 8.213/91 com a
redação dada pela Lei nº 10.719/2003), de sorte que, em última análise, quem paga a licença
maternidade é o próprio Instituto de Previdência Social (INSS), o que a caracteriza como
benefício previdenciário.
Torna-se relevante a inserção desta licença analisada no rol dos benefícios
previdenciários, posto que, transferir tal encargo para o empregador poderia implicar em uma
discriminação contra a mulher no mercado de trabalho, o que afrontaria o art. 5º, I, da
Constituição e, por conseguinte, poderia restringir a contratação de trabalhadoras (Barros, 2006,
p. 1063).
Há que se salientar que o estado gravídico autoriza a gestante a romper o contrato de
trabalho, mediante atestado médico e comprovação de que seja prejudicial à gravidez (art. 394,
CLT), assegurando, nesse caso, a mulher a dispensa da concessão do aviso prévio ao empregador
(Carrion, 2006, p. 268).
Ante o exposto, vê-se que, apesar da disposição contida no art. 7º, XXX, da Constituição
vigente, segundo o qual a proteção do mercado de trabalho da mulher deve ser feita por meio de
lei própria, não existe uma intenção legislativa de elaboração desse diploma legal.
Por essa razão, desde a entrada em vigor do novo ordenamento constitucional até a
presente data, várias Leis foram promulgadas, ora revogando dispositivos celetistas, ora
introduzindo novos artigos no texto da CLT. Apesar disso, observa-se que persistem algumas
incoerências no corpo do citado capítulo da CLT.
181
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Nesse sentido, são desnecessários o art. 381, parágrafo 1º e 2º (que dispõe acerca do
trabalho noturno), porque as previsões desse dispositivo são as mesmas contidas no art. 73,
parágrafos 1º e 2º. Pode ser suprimido também o art. 389, I a IV, que trata das medidas de
higienização, instalação de bebedouros, vestiários e fornecimento de equipamentos de proteção
individual, ora porque já foram disciplinadas nos art. 166 e 175 a 178 ou por ficarem mais
adequadas no capítulo referente às medidas de higiene e segurança no trabalho, que são
instituídas para ambos os sexos.
Outras normas que podem ser suprimidas são as constantes dos arts. 382 (intervalo entre
duas jornadas), 383 (intervalo para refeição), 385 (descanso semanal) e 386 (escala de
revezamento), porque tais disposições já constam dos arts. 66, 67, 68, 70 e 71, da CLT.
Já que o legislador infraconstitucional optou pela dinâmica de promover a adequação das
normas da CLT que tratam do trabalho da mulher, mister se faz uma última revisão da norma
consolidada, a fim de que haja uma perfeita harmonia entre os preceitos analisados e o contido
no art. 7º, XXX, da atual Constituição Brasileira.
Conclusões
182
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Referências bibliográficas
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COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
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184
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
RESUMO:
1
TEODORO, Maria Cecília Máximo. Pós-Doutora em Direito do Trabalho pela Universidad Castilla La-
Mancha, com bolsa de pesquisa da Capes; Doutora em Direito do Trabalho e da Seguridade Social pela USP;
Mestre em Direito do Trabalho pela PUC/MG; Professora do Mestrado e da Graduação da PUC/MG.
2
SOUZA, Miriam Parreiras de. Mestranda em Direito do Trabalho pela PUC/MG. Professora de Direito do
Trabalho e Processo do Trabalho. Advogada.
185
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
ABSTRACT:
This paper will address the legal treatment given to domestic workers focusing on a new
interpretation, seeking to justify the possibility of assimilation of legal work with other
employees. Initially we will analyze the historical evolution of domestic work, pointing out
the discriminatory character that comes from their origin. Then we will study some of the
mechanisms and principles of constitutional interpretation, proving the possibility of legally
interpret the law applicable to the employment relationship differently from domestic
restrictive interpretation which is usually held in your loss. At this point, it will be shown that
the law governing the employee is merely symbolic, as theory developed by Kindermann.
Moreover, it will be shown that it is possible to take a fresh look legal on this particular type
of employment relationship, through new techniques of interpretation raised and also using
the theory of the open society of Peter Haberle. At the end you will be offered through new
techniques of interpretation, even before the law now in force, the domestic employee can be
equated to the other, with respect to their rights justrabalhistas. It will be demonstrated that
although there is already several such attempts, there is no need for a change in rules to be
assured that all domestic workers rights, on an equal footing with other workers, ensuring
thereby the equality and dignity of worker.
1 INTRODUÇÃO.
186
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
3
BÍBLIA, tradução ecumênica. Lucas, 10:38-42. São Paulo: Paulinas, 2002.
187
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
perante o seu esposo e do escravo perante o seu senhor. Verifica-se, com isso, que
culturalmente o doméstico está relacionado como uma classe inferior da sociedade.
Na Roma antiga, a lógica do trabalho escravo permaneceu incólume, mas nessa fase
histórica, a escravidão não era considerada uma forma de exploração ou um caminho para
melhor acumulação de riqueza, mas um elemento essencial para à sociedade. Contudo,
existia a possibilidade de os escravos se libertarem e começarem a trabalhar de forma livre.
Como agradecimento pela sua libertação, os libertos prestavam serviços para os seus antigos
donos e repassavam-lhes parte do valor recebido pelos serviços prestados a terceiros. Uma
das formas de prestação desses serviços era em âmbito doméstico4.
No âmbito doméstico, apesar de o direito Romano ser uma fonte essencial para o
desenvolvimento de noção de trabalho juridicamente protegido e, ser inegável o avanço da
proteção ao trabalhador dessa época, o trabalho doméstico não foi objeto de qualquer
regulamentação.
Mais uma vez é possível verificar o tratamento degradante e humilhante que sempre
foi conferido ao doméstico. Mesmo tendo início um pensamento protetor dos trabalhadores
por parte do Estado, na Roma antiga, o empregado doméstico sequer foi considerado como
possível destinatário de qualquer norma de proteção.
No século XVII, havia várias pessoas que faziam serviços domésticos, como aias,
despenseiros, amas, amas de leite, amas-secas, cozinheiros, secretários, criados, damas de
companhia5.
Após esse período, o trabalho doméstico continuou presente em todos os tipos de
sociedade, até a contemporânea, sendo sempre caracterizado pelo trabalho prestado em
âmbito doméstico sem finalidade lucrativa por parte do empregador. Contudo, a tutela desse
trabalhador, apesar de ter passado por uma certa evolução, não é plenamente eficaz,
conforme será demonstrado a seguir.
No Brasil, surpreendentemente, as Ordenações Filipinas de 1603 trazem diversas
regulamentações para o trabalho doméstico. No início do século XVII, a atividade em torno
do lar era preponderante, com as pessoas mais abastadas contando com numerosos séquitos
de escudeiros, estribeiros, aias, despenseiros, amas, cozinheiros, e não raros secretários e
contadores6.
4
LIMA, Oliveira. A História da Civilização. São Paulo: Melhoramentos, 1922, p. 22.
5
MARTINS, Sérgio Pinto. Manual do Trabalho Doméstico. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 1.
6
PRUNES, José Luiz Ferreira. Contrato de trabalho doméstico e trabalho a domicílio. São Paulo: Juruá,
1995, p. 18.
188
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
A atividade pastoril e agrícola era de tal forma unida ao consumo das populosas casas
que se tornava difícil avaliar qual era o limite da vida privada e doméstica, e da produção de
frutos da terra para o comércio7.
Contudo, aquela minuciosa legislação lusitana não foi observada no Brasil. A
extensão do país, as imensas áreas de muitas propriedades, o isolamento das fazendas e das
lavouras e, principalmente, a estrutura familiar que traduzia grande dependência e
subordinação dos empregados, não permitiu qualquer atenção à referida passagem legal8.
Antes de 1888, o trabalho doméstico no Brasil era exercido preponderantemente por
escravos de origem africana. Por essa razão afirma-se que no Brasil a origem do trabalho
doméstico é nitidamente escravocrata.
Os portugueses traziam os negros africanos de suas colônias na África para utilizar
como mão de obra nos engenhos de açúcar e em minas de ouro. Junto com os escravos
homens, eram traficadas também escravas mulheres, para serem utilizadas nos trabalhos
domésticos, servindo aos senhores que as compravam.
Somente após a abolição da escravatura em 1888 é que começaram as primeiras
manifestações do Direito do Trabalho, de forma ainda tímida, com contornos típicos do
pensamento hegemônico do liberalismo da época.
Mesmo com a abolição da escravatura, as escravas que exerciam a função doméstica
não saíam da casa dos senhores, pois preferiam permanecer como domésticas e ter em troca
um lugar para comer e dormir, ao invés de enfrentar uma sociedade cheia de preconceitos.
Martins ressalta que “[...] com a abolição da escravatura, muitas pessoas que eram
escravas continuaram nas fazendas, em troca de local para dormir e comida, porém na
condição de empregadas domésticas”9.
No decorrer de toda a história do Direito do Trabalho Brasileiro é fácil perceber que o
doméstico sempre assumiu uma posição inferiorizada, tendo em vista que nunca foi tutelado
pelo legislador e demais operadores do Direito com vistas a sua emancipação.
Prova disso nem mesmo a Constituição da República de 1988, considerada a carta
cidadã, conseguiu romper com o estigma discriminatório que acompanha o doméstico. No
artigo 7º, após um extenso rol de direitos sociais, o legislador constituinte cuidou de restringir
7
PRUNES, José Luiz Ferreira. Contrato de trabalho doméstico e trabalho a domicílio. São Paulo: Juruá,
1995, p. 18.
8
PRUNES, José Luiz Ferreira. Contrato de trabalho doméstico e trabalho a domicílio. São Paulo: Juruá,
1995, p. 18.
9
MARTINS, Sérgio Pinto. Manual do Trabalho Doméstico. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 2.
189
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
3 A INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL.
Daí surge à função do intérprete da lei. Ele é responsável por extrair da norma a
solução para o caso concreto que lhe for apresentado. Para isso, não basta apenas aplicar o
texto positivado diante do caso analisado. É necessário um processo intelectivo que leva à
realização do Direito.
10
SILVA JÚNIOR. Arnaldo. A legislação aparente na construção de uma constitucionalização simbólica.
2011. p. 3. Disponível em: <http://www.ribeirosilva.com.br/content/pdf/1410201171346.pdf>. Acesso em 30
jan. 2013.
190
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Luís Roberto Barroso11 ensina que três conceitos são marcos desse processo. A
hermenêutica jurídica, que é responsável pelo estudo e sistematização dos princípios e regras
de interpretação e aplicação do direito. A interpretação, como uma atividade prática de
revelar o conteúdo, o significado e o alcance de uma norma, tendo por finalidade fazê-la
incidir no caso concreto; e a aplicação da norma, que é o momento final do processo
interpretativo, através do qual se dá a efetiva incidência da norma sobre a realidade do fato.
No caso do empregado doméstico, atualmente a legislação que o rege encontra-se
fundamentada no art. 7º, parágrafo único, da Constituição da República de 1988. Por essa
razão, para dirimir os conflitos que envolvem esse tipo de trabalhador, exige-se, em primeiro
lugar, a realização de uma interpretação desse dispositivo constitucional.
11
BARROSO. Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática
constitucional transformadora. 6. ed. rev. atual. e amp. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 103.
12
TEODORO, Maria Cecília Máximo; DOMINGUES, Gustavo Magalhães de Paula Gonçalves. Adicionais de
Insalubridade e periculosidade: base de cálculo, cumulatividade e efeitos preventivos e pedagógicos. In: XX
ENCONTRO NACIONAL DO CONPEDI. 20.2011, Belo Horizonte: Anais do Recurso Eletrônico do XX
Encontro Nacional do Conpedi. Florianópolis: Fundação Boiteaux, 2011, p. 3.270.
13
NEVES, Marcelo. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 50.
191
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Temos que produzir a verdade como, afinal de contas, temos de produzir riquezas.
E, de outro lado, somos igualmente submetidos à verdade, no sentido de que a
14
KINDERMANN, Harald. apud NEVES, Marcelo. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins
Fontes, 2007, p. 32
15
LOPES, Fernanda Ravazzano Azevedo. O conceito não revelado e as funções não declaradas da
ressocialização: a resposta garantista à manipulação da linguagem. 2009. 244fls. (Dissertação de Mestrado em
Direito). Universidade Federal da Bahia. Programa de Pós-Gradução em Direito Público, Bahia, 2009. p. 76.
Disponível em http://www.bibliotecadigital.ufba.br/tde_arquivos/17/TDE-2010-05-24T064553Z-
1652/Publico/FRavazzano%20seg.pdf. Acesso em 14 dez. 2012.
192
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
16
FOUCAULT, Michel. Em defesa da Sociedade. São Paulo: Martins Fontes, 2005, p. 29.
17
SILVA JÚNIOR. Arnaldo. A legislação aparente na construção de uma constitucionalização simbólica.
Disponível em <http://www.ribeirosilva.com.br/content/pdf/1410201171346.pdf>. Acesso em: 30 jan. 2013.
18
ARCELO, Adalberto Antônio Batista; GONTIJO, Lucas de Alvarenga. A Biopolítica nos Estados
Democráticos de Direito: a reprodução da subcidadania sob a égide da constitucionalização simbólica. Belo
Horizonte, 2011, p. 10.
193
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
aos direitos fundamentais desse trabalhador, enquanto não se produz uma alteração no texto
constitucional.
Inicialmente, convém destacar que a Constituição é composta por normas que
possuem várias peculiaridades. Para ser realizada uma interpretação constitucional eficaz,
primeiramente é necessário conhecê-las.
As normas constitucionais possuem superioridade jurídica no ordenamento positivado
de um Estado. É essa superioridade que confere o caráter paradigmático e subordinante de
todo o ordenamento, de sorte que nenhum ato jurídico pode subsistir validamente no âmbito
do Estado se contravier seu sentido19.
Além disso, as normas constitucionais possuem um caráter político. A propósito, a
Constituição materializa a tentativa de conversão do poder político em poder jurídico. Assim,
por mais técnica e apegada ao direito que possa e deva ser, a jurisdição constitucional jamais
se libertará de uma dimensão política. Com isso, não é possível neutralizar inteiramente a
interferência de fatores políticos na interpretação constitucional20.
A Constituição contém, ainda, uma força normativa que estimula e coordena as
relações entre os cidadãos e o Estado, e dentre eles. Ela possui, por si só, eficácia jurídica,
conforme atesta de modo expressivo a moderna doutrina da hermenêutica constitucional,
cujas teses são reiteradamente adotadas pela jurisprudência21.
Contudo, essa eficácia das normas constitucionais não se produz sem a cooperação da
vontade humana. Desse modo, os operadores do Direito devem caminhar de forma a alcançar
cada vez mais a concretização dos direitos fundamentais, conforme proposto por Konrad
Hesse já nos idos de 1959 e destacado, na doutrina pátria, por Paulo Bonavides22.
Hesse leciona que a interpretação constitucional tem significado decisivo para a
consolidação e preservação da força normativa da Constituição. Para ele, a interpretação
19
BARROSO. Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática
constitucional transformadora. 6. ed. rev. atual. e amp. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 107.
20
BARROSO. Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática
constitucional transformadora. 6. ed. rev. atual. e amp. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 110.
21
TEODORO, Maria Cecília Máximo; DOMINGUES, Gustavo Magalhães de Paula Gonçalves. Adicionais de
Insalubridade e periculosidade: base de cálculo, cumulatividade e efeitos preventivos e pedagógicos. In: XX
ENCONTRO NACIONAL DO CONPEDI. 20.2011, Belo Horizonte: Anais do Recurso Eletrônico do XX
Encontro Nacional do Conpedi. Florianópolis: Fundação Boiteaux, 2011, p. 3.270.
22
TEODORO, Maria Cecília Máximo; DOMINGUES, Gustavo Magalhães de Paula Gonçalves. Adicionais de
Insalubridade e periculosidade: base de cálculo, cumulatividade e efeitos preventivos e pedagógicos. In: XX
ENCONTRO NACIONAL DO CONPEDI. 20.2011, Belo Horizonte: Anais do Recurso Eletrônico do XX
Encontro Nacional do Conpedi. Florianópolis: Fundação Boiteaux, 2011, p. 3.270.
194
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
23
SOUZA, Josafá Jorge de. A força normativa da Constituição – Konrad Hesse (resenha). 2005, p. 1.
Disponível em: <http://www.viajus.com.br/viajus. php?pagina=artigos&id=350&idAreaSel=
16&seArt=yes>. Acesso em: 14 dez. 2012.
24
TEODORO, Maria Cecília Máximo; DOMINGUES, Gustavo Magalhães de Paula Gonçalves. Adicionais de
Insalubridade e periculosidade: base de cálculo, cumulatividade e efeitos preventivos e pedagógicos. In: XX
ENCONTRO NACIONAL DO CONPEDI. 20.2011, Belo Horizonte: Anais do Recurso Eletrônico do XX
Encontro Nacional do Conpedi. Florianópolis: Fundação Boiteaux, 2011, p. 3.270.
25
BARROSO. Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática
constitucional transformadora. 6. ed. rev. atual. e amp. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 103.
26
BARROSO. Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática
constitucional transformadora. 6. ed. rev. atual. e amp. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 104.
27
BARROSO. Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática
constitucional transformadora. 6. ed. rev. atual. e amp. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 124.
195
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
28
FERRARA, Francesco. Interpretação e aplicação das leis. Coimbra: Arménio Amado, 1987, p. 131.
29
BARROSO. Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática
constitucional transformadora. 6. ed. rev. atual. e amp. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 124.
30
BARROSO. Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática
constitucional transformadora. 6. ed. rev. atual. e amp. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 136.
31
Art 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I. Construir uma sociedade livre, justa e solidária.
196
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
as finalidades do Estado brasileiro, cuja consecução deve figurar como vetor interpretativo de
toda a atuação estatal.
Portanto, ao realizar a interpretação de qualquer texto legal ou constitucional, o
intérprete deve ter como ponto de partida o art. 3º, da Constituição.
Não existe, a rigor, nenhuma hierarquia predeterminada entre tais métodos de
interpretação, nem um critério rígido de desempate. A tradição romano-germânica, todavia,
desenvolveu algumas diretrizes32 que são úteis ao intérprete.
Em primeiro lugar, a atuação do intérprete deve conter-se sempre dentro dos limites e
possibilidades do texto legal. A interpretação gramatical não pode ser inteiramente
desprezada. Em segundo lugar, os métodos objetivos, como o sistemático e o teleológico, têm
preferência sobre o método tido como subjetivo, que é o histórico. A análise histórica
desempenha um papel secundário, suplementar na revelação do sentido da norma33.
Dada a diversidade da sociedade contemporânea e dos conflitos sociais, os métodos
clássicos de interpretação nem sempre conseguem extrair o melhor do direito do texto legal.
Com isso, vários estudos são realizados e novos critérios e princípios que orientam o
intérprete são criados a cada dia.
Saliente-se que os métodos clássicos não são desprezados pela doutrina moderna,
todavia, novas técnicas foram criadas para auxiliá-los no momento da interpretação
constitucional.
197
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
35
BARROSO. Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática
constitucional transformadora. 6. ed. rev. atual. e amp. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 161.
36
BARROSO. Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática
constitucional transformadora. 6. ed. rev. atual. e amp. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 164.
37
BARROSO. Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática
constitucional transformadora. 6. ed. rev. atual. e amp. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 164.
198
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
38
BARROSO. Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática
constitucional transformadora. 6. ed. rev. atual. e amp. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 178.
199
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
39
BARROSO. Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática
constitucional transformadora. 6. ed. rev. atual. e amp. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 189.
40
BARROSO. Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática
constitucional transformadora. 6. ed. rev. atual. e amp. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 189.
41
MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. 2. ed. Coimbra: Ed. Coimbra, 1983, p. 233.
200
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
a clara intenção do legislador, ou seja, para salvar a lei, não é admissível uma interpretação
contra legem.42
No caso do doméstico, esse tipo de interpretação é muito aplicável quando da análise
de seus direitos. Quando o legislador constituinte estende a esse trabalhador alguns direitos
específicos, a maioria deles possui uma lei infraconstitucional que a regula.
Tal legislação infraconstitucional, quando interpretada conforme a Constituição torna-
se completamente aplicável ao doméstico e permite que a ele seja assegurado vários direitos
que não poderiam ser a ele estendidos, caso não fosse usado esse método interpretativo.
Esse tipo de interpretação permite que o doméstico seja destinatário de direitos que
normalmente não lhe são assegurados pela doutrina majoritária e positivista. Tal
interpretação se coaduna com os objetivos do Estado Democrático de Direito Brasileiro
previstos no art. 3º da Carta Constitucional, acima mencionados.
42
BARROSO. Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática
constitucional transformadora. 6. ed. rev. atual. e amp. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 192.
43
BARROSO. Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática
constitucional transformadora. 6. ed. rev. atual. e amp. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 196.
201
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
44
BARROSO. Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática
constitucional transformadora. 6. ed. rev. atual. e amp. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 196.
45
SOUTO MAIOR, Jorge Luiz Souto. Curso de Direito do Trabalho: A relação de emprego. vol. II. São
Paulo: LTr, 2008, p. 261.
46
SOUTO MAIOR, Jorge Luiz Souto. Curso de Direito do Trabalho: A relação de emprego. vol. II. São
Paulo: LTr, 2008, p. 261.
202
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Além dos princípios que orientam o intérprete da Constituição, várias teorias foram
criadas pelos estudiosos da matéria para auxiliar no processo de interpretação. Nesse sentido
é a doutrina do alemão Peter Habërle, que desenvolveu a teoria da sociedade aberta.
Segundo essa doutrina, no processo de interpretação e aplicação da norma deve ser
levado em conta todos os potenciais atores sociais, participantes materiais do fenômeno
social, para aproximar a norma da realidade. Através dessa ampliação do rol dos participantes
no processo de interpretação é possível uma maior concretização da norma constitucional49.
Habërle busca garantir um acesso maior das classes menos favorecidas ao texto
constitucional, como meio de efetivação de decisões mais justas e soluções mais adequadas
aos problemas.
Condena o jurista, diante da constatação da insuficiência das técnicas tradicionais de
interpretação, uma hierarquização entre os intérpretes da Constituição e a defesa de que a
interpretação é função privativa estatal. Assim, todos aqueles que se submetem à
47
SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Curso de Direito do Trabalho: A relação de emprego. vol. II. São Paulo: LTr,
2008, p. 262.
48
SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Curso de Direito do Trabalho: A relação de emprego. vol. II. São Paulo: LTr,
2008, p. 261.
49
TEODORO, Maria Cecília Maximo. As cláusulas gerais concretizam a sociedade aberta de Peter Haberle.
Nov. 2009. Disponível em http://jus.com.br/revista/texto/14309/as-clausulas-gerais-concretizam-a-sociedade-
aberta-de-peter-haberle. Acesso em 20 jan. 2013.
203
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Diante do que foi até aqui exposto, é possível perceber que o doméstico é um
trabalhador discriminado e que o tratamento que lhe é conferido pela legislação, pela doutrina
e pela jurisprudência majoritárias não condiz com os objetivos e os princípios de um Estado
Democrático de Direito.
A ampliação dos direitos dos domésticos é uma medida que deve ser adotada com
urgência. Para isso, não é necessária qualquer alteração legal, bastando tão somente uma
interpretação constitucional voltada para a questão social, tão cara ao Direito do Trabalho.
Neste capítulo, será defendida a equiparação de seus direitos com os direitos dos
típicos empregados e serão demonstradas as formas pelas quais ela pode ser alcançada. Nesse
viés, já existem normas internacionais que estabelecem a igualdade de direitos dos
empregados domésticos e, no cenário nacional, projetos estão em andamento no Congresso
Nacional na tentativa de fazer ingressar, no ordenamento jurídico positivado, normas mais
benéficas a esse trabalhador.
Considerando tudo o que foi exposto ao longo deste trabalho, não restam dúvidas de
que o doméstico é um trabalhador altamente discriminado. Para romper com essa
50
MENDES, Gilmar; VALE, André Rufino do. A influência do pensamento de Peter Haberle no STF. Abril
2009. Disponível em http://www.conjur.com.br/2009-abr-10/pensamento-peter-haberle-jurisprudencia-
supremo-tribunal-federal. Acesso em 20 jan. 2013.
204
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
discriminação, o operador do Direito deve assumir uma postura mais ativa, que atenda aos
preceitos dos direitos humanos fundamentais, cerne de toda a principiologia e dos objetivos
do Direito do Trabalho.
Para isso, é preciso o uso de novos métodos de interpretação das normas, lastreados
no juízo crítico, na pré-compreensão e no uso da argumentação51.
Com o uso de tais métodos, é possível reinterpretar o art. 7º, parágrafo único, da
Constituição de 1988, a Lei nº 5.859/72 e os entendimentos doutrinários e jurisprudenciais
atinentes ao direito dos domésticos, conforme já exposto.
Entretanto, não obstante ser possível essa interpretação, infelizmente tal orientação
não é a adotada pela maioria da doutrina e da jurisprudência. Em razão do direito positivado,
o doméstico fica à mercê de um tratamento discriminatório e é relegado a uma condição de
inferioridade, que é refletida na sua vida pessoal e na sociedade.
Atentando-se para tal problemática, atualmente crescem as tentativas de inserir no
ordenamento jurídico normas expressas, que melhorem as condições de trabalho do
empregado doméstico. Em âmbito internacional, foi aprovada a Convenção 189, da OIT
(Organização Internacional do Trabalho), que equipara os direitos do doméstico aos dos
demais empregados.
No Brasil, antes mesmo da aprovação da Convenção Internacional citada, já estava
em andamento, no Congresso Nacional, o Projeto de Emenda Constitucional nº 478/2012 que
possui o mesmo objetivo de equiparar os direitos dos domésticos àqueles assegurados aos
típicos empregados.
De fato, a equiparação dos direitos do empregado doméstico com os dos demais
empregados é uma medida imprescindível, para fins de sedimentar o entendimento protetivo,
tão caro ao Direito do Trabalho, e assegurar a esse trabalhador o patamar mínimo de
dignidade, de forma positivada.
51
LOPES, Fernanda Ravazzano Azevedo. O conceito não revelado e as funções não declaradas da
ressocialização: a resposta garantista à manipulação da linguagem. 2009. 244fls. (Dissertação de Mestrado em
Direito). Universidade Federal da Bahia. Programa de Pós-Gradução em Direito Público, Bahia, 2009.
Disponível em: <http://www.bibliotecadigital.ufba.br/tde_arquivos/17/TDE-2010-05-24T064553Z-
1652/Publico/FRavazzano%20seg.pdf>. Acesso em: 14 dez. 2012.
205
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
52
ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Passos para a ratificação da convenção nº 189
sobre as trabalhadoras e os trabalhadores domésticos. Notas OIT – O Trabalho Doméstico na América
Latina e Caribe. 2011. Disponível em:< http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/topic
gender/pub/notas_oit_%208_797.pdf>. Acesso em: 14 dez. 2012.
206
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Não decorreu muito tempo para que a referida Convenção fosse ratificada por outro
país. Dessa feita, em 05 de setembro de 2012, as Filipinas foram o segundo país a ratificar a
Convenção sobre o trabalho doméstico.
Assim, essa Convenção, a primeira norma mundial dirigida aos trabalhadores
domésticos, entrará em vigor em doze meses, ou seja, em 05 de setembro de 2013, ficando
aberta aos outros Estados Membros para que efetuem a ratificação e, assim, aumente sua
abrangência no cenário internacional, favorecendo o maior número de trabalhadores
domésticos possível.
A referida Convenção foi assinada pelo Brasil em Genebra. Contudo, até a presente
data, não foi ratificada.
O início desse processo de ratificação é realizado por meio do envio de um projeto de
lei ao Congresso Nacional por parte do Poder Executivo. No Brasil, projetos dessa natureza
são conduzidos pelos Ministérios do Trabalho e das Relações Exteriores. Atualmente, o
Ministério do Trabalho e Emprego brasileiro já iniciou os estudos para a ratificação da
Convenção 189 da OIT, mas ainda não enviou o projeto de emenda constitucional ao Poder
Legislativo53.
Antes de ser assinada a Convenção na OIT, o Brasil já estava tomando providências
para estender aos domésticos os direitos trabalhistas assegurados aos demais empregados.
De autoria da Deputada Benedita Barbosa (ex-empregada doméstica), o Projeto de
Emenda Constitucional nº 478/2012 tramita no Congresso Nacional desde 14 de abril de
2010. O referido projeto visa revogar o parágrafo único do art. 7º da Constituição da
República de 1988, para estabelecer a igualdade de direitos trabalhistas entre os empregados
domésticos e os demais trabalhadores urbanos e rurais.
Após ser aprovada pelas comissões da Câmara dos Deputados, em 04 de dezembro de
2012, a referida PEC (Projeto de Emenda Constitucional) também foi aprovada no segundo
turno de votação pelo Plenário da casa, sendo remetida ao Senado Federal em 13 de
dezembro de 201254, onde também deveria ser aprovada em dois turnos para, depois, ser
enviado ao chefe do Poder Executivo para sanção ou veto. Só depois de findo todo esse
processo legislativo é que a equiparação dos direitos dos domésticos será introduzida no
53
ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Passos para a ratificação da convenção nº 189
sobre as trabalhadoras e os trabalhadores domésticos. Notas OIT – O Trabalho Doméstico na América
Latina e Caribe. 2011. Disponível em:
<http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/topicgender/pub/notas_oit_%208_797.pdf>. Acesso em: 14 dez.
2012.
54
BRASÍLIA. Câmara dos Deputados. Projetos de Lei e outras preposições: PEC 478/2010. Disponível em: <
http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposica=47349
6>. Acesso em: 14 dez. 2012.
207
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
208
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
209
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
REFERÊNCIAS
BRASÍLIA. Câmara dos Deputados. Projetos de Lei e outras preposições: PEC 478/2010.
Disponível em:
<http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposica=473496>.
Acesso em: 14 dez. 2012.
FOUCAULT, Michel. Em defesa da Sociedade. São Paulo: Martins Fontes, 2005, p. 29.
LIMA, Oliveira. A História da Civilização. São Paulo: Melhoramentos, 1922, 148p.
MARTINS, Sérgio Pinto. Manual do Trabalho Doméstico. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2009,
154p.
MENDES, Gilmar; VALE, André Rufino do. A influência do pensamento de Peter Haberle
no STF. Abril 2009. Disponível em http://www.conjur.com.br/2009-abr-10/pensamento-
peter-haberle-jurisprudencia-supremo-tribunal-federal. Acesso em 20 jan. 2013.
MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. 2. ed. Coimbra: Ed. Coimbra, 1983,
457p.
OLIVEIRA. Fábio Corrêa Souza. Por uma teoria dos princípios: o princípio constitucional
da razoabilidade. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, 376p.
210
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/topicgender/pub/notas_oit_%208_797.pdf>.
Acesso em: 14 dez. 2012.
PRUNES, José Luiz Ferreira. Contrato de trabalho doméstico e trabalho a domicílio. São
Paulo: Juruá, 1995, 97p.
SOUTO MAIOR, Jorge Luiz Souto. Curso de Direito do Trabalho: A relação de emprego.
vol. II. São Paulo: LTr, 2008, 436p.
SOUZA, Josafá Jorge de. A força normativa da Constituição – Konrad Hesse (resenha).
2005, p. 1. Disponível em: <http://www.viajus.com.br/viajus.
php?pagina=artigos&id=350&idAreaSel=16&seArt=yes>. Acesso em: 14 dez. 2012.
211
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
ABSTRACT: This work deals with the study of the Constitutional Stability of pregnant
women, its application in the form of employment relationship, as well as the institute
of abuse of power of law, brought by the Civil Code of 2002, both against the
constitutional principles of legality and human dignity. Since the confirmation of
pregnancy, up to five months after birth, the pregnant employee has her employment
guaranteed, and should be reinstated in employment in case of arbitrary dismissal, or
be compensated in specific cases. Seeking merely to indemnification, and to avoid
reintegration, many employees, relying in the two years prescription time limit
provided in Article 7, XXIX of the Constitution, have distributed their shares only after
1
advogado, Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUC PR,
Mestrando em Direito Empresarial e Cidadania pelo Centro Universitário Curitiba – UNICURITIBA.
2
advogado, Mestrando em Direito Empresarial e Cidadania pelo Centro Universitário Curitiba –UNICURITIBA.
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the stability period, when there are no more possibilities of reinstatement. The job
guarantee comes from the employment relationship that establishes rights and
obligations for both parties involved, employee and employer. In so doing, the
employer becomes restricted from the possibility of having the work done, having yet
to remunerate the employee. It is Stressed that this right and/or duty is implicit in the
employment relationship. This work invites the reader to ponder about the conflicts
on the topic and search for "just" solutions regarding the practice, or not, of the abuse
of the right of job stability of pregnant women whom, once dismissed, formalize
grievance only after the end of the stability term.
KEYWORDS: pregnant; stability; abuse; legality; human dignity; constitutional law;
labor law.
1 INTRODUÇÃO
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3 PRINCÍPIOS EM DESTAQUE
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4 A GARANTIA NO EMPREGO
No mesmo ano, a lei 5.109 estendeu tal benefício aos empregados das
empresas de navegação marítima ou fluvial. Em 1930, com o decreto 20.465, aos
empregados das empresas de transportes urbanos, luz, força, telefone, telégrafos,
portos, água e esgoto e em 1934, decreto 24.615, aos bancários com dois anos de
trabalho para o mesmo empregador.
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Art. 10 - Até que seja promulgada a lei complementar a que se refere o Art.
7º, I, da Constituição:
II - fica vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa:
b) da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco
meses após o parto.
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[...].
Reza o Código Civil, em seu artigo 187, que “também comete ato ilícito o
titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos
pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé e pelos bons costumes”.
O Código Civil de 2002 acrescenta elementos valorativos ao direito, a fim de
compreendermos o direito de modo aberto. A avaliação do abuso do direito passou a
observar se, ao exercer o direito, o seu titular excedeu a finalidade econômica e/ou
social do bem, os bons costumes, a boa-fé, dentre outras cláusulas gerais que
demandam valoração.
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A Consolidação das Leis do Trabalho, em seu artigo 8º, parágrafo único, reza
que “o direito comum será fonte subsidiária do direito do trabalho, naquilo em que
não for incompatível com os princípios fundamentais deste”.
Entende-se por direito comum qualquer ramo do direito vigente, quando
aplicável ao caso em questão.
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7 CONCLUSÃO
A garantia prevista no art. 10, inciso II, letra " b " , do ADCT da Constituição,
tem por objetivo, seja direto ou indireto, a proteção da maternidade e do nascituro,
no sentido de garantir à empregada gestante a manutenção do emprego e com isso
assegurando-lhe o salário e o direito de cuidar do filho nos primeiros meses de vida.
Impedindo a dispensa sem justa causa da empregada gestante, também se
evita a discriminação da mulher em razão da gravidez, evitando-se, assim, que
encontre dificuldades para a sua recolocação no mercado laboral.
O direito constitucional previsto no artigo 10, inciso II, alínea “b” do ADCT
vigente, não pode ter sua finalidade social desviada, ou seja, não deve ser objeto de
abuso.
De um lado, o comportamento da empregada gestante, ao propor demanda
trabalhista em face do empregador apenas após o termino do período estabilitário,
ou após o término do período em que se possa realizar a reintegração, demonstra
evidente e inaceitável má-fé e abuso no exercício do direito de garantia ao emprego.
Tal ato poderia tolher-lhe o direito à indenização, com fulcro no princípio da
legalidade. Porém, sob o viés do princípio da dignidade da pessoa humana, cabe ao
empregador indenizar o empregado a fim de garantir ao nascituro o direito à uma
vida digna. Posicionamento puramente altruísta, ainda que em respeito ao princípio
da boa-fé e à função social do contrato.
É certo que, passados 25 anos da promulgação da Constituição da República
Federativa do Brasil, ainda não há normas prevendo garantias e estabilidades que
se possa entender como corretas.
Conforme aduz Vladimir de Oliveira Silveira, “a Constituição Federal de 1988
estabeleceu logo no início, propriamente no artigo 1°, incisos III e IV, que a
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REFERÊNCIAS
AMARAL, Francisco. Direito Civil, Introdução. 6ª. Ed. Rio de Janeiro: Renovar,
2006.
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BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 6. ed. São Paulo: Ltr,
2010.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 8. ed. São Paulo: Saraiva,
1994.
IHERING, Rudolf Von. A luta pelo direito. Rio de Janeiro: Forense, 1992.
MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. 26. ed. São Paulo: Atlas S.A., 2010.
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho. 25. ed. São Paulo:
Saraiva, 2010.
SEN, Amartya. A ideia de justiça. 1ª ed. São Paulo - SP: Companhia das Letras
editora, 2012.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: parte geral. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003.
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Resumo
O presente paper tem por escopo o estudo da intimidade e vida privada do empregado em
face do poder diretivo do empregador, especificamente no que concerne às limitações
constitucionais vez que a Constituição Federal de 1988 reconhece expressamente o princípio
da dignidade da pessoa humana. O tema objeto de estudo foi escolhido devido à sua
relevância no mundo hodierno, uma vez que envolve a relação estabelecida entre o
empregado e o empregador, em que cada qual conserva direitos e deveres, devendo-se,
portanto, investigar quais os limites a serem obedecidos em tal relação, para que o
ordenamento jurídico seja devidamente observado e seja alcançada a harmonia no ambiente
de trabalho.
Palavras-Chave: Intimidade e privacidade; Relação laboral; Dignidade; Proporcionalidade;
Ambiente de trabalho.
Abstract
The current article’s scope is to study the intimacy and private life of the employee, taking
into consideration the employer’s directive power, specifically about reviewing the
constitutional limits since the Federal Constitution of 1988 expressly recognizes the principle
of human dignity. The subject studied was chosen due to its importance in the modern world,
once it involves the established relation between the employee and the employer, both having
rights and obligations, therefore it’s necessary to investigate which are the boundaries and
limits needed in that relation in order the legal system will be correctly observed and obtained
the harmony in the labour environment.
Keywords: Intimacy and privacy; Labour relationship; Dignity; Proportionality; Labour
environment.
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Introdução.
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O leque de direitos fundamentais nas relações de trabalho é por demais bem amplo,
pois abrange não somente o princípio da dignidade da pessoa humana, mas também outros
tais como: o da proibição do trabalho escravo (ou trabalho forçado); o respeito à honra; o
respeito à imagem; o direito à livre manifestação do pensamento dentre outros.
Para RUIZ MIGUEL (1995, p. 44) a intimidade pode ser vista sob três dimensões:
como fenômeno (fator socioeconômico), como ideia (fator cultural) e como direito (fator
político-jurídico).
O direito à intimidade encontra-se previsto em nosso ordenamento no art. 5º, inciso
X, da Constituição Federal estando, por conseguinte no mais alto escalão das normas
constitucionais, sendo em verdade uma das cláusulas pétreas. Pertence aos direitos relativos
a integridade moral que compõe o direito da personalidade (BACELLAR, 2003, p. 60).
A personalidade é direito básico que se estende a todos os homens de forma perpétua
e permanente, conferido não só pelo ordenamento civil mas sobretudo guindado aos direitos
constitucionais, sendo que não se pode conceber a existência de um homem que não tenha
direito à vida, à liberdade física ou intelectual, ao seu nome, ao seu corpo, à sua imagem, à
honra (BACELLAR, 2003, p. 60).
O direito à intimidade consiste no direito que toda pessoa tem de se resguardar dos
sentidos alheios, ou seja, o direito de salvaguardar os aspectos íntimos de sua vida
abrangendo a proteção da vida pessoal e familiar e à intimidade do lar dos indivíduos
(BACELLAR, 2003, p. 60).
A intimidade é um direito da personalidade do indivíduo e, portanto, direito do
trabalhador no âmbito da relação de emprego. Proteger a vida privada significa assegurar
proteção a certos aspectos da vida íntima da pessoa, que tem o direito de resguardá-los da
intromissão de terceiros. Trata-se de um direito negativo, no sentido de excluir do
conhecimento de outrem aquilo que só à própria pessoa diz respeito. Reservar seus assuntos
íntimos só para si: eis, em resumo, a expressão do direito à intimidade, que se revela na
vedação do acesso de estranhos ao domínio do confidencial. Como direito da personalidade,
imiscui-se na integridade da pessoa, que não abrange apenas a dimensão antropológica e
física, mas reveste também conteúdos psíquicos, morais, mentais e éticos (LOBO; LEITE,
1989, p. 36).
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Nesse sentido, ROMITA (2005, p. 258) preleciona que a tendência atual revelada
pelo direito do trabalho brasileiro leva a distinguir entre a atividade do trabalhador, enquanto
tal, e o próprio prestador de serviços, enquanto pessoa. Os atributos da personalidade,
relacionados com o segundo tópico, tornam-se credores de proteção que, embora não
mereçam atenção especial do legislador, encontram na doutrina e na jurisprudência
tratamento específico.
Assim, para BARROS (1997, p. 32) embora o Direito do Trabalho não faça menção
aos direitos à intimidade e à privacidade, por constituírem espécies dos direitos da
personalidade consagrados na Constituição Federal são oponíveis contra o empregador,
devendo ser respeitados, independentemente de encontrar-se o titular desses direitos dentro
do estabelecimento empresarial. É que a inserção do obreiro no processo produtivo não lhe
retira os direitos da personalidade, cujo exercício pressupõe liberdades civis.
Acontece que a mesma Constituição assegura o direito de propriedade; logo, no
ambiente de trabalho, o direito à intimidade sofre limitações, as quais não poderão,
entretanto, ferir a dignidade da pessoa humana (BARROS, 1997, pp. 32-33) .
Não é o fato de um empregado encontrar-se subordinado ao empregador ou de deter
este último o poder diretivo que irá justificar a ineficácia da tutela à intimidade no local de
trabalho, do contrário, haveria degeneração da subordinação jurídica em um estado de
sujeição do empregado. O contrato de trabalho não poderá constituir um título legitimador
de recortes no exercício dos direitos fundamentais assegurados ao empregado como
cidadão; essa condição não deverá ser afetada quando o empregado se insere no organismo
empresarial, admitindo-se, apenas, sejam modulados os direitos fundamentais na medida
imprescindível do correto desenvolvimento da atividade produtiva (RUIZ MIGUEL, 1995,
p. 185).
Quanto ao controle da atuação desenvolvida pelo empregado na execução de suas
tarefas, merecem estudo: a) os procedimentos utilizados para controlar o trabalho, como
buscas pessoais, buscas em objetos do empregado, veículos ou em espaços a ele reservados,
instrumentos visuais, instrumentos auditivos; 1 b) controle de objetos, fotos, enfeites que se
colocam no escritório, ao redor do empregado; c) serviços de polícia privada; d) limites
estabelecidos para ir ao toillete ou para chamadas telefônicas; e) imposição de exames
1
De acordo com o disposto no art. 373-A da Consolidação das Leis do Trabalho (acrescentado pela Lei n°
9.799, de 26.5.1999), inciso VI, é vedado ao empregador proceder a buscas pessoais íntimas nos empregados
ou funcionários. São ressalvadas certas especificidades estabelecidas nos acordos trabalhistas. Portanto,
quando se tratar de trabalhadores do sexo feminino, a busca pessoal só será lícita em casos específicos,
mediante prévio ajuste (convenção coletiva de trabalho, acordo coletivo ou contrato individual de trabalho).
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porque todo direito é efeito de fato jurídico; todo fato jurídico supõe suporte
fáctico. No suporte fático está o elemento ‘intimidade’; se A consentiu em que lhe
devassasse a vida privada, a intimidade deixou de existir: o consentimento atuou
como pré-excludente.
Por fim, a intimidade poderá cessar quando em confronto com outro direito mais alto
ou da mesma hierarquia que posto em confronto deva prevalecer, no caso prático, o outro
direito confrontante, pois como já foi dito não existe direito absoluto, ou seja, sempre que
um interesse maior surgir deverá se quedar o interesse de menor proporção, como por
exemplo, um empregado que por ter conhecimento da estratégia da empresa e das atividades
bancárias do empregador viola o dever de sigilo sobre as operações das sociedades por
ações, sobretudo das companhias abertas, aproveitando para auferir vantagens para si ou
para outrem, caracterizando a prática do insider trading; 2 deverá o sócio, com base em seu
2
Em termos puramente doutrinários ignorando-se, portanto a legislação vigente em cada país, insider, em
relação a determinada companhia, é toda a pessoa que, em virtude de fatos circunstanciais, tem acesso a
informações relevantes relativas aos negócios e situação da companhia. Informações relevantes,
doutrinariamente, são aquelas que podem influir de modo ponderável na cotação dos valores mobiliários de
emissão da companhia, afetando a decisão dos investidores de vender, comprar ou reter esses valores. O
Direito Brasileiro, por ora, ainda não definiu expressamente o que seja insider. No entanto, a Lei nº 6.404/76,
nos arts. 155 e 157, combinados com 145, 160 e 165, ao tratar dos deveres de lealdade e de prestar
informações, por parte dos administradores e pessoas a eles equiparados, implicitamente emitiu o conceito de
insider. Da mesma forma procedeu a Lei nº 6.385/76, quando estabeleceu que a CVM expedirá normas,
aplicáveis à companhia aberta, sobre informações que devem ser prestadas por administradores e acionistas
controladores. Com efeito, do texto de tais dispositivos legais pode-se concluir, sem qualquer dúvida, que o
legislador brasileiro admitiu como insider, nos termos da definição doutrinária de início enunciada, as
seguintes pessoas que, em razão de sua posição, têm acesso a informações capazes de influir de modo
ponderável na cotação dos valores mobiliários de emissão da companhia: 1) administradores – conselheiros e
diretores da companhia (art. 145 da Lei nº 6.404/76); 2) membros de quaisquer órgãos, criados pelo estatuto da
companhia, com funções técnicas ou destinadas a aconselhar os administradores (art. 160 da Lei nº 6.404/76);
3) membros do Conselho Fiscal (art. 165 da Lei nº 6404/76); 4) subordinados das pessoas acima referidas (§ 2º
do art. 155 da Lei nº 6.404/76); 5) terceiros de confiança dessas pessoas (§ 2º do art. 155 da Lei nº 6.404/76) e
6) acionistas controladores (art. 22, inciso V, da Lei nº 6.385/76). Informações Relevantes. Relativamente ao
conceito, adotado pelo Direito Brasileiro, do que sejam informações relevantes, acolheu ele idêntico conceito
ao doutrinário, indicado no início deste trabalho (item I.1), ou seja: informações relevantes são aquelas
referentes a fatos, ocorridos nos negócios da companhia, que possam influir, de modo ponderável, na decisão
dos investidores do mercado, de vender ou comprar valores mobiliários de sua emissão (art. 157, § 4º, da Lei
nº 6.404/76, combinado com o art. 155, § 1º). Divulgação de informações relevantes. Relativamente a
divulgação de "informações relevantes", adotou a Lei nº 6.404/76 o critério de obrigar os administradores e as
pessoas a ele equiparadas a divulgá-las prontamente – art. 157, § 4º (salvo expressa autorização em contrário
da CVM – art. 157, § 5º). Assim, o administrador (e pessoas a ele equiparadas: art. 145 – diretores e
conselheiros; art. 160 – membros de quaisquer órgãos com funções técnicas) são obrigados a revelar, além de
qualquer deliberação de Assembleia Geral ou dos órgãos de administração da companhia, qualquer fato
relevante, ocorrido nos negócios da companhia, que possa influir, de modo ponderável, na decisão dos
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direito de propriedade, comunicar a todos os acionistas imediatamente tal atitude sem que tal
ato possa ser impedido com base no direito à intimidade do empregado (BACELLAR, 2003,
p. 69).
investidores do mercado, de vender ou comprar valores mobiliários de sua emissão. Já a Lei nº 6.385/76,
demonstrando igual preocupação com o processo de divulgação da informação relevante, enunciou, em seu art.
22, inciso VI, competir à CVM expedir normas aplicáveis às companhias abertas sobre a divulgação de fatos
relevantes, ocorridos nos seus negócios, que possam influir, de modo ponderável, na decisão dos investidores
do mercado, de vender ou comprar valores mobiliários emitidos pela companhia. Lembre-se ainda que à CVM
cabe, nos termos do art. 8º, inciso III, da Lei nº 6.385/76, fiscalizar a veiculação de informações relativas ao
mercado, às pessoas que dele participem e aos valores nele negociados.
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Ainda BODIN DE MORAES (2003, p. 182) preleciona que o dano moral será
sempre o resultado de uma violação da cláusula geral de tutela da pessoa humana, da qual a
privacidade, cada vez mais identificada com a essência da personalidade, é expressão direta.
Nas hipóteses, nas quais se atinge a privacidade de pessoa ligada ao agressor por
relação de emprego, a demanda deverá ser ajuizada perante a Justiça do Trabalho. Esta é a
interpretação dominante para o preceito contido no art. 114 da Constituição Federal, que
estabelece a competência especializada para conciliar e julgar os dissídios individuais e
coletivos entre trabalhadores e empregadores [...] e, na forma da lei, outras controvérsias
decorrentes da relação de trabalho.
Para BELMONTE (2001, pp. 130 et seq.) a predominância desta tese não é apenas
doutrinária, já tendo se pronunciado a este respeito o Supremo Tribunal Federal, que
reconheceu a competência da Justiça do Trabalho para estes casos, não importando deva a
controvérsia ser dirimida à luz do Direito Civil. 3
É, portanto a Justiça do Trabalho competente para julgar uma lide que contraponha
um empregador e um trabalhador que queira ver compensado o dano oriundo da
interceptação de uma comunicação pessoal sua, tal como um e-mail ou um telefonema.
Caso, contudo, uma pessoa estranha à relação empregatícia – no caso, um eventual
interlocutor externo – queira também postular uma indenização pelo desprezo à sua
privacidade, o deverá fazer junto à Justiça Comum (LEWICKI, 2003, p. 172).
O mesmo acontecerá quando o ambiente de trabalho revelar-se hostil à privacidade
daquele que ainda sequer ingressou definitivamente em seu recôndito assevera TEIXEIRA
FILHO (1996, p. 45):
3
Recurso Extraordinário 238.737-4, julgado pela 1ª Turma em 17.11.98 e relatado pelo Ministro Sepúlveda
Pertence.
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SILVA NETO (2005, p. 92) preceitua ainda que a doutrina tem demonstrado especial
atenção ao estudo da vida privada dos trabalhadores à conta das conseqüências ocasionadas
nas relações privadas dos empregados no uso – cada dia mais intenso – de bip’s, telefones
celulares fornecidos pela empresa, comunicação via Internet à residência do trabalhador e
toda sorte de parafernália eletrônica que lhe subtrai ou limita os momentos de convívio
familiar .
Reconhece-se que algumas profissões, por sua própria natureza, trazem implícito,
desde a inserção do empregado no estabelecimento, o consentimento para que se opere –
digamos assim – uma invasão de privacidade. Profissões ou funções exercidas em atividade
ou serviços considerados essenciais denotam a possibilidade de maior restrição à vida
privada do empregado.
O art. 10 da Lei n° 7.783/89 fornece parâmetro para que se desvende as atividades ou
serviços essenciais que podem admitir o uso de aparelho pelo empregado como possível
limitação à sua vida privada: I – tratamento e abastecimento de água; II – assistência médica
e hospitalar; III – distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos; IV –
funerários; V – transporte coletivo; VI – captação e tratamento de esgoto e lixo; VII –
telecomunicações; VIII – guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e
materiais nucleares; IX – processamento de dados ligados a serviços essenciais; X – controle
de tráfego aéreo; XI – compensação bancária.
O art. 10 da Lei de Greve confere segurança para disciplinar a questão do uso de
aparelhos eletrônicos vinculativos do empregado à empresa mesmo após o encerramento da
jornada de trabalho, e, à luz do princípio da proporcionalidade (SILVA NETO, 2005, p. 84)
pode-se concluir que não será possível estender o uso de qualquer aparelho para empregados
exercentes de funções outras que não se encontrem relacionadas àquelas atividades
empresariais descritas no dispositivo legal (SILVA NETO, 2005, p. 93).
É certo que até nos serviços ou atividades consideradas essenciais, a análise do caso
concreto pela Justiça do Trabalho se há correlação lógica entre a função do empregado na
empresa e a exigência que se lhe dirige quanto ao uso de bip, por exemplo. Na medida em
que, o mero fato de a atividade empresarial estar enquadrada em algum inciso do art. 10, não
autoriza, ato-contínuo, o empregador, a diminuir o espectro da garantia individual de todos
os trabalhadores do estabelecimento; mas sim apenas e tão-só dos que realizam função
estreitamente conjugada àquela atividade reputada essencial pela norma (SILVA NETO,
2005, p. 93).
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A título de exemplo, não parece razoável, ainda que se trate de empresa voltada ao
tratamento e abastecimento de água, obrigar empregado que atue no setor administrativo ao
uso de telefone celular para viabilizar a sua presença em situações de emergência,
principalmente em virtude do fato de que pouco servirá o seu auxílio para combater o
sinistro, à míngua de conhecimentos técnicos necessários (SILVA NETO, 2005, p. 94).
Em face dessa situação, é admissível apresentar alguns critérios que norteadores
diante de alegada transgressão à vida privada do trabalho:
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Considerações finais
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último o poder diretivo não torna ineficaz a tutela desse direito consagrado em preceito
constitucional.
7. Não há entre os autores uma unanimidade no conceito de direito à intimidade e
direito à privacidade. No entanto, sua distinção sobreveio à Constituição Federal de 1988, ao
dar tipificação diversa, em seu inciso X, art. 5º. Direito à intimidade consiste no direito de
não ser ferido em seu íntimo, ou melhor, tudo aquilo que se passa entre quatro paredes,
reservadamente, para a própria pessoa ou para o círculo mais restrito de sua família, e que
compreende tanto o ambiente domiciliar quanto o local de trabalho.
7.1. Os direitos à honra e à intimidade não devem ser confundidos. Com a proteção
da intimidade pretende-se assegurar uma parcela da personalidade que se reserva da
indiscrição alheia para satisfazer exigências de isolamento moral do sujeito.
7.2. Enquanto o direito à intimidade diz respeito a fatos, situações e acontecimentos
que a pessoa deseja ver sob seu domínio exclusivo, sem compartilhar com qualquer outra, o
direito à vida privada diz respeito ao ambiente familiar e cuja lesão resvala nos outros
membros do grupo.
7.3. Esse direito vem reconhecido na Declaração Universal dos Direitos Humanos,
aprovada na Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948 no seu
artigo XII que preconiza que ninguém sofrerá interferências arbitrárias na sua vida
privada, na sua família, no seu lar ou na sua correspondência, nem a ataques à sua honra e
reputação. Todo homem tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques.
7.3.1. Quando se fala de intimidade, impõe-se o terceiro como titular desse espaço
de reserva; seria uma qualidade ou situação de que gozaríamos ou em que estaríamos
perante o outro: ser dele próximo, confidente, ter liberdade para expressar-lhe certos
sentimentos, emitir opiniões ou fazer algum tipo de pedido, sem formalidade.
Referências
BARROS, Alice Monteiro de. Proteção à intimidade do empregado. São Paulo: LTr, 1997.
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BODIN DE MORAES, Maria Celina. Danos à pessoa humana: uma leitura civil-
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SILVA NETO, Manoel Jorge e. Direitos fundamentais e o contrato de trabalho. São Paulo:
LTr, 2005.
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Mestre em Direito Negocial, na linha de pesquisa de Direito Empresarial, pela Universidade Estadual de
Londrina – UEL.
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INTRODUÇÃO
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A partir dos anos oitenta, com a afirmação dos discursos do neoliberalismo, o papel
do Estado passou a ser vigorosamente questionado. A nova proposta de modelo estatal
apresentava um Estado parco em todos os gastos sociais e nas intervenções econômicas
(GRAU, 2004, p. 42).
Sob a justificativa de que o Estado era ineficiente para atuar como agente econômico
e que o mercado não tinha condições de suportar a pesada carga dos direitos sociais, surgiu o
discurso no sentido de que o Estado deveria afastar-se da economia e deixar que o próprio
mercado criasse condições para a distribuição das riquezas. No novo modelo proposto,
buscou-se o restabelecimento da aliança entre o setor privado e o setor público. Mas, na
realidade, o objetivo principal dessa aliança consistia na renovação e no fortalecimento do
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Ressalte-se que a passagem para a iniciativa privada de atividades que antes eram
tipicamente de competência estatal, não implica a demonstração da prescindibilidade do
Estado, mas evidencia a necessidade de um novo tipo de intervenção. Como assinala Pierre
Subrá, “ante tal contexto, o Estado não pode mais seguir cumprindo o mesmo rol de
atividades, o que não quer dizer que não deva cumprir nenhum” (apud MARQUES NETO,
2002, p. 176). Nesse seu novo papel, o Estado deve coadunar sua função de mediador de
conflitos com a tarefa de protetor dos interesses que não logram ser defendidos ou
representados no âmbito social e político.
No Estado Liberal valores fundamentais, como vida, liberdade e propriedade, eram
ameaçados pelo próprio Estado. Hoje, os valores dominantes são outros e a ameaça que
sobres eles paira não procede do Estado, mas da sociedade e de suas estruturas injustas.
Dentro desse contexto, Derani acredita que a Constituição Brasileira de 1988 é
extremamente inovadora porque traz ao direito o prudente equilíbrio. Rechaça o liberalismo
puro e recusa o simplismo de uma centralização no Estado de decisões e programas de ação.
O que há de mais vibrante no texto constitucional é o reconhecimento da indissolubilidade do
Estado e da sociedade civil. “Todo problema de política econômica, social e ambiental só
pode ser trabalhado quando reconhecida esta unidade e garantidos os instrumentos de atuação
conjunta” (2001, p. 230).
A herança deixada pelo neoliberalismo, que se faz hoje sentir no cenário mundial, de
uma profunda crise, não apenas econômica, mas ambiental e social, tem levado a sociedade a
questionar as bases dos modelos econômicos e a examinar as instituições dominantes, no
sentido de buscar um consenso sobre as conseqüências da atividade econômica na sociedade e
impor um novo papel social às organizações.
Mas, a luta não é apenas por melhores condições básicas de subsistência, a busca é
pela revalorização do próprio homem, tornado mercadoria, ou nem isso, na economia
capitalista. O modelo econômico capitalista, fomentador das propostas neoliberais, retirou do
homem o valor de sua principal manifestação como ser humano, o valor do trabalho.
Conforme será abordado na próxima seção, o trabalho externaliza valores que dignificam o
ser humano e está diretamente relacionado com a qualidade de vida, por isso a reivindicação
final da sociedade corresponde ao alcance da própria dignidade humana.
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A esse respeito, Minardi (2010, p. 77) assevera que a revalorização do ser humano
somente pode ser alcançada com base no solidarismo, na função social da empresa e no
princípio da dignidade da pessoa humana. A necessidade de se valorizar os direitos de
segunda dimensão e a qualidade de vida do trabalhador é um escopo da efetividade das
relações sociais, sendo certo que o ambiente de trabalho tem sua parte de influência.
Dessa forma, a valorização do trabalho possibilita a realização do valor da dignidade
humana. O alcance desse escopo depende da concretização dos direito sociais, deixados em
segundo plano na economia capitalista. Todavia, consoante será visto na seção seguinte, as
prestações positivas requeridas pelos direitos sociais não são mais impostas apenas ao Estado,
mas, igualmente, às organizações que, afinal, são as responsáveis pelas externalidades
negativas (custos sociais e ambientais) advindas da exploração da atividade econômica. Há
um redimensionamento da prática econômica, inserindo-a dentro de uma política mais
abrangente, com escopo de equilíbrio e bem-estar social.
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contempla normas sociais, as quais devem ser observadas, para o efetivo desenvolvimento
econômico-financeiro, direcionando a atuação do ramo empresarial e as relações de trabalho.
Os problemas ambientais e sociais da atual sociedade de riscos têm modificado as
bases da atividade econômica. A indústria e o mundo dos negócios se convertem em uma
empresa política, no sentido de que a configuração da atividade econômica – sua estrutura
organizativa, produtos, processo de produção – já não pode desenvolver-se a portas fechadas.
Todas as fases da atividade econômica passaram a ser rodeadas por outras expectativas, isto é,
por outros agentes e considerações. Essa é a nova configuração que se impõe ao mundo dos
negócios: ética e responsabilidade para com a sociedade e o meio ambiente. A sociedade do
risco global está transformando as condições gerais da atividade econômica, exigindo outras
formas organizativas de ação e legitimação dentro do cenário econômico.
Dentro desse contexto mundial, a gestão empresarial não pode ser resumida
exclusivamente ao capital e nem ter como referência apenas os interesses dos acionistas
(shareholders). Um novo modelo de empresa está sendo exigido tanto por grupos sociais de
pressão, quanto pelo próprio consumidor. Trata-se de uma gestão inserida em um ambiente
social e balizada nos interesses e contribuições de um conjunto maior de partes interessadas
(stakeholders). A busca de excelência pelas organizações passa a ter como objetivos a
qualidade nas relações e a sustentabilidade econômica, social e ambiental, haja vista toda
atividade econômica depender intrinsecamente de recursos naturais e pessoas (conhecimento,
mão-de-obra e consumo).
Diante dessas mudanças, cresce o número de empresas que se voltam à
sustentabilidade. As organizações passam a conduzir seus negócios de modo a tornarem-se
parceiras e co-responsáveis pelo desenvolvimento econômico, social e cultural da sociedade.
Justamente em razão de as organizações gerarem externalidades negativas (por
exemplo, a degradação ambiental e os prejuízos sociais), bem como externalidades positivas
(como o processo de desenvolvimento e a geração de riquezas), elas devem assumir o papel
principal em ações que se visam a garantir um futuro sustentável.
Essas alterações na gestão empresarial coadunam com a opção do constituinte
brasileiro que reconhece na propriedade uma dúplice finalidade: individual e social. Por
função individual tem-se que a propriedade é um direito da pessoa, com o fim de servir ao
proprietário e sua família. Por função social entende-se a orientação da propriedade ao bem-
comum, ou seja, denota os deveres que a propriedade privada tem para com os demais
membros da sociedade, sendo que desses deveres derivam seus limites. “A propriedade não é
direito absoluto e ilimitado, como o concebeu a filosofia liberal, mas um direito limitado
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pelos deveres sociais” (NALINI, 2003, p. 170). Hans Küng (1999, p. 397) destaca que a
propriedade, por menor que seja, acarreta obrigações. “O uso da propriedade também deve
servir ao bem de todos. Só assim poderá ser edificada uma ordem econômica justa”.
É nesse sentido que se reclama um redimensionamento da prática econômica,
inserindo-a dentro de uma política mais abrangente, uma política social. Da economia que
privilegia a concorrência para uma economia adequada a finalidades mais abrangentes,
abraçada pelas expressões qualidade de vida e bem-estar. Isso significa unir o princípio da
liberdade no mercado com o equilíbrio social.
Conforme será abordado na próxima seção, esse redirecionamento da atividade
econômica reclama a adoção de uma gestão sustentável nas organizações, pautada não apenas
por escopos econômicos, mas por valores éticos voltados à preservação do meio ambiente e
ao equilíbrio social, buscando, como fim maior, o desenvolvimento sustentável.
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Nesse sentido, Corrêa e Medeiros (2003, p.156) consideram que uma empresa
somente deve ser considerada socialmente responsável quando vai além da obrigação de
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respeitar as leis, pagar tributos e observar as condições adequadas de segurança e saúde para
os trabalhadores. A obrigação social corresponde, portanto, aquilo que a empresa faz pelo
social em vista de uma previsão legal. Já a responsabilidade social pressupõe que a empresa
considere as metas econômicas e sociais nas suas decisões e vá além dos limites da legislação.
Archie Carrol (apud LOURENÇO; SCHRÖDER, 2003, p. 87- 88) subdividiu a
responsabilidade social da empresa em quatro tipos: econômico, legal, ético e discricionário
ou filantrópico. A primeira delas, a responsabilidade econômica, é o principal tipo de
responsabilidade encontrada nas empresas, na qual o lucro é a maior razão para sua
existência. Ter responsabilidade econômica significa produzir bens e serviços de que a
sociedade necessita e quer, a um preço que garanta a continuação das atividades da empresa.
No patamar da responsabilidade legal, as empresas buscam as metas econômicas dentro da
estrutura e exigências legais. Já no plano da responsabilidade ética, a empresa inclui em suas
atividades comportamentos que a sociedade espera que ela adote, mesmo que não haja
previsão legal e que não atenda aos interesses econômicos diretos da empresa. Por fim, a
responsabilidade discricionária ou filantrópica é puramente voluntária e orientada pelo desejo
da empresa em fazer uma contribuição social não imposta pela economia, pela lei ou pela
ética.
A sustentabilidade é o paradigma utilizado nesta pesquisa, pois se trata da idéia
motriz do desenvolvimento sustentável. Assim, a sustentabilidade deve ser visualizada na
perspectiva de um agir organizacional com o objetivo de promover o equilíbrio entre os
aspectos social, econômico e ecológico. A sustentabilidade requer ações das organizações em
seus relacionamentos internos e externos que, dentro da realidade e contexto do qual
participam, se aproximam de um desenvolvimento sustentável.
A sustentabilidade visa a assegurar o sucesso do negócio em longo prazo e, ao
mesmo tempo, contribuir para o desenvolvimento econômico e social da comunidade, um
meio ambiente saudável e uma sociedade estável.
A aplicação do conceito à realidade requer medidas por parte do poder público e da
iniciativa privada: um sistema político que assegure a efetiva participação dos cidadãos no
processo decisório; um sistema econômico capaz de gerar excedentes e conhecimento técnico
em bases confiáveis e constantes; um sistema social que possa resolver as tensões causadas
por um desenvolvimento não-equilibrado; um sistema de produção que respeite a obrigação
de preservar a base ecológica do desenvolvimento; um sistema tecnológico que busque
constantemente novas soluções; um sistema internacional que estimule padrões sustentáveis
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5 AS DIMENSÕES DA SUSTENTABILIDADE
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sociedade ou da organização; e “lucro” (profit), que trata dos resultados econômicos positivos
da organização.
Os referidos autores (p. 189) descrevem oito dimensões para a sustentabilidade:
I) social: propõe a homogeneidade social, distribuição de renda justa, qualidade de vida e
igualdade social;
II) cultural: sugere o equilíbrio, a tradição, a inovação, a autonomia na elaboração de projetos
nacionais integrados e a combinação entre confiança e abertura para o mundo;
III) ecológica: relacionada com a preservação do capital natural e a limitação no uso desses
recursos;
IV) ambiental: relacionada aos ecossistemas naturais;
V) territorial: trata do equilíbrio entre as configurações urbanas e rurais, da melhoria do
ambiente urbano e das estratégias de desenvolvimento de regiões;
VI) econômica: aborda o equilíbrio econômico entre setores, a segurança alimentar, a
modernização dos meios produtivos, a realização de pesquisas científicas e tecnológicas e a
inserção na economia internacional;
VII) política nacional: envolve a democracia, os direitos humanos e a implantação de projetos
nacionais em parceria com os empreendedores;
VIII) política internacional: trata da promoção da paz e da cooperação internacional, do
controle financeiro internacional, da gestão da diversidade natural e cultural e da cooperação
científica e tecnológica.
O uso das dimensões da sustentabilidade e a identificação das relações existentes
entre os critérios contribuem para a superação de um agir organizacional limitado no que
tange às questões de sustentabilidade. O consenso sobre o que é sustentável ou insustentável
no ambiente organizacional pressupõe um processo interativo continuo entre todos os
envolvidos e afetados no processo produtivo, atentando principalmente para a integração dos
pilares econômico, ambiental e social da sustentabilidade.
Em relação ao tripé proposto para o desenvolvimento sustentável, o aspecto
ambiental, juntamente com o social, tem sido encarado como um desafio, visto que os
objetivos econômicos normalmente prevalecem. Uma sociedade somente pode ser
considerada sustentável se atender, simultaneamente, aos critérios de relevância social,
prudência ecológica e viabilidade econômica, os três pilares do desenvolvimento sustentável.
Para tanto, as empresas devem adotar políticas e práticas de sustentabilidade
empresarial, procurando, a partir de então, incorporar estrategicamente aos negócios as
dimensões – econômica, ambiental e social – do desenvolvimento sustentável.
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visem à melhoria das condições de trabalho e de vida de seus empregos, com reflexos diretos
no desenvolvimento de toda a sociedade.
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ou cumpridor de tarefas, que, por receber uma contraprestação pelo labor prestado, já tem
recompensado o seu esforço diário. Ele necessita ser visto como parte integrante de um meio,
como ser indispensável ao desenvolvimento de uma sociedade.
Conforme descrito por Diniz e Maciel (2012, fl. 500), o meio ambiente de trabalho
pode assumir os seguintes aspectos: a) fisiológico, que corresponde ao grau de adaptação do
trabalhador ao meio físico; b) moral, decorrente de aptidões humanas, motivação, grau de
satisfação, personalidade, etc; c) social, ou seja, a interdependência entre o trabalho e a
sociedade; d) econômico, relacionado com a produção de riquezas, propriedade, os bens
produzidos, organizações empresariais e outros.
A proteção do meio ambiente de trabalho fundamenta-se no princípio da
solidariedade, previsto no art. 3º, I, da Constituição Federal, pois, sendo difusa a sua natureza,
as conseqüências decorrentes de sua degradação, como os acidentes de trabalho e as doenças
ocupacionais, atingem toda a sociedade.
O art. 6º da Constituição da República estabelece como direitos sociais fundamentais
a saúde e a segurança e o seu art. 7º, XXII, traz como garantia ao trabalhador a redução dos
riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança.
O Brasil também ratificou o Protocolo Adicional à Convenção Interamericana sobre
Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (Protocolo de San
Salvador), o qual garante condições justas, equitativas e satisfatórias de trabalho e questões
relacionadas à segurança e higiene no trabalho (art. 7º).
A OIT, por meio da Declaração sobre Princípios Fundamentais e Direito do
Trabalho, visa à tutela de direitos mínimos do trabalhador, como a liberdade de associação,
eliminação do trabalho escravo e infantil, dispensa discriminatória, fim do dumping social.
São medidas necessárias, pois, com intuito de diminuir os custos de produção e tornar seus
produtos mais competitivos no mercado internacional, algumas empresas adotam artifícios
desleais, como a utilização de empregados submetidos a condições análogas à de escravo.
A tutela do meio ambiente laboral também é objeto da Convenção 155 da OIT, que
trata da segurança e saúde dos trabalhadores, impondo aos signatários uma política nacional
com o intuito de prevenir acidentes e danos à saúde decorrentes do trabalho. Destaca-se
também a Convenção 148 da OIT, denominada Convenção sobre o Meio Ambiente de
Trabalho, que prima pela eliminação dos agentes de risco à saúde do trabalhador, ao invés de
sua neutralização.
O escopo da proteção jurídica ao meio ambiente laboral é o ser humano trabalhador
saudável e seguro nas relações de trabalho, contribuindo diretamente na sua qualidade de
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vida. Assim, um meio ambiente laboral equilibrado, seja no seu aspecto material como
imaterial, contribui diretamente para a saúde e qualidade de vida do trabalhador e,
consequentemente, para a sustentabilidade da sociedade e da própria organização, conforme
será abordado na próxima seção.
A Constituição Federal Brasileira estabeleceu, no seu art. 1°, IV, como um dos
fundamentos do Estado Democrático de Direito, a tutela dos valores sociais do trabalho, como
expressão básica da proteção à personalidade humana e como forma de buscar o equilíbrio
social e econômico.
O artigo 170 da Constituição da República preconiza a humanização que deve existir
no ambiente de trabalho, ao fixar que a ordem econômica tem por fim assegurar a todos
existência digna, conforme os ditames da justiça social, fundada na valorização do trabalho
humano e na livre iniciativa. Acrescente-se que o art. 193 da Constituição Federal estabelece
que a ordem social tem por base o primado do trabalho, objetivando o bem-estar e a justiça
social.
Dessa forma, os valores sociais do trabalho, a livre iniciativa, a dignidade da pessoa
humana, o desenvolvimento nacional, e tantos outros fundamentos que norteiam as relações
empresariais, estão respaldados no conteúdo da norma constitucional. Não obstante esses
valores constitucionalmente assegurados, os novos contornos assumidos pela economia
capitalista colocam em risco a sustentabilidade do meio ambiente laboral.
Conforme destaca Minardi (2010, p. 76), a competitividade do atual sistema
capitalista, renovado pela globalização e por uma ideologia que resgata o liberalismo
econômico, tem exigido dos trabalhadores um esforço imensurável para o aumento da
produtividade, aliado à cobrança de aperfeiçoamento e resultados, acarretando euforia,
ansiedade, irritação, angústia e outros graves problemas de saúde ao trabalhador.
A busca incessante pelo aumento da produção e do consumo submete os
trabalhadores a condições laborais desfavoráveis. Ainda que se tenha avançado um longo
caminho desde a época da escravidão e do início da Revolução Industrial, denota-se, ainda,
um padrão de exploração. Esse quadro, consoante destacam Vera e Lima (2010, p. 145), é
evidenciado pelo modo como as organizações estruturam as oportunidades de trabalho para
produzir e reproduzir estruturas de classes da sociedade moderna, no modo pelo qual as
organizações abordam problemas relativos a condições inseguras de trabalho, acidentes de
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CONCLUSÃO
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preceitos do pensamento clássico marxista, o trabalho cria o homem. Esta afirmativa continua
valendo, pois através do trabalho não se alcança apenas a subsistência, mas se imprime valor e
sentido à vida humana, pois é a expressão material e psicológica do homem.
Verificou-se que uma das cruéis heranças deixadas por fenômenos como a
globalização, a reestruturação dos meios de produção, a automação, a flexibilização de
direitos trabalhistas e a precarização das relações de trabalho, é a desconsideração da
abordagem humana do trabalho. Nesse cenário, perde-se o conceito da unidade do trabalho,
de integração, de responsabilidade e da dignificação do homem por meio do trabalho. Tal
circunstância é um empecilho ao progresso da sociedade que, sem dúvida, depende do sentido
que se atribui ao trabalho humano.
Observou-se que os ganhos advindos da adoção de práticas sustentáveis no meio
ambiente laboral não envolvem apenas as organizações, que terão uma equipe mais motiva e
produtiva, e os trabalhadores, valorizados como seres humanos, mas também abrangem toda a
sociedade, uma vez que o trabalho reflete diretamente no progresso social, uma das dimensões
do escopo maior, que é o desenvolvimento sustentável.
Assim, a sustentabilidade no meio ambiente laboral, com base na valorização do
trabalho humano, propicia ganhos positivos para as empresas que, além de contar com
trabalhadores mais empenhados e qualificados, passam a ser valorizadas pela sociedade,
garantindo a sustentabilidade econômica da própria organização.
Por fim, constatou-se que, não obstante as vantagens econômicas advindas da
sustentabilidade no meio ambiente de trabalho, na prática, ainda impera o descaso com a
saúde, bem-estar e segurança dos trabalhadores. Destarte, o implemento de práticas
sustentáveis no meio ambiente laboral precisa vencer obstáculos como a flexibilidade de
direitos trabalhistas, a informalidade, a terceirização, o trabalho infantil, e outras práticas
desleais que trazem lucro aos empresários à custa do retrocesso social.
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281
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
RESUMO:
O presente trabalho tem por objetivo uma análise acerca da problemática envolvendo o
trabalho sob condições adversas, atribuindo-se especial ênfase a insalubridade e ao sistema de
monetização do risco, adotado pelo ordenamento jurídico brasileiro. Este sistema concerne ao
pagamento de um adicional sobre o salário do empregado enquadrado em tais condições,
como forma de compensação pelos potenciais e efetivos danos a sua saúde e, como uma
maneira de fazer com que as empresas promovam melhorias no meio ambiente de trabalho.
Far-se-á uma análise dos adicionais previstos no inciso XXIII do artigo 7º da Constituição da
República, do sistema de monetização do risco, apresentando alternativas à problemática da
sujeição dos trabalhadores a agentes nocivos, visando à máxima proteção à higidez destes.
PALAVRAS-CHAVE: Segurança e saúde do trabalho; Monetização do risco; Adicional de
insalubridade.
ABSTRACT:
The aim of this study is to analyze the issues involving the work under adverse conditions,
giving special emphasis to the unhealthiness and monetization system risk, adopted by
Brazilian law. This system concerns the payment of a surcharge on the employee's salary
framed in such conditions, as a form of compensation for actual and potential damage to your
health and as a way to make companies promote improvements in the working environment.
Far will be analyzed the additional included in the article 7th, XXIII of the Constitution, the
monetization system from scratch, presenting alternatives to the problem of subjecting.
KEY-WORDS: Safety and health at work; Monetization of risk; Additional unsanitary.
282
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INTRODUÇÃO
Mais vale prevenir do que remediar.
Bernardino Ramazzini, 1633
(NASCIMENTO, 2009, p. 201)
Na sociedade contemporânea existe uma preocupação com o bem estar dos
trabalhadores, o que tem contribuído para a ampliação de direitos trabalhistas e a
implementação de medidas destinadas à proteção da higidez no ambiente laboral, estando
presente no ordenamento jurídico pátrio um extenso arcabouço legal no que tange à tutela da
saúde e segurança do trabalhador.
Dentre os fundamentos que alicerçam o Estado Democrático de Direito brasileiro
pode-se destacar a dignidade da pessoa humana, como diretriz de todo o ordenamento jurídico
vigente (PIOVESAN, 2012, p. 54), sendo essa inalienável, imprescritível e irrenunciável
(SILVA, 2012, p. 181). Além disso, a valorização do trabalho humano é um dos sustentáculos
da República Federativa do Brasil, conforme dispõe o art. 1º, inciso IV, da Constituição da
República (CR) e na mesma esteira, o inciso III, do artigo 5º deste diploma legal, prevê a
impossibilidade de submissão de qualquer pessoa a tratamento desumano ou degradante.
Também, a CR estabelece, em seu artigo 196, que a saúde é direito de todos e dever do
Estado, de acesso universal e igualitário, sendo que as normas relativas à saúde são de ordem
pública, ou seja, regulam um serviço público essencial (OLIVEIRA, 2011, p. 127). Neste
sentido o artigo 7º, inciso XXII, prevê que consiste em direito dos trabalhadores urbanos e
rurais a “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e
segurança”.
Nos capítulos Constitucionais que tratam da ordem econômica e do meio ambiente,
em especial da análise do caput dos artigos 170 e 225 da CR, tem-se que aquela está fundada
na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, a fim de assegurar a todos uma
existência digna, com observância da defesa do meio ambiente, pois “desenvolvimento
econômico é a garantia de um melhor nível de vida coordenada com equilíbrio na distribuição
de renda e de condições de vida mais saudáveis” (DERANI, 2009, p. 226).
Cotejando os dispositivos mencionados com o previsto no artigo 189 da Consolidação
das Leis do Trabalho (CLT), pode-se verificar que, ao definir atividade insalubre, este
dispositivo legal a trata como condição ou método de trabalho que exponham os empregados
a agentes nocivos à saúde acima dos limites de tolerância, ou seja, além daquilo que pode ser
suportado pela pessoa humana.
283
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
284
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
exercida (OLIVEIRA 2011, p. 173). Dentre tais condições, destacam-se aquelas elencadas no
artigo 7º, XXIII, CR, quais sejam, a insalubridade, periculosidade e penosidade.
O trabalho insalubre é uma modalidade de agressão a integridade física e psicológica
do trabalhador, consistindo na sua exposição a agentes que podem afetar ou causar danos à
sua saúde, provocar doenças, muitas destas diretamente relacionadas à sua atividade e outras
desencadeadas, antecipadas ou agravas pelo trabalho realizado ou pelas condições em que é
prestado (OLIVEIRA, 2011, p. 194).
Os agentes insalubres estão listados na Norma Regulamentadora nº 15 (NR-15),
aprovada pela Portaria nº 3.214 de 8 de junho de 1.978 do Ministério do Trabalho e Emprego,
a qual é alterada periodicamente, sendo divididos em três conjuntos diferenciados: agentes
físicos – ruído, calor, radiações, frio, pressões hiperbáricas, vibrações e umidade; agentes
químicos – poeiras, gases e vapores, névoas e fumos; agentes biológicos – micro-organismos,
vírus e bactérias (PINTO; WINDT; CÉSPEDES, 2011, p. 261).
Ao trabalhador que exerce atividades sob condições insalubres acima dos limites de
tolerâncias legais, é assegurado o adicional de insalubridade, fixado pelo artigo 192 da CLT
no percentual de 40%, 20% ou 10% sobre o salário mínimo a depender do grau de
insalubridade. Ressalte-se, que muito embora a previsão do texto consolidado mencione o
salário mínimo como base de cálculo do adicional em discussão, o entendimento sumulado
pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), era de que o adicional de insalubridade seria
calculado sobre o salário básico percebido pelo trabalhador, ou por outro critério mais
vantajoso estabelecido em instrumento normativo (Súmula 228). Porém, a eficácia deste
entendimento sumular está suspensa por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF),
segundo Resolução 185/2012 do TST. Esta decisão foi adotada em razão da Súmula
Vinculante 4 do STF, que trata da impossibilidade de utilização do salário mínimo como
indexador, porém, a base de cálculo do referido adicional não é objeto deste estudo.
Com relação ao trabalho periculoso, refere-se aquele prestado no ambiente de trabalho
onde se encontram presentes agentes que podem atuar instantaneamente, com efeitos danosos
imediatos, uma vez que podem levar a incapacidade ou morte repentinamente (OLIVEIRA, p.
202). No trabalho perigoso há exposição a risco mais acentuado que em um trabalho comum,
sendo que risco está se referindo a “probabilidade da ocorrência de um evento que cause ou
possa causar dano” (LOPES NETTO, 2005, p. 100).
O artigo 193 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) considera como atividades
ou operações perigosas aquelas prestadas em virtude de exposição permanente do trabalhador
285
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
a inflamáveis, explosivos ou energia elétrica, roubos ou outras espécies de violência física nas
atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial, sendo que esta última hipótese
foi acrescentada pela Lei nº 12.740 de 10 de dezembro de 2012 e se refere ao ambiente que se
desenvolve a atividade profissional, devendo este implicar em risco acentuado em razão de
roubos ou outras espécies de violência física.
Desta forma, são consideradas perigosas as atividades ou operações em que a natureza
ou os métodos de trabalho desenvolvidos impliquem em contato ou exposição permanente do
trabalhador a inflamáveis, explosivos, substâncias radioativas ou radiação ionizantes, energia
elétrica, bem como a roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais
de segurança pessoal ou patrimonial, sendo que as atividades encontram-se descritas na
Norma Regulamentadora nº 16 (NR-16), aprovada pela Portaria nº 3.214 de 8 de junho de
1.978 do Ministério do Trabalho e Emprego, sofrendo alterações periódicas.
O trabalhador que exerce suas atividades sob condições perigosas, receberá um
adicional de 30%, computado sobre o salário básico, nos termos do § 1º do artigo 193
consolidado, à exceção dos eletricitários, cuja base de cálculo será a totalidade das parcelas de
natureza salarial, com fundamento na Súmula 191 do TST.
Destaque-se, como ponto de divergência entre as condições insalubre e perigosa
expostas, que a agressão à saúde provocada por aquela se dá lentamente, sendo os efeitos
percebidos a longo prazo, enquanto os agentes perigosos não têm atuação paulatina, podendo
causar efeitos súbitos, perceptíveis de imediato, e inclusive levar a morte.
Com relação ao trabalho penoso, muito embora tenha sido expressamente previsto o
referido adicional no artigo 7º, XXIII da CR, há que se esclarecer que não existe, até os dias
atuais, determinação legal sobre que atividades seriam consideradas penosas, bem como
referência ao critério a ser utilizado para a concessão do referido adicional, restando à
doutrina a elucidação do tema.
Assim, consideram-se como penosas as atividades que geram desconforto físico ou
psicológico, em nível superior aquele que decorre de um trabalho em condições normais. Diz
respeito aos contextos de trabalho geradores de incômodo, esforço físico e mental, sentido
como demasiados, sobre os quais o trabalhador não tem controle (SATO, 1994, p. 41).
Ressalte-se que, no trabalho penoso, o agente agressivo é o próprio serviço que se
executa, expondo o trabalhador a um grau elevando de fadiga ou stress, mostrando-se
inadequado e provocando um incômodo, um desgaste ao trabalhador dentro do ambiente de
trabalho, bem como podendo apresentar reflexo em sua vida pessoal.
286
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Martins exemplifica atividades que podem ser consideradas como penosas, tais como
aquelas realizadas nas minas de carvão; em matadouros; limpeza de chaminés, caldeiras,
tanques de petróleo; em contato com recipientes de azeite; trabalhos em que há manuseio de
grafite e cola; preparação de farinha de peixe e fertilizantes; atividades exercidas pelos
motoristas de ônibus, táxi; atividades de turnos ininterruptos de revezamento, dentre outras
(2011, p. 673-674).
A despeito da inércia legislativa no que tange à regulamentação do adicional de
penosidade, vê-se que o mesmo vem sendo caracterizado e estabelecido por meio de Acordos
Coletivos de Trabalho (ACT) ou Convenções Coletivas de Trabalho (CCT), hipótese prevista
no artigo 611 da CLT.
Diante do exposto tem-se que os trabalhos em condições insalubres, perigosas e
penosas representam modalidades de agressões à saúde do trabalhador, importando num
grande desafio aos empregadores, aos próprios empregados, ao Estado e a sociedade, tornar o
ambiente de trabalho um local físico e psicologicamente saudável, para que o trabalhador
possa continuar sadio e tenha na sua atividade laboral, não a representação de uma degradação
compulsória, um desprazer inevitável, mas ao contrário, uma fonte de plena realização
profissional e pessoal.
Assim, far-se-á uma análise da saúde do trabalhador e da política adotada no Brasil,
da monetização do risco, atendo-se ao trabalho em condições insalubres, uma vez que quando
de trata de labor perigoso, na maioria das vezes há impossibilidade de dissociação do risco da
própria atividade, bem como pelo adicional de penosidade ainda se tratar de zona nebulosa no
direito brasileiro, carente de regulamentação legal.
287
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
1
O Decreto-Lei n. 399, de 30 de abril de 1938, muito embora tratasse da fixação de salário mínimo a
trabalhadores ocupados em serviços insalubres (art. 4º), não definiu percentual ou forma de incremento salarial
pela atividade, permitindo (e não impondo) as Comissões de Salário Mínimo, o seu aumento até de metade do
salário mínimo normal da região, zona ou sub-zona.
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COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
aliava o estímulo propiciado pelo acréscimo salarial em função do trabalho sob condições
adversas, a possibilidade de aposentadoria precoce (OLIVEIRA, 2011, p. 155-156).
E esta foi a ótica que perdurou, inclusive com a Lei n. 6.514/77, que alterou a redação
de dispositivos celetários, dentre eles os artigos 191 e 192, que dispõem sobre a eliminação e
neutralização da insalubridade e pagamento de adicional em caso de exercício de trabalho em
condições insalubres acima dos limites de tolerância, respectivamente, bem como pelo inciso
XXIII do artigo 7º da CR, uma vez que referidos dispositivos legais, em momento algum
proíbem o trabalho sob condições adversas.
A interpretação das normas em cotejo deveria ser, por óbvio, restritiva, ou seja, ser
norteada pela ideia de primar pela eliminação ou redução da insalubridade e, apenas quando
isso for inviável e de forma excepcional, recompensar o trabalhador em pecúnia, o que não foi
observado na prática, pois ao invés de ser o adicional de insalubridade uma exceção, a
realidade o mostrou como regra. Ressalte-se que o pagamento do acréscimo salarial não se
dava em caráter transitório, como haveria de se esperar ao se imaginar que, com o progresso
da empresa, haveria maiores investimentos nas condições de trabalho e, por conseguinte, a
redução significativa ou eliminação da insalubridade, acabando por ser inevitavelmente
incorporado ao salário dos trabalhadores, haja vista a inexistência de mudanças na situação
fática das empresas ao longo dos anos (OLIVEIRA, 2011, p. 422).
Portanto, uma vez que o trabalho sob condições insalubres está autorizado por lei, é
devido ao trabalhador adicional salarial, a fim de, por um lado, estimular as empresas a
melhorarem as condições de trabalho e, por outro, compensar, de certa forma, o trabalhador,
pelos possíveis danos à sua saúde e integridade física e psíquica. Contudo, este pretendido
caráter pedagógico da medida ao empregador é meramente ilusório, uma vez que não raras
vezes estes preferem arcar com o pagamento do adicional de insalubridade, ante a efetivação
de medidas que atenuem ou eliminem o risco, pelo alto custo que isto pode representar aos
seus cofres, muitas vezes se sobrepondo àquele despendido com o pagamento do acréscimo
legal. Também, sob o ponto de vista do trabalhador, o pagamento do adicional pelo trabalho
em condições insalubres pode, falaciosamente representar um incremento na renda
(SIQUEIRA, 2012, p. 46).
E essa concepção foi adotada durante décadas e até o final do século XX, quando as
discussões no Direito do Trabalho pautavam-se apenas no direito ao pagamento dos
adicionais previstos em lei para o trabalho nocivo ao trabalhador, estando ausente a
preocupação quanto à preservação da saúde e integridade física do obreiro.
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2
A estrutura, organização e o funcionamento do Sistema Federal da Inspeção do Trabalho é disciplinada pelo
Regulamento da Inspeção do Trabalho, aprovado pelo Decreto nº 4552/02.
292
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
proteção do trabalhador sujeito a risco, última modalidade apresentada, somente deve ser
utilizada em caso de impossibilidade da adoção das medidas anteriores e como último
recurso, pois não se trata de uma medida de prevenção ideal, já que se refere à utilização de
mecanismos e medidas visando administrar os efeitos dos agentes nocivos, reduzindo sua
intensidade para níveis considerados toleráveis.
Em verdade, a adoção de estratégias de prevenção, que encontra apoio na tendência
moderna do Direito, é essencial para que se vislumbre a efetiva eliminação e mitigação dos
efeitos nocivos causados pelos agentes insalubres, devendo ocupar posição prioritária sobre a
mera neutralização de tais efeitos, de modo que a aplicação desta medida seja subsidiária
àquela.
Nesse sentido, destacando-a a superioridade de medidas preventivas em relação às
medidas de neutralização, vale mencionar os equipamentos de proteção individual (EPIs), os
quais, muito embora auxiliem na proteção à saúde do trabalhador, não cumprem sua função
de forma ideal, haja vista que, muitos deles, além de prejudicar a percepção do ambiente,
causam incômodo ao trabalhador, que acaba oferecendo resistência em utilizá-los
devidamente.
Por outro lado, pode-se citar um conjunto de acontecimentos e eventos que sinalizam
uma rara oportunidade para a revisão da prática de monetização do risco, em especial o
Programa Nacional de Prevenção a Acidentes lançado pelo TST em 03 de maio de 20113,
criado em virtude do crescimento de ações judiciais indenizatórias por acidentes ocupacionais
e a 14ª Conferência Nacional de Saúde, que aprovou, entre outras diretrizes, a de “Integrar e
ampliar políticas e estratégias para assegurar atenção e vigilância à saúde ao trabalhador”
(DARONCHO, 2012, p. 80-82).
Ainda, podem-se citar como preventivas, medidas de esclarecimento e educação aos
empregadores e empregados, a fim de se demonstrar para aqueles que, muito embora o custo
previsto em lei para a manutenção de obreiros sob condições nocivas a integridade física e
psicológica se mostre muitas vezes irrisório no momento da sua quitação, mormente se
comparado aos altos investimentos que seriam necessários para a eliminação do risco, o
montante a ser despendido numa eventual ação indenizatória promovida pelo trabalhador
poderá superar, e muito, os investimentos mencionados, principalmente se o desgaste a saúde
do empregado o tiver levado a perda da capacidade laboral ou a morte.
3
Disponível em: <http://www3.tst.jus.br/prevencao/noticia1.html>. Acesso em: 10 mar. 2013.
293
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
4
BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Agravo de Instrumento em Recurso de Revista n. 249000-
97.2001.5.01.0421. Agravante Schweitzer-Mauduit do Brasil S.A. e Agravado Almir da Silva.
Relator: Ministro Aloysio Corrêa da Veiga. Publ. 29 jun. 2012. Disponível em:
<http://aplicacao5.tst.jus.br/consultaunificada2/inteiroTeor.do?action=printInteiroTeor&highlight=true
&numeroFormatado=AIRR - 249000-
97.2001.5.01.0421&base=acordao&numProcInt=14142&anoProcInt=2012&dataPublicacao=29/06/20
12 07:00:00&query>. Acesso em: 14 mar. 2013.
294
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
A problemática que envolve os trabalhos sob condições nocivas a saúde e integridade
física do trabalhador, em especial a insalubridade, tem origem precípua na escolha, por parte
do legislador, em adotar o sistema de monetização de risco, compensando financeiramente os
danos à saúde do obreiro através de acréscimos salariais.
Constata-se, conforme exposto ao longo do presente estudo, que a monetização do
risco não encontra amparo junto ao princípio da dignidade humana, consagrado pela Lei
Maior de 1988 como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, junto à
valorização do trabalho e a garantia de um meio ambiente laboral livre de riscos. Logo, não há
295
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
como se admitir que se dê continuidade sólida a aplicação de um critério que, além de violar
um fundamento da CR, mostra-se ultrapassado e manifestamente ineficaz no que diz respeito
à proteção da saúde do trabalhador.
Assim, para alterar essa realidade, é imperioso que haja uma ação reflexiva,
consertada e efetiva sobre a questão, entre sociedade, Poderes Executivo, Judiciário e
Legislativo, uma reflexão sobre a questão, o que se mostra urgente ao se considerar o cenário
atual brasileiro, em que se visualiza uma crescente oferta de empregos, inclusive em
condições nocivas a saúde e integridade física do trabalhador.
É forçoso chegar-se a conclusão de que a estratégia utilizada pelo ordenamento
jurídico pátrio merece ser reformulada, considerando a implementação de medidas
alternativas, priorizando sempre a prevenção, como a melhor alternativa para a proteção do
obreiro em seu ambiente de trabalho, não podendo mais ser tolerado o simples ressarcimento
financeiro, através do pagamento de adicional ao salário, que causa efeitos deletérios na
sociedade.
A manutenção de um ambiente de trabalho seguro e saudável gera ganhos aos
trabalhadores e aos empregadores, implicando em melhora quantitativa e quantitativa da
prestação do labor, além de aprimoramento das relações humanas e da promoção dos
princípios da dignidade da pessoa humana e da função social do trabalho.
Por óbvio que nos casos em que há indissociabilidade da condição nociva com o
trabalho prestado, demonstrou-se a possibilidade de adoção de medidas alternativas, como a
redução da jornada, sem perda salarial. Contudo, é importante reforçar que, a tomada de tais
condutas para com trabalhadores que laboram sob condições adversas, devem ser apenas em
caráter complementar, jamais como forma principal e, muito menos única de solução do
problema.
Portanto, somente através da mudança de paradigmas e implementação de medidas de
proteção à integridade física e psíquica do trabalhador, à luz dos princípios constitucionais é
que será possível a efetiva preservação da sua saúde e segurança, com a verdadeira
concretização do fundamento constitucional da dignidade da pessoa humana.
REFERÊNCIAS
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296
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BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Agravo de Instrumento em Recurso de Revista n.
249000-97.2001.5.01.0421. Agravante Schweitzer-Mauduit do Brasil S.A. e Agravado Almir
da Silva. Relator: Ministro Aloysio Corrêa da Veiga. Publ. 29 jun. 2012. Disponível em:
<http://aplicacao5.tst.jus.br/consultaunificada2/inteiroTeor.do?action=printInteiroTeor&highli
ght=true&numeroFormatado=AIRR - 249000-
97.2001.5.01.0421&base=acordao&numProcInt=14142&anoProcInt=2012&dataPublicacao=
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298
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
1
Professor Universitário do Mestrado e da Graduação em Direito da Universidade de Itaúna (UIT), FACED
(Divinópolis-MG), FADIPA (Ipatinga –MG) e da UNA –BH/MG; ex-bolsita CAPES e atual do FUNDEP/UFMG;
Coordenador do Projeto Cidade Alteridade em Itaúna; Doutor em Direito Empresarial pela UFMG, Mestre e
Especialista em Direito; e Advogado.
2
Advogado, Especialista em Direito do Trabalho e Mestrando em Direito da Universidade de Itaúna (UIT) – Área de
Concentração – Proteção dos Direitos Fundamentais.
299
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300
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
SUMÁRIO
Introdução
1.Novos conceitos para o direito coletivo do trabalho e os direitos fundamentais
2. A eficácia dos direitos fundamentais nas relações particulares
3. Os Direitos Trabalhistas e a nova summa divisio direitos individuais e direitos coletivos
4. A relação entre capital e trabalho: O movimento sindical e os direitos coletivos
do trabalho
4.1. O Dissídio Coletivo e a Emenda Constitucional 045/2004
5. O meio ambiente do trabalho
5.1. A salubridade do ambiente do trabalho
5.2. Dos assédios no ambiente do trabalho – seus danos e a proteção do trabalhador em face
deste mal e sua pacífica reparação perante a Justiça do Trabalho
6. O Ministério Público do Trabalho e a efetivação de direitos coletivos por danos morais
coletivos
Conclusão
Referências bibliográficas
Introdução
O presente artigo fará uma abordagem do Direito Coletivo do Trabalho, sob o ponto de
vista dos Direitos Fundamentais e sob a visão pós-positivista, sem se olvidar da historicidade
deste ramo jurídico, salientando-se tratar de área jurídica eminentemente regulamentada, seja
através da normatização estatal, seja pela normatização sindical. A regulação laboral ocorreu em
resposta a conflitos históricos envolvendo capital e trabalho, cujos enfoques de maior relevância
surgiram com os ideários da revolução francesa, revolução industrial e o avanço do socialismo,
partindo-se das idéias de Karl Marx.
Por outro lado, deve-se ressaltar que a regulação normativa não é sinônimo de
efetividade dos respectivos direitos, haja visto que por diversos momentos este ramo jurídico foi
objeto de manipulação político-econômica, como se verificou no Estado Novo getulista, onde o
governo central, para não perder o controle das massas trabalhadoras, cujos movimentos se
aglutinavam, editou a Consolidação das Leis do Trabalho, como instrumento de co-opção em
resposta ás manifestações operárias.
301
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302
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303
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3
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho, 8. edição. São Paulo: LTr, 2009, p. 49.
4
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho, 8 ed. São Paulo: LTr, 2009, p. 49.
304
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Assim, a doutrina liberal clássica limitava o alcance dos direitos fundamentais à regência
das relações públicas, que tinham o Estado em um dos polos, de forma que tais direitos eram
vistos como limites ao exercício do poder estatal. Os direitos fundamentais eram concebidos,
originariamente, como direitos subjetivos públicos, ou seja, como direitos do cidadão em face do
Estado.
Gregório Assagra de Almeida assegura que:
[...] a melhor orientação, presente tanto em doutrina, quanto em jurisprudência, é no
sentido de que os direitos e garantias constitucionais fundamentais têm eficácia
vinculativa tanto às entidades públicas em geral, quanto aos indivíduos ou entidades
privadas.5
Ipojucan Demétrius Vechi6 afirma que os direitos fundamentais específicos dos
trabalhadores são aqueles expressamente destinados aos trabalhadores e que têm, no polo
passivo, os empregadores, que podem ser públicos ou privados.
Para José Felipe Ledur 7o reconhecimento de direitos fundamentais do trabalho, de
caráter individual e coletivo, que integram o rol dos direitos fundamentais da Constituição de
1988, constitui alteração inovadora porque posiciona particulares (empregadores/tomadores de
trabalho) no polo passivo de direitos fundamentais aos trabalhadores e, por isso, objeto de
análise. A atribuição da titularidade de direitos fundamentais aos trabalhadores, concreção do
próprio valor social do trabalho erigido, fundamento da República Federativa do Brasil, é o ponto
culminante da evolução jurídico-constitucional de aproximadamente um século no País. Por isso,
as consequências desse trânsito do núcleo dos direitos do trabalho da Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT) e da legislação infraconstitucional, para a Constituição, mais especificamente
para o sistema especial de direitos fundamentais do trabalho nela consolidado, determinam a
necessidade de uma dogmática jurídica que responda a essa nova normatividade jus laboral.
Usando o conceito de sistema, Ledur 8 assinala que os direitos fundamentais do trabalho
são um sistema especial, onde o Estado não é, pelo menos diretamente, o sujeito do poder, mas
sim o particular.
5
ALMEIDA, Gregório Assagra de. Direito Material Coletivo.1. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2008, p. 333.
6
VECHI, Ipojucan Demétrius. A Eficácia dos Direitos Fundamentais nas Relações Privadas: O caso da Relação de
Emprego. Revista do Tribunal Superior do Trabalho, São Paulo: Lex Editora, vol.77, nº 3, jul/set 2011, pp 111-135.
7
LEDUR, José Felipe.A Constituição de 1988 e seu sistema especial de direitos fundamentais do trabalho. Revista
do Tribunal Superior do Trabalho, São Paulo: Lex Editora, vol.77, nº 3, jul/set 2011, pp 154-181.
8
LEDUR, José Felipe.A Constituição de 1988 e seu sistema especial de direitos fundamentais do trabalho. Revista
do Tribunal Superior do Trabalho, São Paulo: Lex Editora, vol.77, nº 3, jul/set 2011, pp 154-155.
305
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
9
LEDUR, José Felipe. A Constituição de 1988 e seu sistema especial de direitos fundamentais do trabalho. Revista
do Tribunal Superior do Trabalho, São Paulo: Lex Editora, vol.77, nº 3, jul/set 2011, p. 160
306
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
10
LEDUR, José Felipe. A Constituição de 1988 e seu sistema especial de direitos fundamentais do trabalho. Revista
do Tribunal Superior do Trabalho, São Paulo: Lex Editora, vol.77, nº 3, jul/set 2011, p. 161
11
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 27 edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2012, p. 293
12
O fim das certezas é uma obra de Ylma Prigogine, na qual a autora faz excelente enunciado cientifico no sentido
de relativizar até mesmo as leis da física. O livro intitulado Tempo, Caos e as Leis, foi traduzido no Brasil por
Roberto Leal Ferreira. Nesta obra a autora relativiza as leis de Newton, numa axiológica compreensão do tempo,
representada por uma flecha, a chamada fecha do tempo. A referência a autoria é para justificar a relativização das
normas jurídicas em contraponto à clássica teoria Kelseniana. Se Einstein afirmou que o tempo é ilusão, como
poderia a flecha do tempo emergir de um mundo que a física atribui uma simetria temporal? Ed. UNESP-2011
307
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Felipe Ledur 13 ao dispor que a norma contida no art. 7º da Constituição estende a proteção jus
laboral ao prestador de serviços, à relação de trabalho no plano dos direitos fundamentais. É
possível fixar a diretriz isonômica no sentido de que a norma ensejará tratamento diferenciado na
medida das diferenças específicas, ou seja: para quem trabalha mediante subordinação,
onerosidade, dependência econômica, não eventualidade e percebendo salário (empregado) e do
trabalhador em sentido lato.
Importante ressaltar que os destinatários de direitos fundamentais particulares não são
absolutos, havendo teorias no sentido de enquadrar estes destinatários (particulares) na condição
de pessoas naturais em situação de sujeitos de direitos fundamentais.
Esse entendimento engloba os chamados direitos sociais fundamentais previstos no
artigo 7º da Constituição no sentido de postá-los na categoria dos direitos de aplicabilidade
imediata e não com caráter de eficácia contida, programática ou pior, na teoria da reserva do
possível.
As violações aos direitos fundamentais podem partir tanto do Estado soberano como,
também dos agentes privados. Essa tendência atual de aplicação horizontal dos direitos
fundamentais não visa sobrepor-se à relação anterior, uma vez que o primordial nessa questão é a
aplicação dos direitos fundamentais, no caso concreto.14
Os direitos coletivos trabalhistas estão inseridos no texto Constitucional como direitos e
garantias fundamentais, conforme estabelecido no título II, capítulos I e título II da Constituição
Federal/1988. Portanto, de aplicação imediata, especialmente na proteção e manutenção dos
pressupostos essenciais relacionados à vida, à liberdade e à dignidade humana.
As normas e princípios daí imanentes caminham no sentido de proporcionar uma
“autonomia privada coletiva” justa. Mas é necessária a presença de políticas públicas no sentido
de resguardar direitos fundamentais do hipossuficiente, pois nem toda a categoria profissional
está devidamente aparelhada para enfrentar a organização econômica capitalista, que imprime
situações ideológicas em prol do lucro sem que o trabalhador perceba. Segundo Marcio Túlio
Viana:
[...] Um bom exemplo é a negociação coletiva. Velha bandeira dos trabalhadores, agora
é defendida com ardor crescente pela classe empresarial. Aliás, tornou-se tão importante
13
LEDUR, José Felipe.A Constituição de 1988 e seu sistema especial de direitos fundamentais do trabalho. Revista
do Tribunal Superior do Trabalho, São Paulo: Lex Editora, vol.77, nº 3, jul/set 2011, pp 166-167.
14
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional, 27, Malheiros Editores, 2012
308
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
que já não é vista como simples complemento da lei, mas virtualmente como a sua
sucessora. O problema é a outra metade do discurso, que permanece oculta.15
15
VIANA, Marcio Túlio. A Proteção Social do Trabalhador no Mundo Globalizado - O Direito do Trabalho No
Limiar do Século XXI. Revista Genesis, Curitiba, n.79, p. 49-69, 1999.
16
ALMEIDA, Gregório Assagra de.Direito Material Coletivo.1. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2008, p. 291.
17
CAPELA, Juan Ramón. Fruto proibido – Uma aproximação histórico-teórica ao estudo do direito e do
estado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002.
309
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
18
LEDUR, José Felipe.A Constituição de 1988 e seu sistema especial de direitos fundamentais do trabalho. Revista
do Tribunal Superior do Trabalho, São Paulo: Lex Editora, vol.77, nº 3, jul/set 2011, pp 170-171.
310
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
19
ALMEIDA, Gregório Assagra de.Direito Material Coletivo.1. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2008, pp. 429-435.
311
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
20
O Enunciado nº 310 do TST foi editado pela Resolução 1/1993, conforme DJ 06.05.1993 e cancelado somente
em 01.10.2003 através da Resolução nº. 119/2003, DJ 01.10.2003.
21
O art. 5º, XIII da CF – “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações
profissionais que a lei estabelecer”; XXI – as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm
ligitimidade para representar seus filiados judicial e extrajudicialmente”; o art. 2º da Convenção 87 diz que “Os
trabalhadores e os empreagadores, sem distinção de qulquer espécie, têm o direito, sem autorização prévia, de
312
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
constituir organizações de sua escolha, assim como o de se filiar a estas organizações, à conidição única de se
conformarem com os estatutos destas últimas.”
22
PIMENTA, José Roberto Freire. Tutela Metaindividual Trabalhista. 1ª edição. São Paulo:LTr, 2009, p.13.
23
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho, 8. edição. São Paulo: LTr, 2009, pp.1334-36.
313
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
314
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Embora pareça simples não o é, posto que, se o sindicato não for comprometido com a
categoria, seus representados sofrerão graves consequências de sua má gestão e isso é a grande
realidade vivida no movimento sindical. Não raras vezes maus diretores sindicais se envolvem
em fraudes e causam prejuízos econômicos e políticos à categoria, revelando-se verdadeira força
de opressão em face de seus próprios pares.
Por outro lado, a categoria, especialmente dos trabalhadores - porque a econômica, em
regra, é melhor estruturada, pode não ter representação, em função de estar localizada em lugar
de pouca densidade laboral. Neste caso, os trabalhadores não terão vida digna, porque contarão
apenas com políticas mínimas do governo central. Não terão como exigir qualidade na saúde,
melhores salários, boas condições de trabalho, podendo-se encontrar grupos em áreas territoriais
distantes, submetidos a condições de escravidão ou semi-escravidão.
Há, também, os chamados trabalhadores inorganizados os quais, em diversas áreas de
trabalho e regiões do país, não têm representação sindical e vivem à margem do sistema,à mercê
de suas limitações. Nestas condições, em geral, vigora soberba vantagem patronal em detrimento
das dificuldades obreiras e violação sistemática dos direitos constitucionais fundamentais.
Existe, ainda, um grande número de trabalhadores informais, os quais estão na condição
do chamado não direito, ou seja, não recebem a tutela do direito em nenhuma situação e, por isso,
vivem abaixo da linha da pobreza.
Um dos problemas mais críticos na relação de trabalho, que merece um artigo, mas aqui
será tratado em síntese, é a flexibilização de direitos, incluindo a terceirização. São fenômenos
ligados às inovações tecnológicas, a reestruturação produtiva e aos novos métodos de gestão da
mão-de-obra, cujo objetivo é o lucro desmedido do empregador, em detrimento à vulnerabilidade
do empregado, no que diz respeito à redução remuneratória, à proteção e aos cuidados com a
saúde dos trabalhadores.
Segundo Sebastião Geraldo de Oliveira24, a terceirização, a globalização e a
flexibilização das leis trabalhistas levam ao desemprego, à precarização do trabalho, enfraquece o
movimento sindical, aumenta a pobreza e a violência, provoca a queda do solidarismo e aumenta
o individualismo.
4.1 – O Dissídio Coletivo e a Emenda Constitucional 045/2004
24
OLIVEIRA, Sebastião Geraldo. Declinio do Emprego – Relação de Trabalho:Diagnóstico e Prognóstico. Revista
do Direito Trabalhista, n. 1, p. 30-34, jan. 1997.
315
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Sérgio Pinto Martins conceitua o Dissídio Coletivo como sendo “o processo coletivo
julgado pelos tribunais para estabelecer condições de trabalho aplicáveis às pessoas envolvidas
ou para interpretar determinadas normas jurídicas.”25
Existem dois tipos de Dissídios Coletivos: um de natureza jurídica e outro, de natureza
econômica. O primeiro é aquele em que há divergência na aplicação ou interpretação de
determinada norma jurídica. Sua finalidade é apenas declarar o sentido de uma norma jurídica já
existente ou interpretá-la. O segundo é aquele em que os trabalhadores reivindicam melhores
condições de trabalho, visando a criação, modificação ou extinção de determinadas condições de
labor. Sua sentença é de natureza constitutiva, ao passo que no dissídio jurídico ela é declaratória.
As partes, denominadas suscitante e suscitada, após a promulgação da Emenda
Constitucional 045/2004, passaram a exercer função incomum no processo como normalmente se
concebe. É que para a instauração do dissídio coletivo há necessidade de negociação prévia com
a comprovação do impasse caracterizado. Neste caso, impossibilitada a continuidade negocial, o
legislador passou a exigir que as partes só instaurem a instância se estiverem “de comum
acordo”. Isso motivou grande controvérsia, pois se o que impede as partes do fechamento das
negociações com êxito é exatamente a discórdia, como farão acordo para instaurar o dissídio?
A doutrina dominante entende que o livre acesso à justiça foi obstaculizado e que a
norma do art. 5º, XXXV da CF/88 foi violada. A razão principal do dissídio coletivo é provocar o
poder normativo da Justiça do Trabalho e, sem essa faculdade, as normas relacionadas ao tema
perderam a sua efetividade. Normalmente quem postula em dissídio é a categoria profissional e a
expressão “de comum acordo” estaria violando o direito de ação e aos direitos fundamentais dos
trabalhadores, principalmente levando-se em consideração que a maioria dos sindicatos é de
pequeno porte e de pouca representatividade.
A exigência de anuência da parte contrária para ajuizamento do dissídio coletivo esvazia
o sentido do referido postulado, retirando a eficácia deste importante instituto do direito coletivo
trabalhista e viola o princípio constitucional do livre acesso do trabalhador ao Judiciário
Trabalhista.
Dessa forma, a problematização se aloja na expressão “de comum acordo”. Daí a se
indagar: Há, realmente, violação ao disposto no artigo 5º, XXXV da CF/88? É constitucional
referida expressão? Existe impropriedade semântica na expressão? Qual a dimensão do poder
25
MATINS, Sergio Pinto. Direito Processual do Trabalho. 14 ED São Paulo: Ed. Atlas 2011, p. 121
316
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
26
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito do trabalho. 22 ed. Ver. E atual. São Paulo: Saraiva, 2007.
317
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
27
BRANDÃO,Cláudio.Disponívelemhttp://portal2.trtrio.gov.br:7777/pls/portal/docs/PAGE/GRPPORTALTRT/PAGINAPRI
NCIPAL/JURISPRUDENCIA_NOVA/REVISTAS%20TRT-RJ/049/11_REVTRT49_WEB_CLAUDIO.PDF.
318
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
28
Piovesan, Flavia. O princípio da Dignidade Humana e a Constituição Brasileira de 1988: Revista dos Tribunais,
vol. 833, p. 41, março de 2005. Doutrinas Essenciais de Direitos Humanos | vol. 1 | p. 305 | Ago/2011DTR\2005\203.
29
OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. . Proteção jurídica à saúde do trabalhador. 4. ed. São Paulo: LTr, 2002.1, p.
30-34, jan. 1997.
319
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
320
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
321
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
doenças da alma, muito mais grave e que atingem, um número, cada vez maior de trabalhadores,
ou seja, as depressões mentais. Em conseqüência, estas, afastam aqueles de seus postos de
trabalho, assim como são uma carga negativa e reflexiva em suas vidas sociais e familiares,
causando enormes prejuízos ao País. Aqueles assédios tëm suas causas e efeitos encontrados em
vários setores da sociedade, mas, na maioria das vezes, são conseqüência de um ambiente
empresarial capitalista agressivo e desmedido e por isto mesmo, são estudados multi e inter
disciplinarmente, pois afetam e são verificados em vários ramos das ciências ( por ex. a saúde),
do Governo ( por ex. a previdência) e do direito - como o empresarial, o previdenciário e porque
não, o trabalhista.
Os danos materiais ou morais conseqüentes daqueles assédios, em suas diversas formas
– moral lato sensu, horizontal (causados por chefes), vertical ( por colegas de trabalho), moral
stricto sensu ( mentais, causados por calúnias, difamações ou injúrias), e sexuais, quando
ocorrem no ambiente de trabalho em face do trabalhador, merecem especial proteção e rápida e
justa reparação do Estado, e é o que tem sido efetivamente resgatado pela Justiça do Trabalho em
dissídios individuais, em entendimentos pacificados por nossos TRT’s e, até mesmo, no TST.
Nesse sentido, o renomado doutrinador Yussef Said Cahali, versa sobre o assunto:
[...] é possível distinguir, no âmbito dos danos, a categoria dos danos patrimoniais, de
um lado, dos danos extra patrimoniais, ou morais, de outro; respectivamente, o
verdadeiro e próprio prejuízo econômico, o sofrimento psíquico ou moral, as dores, as
angústias e as frustrações infligidas ao ofendido. (CAHALI, 2011, p.18).
Já nos dissídios coletivos, com uma atuação pro – ativa do M.P. do Trabalho, começam
a despontar decisões educadoras e modelares no País, cada vez, menos isoladas, para
confirmarem a posição de apoio a sua efetividade, como requerida e descrita neste artigo, citando
– se exemplos de casos concretos a posteriori.
Diversos doutrinadores e juristas trabalhistas de peso no cenário nacional, lecionam a
respeito do instituto do assédio moral e a incidência deste fenômeno nas relações trabalhistas,
construindo-se um vasto número de estudos das causas, consequências, bem como, das formas de
sua reparação às vítimas trabalhista como já relatado neste. Verifica-se a ocorrência do dano
moral nas diversas fases do contrato de trabalho, desde a fase pré ( por ex. discriminações e
exigências desmedidas de exames de saúde ocupacionais e absurdas ) até a pós ( por ex.
referências do empregador antigo sobre seu funcionário para outros empregadores ) – contratual,
322
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
assim como a responsabilização do empregador, bem como o tema de mais difícil entendimento,
tão diversificado, quanto não pacificado neste ponto, ou seja, o quantum indenizatório.
A respeito do tema Paulo Eduardo V. Oliveira afirma que:
O dano à pessoa pode ocorrer em todos os momentos da relação de trabalho, quais
sejam: na fase pré-contratual, na celebração do contrato de trabalho, na execução do
contrato de trabalho, na extinção do contrato de trabalho e, até mesmo, na fase pós-
contratual. (OLIVEIRA, 2002, p.121).
Isto posto, o presente estudo, neste item, tem por objetivo principal demonstrar que,
através de estudos e fundamentos fáticos e jurídicos provados, os trabalhadores submetidos e
expostos a qualquer situação que caracterize o assédio e o dano moral laboral, poderão contar
com a justa proteção do Judiciário, mostrando que por meio da responsabilização do agressor,
podem buscar a devida reparação daquele dano, através de pacífico entendimento da Justiça do
Trabalho, mas reitera-se a opção pela conservação de um bom ambiente do trabalho, salubre,
sustentável e livre das diversas formas de assédios trabalhistas, para reafirmar o
comprometimento material da República Federativa do Brasil para com o PRINCÍPIO DA
DIGNIDADE HUMANA.
Nesse sentido, ensina o professor Cavalieri Filho que:
O dano moral ocorre sempre que há violação do princípio da dignidade da pessoa
humana ou de um dos direitos da personalidade, podendo ou não este fato causar dor ou
sofrimento na vítima, como nos casos, por exemplo, de ocorrência de dano moral a
vítimas incapazes de percepção da agressão ao seu patrimônio imaterial (e, portanto, não
vulneráveis ao sofrimento que esse conhecimento provoca), como no caso de crianças
em tenra idade, portadores de doenças mentais ou doentes em estado vegetativo ou
comatoso. O dano moral não está necessariamente vinculado a alguma reação psíquica
da vítima. Pode haver ofensa à dignidade da pessoa humana sem dor, vexame,
sofrimento, assim como pode haver dor, vexame e sofrimento sem violação da
dignidade. Dor, vexame, sofrimento e humilhação podem ser consequências, e não
causas. Assim como a febre é o efeito de uma agressão orgânica, a reação psíquica da
vítima só pode ser considerada dano moral quando tiver por causa uma agressão à sua
dignidade. (CAVALIERI FILHO, 2009, p.80).
Por fim, exige-se ainda, que a sociedade organize-se e atue hodiernamente no
aprimoramento para se efetivar o que fora preceituado nas políticas públicas de um Estado
Democrático de Direito e no princípio constitucional da dignidade humana. Sem esse
envolvimento social e a mudança de postura no sentido de aceitar as pessoas trabalhadoras com
323
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
seus defeitos e qualidades, ou seja, como seres humanos dotados de direitos e necessidades, a
sociedade caminhará na contramão dos ditames constitucionais do repúdio a qualquer tipo de
discriminação ou preconceito. É dever da sociedade democrática de extirpar qualquer espécie de
preconceito conforme determina o art. 3º, inc. IV da CF/88, assim como o exemplo a ser seguido
do PROJETO CIDADE ALTERIDADE: Convivência Multicultural e Justiça Urbana (
http://dgp.cnpq.br/buscaoperacional/detalhegrupo.jsp?grupo=03337026GS18IC ) , do Diretório
dos Grupos de Pesquisa do Brasil , no sítio do CNPQ, de autoria dos nobres Professores Miracy
Barbosa de Sousa Gustin e Boaventura de Sousa Santos.
6. O Ministério Público do Trabalho e a efetivação de direitos coletivos por danos morais
coletivos
Todo o arcabouço normativo e organizacional, destinado ao meio ambiente do trabalho
não tem sentido se não se cuidar da efetivação dos direitos, sob pena destes cuidados ficarem
apenas na aparência. É preciso uma conscientização empresária no sentido de extirpar a
maquiagem nos instrumentos assecuratórios do meio ambiente do trabalho (PCMSO, PPRA e
CIPAS) para, minimizar e, porque não dizer, eliminar a burlar à legislação para dar cumprimento
às normas relativas ao tema.
O empregado ou prestador de serviços deve se conscientizar melhor de seus direitos; o
empregador ou tomador de trabalho deve ter em mente a função social da empresa, que nas
palavras de Eloy Pereira Lemos Júnior 30 precisa estar revestida da boa-fé objetiva.
Para LEMOS JÚNIOR:
[...] A legislação nacional em vigor reconhece que, no exercício da atividade
empresarial, há interesses internos e externos que devem ser respeitados: não só os das
pessoas que contribuem diretamente para o funcionamento da empresa, como os
capitalistas e trabalhadores, mas também os interesses da comunidade em que ela atua. 31
O Estado, também, deve ter sua participação, não no sentido de interferir nas relações
entre empregado e empregador diretamente, mas na regulação dessas relações quando direitos
fundamentais estiverem sendo violados, com aplicação de políticas públicas na proteção dos
direitos fundamentais32 relacionados ao meio ambiente de trabalho.
30
LEMOS JÚNIOR, Eloy Pereira. Empresa & Função Social. Curitiba, Juruá Editora, 2009, p. 154.
31
LEMOS JÚNIOR, Eloy Pereira. Empresa & Função Social. Curitiba, Juruá Editora, 2009, p. 154.
32
GRINOVER, Ada Pelegrine e WATANABE, Kazuo. O Controle Jurisdicional de Políticas Públicas, São Paulo,
Ed. Forense, 2011, p. 158-9.
324
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
33
25 MEDEIROS, Xisto Tiago de. Dano Moral Coletivo, São Paulo, LTR, 2004, pág. 155.
325
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
326
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
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328
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
1
Carlos Eduardo Koller
2
Eduardo Biacchi Gomes
RESUMO
Sempre que se destina parcela de esforços para o discurso que envolve a democracia no
Brasil, salienta-se o papel dos indivíduos enquanto atores sociais e protagonistas do processo
de desenvolvimento. A expansão da liberdade do trabalhador, por sua vez, compadece diante
da negociação coletiva de trabalho que, não raras às vezes, impede o aprimoramento
democrático das instituições políticas. Acontece que a realidade da empresa tende a
internalizar os problemas e as necessidades de certo modo que se assemelha à burocracia de
1
Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Curitiba, 2006, (UNICURITIBA). Especialista em Direito
Constitucional pela Academia Brasileira de Direito Constitucional, 2008, (ABDCONST). Mestrando em Direito Econômico
e Socioambiental da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Professor Colaborador I das Faculdades Integradas do
Brasil (UNIBRASIL) e membro do Grupo de Pesquisa NEATES – Núcleo de Estudos Avançados de Direito do Trabalho e
Socioeconômico da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Advogado.
2
Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná, 1993, possui Mestrado em Direito pela
Universidade Federal do Paraná (2000), Especialista em Direito Internacional pela Universidade Federal de Santa
Catarina, 2001 e Doutorado em Direito pela Universidade Federal do Paraná (2003). É Pós-Doutor em Estudos Culturais
junto à Universidade Federal do Rio de Janeiro, com estudos realizados na Universidade de Barcelona. Atualmente é
professor-adjunto integrante do quadro da UniBrasil, Graduação e Mestrado em Direito, da Pontifícia Universidade
Católica do Paraná (professor titular) e da Facinter. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito
Internacional e Direito da Integração, atuando principalmente nos seguintes temas: blocos econômicos, direito comunitário,
direito internacional público, direito da integração, Mercosul e direito constitucional, foi consultor jurídico do MERCOSUL
em 2005 e 2006. É Editor gerente da Revista de Direitos Fundamentais e Democracia, vinculado ao Programa de Mestrado
em Direto das Faculdades Integradas do Brasil, Qualis B1, desde a sua fundação. Atualmente é coordenador adjunto do
Programa de Mestrado em Direito da UniBrasil.
329
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
ABSTRACT
Where part of efforts intended for speech involving democracy in Brazil, emphasizes the role
of individuals as social actors and protagonists of the development process. The expansion of
the freedom of the worker, in turn, have mercy on collective bargaining of work, not
infrequently sometimes prevents the enhancement of democratic political institutions. It turns
out that the reality of the company tends to internalize the problems and needs in a way that
resembles a state bureaucracy, legally constituted as a public law entity. The worker in this
context can not be considered entirely free to the point of self-determination in choosing their
interests. Often what we have in mind is the speech apocryphal legal standards that engender
the interest of the corporation obscure: the development of their economic potential and profit
with maximum reduction of expenses. However, the Brazilian state protected individual
rights, especially those relating to private property, assuring them "status" of fundamental
rights, which implies recognizing its prevalence over the other species regulations. Of course
this does not mean that the employer can in everything run its business activity as well as in
determining the rules that will make the scene work. There are limits that make this practice
dating from the dawn of humanity. Plato already understand justice as the composition of
conflicting interests, ensuring an interesting past in constructing the history of collective
bargaining work. Finally, Karl Marx showed ecologic attitude about man's relationship with
nature and assigned a "metabolic rift" in this construction that, in contemporary times, is
halting the process of sustainable development.
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COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
1. INTRODUÇÃO
Platão tentando volver a discussão com Gláucon acerca da natureza da Justiça propôs
a falar de sua origem primordial. Empreendeu-se a considerar que cometer a injustiça seria,
por natureza, cometer o bem, ao passo que sofrer com ela, indubitavelmente seria um mal.
Entretanto, grosso modo, teriam descoberto os homens que cometer injustiças é da natureza
humana, porquanto pactuarem-se para a sua extinção, talvez, a forma mais branda de
recuperar os efeitos deletérios daquele processo degenerativo.
Em “A República” de Platão, longo, complexo e extenso ensaio sobre a Justiça
encara a noção de poder, de composição de interesses e da relação do homem no exame das
proposições que podem convergi-los à solução dos interesses em conflito. É claro que não é
este o foco do presente trabalho, qual seja, empreender-se em profunda discussão filosófica
acerca da natureza da justiça. Todavia, o mais surpreendente é imaginar que a humanidade
caminhou longos séculos desenvolvendo a ideia da composição de interesses como causa do
progresso. Isso mesmo, o progresso vem somado com a ideia de superação dos problemas da
sociedade que, na atualidade, envolvem, indubitavelmente, questões ambientais, ecológicas e
de sustentabilidade.
Ainda, criou-se um Estado regido por uma Constituição que, além de outras coisas,
previu a separação daqueles poderes, os mesmos poderes discutidos pelos filósofos da
antiguidade, perpassando pela proteção dos direitos individuais e modernamente, na eterna e
constante busca, quiçá incessante, pelo desenvolvimento nacional, a redução das
desigualdades e a construção de uma sociedade livre, justa e solidária.
Seguramente a Negociação Coletiva de Trabalho é um meio eficaz de se alcançar, no
âmbito privado, a já conhecida composição de interesses que superam as injustiças que, por
natureza, decorrem da própria vida humana. É do homem, senão do empresário, a busca pelo
lucro e pelo aumento do seu capital. O cerne da questão é a que preço se busca esse
progresso? Estariam os homens a cometer as mesmas injustiças em busca do crescimento de
suas atividades empresariais? A atuação do empresário é justa para com o meio ambiente?
Aqueles trabalhadores que, sem escolha, submeteriam-se aos desmandos do poder diretivo do
empregador (injustiça consagrada a partir do momento que surgem os excessos já colimados
pela Consolidação das Leis do Trabalho quando esta prevê a possibilidade de rescindir o
contrato de trabalho quando o trabalhador receber ordens com rigor excessivo, por exemplo)
podem viver em um ambiente de trabalho mais sadio?
O respeito à liberdade e a igualdade permite que o trabalhador externalize as suas
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COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
diferenças e as suas posições no cenário social que, sob nenhuma hipótese – pelo simples
fato dele estar inserido dentro do ambiente empresarial – poderá perder-se, vindo a matar a
democracia que acontece viva, mas fora dos portões da empresa. Muitas vezes, dentro do
local de trabalho o empregado se submete a uma similar ditadura de interesses positivados em
assembleias gerais ou, noutra ponta, em regimentos internos rígidos e completamente
obsoletos, alheios ao regime democrático e ao respeito dos direitos individuais. É como se a
democracia morresse, juntamente com todos os direitos individuais adquiridos, no momento
em que se fecham os portões da empresa, retendo os trabalhadores lá dentro como meros
escravos do progresso da corporação.
Em nenhuma hipótese, todavia, se pretende sustentar o fim da segurança jurídica e da
livre iniciativa que caracterizam a atuação empresarial, bem como não se pretende extinguir a
propriedade individualmente considerada, mas limita-la, seguramente. É dever do Estado
enquanto ente abstrato dirigir esforços neste sentido. Já se tem os meios, a democracia é o
caminho, mas os novos problemas que já tem causas antigas conhecidas – notadamente
aqueles de ordem ambiental – não podem ficar derrogados da discussão. Aparentemente a
tendência que se observa na negociação coletiva é de que o modelo sindical brasileiro é frágil,
tanto é que se chega ao ponto de se afirmar que no Brasil não existe liberdade sindical plena,
porquanto a liberdade de associação fica comprometida no momento em que o trabalhador
não pode, livremente, escolher associar-se ou não ao seu sindicato.
As causas conhecidas, entretanto, podem ter livremente respostas antagônicas, sendo
que a ruptura de velhos paradigmas pode estar próxima de encontrar a verdadeira solução.
Não há liberdade em que não haja democracia.
No mundo contemporâneo somadas empresas exercem um poder de fato
surpreendentemente semelhante àquele formulado pelos Estados autoritários em suas
constituições. Estas mesmas empresas criam situações tão ameaçadoras dos direitos e
garantias individuais, até mesmo dos direitos humanos, que se pode afirmar que, muitas delas,
não todas, evidentemente, superam a própria proteção que o Estado concede a estes direitos
com posturas hostis e marginais, deixando no acostamento da vida social as conquistas sociais
e os resultados da eterna luta de classes. Muitas destas empresas trancam dentro de seus pátios
trabalhadores e seus direitos para, ao fim do expediente, libertá-los com suas garantias
simbolicamente protegidas. Somente a negociação coletiva de trabalho é capaz de dar palavra
e voto aos empregados no âmbito da empresa, bem como revelar os problemas vividos e
prospectar soluções possíveis.
332
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
A filosofia moral grega sempre esteve vinculada à Razão Humana, ainda que a
cultura helênica sempre estivesse vinculada em questões e fatos religiosos, narrados por
Homero, por exemplo. Neste sentido, afirma RAWLS (2005, p. 6-7), que “ a filosofia moral
grega se inicia dentro do contexto histórico e cultural da religião cívica de uma pólis em que
as epopeias homéricas, com seus deuses e heróis desempenham um papel central.”
Com o desenrolar a história, os filósofos modernos e contemporâneos, como Kant
(1724/1804) por exemplo, passaram a considerar a razão como um dos elementos centrais da
filosofia e, assim, elevar a importância do homem como elemento central da filosofia. Os
valores da filosofia e a ética, como qualquer ciência social, devem ser considerados como
elementos centrais em qualquer relação entre os homens, especialmente no que diz respeito ao
trabalho.
Os homens com reduzido poder são por certo os trabalhadores. Eles se submetem às
regras ditadas pela corporação e vivem cada vez mais oprimidos e isolados da verdadeira
democracia. Como anteriormente afirmado, a democracia não penetra no isolamento da
empresa, ao passo que os portões desta vem a despir os trabalhadores de suas garantias
individuais. O único direito que surge, neste momento, é o direito de trabalhar. Parece que a
empresa despe o empregado e lhe devolve a roupagem das garantias individuais no exato
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COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
momento em que este regressa para sua casa, sua família, portanto, para fora dos muros que
lhe separam da sociedade.
A finalidade da atividade empresarial, em sua essência, é o lucro e, muitas vezes, tais
objetivos se sobrepõe aos direitos sociais, reconhecidos tanto pelo Direito Internacional do
Trabalho, como pelo próprio Direito Constitucional. Referida lógica utilitária do capitalismo
perverso deve ser rompida, no sentido de se valorizar a mão de obra, que é o sustentáculo
principal das relações de trabalho.
O utilitarismo, enquanto filosofia, no campo social e laboral é extremamente danoso,
visto que a ideia central desta corrente filosófica, que teve como um de seus Jeremy Benthan
(1748/1832) é no sentido de que “o mais elevado objetivo da moral é maximizar a felicidade,
assegurando a hegemonia do prazer sobre a dor. (...) a coisa certa a fazer é aquela que
maximizará a utilidade.” (SANDEL, 2012, p. 48).
Concretamente, a visão utilitarista da atividade empresaria, gera uma divergência de
interesses entre os empresários e a classe obreira que se oprime no cenário de lutas. A reunião
de pensamentos e ideologias semelhantes faz chegar ao conselho administrativo, por exemplo,
as reivindicações da classe dos trabalhadores. Da mesma forma, ao serem ouvidos em suas
necessidades revelam, por si só, todas as situações que, não raras, sequer chegariam ao
conhecimento do empregador. Portanto, está ai um dos papéis mais significativos da
negociação coletiva, pois além de compor os interesses antagônicos, é, também, capaz de
revelar a realidade interior da empresa, com seus problemas, seus aspectos positivos e
negativos. Veja-se em Patrícia Springborg (1980, p. 205):
Dado que Rousseau ao tratar da natureza humana mostrou a necessidade
associativa como pré-condição de perfectibilidade do homem, somos
forçados a concluir que não é a sociedade como tal que ele condena, mas
uma forma específica de sociedade: aquela orientada para a busca do luxo e
dos bens efêmeros, caracterizada pela desigualdade, o consumo imoderado, a
corrupção, etc. – que Marx subsequentemente iria condenar como os males
específicos da sociedade burguesa.
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se não for possível atribuir voz aos sujeitos envolvidos neste processo que, no ambiente
laboral, proclamam poder de voto. Eleger os seus interesses pelas suas necessidades é a única
forma de trazer, concretamente, a democracia para dentro da empresa.
Paralelamente à intervenção estatal, deve ser reservado amplo espaço para
que os atores sociais, de modo mais dinâmico do que o próprio Estado,
possam acompanhar as mudanças sociais. Um bom exemplo desta
concepção tem sido a atuação das chamadas câmaras setoriais, onde
efetivamente houve um avanço, pois trabalhadores e empregadores
perceberam a necessidade de sentarem-se à mesa e estipularem normas
comuns. Tal experiência constitui um embrião de pacto social, pois se
apresenta como negociação trilateral, contando também com a participação
de representantes governamentais. (HELOANI, SILVA, p. 75).
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COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
brasileiro, sem a correta contrapartida que seria justamente permitir o aumento da liberdade
do trabalhador, poder-nos-ia inclinar para a formação de um poder paralelo, retendo nas mãos
de poucos empresários o poder que antes era somente do Estado. É a velha lógica da
dominação do mais forte e é tudo aquilo que se vive na modernidade, infelizmente.
Isso não se dá com a ampliação da liberdade do trabalhador, por mais paradoxal que
seja, devendo se analisar os limites existentes que conformam uma análise dualista: de um
lado a preservação dos direitos individuais e, de outro, a possibilidade de criação de um
Estado de direito socioambiental.
Antes mesmo de iniciar a análise destas concepções deve-se lembrar de antemão que
o risco é inerente a toda e qualquer hipótese de previsão, podendo se manifestar na
hipossuficiência humana em prever todos os eventos possíveis. A negociação coletiva de
trabalho não tem o condão de esgotar as possibilidades de fato, tampouco de direito, mas tem
a aptidão de resguardar o máximo de garantias, especialmente estende-las ante a complexa
tarefa do Estado em prever o imprevisível.
O Estado, na atualidade, não é mais o único sujeito capaz de condicionar,
restringir ou eliminar a liberdade das pessoas (indivíduos ou grupos). Nas
relações horizontais entre os particulares verifica-se, amplamente, a
capacidade de alguns sujeitos exercerem essas práticas. No mundo
contemporâneo, gigantescos grupos privados exercem um poder de fato não
menos ameaçador do que o Estado. Estratégias políticas nacionais e
transnacionais afetam toda uma coletividade (de trabalhadores e cidadãos)
dependendo da fruição econômica desses conglomerados. (AGUIAR, p.
102).
A ameaça, por óbvio, aos direitos e garantias individuais não decorre de um poder
politicamente constituído enquanto Estado, mas de uma estrutura economicamente organizada
e complexa, voltada para a exploração da atividade econômica e a busca de lucro. Por sua
vez, os fatores de produção que concorrem para o sucesso da proposta são os principais
atingidos, porquanto a mão de obra acaba sendo barateada e o diálogo entre as diversas
estruturas da corporação comprometendo-se com a hígida burocracia empresarial.
A estrutura da empresa demonstra uma saúde tão inabalável ao ponto de não permitir
a invasão de nenhum oportunista que, ironicamente, incluem-se a própria democracia e os
objetivos republicanos, pelo que não é do interesse do megaempresário por em discussão o
seu poder.
Interessante passagem é registada na obra do sociólogo Alain Touriane (1988, p.
209), quando levanta a possibilidade de se equiparar a estrutura jurídica das grandes
corporações aos Estados politicamente constituídos, burocráticos e com o poder
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COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
absolutamente preso nas mãos de uma única pessoa que, no caso da empresa, rende-se ao
conselho de administração.
Hoje, ao contrário, os movimentos sociais que surgem em diferentes
domínios não mais são formas de defesa dos trabalhadores contra padrões da
indústria, mas de defesa do público contra os organismos de administração
que têm o poder de modelar a procura em função de seus interesses.
Abrir as portas da empresa para que além de entrar trabalhadores, permitir, também,
a entrada de novas formas de se exercer a própria política. Não rara são as empresas que,
advindas de um país do exterior, carregam a ideologia política e econômica do local de onde
são originárias, o que implica em dizer que o conflito, em casos tais, será inerente da própria
atividade empresarial.
Como ficaria a situação dos trabalhadores que foram submetidos a uma catástrofe
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COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
É claro que não se pode deixar de considerar que na Europa o que se vivia era um
regime nazifascista que, não obstante fosse voltado para a preservação de ideais nacionais,
procurou, da mesma forma, se estabilizar a indústria, especialmente a bélica com o aumento
da produção de armas de destruição em massa. Mas o que se tem na atualidade é um contexto
semelhante, porquanto as grandes empresas têm impedido os seus trabalhadores de exercerem
aqueles direitos fundamentais conquistados mediante um processo de violenta repercussão
social.
É preciso levar a proteção constitucional para dentro da empresa, especialmente
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O que resta dessa análise e que interessa ao presente trabalho foi justamente a ideia
3
No texto o autor destaca entre aspas a expressão “catástrofes naturais”, pois subentende-se que a exata medida
em que o homem vem destruindo o Planeta Terra com sua postura hostil em busca do maior lucro pelo menor
esforço, vem também ocasionando desastres naturais como se deu recentemente no Japão com um Tsunami que
rompeu grandes reservatórios de energia nuclear, colocando em risco toda uma comunidade local, quiçá, a
humanidade como um todo.
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A vida humana merece esse respeito. O trabalhador precisa desta voz dentro do
ambiente empresarial, pelo que sua participação neste fenômeno irá impedir que se destine
sua vida para um precipício chamado desenvolvimento econômico. A busca incessante pelo
aumento do lucro não pode consistir em depreciação de valores humanos, especialmente
aqueles que decorrem do exercício das liberdades constitucionais.
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Todavia, não se pode imaginar que a natureza deva permanecer intacta, pois isso
implicaria em impedir toda e qualquer manifestação humana, o que impediria o progresso a
tal ponto que teríamos poucas chances de manter a própria espécie humana, por mais
paradoxal que seja precisamos modificar a natureza.
A preservação do meio ambiente, natural e cultural, não pode ser global,
porque isto implicaria impedir qualquer intervenção antrópica modificativa
do meio ambiente e manteria estático o processo cultural. Preservar toda a
intervenção cultural humana na natureza ou toda manifestação cultural é um
absurdo e uma contradição, porque a guisa de proteger as manifestações
passadas, se estaria impedindo que a cultura continuasse a se manifestar.
Implicaria não admitir qualquer possibilidade de mudança, processo ou
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Não se pode incorrer neste equivoco. Estamos certos que a vida humana não é a
única que merece cuidados, porquanto a tutela dos direitos das demais espécies vivas jamais
pode ficar no acostamento ou não se dar a contento. Acontece que a forma que o homem vem
desempenhando a atividade empresarial destoa da proteção da própria vida humana. Permitir
que os trabalhadores sejam ouvidos e fornecer a estes educação ambiental plena, complexa e
satisfatória, aliadas a promoção de um novo modelo de Estado – o Estado de Direito
Socioambiental – , retira do homem a sua máxima importância e maximiza seus interesses
pela preservação de toda e qualquer forma de vida. Mais que isso, revela a crueldade que se
dispõe a atividade empresarial, em alguns setores, notadamente industriais, e dá ao
trabalhador o especial direito de se insurgir contra a atividade nociva ao meio ambiente.
Resguarda-se a vida humana com a proteção de todas as formas de vida. Sempre que
se formularam questões mais profundas acerca dos conceitos pré-existentes obteve-se mais
sucesso. A empreitada humana no Planeta depende da própria noção que o homem formula da
sua realidade. Há pouco tempo para reparos e menos ainda para cometer erros.
John Bellamy Foster (2011, p. 224) traz verticalizada análise acerca da relação do
homem com a natureza, de modo que concebe sua teoria dentro do conceito de metabolismo,
pelo qual os seres vivos estariam a extrair da natureza sua própria fonte de vida, e a essa troca,
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Neste sentido o conceito de metabolismo passou a ser ligado a todas as ciências que
explicaram a relação dos organismos com o meio ambiente. Mas essa discussão é demasiada
antiga para alguns economistas e moderna para juristas que encaram a sustentabilidade como
discurso politicamente correto. A negociação coletiva de trabalho tira da empresa a realidade
e traz a tona a discussão que envolve o contexto laboral – metabolicamente doente – com a
quebra de paradigma diante da sociedade moderna.
A tutela de todas as formas de vida para as próximas gerações advém do pensamento
sistêmico. Todos os homens, especialmente os trabalhadores, estão inseridos dentro de um
contexto que compõe um todo organizado, agora voltado para a preservação de todas as
formas de vida, incluindo neste discurso a vida humana.
À medida que a concepção de rede tornou-se mais e mais proeminente na
ecologia, os pensadores sistêmicos começaram a utilizar modelos de rede em
todos os níveis dos sistemas, considerando os organismos como redes de
células, órgãos e sistemas de órgãos, assim como os ecossistemas são
entendidos como redes de organismos individuais. De maneira
correspondente, os fluxos de matéria e de energia através dos ecossistemas
eram percebidos como o prolongamento das vias metabólicas através dos
organismos. (CAPRA, 2004, p. 45).
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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
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REFERÊNCIAS
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Editores, 2002.
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ed. Curitiba: Juruá, 2006.
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9. LEITE, José Rubens Morato [Org.]; FERREIRA, Heleni Sivini [Org.]; CAETANO,
Matheus Almeida [Org.]. Repensando o estado de direito ambiental. A Expressão dos
Objetivos do Estado de Direito Ambiental na Constituição Federal de 1988.
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349
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
12. PLATÃO. A República. Tradução Leonel Vallandro - [Ed. especial]. Rio de Janeiro:
Editora Nova Fronteira, 2011.
13. RAWLS, John. História da filosofia moral. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2005.
14. SEN, Amartya. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Editora Schwarcz Ltda,
2000.
16. SANDEL, Michael. Justiça: o que é fazer a coisa certa. 7ª. ed. Rio de Janeiro: Editora
Civilização Brasileira, 2012.
17. TOURAINE, Alain. O Pós socialismo. São Paulo: Editora Brasiliense, 1988.
18. VARGAS, Luiz Alberto [Org.]; HELOANI, J. Roberto; SILVA, Walkure Lopes Ribeiro.
Democracia e Direito do Trabalho. Estado democrático, tecnologia e relações de
trabalho. São Paulo: Editora LTr, 1995.
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RESUMO
Hodiernamente o ordenamento jurídico brasileiro vem passando por uma série de
transformações em decorrência da realização da Copa do Mundo FIFA 2014 e da Copa das
Confederações FIFA 2013 em solo nacional, incluindo questões de alçada do direito coletivo
do trabalho. No formato de um artigo científico original esta obra busca verificar o impacto
jurídico causado pelos megaeventos nas relações coletivas de trabalho, bem como estabelecer
conclusões acerca da compatibilidade constitucional do projeto de lei do senado n. 728 de
2011 no que pertine ao tema do exercício de greve. O desenho investigativo selecionado é o
explicativo com emprego do método de abordagem dialético, a pesquisa foi qualitativa e
prospectiva com dados coletados referentes ao período de 2010 até o ano de 2013 alicerçada
em levantamento bibliográfico e em apanhado legislativo. Como resultado desta empreitada
científica se constata a prevalência dos interesses econômicos em detrimento dos interesses
sociolaborais no que se refere ao tema coletivo trabalhista e os eventos FIFA; este fato
desencadeia a incompatibilidade patente entre o vigente ordenamento jurídico e as propostas
de transformações legislativas, quanto ao tema laboral, planificadas para a realização das
competições futebolísticas. Mesmo sendo incontestes os ganhos econômicos alavancados
pelos acontecimentos esportivos mais significativos do planeta no Brasil, cumpre à presente
obra emitir um aviso de prevenção contra a grave ameaça de retrocesso no que concerne aos
direitos sociais do trabalho.
Palavras-chave: Copa do Mundo 2014; Direito coletivo do trabalho; Exercício de greve;
Princípio da proibição do retrocesso dos direitos sociais.
RESUMEN
Actualmente el sistema jurídico brasileño ha experimentado una sucesión de transformaciones
en consecuencia de la realización de la Copa Mundial FIFA 2014 y de la Copa de las
Confederaciones FIFA 2013 en suelo nacional, incluyendo cuestiones relacionadas al derecho
colectivo del trabajo. En el formato de un artículo científico original esta obra objetiva
verificar el impacto jurídico causado por los mega eventos en las relaciones colectivas de
trabajo, igualmente establecer conclusiones acerca de la compatibilidad constitucional del
proyecto de ley del senado n. 728 de 2011 en respecto al tema del ejercicio de huelgas. El
diseño investigativo seleccionado es el explicativo con empleo del método de abordaje
dialéctico, la pesquisa fue cualitativa y prospectiva con datos reunidos referentes al año de
2010 hasta el año de 2013 basada en investigaciones bibliográficas y en compilación
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1 INTRODUÇÃO
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imprensa, salvo raras exceções; refere-se ao que está além das seleções nacionais e da paixão
das massas pelo futebol. Na realidade este escrito nasce do exercício do pensar científico
voltado para as incertezas na preparação brasileira para sediar o maior entretenimento
esportivo do planeta.
Procurou-se aqui pensar se realmente há um “lucro” na realização dos megaeventos
em solo nacional no ano de 2014 e 2013, respectivamente. Não estamos falando aqui
meramente de um superávit financeiro e sim de um ganho abrangente, estamos falando aqui
de um “lucro social” que beneficie a sociedade brasileira em suas camadas mais profundas.
Buscou-se aqui a inspiração em questões que realmente são relevantes para os verdadeiros
patriotas, como: O que é a Copa do Mundo de Futebol do ponto de vista socioeconômico?
Qual o legado social que o campeonato mundial de futebol deixará para o povo brasileiro?
Como a Copa do Mundo ajudará à proporcionar uma distribuição de renda equitativa e o
combate à pobreza?
Mister se faz esclarecer que a corrente obra é norteada pelos questionamentos acima
levantados, todavia sempre partindo da ótica do direito coletivo do trabalho e dos institutos
jurídicos pertinentes ao tema “trabalho”. Desta feita, não haverá risco de fuga ao problema
científico proposto e dos objetivos idealizados.
Pois bem, voltando às inquietações, é difícil dimensionar o gigante em que os
eventos em comento se tornaram, transcendendo em muito ao patamar de meros campeonatos
esportivos. Para um simples vislumbre, seguem as esclarecedoras palavras de Bernasconi:
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Essa convicção exsurge dos números verificados nas edições anteriores dos
Jogos da Copa do Mundo: em 1994, os EUA receberam 400.000 turistas; a
França, em 1998, 500.000; o Japão, em 2002, 400.000; e a Alemanha, em
2000, por conta da sua localização geográfica privilegiada, bem no centro da
Europa, recebeu 2 milhões de turistas; a África do Sul, em 2010 recebeu
cerca de 500.000.
Levantamentos dão conta de que em 1994 os EUA aumentaram em 1,4% o
PIB; em 1998, na França, ele cresceu 1,3% à mais; em 2002, a Coréia o
elevou em 3,1%; e a Alemanha, em 2006, teve crescimento de 1,7%.
(SENADO FEDERAL, 2011, pp. 20-21)
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A lei federal n.º 12.663 (BRASIL, 2012), apelidada de Lei Geral da Copa, dispõe
sobre as medidas relativas à Copa das Confederações FIFA 2013, à Copa do Mundo FIFA
2014 e à Jornada Mundial da Juventude - 2013, que serão realizadas no Brasil; altera as leis
nos 6.815, de 19 de agosto de 1980, e 10.671, de 15 de maio de 2003; e estabelece concessão
de prêmio e de auxílio especial mensal aos jogadores das seleções campeãs do mundo em
1958, 1962 e 1970.
Através desta normativa foram consolidadas condições especiais à FIFA, conforme
havia sido prometido pelo governo brasileiro ainda em fase de concorrência, na época em que
o Brasil ainda era um postulante ao cargo de hospedeiro dos megaeventos. São temas ligados
à permissão de entrada e saída, permissões de trabalho temporário, direitos alfandegários de
impostos, isenção geral de impostos para a FIFA e para seus parceiros, segurança e proteção
dos visitantes e das equipes, facilitação de bancos e câmbio, procedimentos de imigração,
alfândega e check-in, proteção de exploração de direitos comerciais, hinos e bandeiras
nacionais, indenização, infraestrutura de telecomunicação e tecnologia da informação
Insta ressaltar que várias garantias e benefícios concedidos são estendidos aos
consortes comerciais da entidade máxima do futebol, fato este que só reforça a autonomia
emanada pela FIFA, pois não só impôs ao governo brasileiro um completo regime de exceção
quanto aos assuntos mencionados acima, tudo isso para amparo próprio, como também
estende vários destes benefícios aos patrocinadores e protagonistas dos empreendimentos.
No que tange ao tema trabalhista a lei geral da copa (BRASIL, 2012) realiza duas
intervenções e, por consequência, abrindo caminho para outras modificações através de
projetos legislativos específicos. Os dois pontos tratados pela LGC são: a concessão especial
de autorização para trabalho de estrangeiro em solo nacional em caráter temporário; e o
trabalho voluntário para finalidades ligadas aos eventos futebolísticos sem a vinculação
empregatícia dos contratados.
Nesta janela surge o projeto de lei do senado n.° 728 (SENADO FEDERAL, 2011),
que projeta reformas legislativas no âmbito trabalhista ao pretender uma regulamentação mais
particular quanto ao exercício da greve nas atividades relacionadas à Copa do Mundo FIFA
2014 e à Copa das Confederações FIFA 2013. Em verdade, o PLS tenta valer-se da onda de
transformações engendrada para atender os compromissos assumidos pelo governo brasileiro
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perante o órgão máximo do futebol mundial para ser o hospedeiro dos megaeventos em 2014
e em 2013, respectivamente.
No que tange ao objeto de investigação do presente artigo científico interessa o
capítulo VI do projeto de lei do senado n.° 728 (SENADO FEDERAL, 2011), denominado de
“das limitações ao exercício do direito de greve”. De pronto, o artigo 411 do PLS (SENADO
FEDERAL, 2011) inaugura o assunto acerca da greve; neste fica delimitado que os
destinatários da proposta são as categorias profissionais que desempenham atividades
relativas à Copa do Mundo FIFA 2014 e à Copa das Confederações FIFA 2013, inclusive
restringindo-se aos trabalhadores posicionados nas cidades-sedes dos eventos.
Mister se faz ressaltar que o PLS cria uma figura jurídica completamente inédita,
haja vista que emprega a expressão “serviços ou atividades de especial interesse social” ao se
referir aos trabalhadores envolvidos em ocupações laborais conectadas à realização das
competições futebolísticas.
Outro conteúdo do mesmo artigo acima citado é o marco inicial para que as
condições especiais projetadas para a greve passem a ser exigíveis; sendo este, do período que
antecede cada evento (três meses antes do início das competições, conforme explica as
disposições iniciais da proposta) e durante a realização dos próprios. Finalizando quanto a
este artigo do PLS, quanto aos destinatários deste, resta claro que a normativa proposta teria
preponderância em comparação à lei de greve, n.º 7.783 (BRASIL, 1989), em respeito ao
princípio da especificidade da norma passando a lei geral possuir atuação subsidiária e
aplicação apenas no que for compatível com a nova regulamentação.
O artigo 422 do projeto de lei do senado n.° 728 (SENADO FEDERAL, 2011) é
crucial, pois prevê um rol exemplificativo referente aos serviços ou atividades de especial
interesse social, citamos algumas hipóteses: a hotelaria, hospitalidade e serviços similares; a
construção civil, no que se refere a obras destinadas aos eventos ou de mobilidade urbana; a
distribuição e comercialização de alimentos; e etc.
1
No período que antecede ou durante a realização dos eventos, o exercício do direito de greve nas cidades-sede
pelas categorias que desempenham serviços ou atividades de especial interesse social fica condicionado ao
disposto nesta Lei, sem prejuízo da aplicação, no que não contrariá-la, do disposto na Lei n.° 7.783, de 28 de
junho de 1989.
2
Para os efeitos desta Lei, consideram-se serviços ou atividades de especial interesse social: I – tratamento e
abastecimento de água; II – produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis; III – assistência
médica e hospitalar; IV – distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos; V – operação,
manutenção e vigilância de atividades de transporte coletivo; VI – coleta, captação e tratamento de esgoto e
lixo; VII – telecomunicações; VIII – controle de tráfego aéreo; IX – operação, manutenção e vigilância de portos
e aeroportos; X – serviços bancários; XI – hotelaria, hospitalidade e serviços similares; XII – construção civil, no
que se refere a obras destinadas aos eventos de que trata esta Lei ou de mobilidade urbana; XIII – judicial e de
segurança pública, observada a vedação constante do art. 142, § 3o, inciso IV, da Constituição Federal.
357
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
No artigo 433 do projeto de lei do senado n.° 728 (SENADO FEDERAL, 2011) se
fixa a obrigação de pré-aviso, com antecedência mínima de quinze dias, para o acontecimento
da greve nos serviços ou atividades de especial interesse social, este deverá ser destinado à
classe patronal respectiva, aos empregados individualmente interessados e aos usuários dos
serviços paralisados. No mesmo sentido o artigo 444 do projeto de lei do senado n.° 728
(SENADO FEDERAL, 2011) exige que seja mantida uma cota mínima de funcionamento em
se tratando de ocupações de especial interesse social, assim tornaria-se obrigação do
movimento paredista garantir que, no mínimo, setenta por cento da força de trabalho estivesse
ativa para a satisfação das necessidades inadiáveis da organização dos eventos.
O próximo artigo em comento, este de número 455 (SENADO FEDERAL, 2011),
autoriza a contratação de mão de obra substituta em caso de movimento grevista deflagrado
em ocupações de especial interesse social. Já o artigo 486 do projeto de lei do senado n.° 728
(SENADO FEDERAL, 2011) confere às ações de dissídios coletivos referentes às categorias
envolvidas em atividades ou serviços de especial interesse social, ajuizados perante o Poder
Judiciário trabalhista, máxima urgência para julgamento inclusive quanto à publicação
imediata da respectiva sentença normativa.
No que toca aos demais artigos do projeto de lei do senado n.° 728 (SENADO
FEDERAL, 2011), estes são concordantes com a lei de greve (BRASIL, 1989) e não
representam nenhuma novidade quanto ao que já consta no atual ordenamento trabalhista. São
estes os artigos 46, 47, 49 50 e 51, todos inseridos no capítulo VI.
3
Havendo deliberação favorável de categoria que desempenha serviço ou atividade de especial interesse social,
conforme definido no art. 42, no sentido da paralisação coletiva da prestação do correspondente serviço ou
atividade, deverão ser notificados a entidade patronal respectiva, os empregados diretamente interessados e os
usuários, com antecedência mínima de 15 (quinze) dias.
4
Nos serviços ou atividades de especial interesse social, os sindicatos, os empregadores e os trabalhadores ficam
obrigados a garantir, durante a greve, a prestação dos serviços de, no mínimo, 70 % (setenta por cento) da força
de trabalho, garantindo o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade e da organização dos eventos.
5
Ao Poder Público é permitida, em caso de greve, a contratação de servidores substitutos, em número suficiente
para o atendimento das necessidades inadiáveis da população e dos serviços cuja paralisação resulte em prejuízo
irreparável, pela deterioração irreversível de bens, máquinas e equipamentos, bem como a manutenção daqueles
essenciais à retomada das atividades da empresa quando da cessação do movimento.
6
A Justiça do Trabalho conferirá máxima prioridade de processamento e julgamento aos dissídios referentes às
categorias ou atividades arroladas no art. 42, cumprindo ao Tribunal publicar, de imediato, o competente
acórdão.
358
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Desde o início desta obra resta claro que a abordagem aqui desenvolvida parte do
ponto de vista do direito coletivo do trabalho, logo se faz necessário uma compreensão acerca
da teoria jurídica referente às relações coletivas de trabalho, uma vez que o setor do direito do
trabalho aqui pensado possui como objeto de estudo as normas e as relações jurídicas que dão
forma ao modelo sindical pátrio.
O estudo da ciência juscoletiva do trabalho abarca um conteúdo amplo e complexo,
por exemplo temas como: a organização das entidades sindicais e a liberdade sindical; os
conflitos coletivos de trabalho e as suas formas de soluções; a negociação coletiva e os
instrumentos normativos negociados (acordos e convenções coletivas de trabalho); a
regulamentação do exercício da greve; e etc. Todos estes temas exemplificados, além de
outros, estão sempre contextualizados no seio das relações coletivas de trabalho.
Conforme Nascimento (2010, p. 1.253) “relações coletivas de trabalho são relações
que têm como sujeitos os sindicatos de trabalhadores e os sindicatos de empregadores ou
grupos e como causa a defesa dos interesses coletivos dos membros desses grupos”. Assim, a
defesa dos interesses coletivos é assunto à ser desenvolvido aqui, haja vista sua acepção social
e a sua vasta importância jurídica, pois contribui diretamente através da geração de normas
jurídicas com a pacificação de conflitos de natureza trabalhista, bem como manifesta uma
relevante função social.
Os interesses envolvidos nas relações coletivas serão sempre de alçada do grupo,
referem-se à coletividade e possuem causa abstrata e geral. Observe-se que, em sede de
agrupamento, tais relações irão procurar não só melhorar as condições de trabalho como
também regular a estrutura das entidades sindicais, igualmente buscarão a autocomposição
dos conflitos de trabalho podendo gerar, ou não, o que se conhece como instrumentos
normativos negociados.
Para terminar de caracterizar as relações coletivas de trabalho resta apenas ressaltar
que os sujeitos vinculados serão os grupos de trabalhadores e de empregadores, que poderão
estar representados por sindicatos, ou não. Logo não há qualquer monopólio das entidades
sindicais para atuar, entretanto o normal é que estes participem uma vez que a defesa dos
interesses da categoria é uma das prerrogativas inerentes ao munus sindical.
Uma vez compreendido o objeto de estudo do direito coletivo do trabalho cabe
asseverar que a ciência juscoletiva do trabalho é una. Apesar do estudo do direito ser
enciclopédico no sentido de delimitar compartimentos dentro do mesmo ramo da ciência
jurídica consoante conteúdos segmentados, este fato ocorre meramente por motivos didáticos
e acadêmicos. O direito coletivo do trabalho é um organismo complexo e que deve ser mirado
359
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
conforme sua completude, fato inconteste é que os temas e institutos jurídicos desenvolvidos
na seara juscoletiva são simbióticos e não atuam isoladamente, muito pelo contrário, são
componentes de uma única teoria acerca de um sistema de direito laboral.
A unidade do direito coletivo do trabalho é explorada neste trabalho científico, se
não vejamos. O projeto de lei do senado federal n.º 728/2011, retratado no tópico anterior
(2.1), propõe uma nova ordem regulamentadora acerca do exercício da greve durante a
realização da Copa do Mundo FIFA 2014 e da Copa das Confederações FIFA 2013 quanto
aos serviços e atividades consideradas essenciais para ambos os eventos, pois bem, mesmo o
projeto tratando tão somente da greve, a alteração legislativa proposta poderá repercutir muito
além deste assunto haja vista o caráter simbiótico aqui comentado, esta refletirá no
aparecimento de conflitos coletivos e na forma de solução destes, bem como poderá respingar
nos mecanismos de negociação coletiva de trabalho. Por esta razão que a presente obra não se
restringe somente ao exercício da greve, mas trata de uma visão jurídica macro acerca do
problema investigado.
Consoante o melhor entendimento, a paralisação temporária dos serviços ou
atividades laborais por parte dos trabalhadores com o intuito de pressionar o empregador à
ceder ao ponto de vista obreiro, a famigerada greve, deve ser encarada como componente
importante do embate travado entre os atores da relação coletiva de trabalho. Neste sentido
Ruprecht (1967, p. 100) afirma que a finalidade de tal paralisação é “exercer pressão sobre o
patrão, com o fim de obter o reconhecimento de uma prestação de caráter profissional ou
econômico”.
A greve não é um fim em si mesmo, configura uma ferramenta de autodefesa e de
pressão para que a classe obreira consiga atingir um maior grau de sucesso em seus anseios
por um liame laboral mais equitativo socialmente. Percebe-se que a proposta de mudança é
bem mais ampla do que aparenta, pois afetaria a completude do direito coletivo do trabalho;
que, por sua vez, sempre serviu à comunidade cuidando de viabilizar condições de pactuação
da força laboral conforme a ordem socioeconômica, bem como garantindo a manutenção de
um patamar civilizatório mínimo, o qual a sociedade não conceberia ver reduzida por atentar
contra os direitos fundamentais trabalhistas.
360
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361
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
7
Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte: I - a lei não poderá exigir autorização
do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a
interferência e a intervenção na organização sindical; II - é vedada a criação de mais de uma organização
sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que
será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior à área de um
Município; III - ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria,
inclusive em questões judiciais ou administrativas; IV - a assembléia geral fixará a contribuição que, em se
tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da
representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei; V - ninguém será obrigado
a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato; VI - é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações
coletivas de trabalho; VII - o aposentado filiado tem direito a votar e ser votado nas organizações sindicais; VIII
- é vedada a dispensa do empregado sindicalizado a partir do registro da candidatura a cargo de direção ou
representação sindical e, se eleito, ainda que suplente, até um ano após o final do mandato, salvo se cometer falta
grave nos termos da lei.
8
Art. 9º É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo
e sobre os interesses que devam por meio dele defender. § 1º - A lei definirá os serviços ou atividades essenciais
e disporá sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade. § 2º - Os abusos cometidos sujeitam
os responsáveis às penas da lei.
362
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9
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do
Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a
cidadania III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o
pluralismo político.
10
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição
social: XXVI - reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho;
363
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
A idéia por detrás do princípio da proibição de retrocesso é fazer com que o Estado
sempre atue no sentido de melhorar progressivamente as condições de vida da população.
Qualquer medida estatal que tenha por finalidade suprimir garantias essenciais já
implementadas para a plena realização da dignidade da pessoa humana deve ser vista com
desconfiança e, somente, pode ser aceita se outros mecanismos mais eficazes para alcançar o
mesmo desiderato forem adotados. Esse mandamento está implícito na constituição federal
brasileira (BRASIL, 1988) e decorre, dentre outros, do artigo 3º11 que incluiu a redução das
desigualdades sociais e a construção de uma sociedade mais justa e solidária entre os
objetivos nacionais, sendo inconstitucional qualquer comportamento estatal que vá em direção
contrária a este comando.
11
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade
livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e
reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça,
sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
364
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Ato contínuo, fato é que quando o Estado cumpre, total ou parcialmente, o encargo
constitucional fundamental efetivando as medidas necessárias para a realização de um direito
social, o comportamento da administração pública deixa de consistir meramente em uma
obrigação positiva e passa a ser também uma obrigação negativa, ou seja, antes era necessário
o agir para implementar um direito fundamental, agora é igualmente necessária a abstenção
estatal para não atentar contra a satisfação do mesmo right.
Concernente aos institutos de direito coletivo do trabalho, verdadeiros direitos sociais
fundamentais, a observância deste imperativo principiológico é importante para que a ordem
constitucional vigente não passe a ser afrontada por quem quer que seja, especialmente o
próprio governo nacional.
Quanto ao tema juscoletivo do trabalho mister se faz colocar em relevo o artigo 7º da
CF (BRASIL, 1988) uma vez que este ajuda a materializar a proibição do retrocesso dos
direitos sociais do trabalho, pois o rol protetivo laboral encontrado nos incisos que compõem
o mencionado artigo sempre serão mirados como condições mínimas para o contrato de
trabalho, verdadeiras garantias constitucionais básicas, já que a própria cabeça do artigo
impõe a adoção de outras medidas, além das já listadas no aludido artigo, tendentes à
melhorar os patamares de trabalho.
Para finalizar este momento, apontamos a situação dos instrumentos normativos
negociados, as famigeradas convenções coletivas de trabalho e os acordos coletivos; estes
observam a mesma limitação apontada no parágrafo anterior. Tal restrição decorre
diretamente e validamente da proibição do retrocesso de direitos sociais, para tanto, basta
verificar que as entidades sindicais não podem pactuar a redução ou a retirada de eficácia de
determinado benefício trabalhista que já foi consolidado através da norma heterônoma,
legislada. Resta claro que o instrumento normativo negociado não foi idealizado para
viabilizar a eliminação, imediata ou paulatina, dos direitos sociais do trabalho.
12
“O direito é política”. Tradução livre.
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COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
âmbito meramente esportivo, que o universo que envolve os megaeventos abarca contextos
econômicos e políticos. Logo, o direito se vê afetado por tal conjuntura.
Os fatos sociais Copa do Mundo e Copa das Confederações respingam no direito
coletivo do trabalho brasileiro uma vez que as conveniências econômicas envolvidas, através
da coalisão política, resolveram afetar o exercício do instituto trabalhista da greve nos exatos
moldes propostos no projeto de lei do senado n.° 728 (SENADO FEDERAL, 2011). Da
análise meticulosa da proposta de regulamentação da greve para atividades e serviços
considerados essenciais para a execução dos megaeventos, percebe-se a forte preocupação em
assegurar a tutela dos interesses econômicos da própria FIFA e dos investidores nacionais e
estrangeiros abrangidos na preparação e realização da Copa do Mundo FIFA 2014 e da Copa
das Confederações FIFA 2013.
Em sustentação ao resultado aqui encontrado, o de que os interesses econômicos
tentam suplantar a ordem jurídica trabalhista para concretizar o lucro de seus investimentos na
promoção dos megaeventos em solo brasileiro, é que passamos a revirar a justificativa do
projeto de lei do senado n.° 728 (SENADO FEDERAL, 2011) de autoria dos senadores da
república Marcelo Crivella, Ana Amélia e Walter Pinheiro.
Os senadores autores do projeto de lei afirmam que:
Consideramos que as razões expostas pelos senadores para o surgimento da lei nova
são atentatórias ao espírito da relação coletiva laboral, não possuem qualquer respeito pelos
princípios norteadores do direito coletivo do trabalho, além de ofensivas à classe obreira
brasileira, pois implicitamente a chama de oportunista.
Restou entendido diante do deslinde desta jornada que as relações coletivas de
trabalho visam regular as condições laborais dos atores sociais participantes do vínculo
empregatício: sendo estes, empregados e empregadores coletivamente organizados. Desta
feita, seria normal perceber que não se trata de “oportunismo”, como quer fazer parecer o
projeto de lei, que faz parte da própria natureza comportamental dos grupos obreiros e
patronais a eterna busca por uma melhor condição sociolaboral.
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O projeto de lei do senado n.° 728 (SENADO FEDERAL, 2011) expressa uma visão
facista e antidemocrática, pois considera um atentado ao interesse público o regular exercício
da greve por parte dos grupos de empregados envolvidos nas atividades relativas à preparação
e realização dos eventos da FIFA em 2013 e 2014. A postura expressada na proposta de lei
lembra muito o pensamento do liberalismo e da Revolução Francesa de 1789 onde era
dominante a vedação da associação dos trabalhadores, este período ficou conhecido como a
fase da proibição, pois a agregação de indivíduos era vista como incompatível com a
liberdade do ser humano já que a pessoa natural se tornava refém da vontade grupal. Qualquer
limitação ao livre arbítrio econômico e qualquer iniciativa de se obter melhores salários ou
condições de trabalho seria encarada como conspiração criminosa.
A tentativa de reforma legislativa acerca do instituto da greve, ora em análise, em
verdade propõe um retrocesso ideológico e de direitos sociais fundamentais já efetivados, haja
vista que dificulta em demasia, torna quase que inviável a deflagração de movimento
paredista nas atividades envolvidas nas competições futebolísticas. Ainda, a aprovação da
proposta representaria uma intervenção descabida do governo brasileiro nas relações coletivas
de trabalho, motivada exclusivamente pela coalisão política dos interesses econômico que
promovem os megaeventos esportivos.
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368
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que nas cidades-sedes (limitação espacial), antes e durante a realização dos eventos FIFA
(limitação temporal), os trabalhadores coletivamente organizados estariam amordaçados pelas
formalidades aprisionantes contidas no PLS para o exercício da paralisação temporária de
labor. Nos termos da proposta a conveniência dos grupos de obreiros para o exercício do right
não sobrevive, apenas impera a proteção aos interesses dos empregadores envolvidos nos
megaeventos, dos investidores nacionais e estrangeiros, além da própria FIFA.
As formalidades sugeridas pelo projeto de lei do senado n.° 728 (SENADO
FEDERAL, 2011) que esta obras considera desproporcionais e, também tendenciosas aos
interesses econômicos, são redigidas nos artigos 43, 44, 45 e 47. São elas, respectivamente:
em caso de greve em atividades de especial interesse social, a entidade patronal envolvida
deverá ser notificada da paralisação com no mínimo quinze dias de antecedência, idem para
os interessados e usuários dos serviços paralisados; nos serviços ou atividades de especial
interesse social, os sindicatos, os empregadores e os trabalhadores ficam obrigados a garantir,
durante a greve, a prestação dos serviços de no mínimo setenta por cento da força de trabalho;
e, por fim, a permissão legislativa para se contratar mão de obra substituta em caso de
movimento grevista nas atividades de especial interesse social.
Este conjunto de medidas descaracteriza a própria essência da greve, pois retira a
pressão dos ombros do empregador que não se sentirá afetado quanto ao seu meio de
produção e, consequentemente, quanto ao seu lucro; inclusive facultando ao patrão o poder
para contratar mão de obra substituta durante a realização do movimento paredista.
Ratificando este ponto de vista, exemplifica-se citando o alargamento do prazo de
comunicação prévia da entidade patronal para deflagração do movimento grevista, requisito
formal para a juridicidade do ato. Tal prazo, inexplicavelmente, salta de setenta e duas horas
nas atividades essenciais conforme a lei n.° 7.783 (BRASIL, 1989) para quinze dias nas
atividades ou serviços ligados à realização dos eventos FIFA. Ou seja, caso a classe obreira
pretenda promover uma ação sindical de paralisação do trabalho durante a realização das
competições esportivas, terá que se planejar com antecedência mínima de quinze dias, pois do
contrário a manifestação poderá ser tida como irregular.
Outro ponto crítico do PLS é a criação da terminologia inédita “serviços ou
atividades de especial interesse social”, de imediato se conclui que apesar da nomenclatura
adotada pelo artigo 42 do projeto de lei do senado n.° 728 (SENADO FEDERAL, 2011) não
há qualquer interesse social envolvido, apenas uma camuflagem para assegurar a viabilidade
econômica dos eventos FIFA realizados em solo nacional no ano de 2013 e no ano de 2014.
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13
Art. 10 São considerados serviços ou atividades essenciais: I - tratamento e abastecimento de água; produção
e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis; II - assistência médica e hospitalar; III - distribuição e
comercialização de medicamentos e alimentos; IV - funerários; V - transporte coletivo; VI - captação e
tratamento de esgoto e lixo; VII - telecomunicações; VIII - guarda, uso e controle de substâncias radioativas,
equipamentos e materiais nucleares; IX - processamento de dados ligados a serviços essenciais; X - controle de
tráfego aéreo; XI compensação bancária.
370
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A realização da Copa do Mundo FIFA 2014 em solo nacional, bem como da Copa
das Confederações FIFA 2013, representa uma oportunidade ímpar para consolidar a posição
brasileira de protagonismo no cenário mundial. Igualmente, pode representar uma janela para
o desenvolvimento e para a modernidade não só do ponto de vista econômico mas também do
prisma infraestrutural do país. Cifras enormes estão sendo investidas em equipamentos
públicos como aeroportos, rodovias, telecomunicações, hospitais, redes elétricas, saneamento
básico e etc.
É inconteste o impulso dado pelos eventos FIFA à segmentos importantes da
economia brasileira. Apenas para citar um exemplo, a indústria do turismo prevê um
incremento de aproximadamente quinhentos mil consumidores, todos turistas estrangeiros, só
durante o acontecimento da Copa do Mundo FIFA 2014 (CÂMARA DOS DEPUTADOS,
2010). Este tipo de publicidade mundial certamente ajudará o Brasil a consolidar-se como
renomado destino internacional de viagens.
Pois bem, a pretensão da corrente obra neste tópico é buscar transcender as
volumosas cifras investidas na preparação para os eventos FIFA em 2013 e em 2014 tentando
perceber a existência de um “lucro social” com a realização das competições esportivas,
especificamente quanto às relações trabalhistas nacionais.
Exatamente por existir uma grande perspectiva de desenvolvimento econômico para
o Brasil devido aos efeitos promovidos pelos eventos FIFA, necessário se faz o rateio das
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7 CONCLUSÃO
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REFERÊNCIAS
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http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm. Acesso em: 28 jan. 2013.
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das Confederações FIFA 2013, à Copa do Mundo FIFA 2014 e aos eventos relacionados, que
serão realizados no Brasil. Diário Oficial da União. Brasília, 8 jun. 2012. Disponível em:
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BOBBIO, Noberto. Era dos direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro/RJ:
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KENNEDY, Duncan. La enseñanza del derecho como forma de acción política. Buenos
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ROMITA, Arion Sayão. Direitos fundamentais nas relações de trabalho. São Paulo: Ltr,
2007.
SILVA, Fábio de Sousa Nunes da (Org.). Legislação dos direitos humanos. Araçatuba/SP:
Editora MB, 2009.
378
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Resumo
Este artigo analisa como o tempo livre do trabalhador realmente se efetiva como lazer
na vida deste indivíduo. Consideramos a concepção do direito ao lazer ser um direito
fundamental do trabalhador, bem como, ser de forma direta um dos objetivos da
República. Aproveitamos também para estudar outras concepções de lazer sob o
enfoque psicológico e filosófico a fim de nos auxiliar na elaboração de uma proposta
viável para a efetividade do lazer, como um direito social de segunda dimensão dos
trabalhadores no atual contexto sócio cultural brasileiro. Os direitos fundamentais
exprimem valores superiores, dentre os quais se encontram os direitos sociais, com
eficácia imediata conforme sua densidade normativa. Com o desenvolvimento do
estudo, nota-se a importância em se verificar a efetiva proteção aos direitos
fundamentais sociais dentro de uma sociedade globalizada. Ademais, notamos de
maneira acentuada como o lazer pode negativamente se expressar como um produto de
consumo cultural, quando deveria ser identificado como a busca pela cultura no sentido
de enriquecimento do espírito.
Abstract
This article analyzes as the time free from the worker is executed really as leisure in this
individual's life. We considered the conception of the right to the leisure to be a
fundamental right of the worker, as well as, to be in a direct way one of the objectives
of the Republic. We also took advantage to study other leisure conceptions under the
psychological and philosophical focus in order to in the auxiliary in the elaboration of a
viable proposal for the effectiveness of the leisure, as a social right of the workers'
second dimension in the current social context. The fundamental rights express superior
values, among which are the social rights, with immediate effectiveness according to
his/her normative density. With the development of the study, it is noticed the
importance in verifying the effective protection inside to the social fundamental rights
of a society globalized and highly consumerist and as the leisure expressed her
mistakenly as a consumption product when it should be identified as the search for the
culture in the sense of enrichment of the spirit.
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1. Introdução
O direito ao lazer está contido no rol dos direitos fundamentais nos arts. 6°, 7°,
inciso IV, 217, § 3°, e 227, caput, da Constituição da República de 1988.
Por fim, a importância do tema se vale também para demonstrar que a tutela do
direito ao lazer pode ser um instrumento de acesso à dignidade humana, através do
desenvolvimento pessoal e social do trabalhador. Pensando-se que a prática e a
380
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Pretende-se com este trabalho buscar nas fontes filosóficas o conceito de lazer,
no sentido de descanso da alma e estudar as obras de filósofos influentes que trataram
do tema de forma a solidificar a teoria da necessidade humana ao descanso e, mais
especificamente, da diminuição da jornada de trabalho e a necessidade de utilização
desse tempo livro para a busca de conhecimento cultural como enriquecimento d alma e
desenvolvimento intelectuais dos trabalhadores.
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Nos parece, em particular, que esta síntese expressa de maneira combinada dois
aspectos paralelos essenciais da globalização: sua força atrativa para um sistema
próprio, baseado na abertura para uma proliferação dos laços de comunicação e
comércio; e seu potencial desagregador das estruturas institucionais tradicionais,
sobretudo as de caráter nacional.
383
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384
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seu significado seja desconhecido. A unidade cultural faz com que cada categoria social
tenha acesso a um tipo específico de cultura para sua categoria, conformando-se com
isso. (ADORNO. e HORKHEIMER, 2006, p. 128).
A grande vitória da indústria cultural é a segurança que passa aos indivíduos de que
nada irá mudar, e que nada surgirá que não se possa adaptar. O espectador do cinema sai às
ruas e as vê como um prolongamento do filme, agindo como se nele estivesse. Nisso reside
o problema da indústria cultural, o problema se encontra justamente no fato de que a
imaginação e a espontaneidade do consumidor fica atrofiada. (LUNARDI, 2010, p. 211)
385
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Hoje, a diversão, o lazer, é procurada, não por aqueles que tentam escapar da guerra,
mas por quem precisa escapar do processo de trabalho mecanizado, da sociedade
automatizada:
A liberdade não pode ser reduzida a uma questão de consumo, sob pena de
desvalorizar a dignidade humana. Talvez, seja este ponto hoje que no Brasil nos chame
mais a atenção. O país vive um momento econômico de desenvolvimento, impulsionado,
principalmente, por pacotes econômicos destinados a população mais carente.
Inevitavelmente, depois de suprir a fome física, o cidadão brasileiro mais carente tem se
enveredado pelo “consumo de cultura”. Nesse sentido, constata Valquíria Padilha, o
impacto do consumismo no lazer:
386
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4. A cultura e o lazer
387
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Disto, conclui-se que não adianta apenas proteger a fauna, a flora, a atmosfera, o
solo, pois não pode se dizer que uma pessoa vive em um meio ambiente equilibrado se o
seu modo de viver, de se relacionar com a natureza, com os animais, com seus próprios
semelhantes não for garantido, respeitado e acima de tudo, protegido. Se o conceito de
cultura for aplicado de forma ampla, todas as criações humanas se encontram dentro do
meio ambiente cultural. (LUNARDI, 2010, p. 221)
Dentre diversos fatores, o homem possui um valor único dentre os demais seres pois
detém potências únicas que lhe concedem a capacidade criativa. Quando se retira a
capacidade criativa do ser humano, não está se reconhecendo o seu valor, a sua dignidade.
O meio ambiente cultural diz muito mais respeito à proteção da expressão cultural
humana do que os objetos materiais. Sem dúvida, estes objetos possuem um valor
inestimável, até mesmo por serem insubstituíveis, mas, uma vez que direito ambiental optou
por uma postura antropocêntrica, a tutela dos objetos criados pelo homem consistem em
uma decorrência da proteção da manifestação cultural humana.
388
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Destaca-se o ponto em que a Convenção explica que a cultura é aquilo que traz o
sentimento de identidade de um povo. Esse é o ponto em que a cultura se mostra como um
elemento primordial para a sociedade, pois identificação com o seu semelhante significa
cidadania, significa democracia, significa respeito, significa a realização de uma sociedade
que é orientada pela dignidade humana. (LUNARDI, 2010, p.223)
389
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Hoje não é possível imaginar a retirada dos benefícios trazidos pela globalização,
entretanto, a perda de culturas de minorias, a mudança de hábitos e tradições locais seria um
efeito colateral muito prejudicial para a raça humana, uma vez que temos como exemplo as
antigas civilizações que foram dizimadas culturalmente por outros povos, trazendo a
inestimável perda de conhecimentos e costumes que poderiam solucionar os problemas que
vivemos atualmente.
5. Considerações finais
390
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Nisto, talvez, resida a maior urgência em cuidar dos meios e forma de “aquisição de
cultura por parte do trabalhador brasileiro. São necessários mecanismos sociais de apoio ao
acesso a cultura e formas educativas de informá-los o que pode ser mais atrativo
culturalmente, tendo em vista a alta concorrência da cultura de baixa qualidade do universo
capitalista. Neste aspecto atores sociais, como os sindicatos, são grandes consolidadores do
bem estar cultural do trabalhador pelos mecanismos que tais entes já podem fazer uso.
Referências Bibliográficas
ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. 2ª ed. São Paulo: Mestre Jou, 1982.
BAUMAN, Zygmunt. Medo líquido. 1ª ed. Rio de Janeiro: Ed. Jorge Zahar, 2008.
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São Paulo: Saraiva, 2007.
DE MASI, Domenico. O ócio criativo. (trad.) Lea Manzi. 10ª ed. Rio de Janeiro:
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391
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
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LUNARDI, Alexandre. Função social do direito ao lazer nas relações de trabalho. São
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SANTOS, Milton. Por uma Outra Globalização. 3. ed. Rio de Janeiro: Record, 2000.
392
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393
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decisioni dei lavoratori. Sarà fatta anche un’analisi panoramica del sindacato e dei contratti
colletivi nei due paesi.
394
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1 Introdução
Capital e trabalho são intrinsecamente opostos: haverá sempre entre eles um objeto
de disputa. Mas, como bons opostos, eles também se atraem. O modo de produção capitalista
necessita de que os dois trabalhem em conjunto, mesmo que cada qual para o seu interesse. Se
um romper por completo com o outro, o sistema implode, deixa de existir da maneira com a
qual se manifesta hoje. É como se capital e trabalho fossem dois trilhos de um trem, sempre
paralelos, mantidos sempre a certa distância. Eles nunca se tocam, porém, caso se afastem
demais, o trem descarrilha, quebra, deixa de seguir seu curso.
Trabalhadores desejam melhores salários, patrões querem pagar menos para lucrar
mais. Trabalhadores desejam menor jornada de trabalho, patrões querem que se trabalhe mais,
para produzir mais. Trabalhadores desejam melhores condições de trabalho, patrões desejam
que tudo permaneça como está, pois afinal, um melhor ambiente de trabalho quase sempre
significa maior gasto de dinheiro. Em meio a uma infinidade de divergências, um conflito se
torna iminente. E numa guerra, todos saem perdendo, até mesmo a parte vencedora. Haveria
alguma solução para que a controvérsia não desencadeie conflito?
A negociação coletiva, então, é uma forma de diálogo entre capital e trabalho, com
objetivo de evitar que as controvérsias se desdobrem em campos de batalha. A negociação
deve ser coletiva, pois, nesta relação, o trabalho é a parte naturalmente mais fraca. Estamos
diante de uma realidade bem próxima da luta entre Davi e Golias, imortalizada nas páginas
das Sagradas Escrituras. Davi não podia enfrentar Golias sozinho, foi necessário que Deus
395
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interviesse na batalha para que os israelitas fossem vencedores. Bom, também é necessário
que haja a reunião dos trabalhadores em sindicatos fortes, para que a guerra não seja vã, quiçá
insanidade. Por óbvio que a história bíblica conta com o elemento sobrenatural de Deus. Mas
a comparação é bastante útil quando pensamos na luta contra gigantes. Sem algo a mais é
impossível derrotá-los.
Assim devem funcionar os acordos entre sindicatos: um deve esperar pelo sono do
gigante, o outro sindicato, para tomar para si parte do tesouro que possui o adormecido. A
refeição que leva os gigantes a adormecerem, aqui, é a sensação de vitória. Se ambos dela se
alimentarem, o outro poderá, no papel de João, tomar para si parte do que não possuía. Com
isto, ficará estabelecido o jogo de ganha-ganha. O que importa, sobremaneira, é que o ajuste
396
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
tende a ser cumprido, ganha eficácia pela vontade das partes, e gera transformações positivas
no cotidiano da vida dos operários e das empresas.
2 Cultura Negocial
A palavra cultura deriva do vocábulo latino colere, que significa cultivar. Os seres
humanos, devido à razão, cultivam coletivamente hábitos, repetindo-os no tempo, em um
determinado espaço. Assim, os homens criam cultura, uma maneira de viver de um povo.
Englobam conhecimentos, práticas, formas de alimentação, de higiene, de manifestação
artística, de religião, a história, e também a comunicação.
Todo ser humano negocia no seu dia a dia. Uns são mais preparados para o ato
negocial. Uns mais autoritários, querem impor suas vontades. Outros dependem do
direcionamento de algo que consideram mais fortes que eles mesmos. Mas fato é que o
negócio é inerente ao ser humano, assim como a comunicação. Isto porque o homem é, por
essência, um ser relacional. Assim diz Ciro Pereira da Silva: “Todos possuem qualidades
para negociar; Essas qualidades precisam ser trabalhadas, desenvolvidas, para que qualquer
um esteja apto a sentar-se a uma mesa de reunião negocial, mesmo que de improviso”1.
É fato, e já dissemos isto, que capital e trabalho sempre terão conflitos em suas
relações. O modo de resolvê-los é que deve ser pensado. A tradição do Ocidente está no
sentido da judicialização das demandas. Isto porque se herdou as tradições do Estado forte,
1
SILVA, Ciro Pereira da. A milenar arte de negociar e a negociação sindical. São Paulo: LTr,
1999, p. 40
397
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
A democracia deve advir de baixo para cima, não de cima para baixo. É mister que
se eduque as pessoas a conviver com as diferenças e se rompa com a cultura beligerante que
vige até então no Ocidente. O espaço democrático deve ser, por meio do diálogo social,
ampliado para as famílias, para as salas de aula, para as igrejas, e também para as fábricas.
Para a questão sobre o sentido da política há uma resposta tão simples e conclusiva
em si mesma que se poderia pensar que as outras respostas são totalmente
desnecessárias. A resposta é a seguinte: o sentido da política é a liberdade.2
398
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
momento não se apresenta como o ideal para uma verdadeira negociação, visto que todos os
vários problemas do ano devem ser resolvidos num pequeno intervalo de tempo.
2.1 Histórico
O caso italiano conta com uma Unificação tardia, concluída apenas em 1929. Além
disso, o país passou por longo período de ditadura fortíssima com Benito Mussolini, o
fascismo, no interstício das duas grandes guerras. O “Duce” instaurou a doutrina
corporativista, trazendo o trabalho como um dever do cidadão, para servir à pátria. Em
contrapartida, a experiência italiana conta com uma formação sindical pré- fascista fortemente
ideológica, inspirada, sobretudo, nas doutrinas comunistas e anarquistas. Não à toa, Mikhail
Bakunin já percebia o papel da burocracia no controle estatal sobre os movimentos sociais,
dentre eles o sindicato. Raul Seixas, de modo bem humorado, parafraseia trecho do livro
“Deus é o Estado”, do doutrinador anarquista: “tem que ser selado/ Registrado, carimbado/
Avaliado, rotulado/ Se quiser voar”.
4
COELHO, Elaine D’Ávila. “O Contexto Atual das Negociações Coletivas em Saúde e Ambiente do Trabalho”.
In: BONCIANI, Mário (org). Saúde, Ambiente e Contrato Coletivo de Trabalho: Experiências em Negociações
Coletiva. São Paulo: LTr, 1996.
399
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
justiça do trabalho, sem uma consolidação de normas como a CLT, ajudam a centralizar o
papel da negociação coletiva. Tudo isso, torna a Itália mais avançada que o Brasil no assunto.
A falta de cultura negocial no Brasil tem raízes históricas. Tem-se que a forma
vigente de relações de trabalho foi implantada há cinquenta anos e foi embasada no modelo de
sindicalismo vigiado pelo Estado, dotado de mecanismos legais de controle e de
mascaramento dos conflitos entre capital e trabalho. Por isso, era chamado de sindicato
pelego.
Ademais, o Brasil viveu dois grandes períodos ditatoriais, como se verá adiante. Isto
calou os movimentos sociais em grande parte, restando uma resistência quase sempre
aniquilada. É bem verdade que os movimentos sindicais tiveram importante papel na
derrocada da ditadura militar. Mas falta ainda aprender a negociar, criar a cultura
democrática. O estado, por outro lado, deve dar às entidades maior autonomia e liberdade para
que o traço negocial se torne efetivo.
5
COELHO, Elaine D’Ávila. “O Contexto Atual ...”, op. cit.
400
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
3 Convenção Coletiva
Délio Maranhão define convenção coletiva como sendo a solução por via de acordo
dos conflitos de interesses coletivos de grupos ou categorias, através do estabelecimento de
normas e condições de trabalho reguladoras, durante o prazo da respectiva vigência das
relações individuais entre os integrantes das categorias ou grupos.6
Percebe-se, portanto, ao menos dois traços, tão marcantes quanto fundamentais, nas
Convenções Coletivas. Toda norma é um “dever-ser”, abstrato, geral, que deverá incidir nos
casos reais, da vida, o que se chama de “ser”. Os estudiosos das normas colocam como uma
dos grandes problemas da justiça no Direito, o distanciamento entre aqueles que criam as
normas e seus dizeres da realidade a qual esta irá se aplicar. Isto significa que a norma que
intenta mudar algo na realidade social, acaba por ser inócua, perde seu sentido, não realiza
justiça. O “status quo antem” permanece, a norma perde total ou parcialmente sua capacidade
transformadora.
No Direito comum, o direito civil, as normas tendem a serem respeitadas, eis que a
própria vontade das partes acaba por fazer cumpri-las. Se, por exemplo, uma loja vende ao
seu cliente uma máquina de lavar, é de seu interesse que corra tudo bem com a mercadoria,
para que o freguês se mantenha fiel. Já o consumidor, na maior parte das vezes, paga o que
deve, para manter o “nome limpo”, além de não correr riscos de ficar sem o bem que
desejava. É, pois, na reciprocidade de interesses que se encontra a eficácia do Direito.
6
MARANHÃO, Délio. Direito do Trabalho. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1977, p. 318.
401
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3.1 Na Itália
7
LUCA, Carlos Moreira de. Convenção Coletiva do Trabalho: um estudo comparativo. São Paulo: LTr, 1991, p.
31.
402
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Mas, qual é a natureza jurídica dos Contratos Coletivos? O artigo 1322, parágrafo 2°
do Código Civil italiano diz assim:
Le parti possono anche concludere contratti che non appartengono ai tipi aventi una
disciplina particolare, purché siano diretti a realizzare interessi meritevoli di tutela
secondo l'ordinamento giuridico.10
8
LUCA, Carlos Moreira de. Convenção Coletiva do Trabalho: um estudo comparativo. São Paulo: LTr, 1991, p.
31.
9
LUCA, Carlos Moreira de. Convenção Coletiva..., op. cit, p. 33.
10
Tradução livre: “As partes podem também realizar contratos que não pertencem aos tipos de uma disciplina
particular, se tiverem por escopo satisfazer interesses merecedores de tutela segundo o ordenamento jurídico.”
11
Tradução livre: “A Itália é uma República democrática fundada no trabalho.”
403
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Então, os contratos coletivos são considerados fontes extra ordinem, ou seja, são atos
da economia privada, com a liberdade inerente aos atos desta natureza, mas com força de lei,
pleno de normas gerais, abstratas, obrigatórias e inovadoras aplicáveis aos contratos
individuais de trabalho.
3.2 No Brasil
12
BELLARDI, Lauralba. Concertazione e contratazione. Bari: Cacucci Editore, 1999, p. 12.
Tradução livre: “O confronto negocial que, tradicionalmente, se desenrolava entre as organizações de
empregadores e empregados, ou separadamente entre estes e o poder público.”
13
Tradução livre: “Quando não houver disposição de lei e contrato coletivo se aplicam os usos. Todavia, os usos
mais favoráveis aos trabalhadores prevalecem sobre as normas dispositivas da lei.”
404
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
CLT, ainda no governo de Getúlio Vargas. Reside neste ponto uma das primeiras diferenças
em relação ao regime italiano do Contratto Colletivo. Por haver uma intensa normatização
estatal, a negociação acaba relegada a segundo plano.
Na década de 80 o regime já estava débil, claudicante. Era questão de tempo para que
chegasse ao seu fim. A sociedade civil organizada lutava pela liberdade nos setores da
música, da literatura, da imprensa, da política e do trabalho. Os sindicatos tiveram importante
papel na queda do sistema autoritário, sobretudo com a criação da CUT (Central Única dos
Trabalhadores). E a negociação coletiva ganhou força. Como nos ensina o mestre Márcio
Túlio Viana:
14
VIANA, Márcio Túlio. La Consolidação das Leis do Trabalho brasiliana, tra avventure, sventure e sogni.
Associazione per gli Studi internazionali e comparati sul Diritto del lavoro e sulle Relazioni industriali, 2001, p.
23.
405
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Ocorre que, nos últimos anos, as políticas neoliberais vêm flexibilizando o direito do
trabalho. A pressão por diminuir direitos dos operários em nome de resultados econômicos
mudou a relação de forças no jogo da negociação coletiva. Isto porque não há estabilidade no
emprego (salvo em casos específicos) e o desemprego é sempre um fantasma à espreita,
pronto para atacar. Piora o quadro o sindicalismo pragmático, fraco, que sobrevive
principalmente da contribuição sindical (imposto repassado pelo Estado aos entes sindicais
art. X).
15
VIANA, Márcio Túlio. La Consolidação..., op. cit.
406
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Conclui-se que a negociação sindical acaba por perder força mais uma vez. Está bom
se as coisas forem mantidas como estão. Pelo ou menos não pioraram. E os empregados se
vêem cada vez mais sufocados pela impossibilidade de enfrentar o gigante...
4 Sindicato
4.1 Na Itália
Contudo, em 1926 foi fundado o Sistema Corporativo por Benito Mussolini. Assim,
o Estado Corporativo Fascista, como a maioria dos governos autoritários, atrelava os
sindicatos a sua estrutura, fazendo-os pensar que faziam parte do um corpo, de um ser vivo
estatal (e consequentemente que detinham enormes responsabilidades na vida pública).
Extinguia-se, portanto, os conflitos de classe.
407
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Ai sindacati non può essere imposto altro obbligo se non la loro registrazione presso
uffici locali o centrali, secondo le norme di legge.
È condizione per la registrazione che gli statute dei sindacati sanciscano un
ordinamento interno a base democratica.
I sindacati registrati hanno personalità giuridica. Possono, rappresentati
unitariamente in proporzione dei loro iscritti, stipulare contratti collettivi di lavoro
con efficacia obbligatoria per tutti gli appartenenti alle categorie alle quali il
contratto si riferisce.18
Com relação ao sindicato livre, Perone afirma que “a categoria profissional não é
um prius, mas sim um posterius.”
16
Tradução livre: “Ao sindicato é reconhecido um lugar de honra na Carta Constitucional de 1948.”
17
PERONE, Giancarlo. “A liberdade sindical na Itália”. In: FREDIANI, Yone; ZAINAGHI, Domingos Sávio
(Coords.). Relações de Direito Coletivo Brasil-Itália. São Paulo: LTr, 2004, p. 39.
18
Tradução livre: “Aos sindicatos não pode ser imposta outra obrigação senão o registro junto aos órgãos locais
ou centrais, segundo as normas legais. É condição para o registro que os estatutos dos sindicatos decretem um
ordenamento interno de base democrática. Os sindicatos registrados possuem personalidade jurídica. Podem
representar unicamente em proporção dos inscritos, estipular contratos coletivos de trabalho com eficácia
obrigatória para todos que pertencem às categorias às quais o contrato se refere.”
408
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Pode-se dizer que, na Itália, os sindicatos não se deixam influenciar pelo Estado. Não
são registrados, nem sobrevivem de contribuição compulsória, repassada pelo governo. O
pluralismo e a liberdade dão maior força às entidades que dependem somente de seus
associados, verdadeiramente livres, tanto para escolher o ente ao qual se filiarão quanto para,
inclusive, fundar um novo.
Como não poderia deixar de ser, resulta disso tudo sindicatos mais fortes, como a
CGIL, a CISL e a UIL. Há entre os trabalhadores uma consciência política maior, o que
confere credibilidade às lutas coletivas. Elas têm um fundamento, uma finalidade clara.
Ademais, a cultura negocial é desenvolvida, sendo que sem ela o direito do trabalho italiano
estaria fadado ao desaparecimento.
4.2 No Brasil
Pode-se observar que o Estado Brasileiro passou por três fases no âmbito do Direito
Sindical quais sejam: o anarcossindicalismo, o corporativismo sindical e o sindicalismo
autônomo.
Pode-se dizer que, na Itália, os sindicatos não se deixam influenciar pelo Estado. Não
são registrados, nem sobrevivem de contribuição compulsória, repassada pelo governo. O
pluralismo e a liberdade dão maior força às entidades que dependem somente de seus
associados, verdadeiramente livres, tanto para escolher o ente ao qual se filiarão quanto para,
inclusive, fundar um novo.
19
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. “A liberdade sindical na perspectiva do direito legislado brasileiro”. In:
FREDIANI, Yone; ZAINAGHI, Domingos Sávio (Coords.). Relações de Direito Coletivo Brasil-Itália. São
Paulo: LTr, 2004, p. 25.
409
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
O ápice desse movimento se deu na Greve Geral de 1917 em São Paulo. Ocorreu um
efeito em cadeia, pois a greve se iniciou numa fábrica de tecidos, espalhando-se não só a todo
o setor têxtil, mas também a várias outras categorias. O motivo da greve era, dentre outros, a
vertiginosa queda dos salários causada principalmente pela primeira guerra Mundial.
Em 1930, após a “Revolução” liderada por Getúlio Vargas, inicia-se a segunda fase
do Direito Sindical. Atrela-se a estrutura sindical ao Estado, destruindo as bases sociais e
políticas em que o movimento anterior tinha se desenvolvido.
20
VIANA, Márcio Túlio. VIANA, Márcio Túlio. La Consolidação..., op. cit., p. 6.
410
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A primeira central sindical foi criada em São Bernardo do Campo por trabalhadores
que contestavam o dirigismo estatal. Nascia a Central Única dos Trabalhadores – CUT.
Pode-se dizer que hoje o Brasil possui uma liberdade sindical relativa. Amauri
Mascaro de Nascimento diferencia a liberdade sindical plena da relativa:
Por último, tem-se a pluralidade sindical que se refere à oferta da opção de se filiar a
uma entidade de sua preferência ou, ainda, uma vez filiado o trabalhador, facultar o
rompimento deste vínculo em conjunto com a criação de uma nova entidade, agora baseada
em ideologias que mais bem correspondem aos seus desejos.
21
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. “A liberdade sindical...”, op. cit., p. 28.
411
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Cabe aqui refletir sobre a atuação política do sindicato. Segundo o professor Antônio
Álvares da Silva “atuação do sindicato é ainda um fenômeno inacabado na sociedade
contemporânea e é a demonstração evidente de força dos grupos no mundo moderno”22.
A Constituição Federal em seu artigo 8º, caput, estabelece que é livre a associação
profissional ou sindical. Porém, o inciso II do referido artigo veda a criação de mais de uma
organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou
econômica, na mesma base territorial, não podendo ser inferior à área de um Município.
Percebe-se, portanto que não se trata de liberdade plena, uma vez que o elemento pluralidade
sindical não se aplica ao ordenamento brasileiro.
Após se fazer a leitura de todo o artigo 8º da Carta Magna Brasileira, percebe-se que
dois erros fundamentais23 foram incorporados do corporativismo: sindicato único e
contribuição sindical.
Por sua vez, a contribuição sindical vincula a sobrevivência dos entes coletivos ao
Estado. Na realidade, constitui a maior parte dos recursos que eles possuem. Deveriam ser os
trabalhadores, de maneira direta, os mantenedores da instituição que os representa. Ninguém
gosta de pagar tributo. O desconto obrigatório pode ainda gerar certa antipatia dos
contribuintes. O sindicato deveria ser um espaço dos trabalhadores e para os trabalhadores.
Mas com este formato, não é bem o que ocorre...
Que continue a defender o fim da contribuição sindical, [...], mas articule fortemente
essa luta com outra – tão ou mais importante – que é da criação de mecanismos de
apoio à ação de seus líderes. Que empunhe, com vigor, a bandeira da liberdade, mas
sem se esquecer de que o seu maior problema, hoje, seja a igualdade [...].24
22
SILVA, Antônio Álvares. Direito Coletivo do Trabalho. Rio de Janeiro: Forense, 1979, p. 24.
23
Exposição inspirada no artigo do Professor Antônio Álvares da Silva publicado pela Revista do TRT 3ª Reg.
24
VIANA, Márcio Túlio. “O Direito, a Química e a Realidade Social”. Revista do Tribunal Regional do
Trabalho da 3ª Região, Belo Horizonte. Jan/Jun 1999, p. 3.
412
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
5 Conclusão
Os italianos têm muito o que nos ensinar sobre negociação coletiva e liberdade
sindical. Aliás, os temas encontram-se visceralmente entrelaçados, visto que para uma efetiva
negociação é necessário que à mesa se sentem negociantes igualmente fortes. E sindicato de
empregados fortes (eliminando-se a hipossuficiência) só se faz com liberdade.
25
Esse trecho foi inspirado na leitura do artigo Obligación de negociar, de Hugo Fernandez Brignoni.
413
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Referências bibliográficas
CAZZOLA, Giuliano. C’era una volta Il sindacato. Milão: Boroli Editore, 2010.
LUCA, Carlos Moreira de. Convenção Coletiva do Trabalho: um estudo comparativo. São
Paulo: LTr, 1991.
MARANHÃO, Délio. Direito do Trabalho. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1977.
SILVA, Antônio Álvares da. Direito Coletivo do Trabalho. Rio de Janeiro: Forense, 1979.
SILVA, Ciro Pereira da. A milenar arte de negociar e a negociação sindical. São Paulo: LTr,
1999.
414
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
RESUMO
O presente artigo visa investigar novas regras que implicam mudanças nos direitos
trabalhistas relacionados aos motoristas de cargas e passageiros a partir do conceito de
trabalho digno. O princípio da dignidade da pessoa humana é aplicável ao Direito do Trabalho
e está localizado ao lado do valor social do trabalho compondo os fundamentos da República
Federativa do Brasil. As alterações, quanto à jornada de trabalho do motorista foram
introduzidas pela Lei 12.619 de 2012, que deu redação a dispositivos legais da Consolidação
das Leis Trabalhistas, bem como do Código de Trânsito Brasileiro. Em especial, este artigo
objetiva verificar o novo regramento sobre a jornada de trabalho do motorista, que até a
edição da Lei não era submetido a controle. De plano é possível afirmar que um dos grandes
avanços da Lei foi justamente o controle e limitação da jornada de trabalho dos motoristas.
Todavia, apesar dos avanços legais, existem pontos na legislação em estudo que
possivelmente configuram afronta à Constituição Federal, o que poderia significar um
retrocesso social. Esses pontos se referem a jornada de 12 (doze) horas por 36 (trinta e seis), a
remuneração do “tempo de espera”, e ainda, o fracionamento dos intervalos intrajornada.
Assim, é mister analisar o ordenamento jurídico brasileiro para realizar a desejável
interpretação sistemática sobre o assunto impedindo esse retrocesso.
Palavras-chave: Trabalho digno; nova lei dos motoristas; jornada de trabalho; Constituição;
retrocesso social.
ABSTRACT
This paper aims to investigate new rules entailing changes in labor laws related to drivers of
cargo and passengers from the concept of decent work. The principle of human dignity is
applicable to the Labour Law and is located next to the social value of work composing the
fundamentals of the Federative Republic of Brazil. The changes, as the workload of the driver
were introduced by Law 12,619 of 2012, which gave legal writing devices Consolidation of
Labor Laws, as well as the Brazilian Traffic Code. In particular, this article aims to verify the
new regramento on the workload of the driver, who until the enactment of Law was not
subject to control. Plan is possible to say that one of the great advances of Law was just the
1
Mestranda em Direito pela UNOESC. Especialista em Direito Material e Processual do Trabalho. Professora,
pesquisadora e Coordenadora Adjunta do grupo de pesquisa de Direitos Fundamentais Sociais da Unoesc.
Advogada; carenmac20@yahoo.com.br
2
Doutor em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina. Professor e pesquisador do programa de
Mestrado em Direito da Unoesc. Coordenador da Linha de Pesquisa em Direitos Fundamentais Sociais da
Unoesc. Juiz do Trabalho do TRT 12/SC; rmgold@desbrava.com.br
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control and limitation of working hours of drivers. However, despite legal advances, there are
points in upcoming legislation that possibly constitute an affront to the Constitution, which
could mean a social backlash. These points relate the journey of twelve (12) hours per 36
(thirty six), the remuneration of the "waiting time", and yet, the fractions of intrajornada
intervals. Thus, it is necessary to analyze the Brazilian legal system to accomplish the
desirable systematic interpretation on the issue preventing this setback.
Keywords: Decent work; new law for drivers; workday; Constitution; social regression.
1 INTRODUÇÃO
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ordena que os muçulmanos tratem o trabalhador justa e generosamente. Não só deve receber
seus salários imediatamente como também tem direito ao repouso adequado e ao lazer.”
Admite-se que o ser humano seja contratado para prestar serviços a outro ser
humano, desde que o faça livremente e sem que isso signifique a degradação de sua condição
humana. Isso encontra fundamento no fato de que o exercício das funções sociais encontra-se
vinculado a uma mútua sujeição. O que não pode ocorrer é a utilização da força de trabalho
do outro como mero meio de atingir determinado fim, de forma a “coisificar” o trabalhador.
(SARLET, 2012).
No plano internacional, destaca-se a Constituição Mexicana de 1917 que teve suas
linhas mestras influenciadas por um manifesto com propostas editadas por um grupo de
jovens intelectuais contrários à ditadura de Porfirio Diaz e liderados por Ricardo Flores
Magón.
A Constituição Mexicana foi a primeira constituição que atribuiu status de direitos
fundamentais aos direitos trabalhistas. Sendo que na Europa essa consciência, de que os
direitos sociais são também direitos humanos fundamentais, só se afirmou após a primeira
grande guerra, com o Tratado de Versalhes (1919). Dentre as previsões desse diploma legal
salienta-se a estipulação da duração máxima da jornada de trabalho de 8 horas.
(COMPARATO, 2003).
A constituição alemã de Weimar de 1919, também produto da primeira grande
guerra, trilhou o mesmo caminho elevando normas relativas ao Direito do Trabalho, em
especial à jornada de trabalho, ao status constitucional. Foi decisiva no que tange a sua
influência sobre a evolução das instituições políticas em todo o Ocidente de forma que
organizou as bases da democracia social. Os direitos trabalhistas foram elevados ao nível
constitucional de direitos fundamentais. (COMPARATO, 2003).
No âmbito internacional a Organização Internacional do Trabalho (OIT) tem o
trabalho digno como o seu principal objetivo, consistindo em fomentar oportunidades para
que homens e mulheres possam ter acesso a um trabalho digno e produtivo. O Organismo
Internacional em tela conceitua trabalho digno como aspirações do ser humano no domínio
profissional abrangendo elementos como oportunidade para desempenhar um trabalho
produtivo com a devida remuneração, segurança no local de trabalho e proteção social para o
trabalhador e sua família e, ainda, perspectivas de desenvolvimento pessoal e integração
social, liberdade para expressar suas preocupações e para participar nas decisões que afetem
sua vida. (OIT LISBOA, 2013).
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Veja que a OIT elenca elementos mínimos para a garantia de um trabalho digno. Da
mesma forma Maurício Godinho Delgado preleciona sobre a existência de um “patamar
civilizatório mínimo” composto por três grupos de normas: tratados e convenções
internacionais, normas constitucionais e normas infraconstitucionais. O autor destaca as
previsões legais sobre saúde e segurança do trabalhador, onde estão incluídas as normas sobre
a jornada de trabalho, tema do presente estudo. (DELGADO, 2012).
A Constituição Federal de 1988 é um marco na história político-jurídica do Brasil,
considerada como grande símbolo da democracia brasileira. Conforme Delgado (1992) foi a
mais substantiva Constituição de Direitos produzida pelo Poder Constituinte do País. Elencou
a prevalência da pessoa humana como sua bandeira primordial tanto no âmbito individual
como social.
No que tange à matéria trabalhista, a Carta em questão, já no artigo 1º, cita a
dignidade da pessoa humana, bem como o valor social do trabalho e da livre iniciativa como
fundamentos da República Federativa do Brasil. O art. 7º, por seu turno, é verdadeiro cerne
dos direitos trabalhistas, o qual se encontra no Título II da Constituição, sendo parte
integrante dos Direitos e Garantias Fundamentais. (BRASIL, 2012).
Também é importante destacar o art. 170, que determina que a ordem econômica
garanta a todos uma existência digna e o art. 193 que exige que a ordem social tenha como
objetivos o bem-estar e a justiça social, que são os próprios fins do Estado. (BRASIL, 2012).
Pode-se auferir do texto Constitucional que, em decorrência do princípio da
dignidade da pessoa humana, epicentro do ordenamento jurídico, a ideia de valor central da
sociedade está na pessoa, que consiste no centro convergente dos direitos fundamentais.
(DELGADO, 2006).
Ao analisar o texto constitucional é possível concluir que não é possível a existência
de um Estado Democrático de Direito sem que haja trabalho digno. Dessa forma, há
necessidade de que o trabalhador seja um fim em si mesmo e não mero instrumento para
obtenção de lucro.
Após analisar o conceito do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, bem como
sua evolução histórica no plano nacional e internacional, passa-se a conceituar a jornada de
trabalho pelo plano legal e doutrinário.
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trabalhador entre a portaria da empresa e o local de trabalho, desde que supere o limite de 10 (dez) minutos
diários.
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Entretanto, com a edição da lei 12.619/2012 foi acrescentada a Seção IV-A ao Título
III do texto consolidado, tratando do serviço do motorista profissional. Desse modo, a jornada
do motorista passou a ter o entendimento de que necessita ser controlada.
Destaca-se que, mesmo antes da Lei supra mencionada entrar em vigor, na hipótese
de o empregado desempenhar atividade externa e ter suas condições registradas, se houvesse
fiscalização indireta através do estabelecimento de roteiros com fixação da duração das
viagens, que indicasse horário a cumprir, poderia gerar o direito ao recebimento das horas
extras. Nesse sentido, recente julgado do Tribunal Superior do Trabalho em sede de Recurso
de Revista- 250600-66.2009.5.04.0203, publicado no dia 25/12/2012.
Por outro lado, o disco registrado pelo cronotacógrafo4, por si só, não é instrumento
hábil a realizar o controle de jornada, pois não identifica o condutor, tão pouco o trajeto
cumprido, assim é o entendimento da OJ 332 da SBDI-1 do TST5. Como já asseverado
jornada de trabalho é o período de tempo diário em que o trabalhador presta serviço ou se
coloca à disposição de seu empregador. Estão incluídos nesse período os intervalos
remunerados (DELGADO, 2007).
Importante dizer que, além das horas de efetivo trabalho, o tempo à disposição do
empregador também é considerado na jornada de trabalho. No que diz respeito à natureza
jurídica, a jornada de trabalho consiste em norma de ordem pública, uma vez que o interesse
na limitação do trabalho não é apenas subjetivo, mas de toda a sociedade. Dessa forma, a
limitação é um imperativo da manutenção da saúde, segurança, dignidade e, sobretudo, da
vida do trabalhador (CAMINO, 2003).
Jornada de trabalho, juntamente com o salário, ocupa posição de destaque na história
do Direito do Trabalho. Sempre foram temas centrais nas lutas trabalhistas. Conforme
Maranhão (1987), o salário é o preço atribuído à força de trabalho, já a jornada seria a medida
dessa força.
Ocorre que modernamente a jornada de trabalho ocupa posição de mais destaque,
pois está atrelada à saúde do trabalhador. Conforme Delgado (2007), estudos têm revelado
Os veículos de carga com peso bruto acima de 4.536 quilogramas e os veículos de passageiros com mais de 10
4
lugares são obrigados pelo Código de Trânsito Brasileiro a possuir cronotacógrafo. Através dele, é possível
monitorar o deslocamento do veículo. O disco diagrama, de papel especial, colocado no cronotacógrafo, registra
dados importantes, como as velocidades desenvolvidas pelo veículo, intervalos de tempo parado e em
deslocamento e distâncias percorridas. São informações aceitas legalmente como prova em caso de acidentes ou
denúncias de má condução do veículo.
5
TST- OJ-SDI1-332 MOTORISTA. HORAS EXTRAS. ATIVIDADE EXTERNA. CON-TROLE DE
JORNADA POR TACÓGRAFO. RESOLUÇÃO Nº 816/1986 DO CONTRAN (DJ 09.12.2003)
O tacógrafo, por si só, sem a existência de outros elementos, não serve para controlar a jornada de trabalho de
empregado que exerce atividade externa.
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doenças ocupacionais como burnout6. De outra banda, a jornada de trabalho com duração
elevada acarreta fadiga, resultando no cansaço do trabalhador e aumento do risco de
acidentes. Socialmente falando, é mister lembrar que o indivíduo, além de trabalhar, deve
integrar-se à sociedade na qual está inserido, inclusive sua própria família, o que não é viável
se submetido a extensa carga horária de trabalho.
Sob o aspecto econômico, deve-se dizer que a jornada de trabalho elevada induz o
empregador a deixar de contratar novos empregados, aumentando o nível de desemprego.
Outro fator de extremo relevo é o fundamento de natureza humana, preconizando que o
indivíduo não pode ser submetido à jornada de trabalho extenuante, pois isso colocaria em
risco a sua vida, bem como dos demais colegas.
Feito esse apanhado sobre os limites da duração do trabalho, cumpre agora abordar a
nova lei do motorista profissional sob a égide do trabalho digno.
6
Exaustão emocional humana decorrente da condição de trabalho que o indivíduo está exposto. Situação de
estresse crônico que gera a falta de energia, esgotamento físico e mental. (FERRARI, 2013).
7
“Duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a
compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho”
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que respondia pela presidência devido à ausência do então Presidente da República, Luiz
Inácio Lula da Silva.
Assim, nota-se que a matéria vem sendo debatida há anos por meio de inúmeros
projetos de lei, os quais, todavia, restaram infrutíferos devido aos anseios antagônicos por
parte dos motoristas e seus empregadores. Aponta-se o Projeto de Lei 99 de 2007, bem como
ajuizamento da Ação Civil Pública 1372.2007.021.23.00-3 em Rondonópolis – MT, como
dois marcos na iniciativa do Projeto de Lei que deu surgimento à lei 12.619/2012, objeto
deste estudo.
A partir da propositura da ACP acima referida, houve uma preocupação em nível
nacional com a limitação da jornada de trabalho e do tempo de direção dos motoristas, bem
como da adaptação e estrutura ambiental para que os motoristas pudessem exercer suas
atividades. O Ministério Público mediou as negociações entre empresários e motoristas,
dando corpo ao PL 99 de 2007.
Assim, nasceu a Lei 12.619 de 2012, que regulou a jornada de trabalho dos
motoristas profissionais empregados e autônomos que transportam cargas e passageiros,
trazendo diversos avanços. Porém não se pode negar que alguns pontos da Lei se demonstram
um verdadeiro retrocesso social ou mesmo questionáveis diante do texto Constitucional.
Canotilho (2001) diz que, tendo em vista o princípio da vedação ao retrocesso social
não é possível que a legislação já efetivada e realizada protegendo direitos sociais seja
revogada. Pois são consideradas constitucionalmente garantidas sendo vedada a sua
revogação, salvo se provier outra medida compensatória. Ou seja, o legislador encontra limite
no núcleo essencial já realizado.
Na mesma linha Piovesan (2000) entende que esfacelar os direitos sociais consiste
em afrontamento direto ao texto Constitucional. A autora diz que os direitos sociais são parte
dos Direitos e Garantias Individuais e, portanto, revestem-se da roupagem de Cláusula Pétrea,
não podendo ser suprimidos pelo legislador.
Adiante passa-se ao conceito de motorista profissional e põe-se em relevo os
aspectos mais polêmicos da Lei 12.619/2012, atinentes à duração do trabalho.
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cargas por conta de terceiros mediante remuneração e revoga a Lei no 6.813, de 10 de julho de
1980.
Numa primeira análise pode parecer que a lei alcança somente os motoristas
profissionais empregados, ficando os motoristas profissionais autônomos excluídos. Contudo,
em que pese opiniões contrárias, ao analisar sistematicamente o diploma legal verifica-se sua
pertinência aos motoristas profissionais autônomos. Isso porque o art. 5º introduz uma série
de dispositivos no Código de Trânsito Brasileiro (art. 67-A e art. 67-C; art. 230, XXIII), os
quais, são aplicáveis tanto aos motoristas empregados, quanto aos autônomos. Esse é o
entendimento, inclusive da NTC & Logística, empresa de transportes em diversos estados da
Federação8.
É necessário distinguir a figura do motorista de carga empregado e o motorista de
carga autônomo. Esse último também pode ser chamado de Transportador Autônomo de
Cargas (TAC). A lei 11.442 de 2007 regula as funções do TAC. Dentro desta espécie tem-se o
TAC agregado e o TAC independente. Veja o art. 4o da lei acima referida: “O contrato a ser
celebrado entre a ETC e o TAC ou entre o dono ou embarcador da carga e o TAC definirá a
forma de prestação de serviço desse último, como agregado ou independente”.
O transporte rodoviário de cargas deve ser realizado por pessoa física regido pela lei
11.442/2007. Para se configurar um fidedigno TAC deve obedecer ao previsto no art. 2º da lei
citada, veja:
A atividade econômica de que trata o art. 1o desta Lei é de natureza comercial,
exercida por pessoa física ou jurídica em regime de livre concorrência, e depende de
prévia inscrição do interessado em sua exploração no Registro Nacional de
Transportadores Rodoviários de Cargas - RNTR-C da Agência Nacional de
Transportes Terrestres - ANTT, nas seguintes categorias:
I - Transportador Autônomo de Cargas - TAC, pessoa física que tenha no transporte
rodoviário de cargas a sua atividade profissional;
II - Empresa de Transporte Rodoviário de Cargas - ETC, pessoa jurídica constituída
por qualquer forma prevista em lei que tenha no transporte rodoviário de cargas a
sua atividade principal.
http://www.viclogistica.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=113:ntc-debate-principais-
pontos-da-lei-da-profissao-de-motorista&catid=2:noticias
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Conclui-se, portanto, que a Lei 12.619 de 2012 aplica-se aos motoristas profissionais
empregados e autônomos que desenvolvem suas atividades no meio urbano ou mesmo rural e,
ainda, nas vias urbanas ou interurbanas. Porém, devem ser respeitadas as peculiaridades, pois
aos motoristas autônomos aplica-se os dispositivos que alteraram o CTB, bem como as
Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho e Emprego, já aos motoristas
empregados a aplicação é mais ampla, correspondendo além das alterações do CTB, as
inovações advindas à CLT.
Alexandre de Moraes classifica os Direitos Humanos em dimensões. Sendo de primeira dimensão aqueles
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referentes a liberdade do ser humano, ou seja, um “não-fazer” do Estado. Direitos Humanos de segunda
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dimensão consistem no direito a igualdade, estando inseridos os direitos sociais, seria o “fazer” do Estado. Já os
direitos humanos de terceira dimensão são aqueles relativos ao meio ambiente sadio.
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Horas Extras - Limitação Legal - Cálculo dos Haveres Trabalhistas I - A limitação legal da jornada
suplementar a duas horas diárias não exime o empregador de pagar todas as horas trabalhadas.
II - O valor das horas extras habitualmente prestadas integra o cálculo dos haveres trabalhistas,
independentemente da limitação prevista no "caput" do art. 59 da CLT.
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No próximo tópico serão abordadas algumas mudanças introduzidas pela nova Lei do
Motorista Profissional, à luz da Constituição Federal de 1988.
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prescreve que o tempo de espera não será computado como horas extraordinárias. O segundo
comando vem logo a seguir no § 9o , da mesma Lei onde assevera que o valor a ser pago pelo
tempo de espera do motorista consiste em verba indenizatória e não salarial.
Também consiste em tempo de espera o período em que o trabalhador, extrapola a
sua jornada para permanecer junto ao veículo por exigência do empregador nas viagens de
longa distância, interpretação dada através, do art. 235-E, § 4º da CLT: “O motorista fora da
base da empresa que ficar com o veículo parado por tempo superior à jornada normal de
trabalho fica dispensado do serviço, exceto se for exigida permanência junto ao veículo,
hipótese em que o tempo excedente à jornada será considerado de espera”.
Moraes (2012) entende que isso ocorre devido a falta de disponibilização, por parte
do empregador, de custeio para as despesas de hospedagem ou local apropriado para repouso.
Conforme o autor faltam as condições mínimas de descanso para que o trabalhador possa
gozar de seu tempo livre. Deve-se lembrar que o período de embarque e desembarque pode
significar muitos dias seguidos em algumas hipóteses. Situação que figura o exercício de
trabalho indigno. Isso pode decorrer, não da omissão do empregador, mas sim de atitudes do
embarcador, que atualmente também responsabiliza-se por garantir as condições sanitárias de
conforto mínimas previstas pelas Normas Regulamentadoras do MTE.
Já na hipótese de o empregado preferir permanecer na “boleia” após a jornada de
trabalho, entende-se que o preceito é inconstitucional, porque, à luz do art. 4º da CLT,
constitui-se jornada o tempo que o empregado fica à disposição do empregador. Logo, sendo
jornada e extrapolando a 8ª hora diária, isso irá configurar hora extra fazendo uma
interpretação à luz da CF.
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Não obstante o exposto, é mister dizer que as súmulas do TST não são vinculantes e
que muitas vezes necessitam inúmeros debates judiciais para que os direitos trabalhistas não
sejam preteridos. E ainda, atividade do motorista é extremamente desgastante e perigosa,
sendo as pausas e limitações de jornada um imperativo à saúde, não só do motorista, mas de
toda a sociedade.
Moraes (2012) assevera que a previsão legal da jornada 12 X 36 significa um
verdadeiro retrocesso social. Conforme o entendimento de Alemão (2012), além da
negociação coletiva deve ser justificado em razão da especificidade do transporte, de
sazonalidade ou característica. Pode também ser justificada a escala para realizar reparos, ou
ainda, a lei diz em outros casos, deixando uma margem extensa de subjetividade. Assim, a
norma coletiva deve ser analisada com bastante acuidade sob pena de ser considerada nula.
Visto que o pagamento das horas extraordinárias possui natureza alimentar, pois
integra o salário e que jornada superior a oito horas diárias lesa a saúde do trabalhador,
percebe-se nesse ponto à ofensa ao princípio da dignidade da pessoa humana, pois os direitos
referidos são tutelados pela Constituição Federal, portanto são direitos fundamentais.
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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo analisou a Lei 12.619 de 2012 - Nova Lei do Motorista - sob um
viés constitucional, nomeadamente à luz do princípio da Dignidade da Pessoa Humana. A
dignidade é o ponto em comum que os Direitos Humanos Fundamentais. São direitos
intrínsecos ao ser humano, que estabelecem condições mínimas para a existência da pessoa.
Os Direitos Humanos que constam na Constituição Federal de 1988 consistem em
Direitos Fundamentais e neles estão abrangidos os direitos sociais, e, portanto, o Direito do
Trabalho. O Trabalho Digno, em especial, refere-se à observância do patamar civilizatório
mínimo e é consagrado como um direito humano fundamental em tratados internacionais, na
Constituição Federal e em normas infraconstitucionais.
Foram analisados também aspectos gerais no que tange à jornada de trabalho. E,
ainda, examinado, especificamente, a jornada de trabalho do motorista profissional a partir do
novo diploma legal que lhe foi outorgado. E, por fim, foram abordadas questões
controvertidas em relação a sua constitucionalidade.
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7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 3ª ed. São Paulo: LTr, 2007.
CAMINO, Carmen. Direito Individual do Trabalho. 3ª ed. Porto Alegre: Síntese, 2003.
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 6ª ed. São Paulo: LTr, 2007.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 14ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
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MARANHÃO, Délio. Direito do Trabalho. 14ª ed. Rio de Janeiro: fundação Getúlio Vargas,
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MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. 28ª ed. São Paulo: Atlas, 2012.
MORAES, Alexandre de Moraes. Direitos Humanos Fundamentais. 5ª ed. São Paulo: Atlas,
2003.
MORAES, Paulo Douglas Almeida de. Abordagem holística sobre nova regulamentação
da profissão do motorista (Lei n. 12.619/2012). Disponível em:
<http://jus.com.br/revista/texto/22405/abordagem-holistica-sobre-nova-regulamentacao-da-
profissao-do-motorista-lei-no-12-619-2012>. Acesso em: 03 fev. 2013.
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Abstract
Work Education is one institute initiated by the Child and Adolescent which has very little
publicity and applicability in the Brasil productive scenario. This form of integration of young
people in the labor market aimed primarily the personal and human development of students
coupled with his professionalism. Accordingly, faced with numerous examples for and
against the educational work discusses whether the institute could actually achieve the desired
ends and put in the regulations. The opinions are controversial, however, is not denying the
difficulties in implementing a program that truly achieves the purposes described in the
legislation, it will show some examples of work in educational bonds are desired by the
international conventions, status of children and adolescents and by art. 227 of the
Constitution of 1988, which may represent a realization of social rights.
1
Aluna da Disciplina Isolada Direito Processual do Trabalho lecionada no programa de Pós-Graduação, stricto
sensu , da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Especialista em Direito do Trabalho pelo IEC –
Instituto de Educação Continuada da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Advogada.
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1 INTRODUÇÃO
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Assim, notável se faz a teoria da proteção integral, adotada pela Constituição Federal,
baseando-se em direitos próprios e especiais das crianças e adolescentes que, na condição
peculiar de pessoas em desenvolvimento, precisam de proteção integral, especializada e
diferenciada. (FERNANDES, 2001)
Nestes termos, dentro do sistema de proteção completa e geral à criança e ao
adolescente, além da proibição a certas e determinadas formas de trabalho, temos em
contrapartida, o direito destes jovens ao ingresso no mercado de trabalho.
Segundo o já citado artigo 227 da Constituição Federal de 1988 a “profissionalização
de adolescente” é também um direito que dever ser garantido com absoluta prioridade.
(OLIVEIRA, 2009, p. 156)
Assim, o texto constitucional sinaliza tal importância, possibilitando que a partir dos
14 anos o adolescente possa iniciar sua profissionalização, via aprendizagem.
Isto porque, com um mercado de trabalho cada vez mais competitivo a
profissionalização do adolescente vai ao encontro das exigências de tal realidade, a qual
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revela um contingente de jovens que não conseguem uma oportunidade de emprego, por pura
falta de qualificação.
Portanto, a exclusão do mercado de trabalho revela-se como uma ofensa a cidadania e
aos direitos e garantias fundamentais, haja vista que o art. 5, XIII, resguarda a todos o
trabalho livre.
Outrossim, elucida Pedro Demo que “por sermos cidadãos, temos direito ao trabalho”,
nos seguintes:
A visão política do trabalho é uma exigência da cidadania. Por isto dizemos que é
derivado dela. Por sermos cidadãos, temos o direito ao trabalho. Por ser direito, está
definitivamente ligado à realização da dignidade e da decência social. Não quer
dizer secundarização porque o cidadão que não trabalha é parasita, ou seja, não é
cidadão. No entanto, é muito diferente enfocar o trabalho como componente da
cidadania, ou como exclusiva realização profissional. A educação tem a ver
essencialmente com a primeira visão. Engloba a segunda, como decorrência, e será
sempre um dos frutos da dignidade profissional. É função, pois, do processo
produtivo, mesmo quando chamado a profissionalizar, não relegar a cidadania a
segundo plano. (DEMO, 1985, p. 67)
Assim, o instituto do trabalho educativo disposto no ECA tem como uma de suas
finalidades a efetivação de direitos fundamentais.
Escopo este que será analisado no tocante ao alcance da sua finalidade pelas singelas
elucidações do presente estudo.
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O Trabalho Educativo é definido pelo art. 68 da Lei 8.069, de 13 de julho de 1990, que
dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente. (BRASIL, 1990)
Segundo o parágrafo primeiro do mencionado artigo, trabalho educativo é a atividade
laboral em que as exigências pedagógicas relativas ao desenvolvimento pessoal e social do
educando prevalecem sobre os aspectos econômicos e de mercado.
Dispõe ainda o art. 68 do referido diploma que o programa social que tem por base
este tipo de trabalho deve assegurar ao adolescente que dele participa condições de
capacitação para a realização de exercício de atividade regular remunerada.
Nestes termos, é educativo o trabalho:
1. que possibilite condições de capacitação para o exercício de atividade
remunerada;
2. que há exigências pedagógicas relativas ao desenvolvimento pessoal e social
do educando, que prevaleçam sobre o aspecto produtivo;
3. que resulte produção;
4. que ocorra a remuneração pelo trabalho efetuado por “unidade de obra” ou por
participação na venda dos produtos sem desfigurar o caráter produtivo.
Assim, define Oris de Oliveira (2009) que o trabalho educativo nos moldes abaixo
declinados:
Não uma atividade laborativa qualquer, mas a que se insere em projeto pedagógico
que vise ao desenvolvimento pessoal e social do educando. Portanto o ritmo,
desenrolar das atividades deverá ser ditado, sob pena de inversão de meios e fins,
por um programa preestabelecido.
Não uma produção qualquer, mas aquela cujo produto possa ser vendido dentro das
exigências de qualidade e competitividade. Uma produção, pois, que implique custo
e benefícios, capaz de remunerar quem a executa.
(OLIVEIRA, 2009, p. 222)
Ressalta, todavia, referido autor que o termo trabalho educativo possui múltiplos
significados, haja vista que no mundo grego, por exemplo, os termos “trabalho” e “educação”,
podiam ser tidos como dicotômicos. Assim, segundo Oris de Oliveira (2009):
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as concepções teóricas adotadas. Isso quer dizer que não há somente um único
significado que possa ser válido ou verdadeiro”.
A multiplicidade de significados não implica um relativismo estéril porque “a
utilização coerente do termo dentro de cada concepção teórica, é indispensável que
aquele que o adote tenha claro não só referencial teórico, que embasa, mais
diretamente os procedimentos metodológicos que utiliza, mas também é
indispensavelmente tenha muito bem claro os valores para os quais tais princípios
servem, sem o que não terá condições de prever as implicações das soluções
propostas.
Entre seus múltiplos significados “trabalho educativo” pode referir-se às ações
consistentes em educar, quando a educação concebida como a atividade mediadora
no seio da prática social global serve ao objetivo de promover o homem (...); a
educação é sempre uma mediação valorativa, isto é, dirigida por valores, uma
mediação que indica um determinado posicionamento. Não é, portanto, neutra.
Trabalho educativo significa, também, uma inter-relação entre educação (este
tomada em todas as suas dimensões como processo que visa a promover o
desenvolvimento da pessoa com todas as suas potencialidades) e o trabalho (este
visto não somente como realização do indivíduo, mas também, em que está
concretamente inserido). (OLIVEIRA, 2009, p.223-224):
450
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
O trabalho educativo nos termos acima descrito é aquele que promove a junção entre
escola e labor na medida certa, porém, prevalecendo o aspecto educativo a fim de que não
apenas o crescimento profissional seja completo, mas também que promova no educando o
desenvolvimento dos aspectos morais e sociais.
Nestes termos, o trabalho educativo não esta adstrito a uma única e exclusiva
modalidade de labor, mas pode ser encontrada em algumas formas de contratação de
adolescente, como por exemplo, o aprendiz e o estágio.
Assim, bem explicita Oris de Oliveira que:
451
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
O Estágio, por sua vez, é definido em lei própria, qual seja, a Lei 11.788 publicada em
25 de setembro de 2008. Este pode ser conceituado como um tempo de efetivo exercício de
uma profissão a qual tem suas bases teóricas explanadas por uma instituição de ensino técnico
ou superior diversa do local de exercício da prática. (BRASIL, 2008)
A Lei brasileira delimita precisamente os contornos e finalidades do contrato estágio
nos seguintes termos:
452
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
“constrói uma “ponte” que liga um todo constituído por estudo e trabalho, devendo, porém, o
aspecto educativo prevalecer sobre o produtivo”. (OLIVEIRA, 2009, p. 254)
Nestes termos, percebe-se que tanto o estágio como a aprendizagem são modalidades
de trabalho educativo, desde que desenvolvidos nos estritos limiares legislativos.
Todavia, assim como qualquer trabalho que se define por educativo a não observância
das finalidades legais desconstitui o contrato de estágio e faz surgir, espontaneamente, uma
relação de emprego com todos os encargos dela decorrentes, nos termos do §2º do art. 3º da
Lei 11.788/2008. (BRASIL, 2008)
Igualmente, a aprendizagem e qualquer outra forma de trabalho educativo somente
podem ser classificados como tal desde que atendam as finalidades educativas, de formação
pessoal, moral e profissional dos adolescentes.
Caso contrário, estas formas de labor passar a revelar simples relação de prestação de
serviço, sem fins pedagógicos e/ou pretensões educativas, mas apenas produtivas.
453
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Não teve utilidade e nem influencia no que faço hoje. Não que seja negativo ter
pertencido a guarda mirim. Naquela época era necessário para ajudar em casa (...) Se
tivesse um filho, não deixaria frequentar a guardinha. A formação que recebi não me
ajudou em nada. Preferiria deixá-lo estudando e me esforçaria mais para que ele só
estudasse. (PEREIRA, 1994, p.25)
454
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
455
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Não menos interessante apresenta-se o Projeto Pescar que apesar da nomenclatura, não
se relaciona com as atividades de apicultura:
Oliveira (2009) cita ainda as principais características destes tipos de projetos, que,
segundo sua opinião deu uma “interpretação autêntica” ao art. 68 e seus parágrafos, no
456
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
457
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Questão esta também bem colocada por Antônio Carlos Gomes da Costa (1992) ao
comentar o art. 68 do Estatuto da Criança e do Adolescente:
Da mesma forma, não se oculta que o ideal seria todos os jovens brasileiros terem todo
o tempo livre para se dedicar a educação, sem ter a mínima preocupação com as despesas de
alimentação, vestuário e outros, assim como ressalta Maurício Godinho Delgado (2009):
Trabalho versus escola parece ser dilema proposto, inevitavelmente, neste debate.
Os padrões internacionais vigorantes indicam que o trabalho precoce consolida e
reproduz a miséria, inviabilizando que a criança e o adolescente suplantem suas
deficiências estruturais através do estudo. Por isso é que a Organização Internacional
do Trabalho recomenda a proibição de qualquer trabalho anterior à idade de quinze
anos (Convenção 138 da OIT). Embora o texto original da Constituição de 1988 não
tenha avançado, satisfatoriamente, nesse tema (uma vez que coloca 14 anos como a
idade mínima para o trabalho, admitindo o trabalho de aprendiz desde os doze anos
– art. 7, XXXIII), pelo menos inviabilizou a utilização do trabalho do menor de
forma economicamente perversa, ao lhe garantir todos os direitos trabalhistas (salvo
no caso de aprendizagem). (DELGADO, 2009, p.731)
Porém, frente à realidade enfrentada pelo Brasil, que possui no ano de 2012
aproximadamente dois milhões de crianças e adolescentes que podem ser consideradas vítima
458
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
do trabalho desregulado sem qualquer qualificação, o trabalho educativo pode sim ser uma
alternativa viável. (BRASIL, 2012)
Isto porque, esta forma de trabalho do jovem não visa apenas de aprendizagem de uma
profissão, mas também o crescimento pessoal e moral, pois um projeto de “trabalho
educativo” elaborado e desenvolvido nos estritos termos legais pretende o avançar da
consciência de cidadania dos adolescentes que deles participam.
Ora, o simples fato de ser um adolescente pertencente ao grupo dos sociais excluídos
não autoriza sua inserção no mercado de trabalho pela via de uma nova exclusão, mesmo que
velada por boas pretensões. (DELGADO, 2009, p.730)
Nestes termos, a desfiguração do instituto enseja a ocorrência de fraude trabalhista
(art. 9/CLT) e o consequente reconhecimento do vínculo de emprego diretamente com o
tomador de serviços do adolescente educando, com todas as suas obrigações daí decorrentes.
(VASCONCELIS, 1998, p. 214)
Portanto, diante das garantias constitucionais e da verdadeira realidade enfrentada por
milhares de jovens no Brasil a aprendizagem de uma profissão via um programa que
desenvolva a consciência de cidadania e dignidade da pessoal humana representa um grande
avanço para aquela e as futuras gerações.
Um adolescente que aprende a importância do trabalho e do estudo como fator de
promoção social dificilmente permitirá que seus descendentes abandonem os estudos para
laborar em tarefas simples e sem qualquer fator de crescimento social.
Nestes termos, não se defende o trabalho do adolescente de caráter nitidamente
assistencialista, até mesmo porque tais projetos não foram recepcionados pela nova ordem
constitucional implantada em 1988 - que dispõe sobre a proteção integral a criança e ao
adolescente – mas aquele trabalho verdadeiramente educativo. Este que promova a efetivação
de direitos sociais, com o desenvolvimento moral, profissional e intelectual dos adolescentes,
conforme os que já estão sendo desenvolvidos nas cidades de Patos de Minas e Patrocínio,
nos termos acima citados.
7 CONCLUSÃO
459
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Ora, não se pode afirmar que a melhor alternativa para os jovens de baixa renda seja a
iniciação profissional precoce. Todavia, também não é adequado olvidar a real situação de
abandono que se encontram diversos adolescentes.
Não é difícil verificarmos, principalmente nos grandes centros urbanos, a exploração
do trabalho de menores sem as mínimas condições de saúde e higiene.
São milhares de crianças e adolescentes vendendo balas nos sinais de trânsito, lavando
carros nas ruas, vigiando automóveis em estacionamentos públicos ou até mesmo pedindo
dinheiros para todos que com eles se defrontam.
Nestes termos, o trabalho educativo como forma de desenvolvimento pessoal, moral e
profissional é um caminho que se pode seguir a fim de que futuramente atinjamos o ideal, ou
seja, a educação das crianças e adolescentes em período e forma integral.
Educação esta que lhe possibilite o desenvolvimento intelectual, moral e cultural, e
que, segundo Oris de Oliveira, através do trabalho:
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, André Luiz Paes de. Direito do Trabalho: material, processual e legislação
especial. São Paulo: Rdieel, 2006.
460
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
_____. Consolidação das Leis do Trabalho. CLT. Decreto-Lei n.º 5.452, de 1º de maio de
1943.
_____. Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil (Lista TIP). Decreto Lei 6.841, de 12
de junho de 2008. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-
2010/2008/decreto/d6481.htm. Acesso em 15 de junho de 2012.
COSTA, Antônio Carlos Gomes da. Febem-MG e a proposta da educação pelo trabalho.
Em: Menor e sociedade brasileira, mimeo, 1988.
DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho . 4. ed. São Paulo : LTr,
2009.
MARTINS, Sergio Pinto. Fundamentos de Direito do Trabalho. São Paulo: Atlas, 2002.
461
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
VIANNA , Claudia Salles Vilela . Manual Prático das Relações Trabalhistas. Editora LTR.
11ª EDIÇÃO. 2012
462
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RESUMO
ABSTRACT
The goal of this work is to show that the outsourcing in the Public Administration, which is
the result of the outsourcing companies being hired to support the execution of public
services, implies a mechanism of precarization and devaluation of the outsourced worker.
Advogado, Especialista em Direito Constitucional e Mestre em Direito pela UFRN – Universidade Federal do
Rio Grande do Norte.
Doutora em Direitos Humanos pela Université Catholíque de LYON – França – França. Pós-Doutorado pela
Université Lumière LYON II – France. Professora Associada IV do Programa de Pós-Graduação em Direito da
UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
463
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Through the judgement of constitutionality of the art. 71, § 1º of the Law nº 8666/93, it is
noticed that the difficulty in calling the subsidiary of the Public Administration for a legal
process due to the lack of payment for the labor rights becomes higher. Consequently, the
adventures of companies without financial conditions to accomplish what must be paid as
well as the Public Administration when they are under guilt “in eligendo” and “in vigilando”
may result damage for the worker whose hyposuffciency is very clear in this three-side
relation. Also, it is made an analysis about the judicial differences between the outsourced
workers and the ones directly hired. On this issue, the protective differences between state
workers and private ones who work in the same environment result in inequality of
perspectives – a fact that is evident, for example, in the criteria of stability. Another crucial
aspect lies in the low representativity of the outsourced workers when compared to the ones
directly hired – fact that lessens the power of bargain and keeps the status of precarization of
those who depend on the outsourced work.
1 INTRODUÇÃO
464
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Por fim, além da insegurança jurídica provocada por esta recente decisão, o presente
artigo aborda em linhas finais, dois fatores que potencializam a precarização do trabalho
terceirizado no âmbito da Administração Pública: O primeiro refere-se à desigualdade
provocada no ambiente de trabalho em face da convivência de celetistas e estatutários; o
segundo aspecto versa sobre os reflexos da terceirização pública na representação sindical.
2 CONCEITO DE TERCEIRIZAÇÃO
465
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
empregado contratado deve executar e, finalmente, a onerosidade como requisito que também
deve se fazer presente.
1
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 8. ed. São Paulo: LTr, 2009, p. 407.
2
BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 6. ed. rev. e ampl.. São Paulo: Ltr, 2010, p. 452.
466
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
serviço público, a Administração Pública contrata empresas para a prestação de serviços que,
em tese, não devem ter ligação direta com os fins da Administração Pública.
3
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 24 ed. rev. e atual.. São Paulo:
Malheiros Editores Ltda, 2007, p. 656.
467
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Dinorá Adelaide Musetti Grotti pondera que atribuir determinado serviço como
sendo de natureza pública, depende das peculiaridades e escolhas de cada povo, sobretudo em
virtude de tais escolhas estarem inseridas no sistema jurídico. Nas palavras da autora:
Uma vez estabelecida à conceituação para serviço público, é de bom alvitre buscar
neste momento uma definição de terceirização no serviço público. Helder Santos Amorim
estabelece tal definição. Eis as palavras do autor:
O acesso aos cargos e empregos públicos é um direito que pode exercido por
qualquer brasileiro, desde que atenda as exigências legais. O meio adequado para a escolha
4
GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. O Serviço Público e a Constituição Brasileira de 1988. São Paulo:
Malheiros Editores Ltda, 2003, p. 87
5
AMORIM, Helder Santos. A Terceirização no Serviço Público: à Luz da Nova Hermenêutica
Constitucional. São Paulo: LTr, 2009, p. 197.
468
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
destes profissionais é através do concurso público, por força do art. 37, II, da Constituição de
1988.
6
VIANA, Márcio Túlio; DELGADO, Gabriela Neves; AMORIN, Helder Santos. Terceirização – Aspectos
Gerais. A Última Decisão do STF e a Súmula 331 do TST. Novos Enfoques. In: Revista do Tribunal Superior
do Trabalho. Ano 77 - n. 1, jan. a mar, 2011, p.77
469
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Convém ressaltar que a inclusão dos itens V e VI na Súmula n° 331 do TST atendem
perfeitamente a decisão do STF no julgamento da ADC 16, reforçando a idéia lógica de que a
Administração Pública não pode se furtar de fiscalizar seus contratos de mão-de-obra
terceirizada, sob pena de responder subsidiariamente, porém, é sempre bom lembrar o
cabimento da ação regressiva em caso de condenação do ente público.
7
FREITAS, Juares. Discricionariedade Administrativa e o Direito Fundamental à Boa Administração
Pública. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 48.
8
VIANA, Márcio Túlio; DELGADO, Gabriela Neves; AMORIN, Helder Santos. Op. cit., p. 78.
470
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
passa a ser dobrado, pois algumas destas empresas possuem uma grande fragilidade
financeira, encerrando suas atividades sem pagar o crédito devido aos funcionários.
9
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE
I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o
tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).
II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os
órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).
III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de
20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do
tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.
IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade
subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual
e conste também do título executivo judicial.
V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas
condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666,
de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora
de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações
trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.
VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação
referentes ao período da prestação laboral.
Disponível em: <http://www.tst.gov.br/jurisprudencia/Livro_Jurisprud/livro_html_atual.html>. Acesso em 2 de
agosto de 2011.
471
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Cabe também a tomadora, cuidar para que a empresa terceirizada mantenha uma
política correta de pagamento dos direitos trabalhistas, quando isto não acontece, incorre a
tomadora em culpa in vigilando. Existem ferramentas contratuais que podem ser utilizadas
para a garantia da tomadora, evitando problemas futuros. Um exemplo é a vinculação do
pagamento das faturas, desde de que a terceirizada comprove estar quite com os encargos
trabalhistas.
472
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
deste fato, é preciso definir se caberia ou não a administração pública responsabilizar-se pelo
adimplemento de tais verbas, pois com a falência das empresas ou mesmo pelo
descumprimento da legislação laboral vigente por parte destas, restaria ao trabalhador,
hipossuficiente nestas relações, arcar com o prejuízo, principalmente no primeiro caso, ou
seja, em caso de falência, visto que não é difícil concluir que o trabalhador encontra enormes
dificuldades, mesmo através dos meios judiciais, na restauração dos direitos violados.
Em julgamento realizado dia 24/11/2010 a ação foi julgada procedente, tendo voto
contrário do Ministro Ayres Brito. O julgamento declarou a constitucionalidade do art. 71, §
1º da Lei 8.666/93, mas não declarou a inconstitucionalidade do Enunciado n. 331, de
maneira que o TST terá de trabalhar com estas duas normas jurídicas. Coube, diga-se de
passagem, ao Ministro Ayres Brito, mesmo vencido, sustentar argumentos voltados a uma
maior proteção dos trabalhadores terceirizados. Nesse sentido, é cabível a transcrição de parte
do informativo n. 610 do STF, naquilo que concerne ao pensamento do referido Ministro:
11
Art. 71. O contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais
resultantes da execução do contrato.
§ 1o A inadimplência do contratado, com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere
à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou
restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis.
473
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Porém, é preciso considerar que a falta dos limites temporais e a abrangência destas
fiscalizações durante a execução do contrato, implicam na extremamente árdua tarefa de
12
Informativo n. 610 do STF. Disponível em: www.stf.jus.br.
474
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descobrir com precisão se a Administração Pública agiu ou não com omissão, incorrendo em
culpa in vigilando.
13
GEMIGNANI, Tereza Aparecida Asta. Artigo 71 da Lei N° 8.666/93 e Súmula 331 do TST: Poderia Ser
Diferente? In: Revista do tribunal Superior do Trabalho. Ano 77 - n. 1, jan. a mar, 2011, p. 44.
14
Ibidem, p. 41.
475
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476
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
por vezes exercendo funções iguais, porém tutelados por diplomas legais que oferecem
dispositivos protetivos factualmente desiguais.
Para demonstrar que a convivência de trabalhadores regidos por regimes jurídicos tão
diversos importa em condições de extrema desigualdade, é preciso conhecer os critérios
necessários para identificação do desrespeito à isonomia. Celso Antônio Bandeira de Mello
enfrentou o tema e estabeleceu três critérios basilares que, uma vez preenchidos, resultam na
quebra da isonomia. Em seguida arremata afirmando que a agressão a apenas um destes
critérios importa em ofensa ao princípio da isonomia. Eis as palavras do autor:
15
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3. ed., 18ª tir..
São Paulo: Malheiros, 2010, p. 21.
477
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16
DELGADO, Maurício Godinho. Op. cit., p. 443.
478
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Ante ao exposto, fica a certeza de que para atender aos fundamentos que regem o
Estado Democrático de Direito, sobretudo a dignidade da pessoa humana e os valores sociais
do trabalho, é necessário que ajustes legislativos sejam feitos, buscando eliminar o abismo
que separa o servidor público diretamente contratado e o trabalhador contratado por meio de
contratos de terceirização com os diversos entes públicos.
5 CONCLUSÕES
17
DRAY, Guilherme Machado. O Princípio da Igualdade no Direito do Trabalho. Coimbra: Almedina, 1999,
p. 125.
479
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6 REFERÊNCIAS
480
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Belo Horizonte
2013
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ABSTRACT: classical tying satisfy the desires for some time workers, lawyers and social
movements. The typical form of subordinate work consisted largely of workers who needed
legal protection. However, social reality is now very different from that contemplated in
contemporary society. Given this, the legal subordination no longer presents itself as a
sufficient criterion for pursuing the true purposes of Labor Law, taking into account the range
of workers who are no longer protected by not contemplate, directly or indirectly, in relation
work, such a criterion. It is in this context that the Parassubordinação brings up important
discussions and of great relevance for the future of labor law, given the new working
arrangements that emerged in the late twentieth century that, on one side, were adequate to the
demands of capitalism and on the other, inadequate to the labor law by not fit their principles,
institutions and rules.
482
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INTRODUÇÃO
Trazendo o charme das coisas novas e o peso da cultura europeia, a
parassubordinação seduz e encanta – tal como acontecia, nos tempos do Brasil-
Colônia, com as cartolas de feltro que os navios traziam. Apesar disso, ou por isso
mesmo, ele esconde por entre as abas uma estratégia de exploração – o que não
significa, necessariamente, que de seu interior não seja possível extrair um coelho.
(VIANA, 2011, p. 23)
As mudanças ocorridas nas ultimas décadas, dentre elas a crise do Estado do Bem
Estar Social, o advento da robótica, a ascensão das ideias liberais, a mundialização da
economia e do mercado e a reestruturação do modo de produção fizeram com que a
subordinação perdesse a sua vitalidade e com isso colocasse à prova o protecionismo do
Direito do Trabalho.
Em que pese à ideia originária dos defensores terem sido estender aos trabalhadores
autônomos alguns direitos trabalhistas, já que são desamparados de todos, o que ocorreu, na
realidade, foi o esvaziamento do direito do trabalho, pois os que deveriam ser considerados
empregados foram enquadrados como parassubordinados.
483
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Contudo, é a subordinação o cerne para o Direito do Trabalho, pois é ela que define a
relação de emprego, na medida em que os demais elementos – não eventualidade,
pessoalidade e onerosidade- podem estar presentes em outras espécies do gênero relação de
trabalho que não caracteriza relação de emprego.
1
Os elementos fático-jurídicos componentes da relação de emprego são: trabalho não eventual, prestado com
pessoalidade, por pessoa física, em situação de subordinação, com onerosidade. Esses elementos são extraídos
no ordenamento jurídico brasileiro dos artigos 2º e 3º da CLT.
2
“O Direito do Trabalho surgiu em momento histórico de crise, como resposta política aos problemas sociais
acarretados pelos dogmas do capitalismo liberal. Seu marco mundial é o século XIX. A disciplina em estudo
surgiu quando se tentou solucionar a crise social posterior a Revolução Industrial. Nasceu sob o império da
máquina, que, ao reduzir o esforço físico e simplificar a atenção mental, facilitou a exploração do trabalho das
mulheres e dos menores, considerados “meias forças”, relegando os trabalhos do homem adulo ao plano
secundário. O desgaste prematuro do material humano nos acidentes mecânicos do trabalho, os baixos salários e
as excessivas jornadas foram, então, inevitáveis. O Direito Civil já não se encontrava apto à solução desses
problemas, os quais exigiam uma legislação mais de acordo com o momento histórico-social. Isso porque a
celebração e o cumprimento do contrato de trabalho disciplinados pela liberdade asseguradas às partes no direito
clássico, intensificavam a flagrante desigualdade dos interlocutores sociais.
Diante as agitações dos trabalhadores e das lutas sociais no continente europeu, o Estado resolveu intervir na
regulamentação do direito do trabalho, inspirando-se em normas que lhe atribuem critérios próprios, não
encontrados em outro ramo do Direito. Essas normas são os princípios peculiares do Direito do Trabalho, entre
os quais está o da proteção, centralizado numa garantia de condições mínimas de trabalho, sustentados por outro
princípio, o da irrenuciabilidade.” (BARROS, 2012, p.67)
484
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Foi com base nessa relação nascida nos chãos das fabricas que se construiu o
conceito de relação de trabalho e o principal e tão debatido pressuposto, a subordinação.
485
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Como já notamos em outras paragens, até algumas décadas atrás, quando o sistema
ainda seguia uma tendência includente, o conceito de subordinação foi-se ampliando
– pelo menos na leitura da grande maioria dos juízes e doutrinadores. Era um modo
inteligente embora nem sempre consciente – de transformar trabalhadores em
empregados e empregados em consumidores, realimentando o processo produtivo e
gerando o que alguns chamam de circulo virtuoso. (VIANA, 2011, p.30)
Entretanto, com as mudanças ocorridas nas ultimas décadas, dentre elas a crise do
Estado de Bem Estar Social, o advento da robótica, a ascensão das ideias liberais, a
mundialização da economia e do mercado, a reestruturação do modo de produção e a
revolução tecnológica fizeram com que as relações de trabalho afastassem a noção antes tida
da subordinação.
Com essa evolução, o “novo” trabalho se perfaz menos subordinado, com ordens
menos agudas, ou melhor, com características de trabalho autônomo o que consequentemente
gera o afastamento do amparo trabalhista, na medida em que os trabalhadores passam a ser
qualificados como tal, sem que na realidade, os sejam de fato.
486
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Juntamente com essa tendência que ganhou maior relevo no final da década de 70 e
que a doutrina ultraliberal estava em alta, iniciou-se o fenômeno da flexibilização e
desregulamentação3 do Direito do Trabalho.
[a] década de 1990 reflete uma política neolibaral, com o abandono do conceito de
Estado do Bem-Estar Social. Enquanto se privilegiam os grandes grupos
econômicos as pequenas e medias empresas quebram em decorrência do dano
causado pelas políticas econômicas. A saúde, a educação, a segurança e a
previdência são relegadas a um plano secundário. (BARROS, 2012, p.67)
[...] embora muitas vezes sejam tomadas como sinônimos, a flexibilização não se confunde com a
3
desregulamentação do direito do trabalho. Enquanto esta consiste na completa substituição das normas
trabalhistas estatais pela regulamentação autônoma, aquela encerra apenas uma adaptação das leis laborais às
novas realidades das relações de trabalho. laborais às novas realidades das relações de trabalho. (BONNA, 2008,
p.11)
487
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
2. A PARASSUBORDINAÇÃO NA ITÁLIA
Ainda que uma lei anterior já se referisse à parassubordinação4, foi a partir de uma
reforma, no Código de Processo Civil Italiano, efetuada pela Lei n. 533 de 1973, que esse
instituto ganhou relevo e se tornou alvo de discussão pela doutrina e jurisprudência, não só da
Itália, mas mundialmente.
Uma das maiores inovações trazidas por essa lei foi a extensão operada pelo
surgimento do parágrafo 3º do artigo 409, que estendeu o processo do trabalho às “relações de
agência, de representação comercial e outras relações de colaboração que se concretizem em
uma prestação de obra continuada e coordenada, prevalentemente pessoal, ainda que
subordinado”.
Foi nessa alteração do mencionado artigo que a doutrina, tendo como maior
referência Guiseppe Santoro Passarelli, vislumbrou a definição de um novo ou terceiro tipo de
relação de trabalhado denominado parassubordinação. (PORTO, 2009, P.119)
Foi Guiseppe Santoro Passarelli, em sua obra “Il lavoro parassubordinado”, de 1979,
quem individualizou de forma mais completa essa categoria conceitual. O autor
identificou uma ratio substancial nessa norma processual: a existência de um
desequilíbrio contratual entre as partes. Defendia assim, que a figura, embora
prevista no diploma processual, tinha ampla relevância e gerava consequências
também no plano do Direito material. (PORTO, 2009, p.119)
4
Conforme leciona Lorena Porto “a figura da parassubordinação foi definida pela primeira vez pelo artigo 2º, da
Lei n. 741 de 1959. Essa lei delegava ao governo ao Governo a emanação de Decretos Legislativos específicos
para assegurar uma disciplina econômica e normativa mínima e inderrogável a todos os trabalhadores
pertencentes a uma mesma categoria.” (...) O artigo 2º da Lei determinava que essa disciplina deveria ser
emanada pelo Governo para todas as categorias abrangidas por contratos coletivos que regulamentavam as
relações de emprego, as relações de associação agrária , de locação a cultivador direto e as “relações de
colaboração que se concretizem em prestação de obra continuada e coordenada” (PORTO, 2009, p.118/119)
488
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Assim, com a alteração do artigo 409, parágrafo 3º, do CPC Italiano e a consequente
positivação da parassubordinação incumbiu a doutrina o dever de identificar as características
dessa nova modalidade de trabalho.
A esse respeito, importante mencionar o estudo realizado por Otávio Pinto e Silva
que reunindo o entendimento de diversos autores italianos e explanando o âmago do artigo
409, parágrafo 3º, do CPC italiano, aponta como elementos essenciais do trabalho
parassubordinado a continuidade da relação, a natureza preponderantemente
pessoal da prestação e, especialmente, a existência de uma colaboração ou ligação funcional
entre a atividade do prestador de serviços e aquela de seu tomador. (SILVA, 2004, p.105)
489
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
5
Porto, em seu livro de A Subordinação No contrato de Trabalho, menciona exemplos de trabalhadores
parassubordinados como sendo aqueles contratados pelas empresas para transportar os seus produtos, os que
exercem profissões intelectuais (médico, paramédicos, professores, jornalistas, advogados, biólogos) os
motociclistas, os telefonistas, operadores de telemarketing, dentre outros. (PORTO, 2009, p. 121).
490
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Com a criação desse novo contrato, que ficou conhecido como “co.co.pro”
(colaboração, coordenada, continuada a projeto), o trabalho parassubordinado para assim ser
entendido e enquadrado deve necessariamente vincular a um “projeto”.
Além disso, não há vedação para que o contrato a projeto seja renovado por diversas
vezes o que torna possível a o prolongamento da fraude.
6
São eles, os agentes de comércio, os profissionais intelectuais que exigem para o seu exercício registro prévio
nas entidades profissionais, os componentes dos órgãos de administração e controle das sociedades, dos
participantes do colegiado e comissões, dos colaborados no âmbito do Comitê Olímpico, os trabalhadores
aposentados por velhice e os colaboradores da Administração Pública.
491
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Para um exame mais aprofundado e detalhado do tema, cf. o livro de REIS, Daniela Muradas.O princípio da
7
492
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
Contudo, foi com a aprovação em 1966 dos Pactos de Direitos Humanos que o
princípio do não retrocesso ganhou novas adjacências, mormente no plano dos direitos
econômicos, sociais e culturais.
Não diferente, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) que tem por objetivos,
dentre outros, a promoção dos princípios fundamentais e direitos, o aumento da abrangência e
da eficácia da proteção social, assim como na fixação de condições mínimas de trabalho
aplicáveis a todos os trabalhadores, também positivou, através de sua Constituição o princípio
da vedação do retrocesso.
8
Assim como no Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais a vedação ao retrocesso foi
ainda reiterado nos diplomas internacionais de proteção aos direitos humanos do Teerã de 1968, Viena de 1993,
na Convenção contra tortura, assim como na Convenção Americana de Direitos Humanos. (REIS, 2012, p.38).
Destaque-se que tanto pelo Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, de 1966, quanto
pelo apelidado Protocolo de São Salvador, em vigor desde 1999 (Decreto n. 3.321/99), o Brasil se comprometeu
a implementar, progressivamente e com o máximo de seus recursos disponíveis, os direitos ligados à igualdade.
493
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Com efeito, assim dispõe o artigo 19, VIII, da Constituição da OIT, que veda
expressamente a adoção de uma convenção ou recomendação em retrocesso à proteção do
trabalhador no plano nacional.
494
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495
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Para melhor situarmos o seu tratamento como tal, recorremos à sua conceituação
cientifica, quando as teorias a respeito o apresentam fundamentado no sentido
dinâmico de modificação do status quo, na direção de configurações diferentes das
atuais. A partir desse ponto, faz-se necessária a diferença entre o seu conceito e o de
‘crescimento’, podendo ambos incluir-se, sem, qualquer confusão, na ideia de
‘progresso’. O dado referencial, ‘diferenciador’, pode ser tomado, portanto, como
ideia de ‘equilíbrio’, a ele prendendo-se a de ‘desequilíbrio’. No ‘crescimento’, tem-
se o ‘equilíbrio’ das relações entre os componentes do todo, podendo haver o seu
aumento quantitativo qualitativo, porém mantidas as proporções dessas relações. No
‘desenvolvimento’, rompe-se tal ‘equilíbrio’, dá-se o ‘desequilíbrio’, modificam-se
as proporções no sentido positivo. Se tal verificasse no sentido negativo, teríamos o
retrocesso, a recessão, embora também como forma de ‘desequilíbrio’, pois
igualmente rompida com status quo ante. (SOUZA, 1999, p.404)
Por fim, imperioso mencionar, ainda, que o não retrocesso e o progresso estão
associados de maneira indissolúvel ao princípio da proteção do trabalhador, a base do Direito
do Trabalho.
496
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Trabalho (CLT): trabalho prestado com pessoalidade, por pessoa física, onerosidade, não
eventualidade e sob subordinação jurídica do empregador.
O divisor de águas entre essas duas modalidades e que garante o acesso a todos os
direitos assegurados ao empregado é a subordinação.
Como visto a subordinação, nas ultimas décadas, evoluiu assim como a relação de
trabalho. As mudanças na organização produtiva e o avanço tecnológico tornou a prestação
de trabalho muito mais autônoma, na media em que o controle tornou-se menos rígido em
razão da maior autonomia concedia ao empregado. Em suma “[o] controle do empregado
não desaparece, mas o seu objeto se modifica”. (PORTO, 2009, p.92)
497
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A parassubordinação, apesar de a sua ideia originária ter sido “proteger pelo menos
um pouco os de que outro modo nada teriam”, (VIANA, 2011, p.25) o que ocorreu e ocorre
na prática é a contratação de verdadeiros empregados como trabalhadores parassubordinados
o que significa dizer trabalhadores com menos direitos, trabalhadores desamparados.
9
A corrente minoritária defende, através da analogia a aplicação de outros direitos, além dos previstos nas
normas jurídicas, como o princípio da suficiência da remuneração. Contudo, para a própria vertente que defende
a extensão aos parassubordinados dos direitos aplicáveis aos empregados há a impossibilidade de se estender
analogicamente todas as normas criadas para o trabalho subordinado. Assim, por mais que a corrente minoritária
viesse a ganhar maior relevo e o seu entendimento fosse aplicado ao caso concreto, jamais os parassubordinados
estariam abrangidos por todos os direitos garantidos aos empregados.
498
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Não se pode deixar, nesse ponto, de listar as tutelas que alcançam e as que não
alcançam os trabalhadores parassubordiandos, no intuito de se demonstrar o esvaziamento do
direito ocorrido com o nascimento dessa nova forma de contratação.
499
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Assim, como bem concluiu Daniela Muras Reis “a Constituição de 1988 assegurou
a expansão das garantias originais deferidas à pessoa humana, na linha enunciada pelo
princípio da progressividade dos direitos humanos” (REIS, 2012, p.39)
500
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Por via de conseqüência, o artigo 5º, parágrafo 1º, da nossa Constituição, impõe a
proteção efetiva dos direitos fundamentais não apenas contra a atuação do poder de
reforma constitucional (em combinação com o artigo 60, que dispõe a respeito dos
limites formais e materiais às emendas constitucionais), mas também contra o
legislador ordinário e os demais órgãos estatais (já que medidas administrativas e
decisões jurisdicionais também podem atentar contra a segurança jurídica e a
proteção de confiança), que, portanto, além de estarem incumbidos de um dever
permanente de desenvolvimento e concretização eficiente dos direitos fundamentais
(inclusive e, no âmbito da temática versada, de modo particular os direitos sociais)
não pode – em qualquer hipótese – suprimir pura e simplesmente ou restringir de
modo a invadir o núcleo essencial do direito fundamental ou atentar, de outro modo,
contra as exigências da proporcionalidade. (SARLET, 2005),
Conclui-se, assim, que sob todos os prismas que se analise o princípio da vedação ao
retrocesso, os direitos sociais, dentre eles o direito do trabalho, estão preservados de medidas
de caráter retrocessivo.
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CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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RESUMO
O presente artigo tem como objetivo apresentar, de acordo com as diferenças entre os
principais conceitos que envolvem o trabalho do estrangeiro no Brasil e no exterior, tanto na
condição de imigrante quanto na de refugiado, discussão crítica sobre as políticas públicas e a
legislação atual sobre essa importante área. Também se propõe a analisar, com base na
vertente metodológica jurídico-teórica, dispositivos do Projeto de Lei 5.655, que pode se
tornar o novo “Estatuto do Estrangeiro” brasileiro, e casos concretos advindos de
controvérsias trabalhistas envolvendo o trabalho de estrangeiros no Brasil e o de brasileiros no
exterior, apresentando-os e debatendo as teses por ora aceitas pela Justiça do Trabalho que
fundamentam suas respectivas decisões e enunciados.
PALAVRAS-CHAVE: Regulamentação do Trabalho de Estrangeiros no Brasil; Estatuto do
Estrangeiro; Migrantes e Refugiados.
ABSTRACT
This paper aims to present, according to the differences between the main concepts that
involve foreigner workers the in Brazil, both as an immigrant and as in the refugee statue,
critical discussion about public policy and current legislation on this important area. It also
intends to analyze, based on the legal-theoretical methodological aspect, procedures of the
Bill 5655, which may become the new Brazilian "Foreigner‟s Statute", and also cases arising
1
Graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC/PR), especialista em Direito e
Processo do Trabalho pelo Instituto Brasileiro de Estudos Jurídicos (IBEJ), mestre em Direito e Relações
Internacionais pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), doutora em Direito Público, pela Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais (PUC/Minas), na área de concentração “Direitos Humanos, processo de
integração e constitucionalização do Direito Internacional”. Professora de Direito Internacional Público e de
Direito da Integração e das Organizações Internacionais no curso de Direito da Universidade FUMEC. Autora do
livro publicado pela LTr Brasil e trabalhadores estrangeiros nos séculos XIX e XX: evolução normativo-
legislativa nos contextos histórico, político e socioeconômico. Email: flaviadeavila@gmail.com.
2
Graduada em Direito e em História pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), especializada em
Direito Internacional pelas Faculdades Milton Campos, mestre em Direito Público, pela PUC/Minas, na área de
concentração Direitos Humanos, processo de integração e constitucionalização do Direito Internacional, e
doutoranda da UFMG na linha de pesquisa “A reconstrução discursiva dos Direitos Humanos”. Pesquisadora e
professora do programa de pós-graduação do Centro de Direito Internacional (CEDIN), membro e consultora da
organização não-governamental Instituto de Reintegração do Refugiado no Brasil (ADUS), professora e
coordenadora do Curso de Direito do Centro Universitário UNA, professora de História do Direito do Curso de
Direito da Universidade FUMEC. Autora do livro publicado pela Del Rey Para Entender o Direito
Internacional dos Refugiados: análise crítica do conceito "Refugiado Ambiental". Email: ludiniz11@fumec.br.
504
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from labor disputes involving the employment of foreigners workers in Brazil and Brazilians
abroad, presenting and discussing the theses accepted at present by the Labor Justice that
underlie their decisions and statements.
KEYWORDS: Regulation of Foreign Labor in Brazil; Foreigner‟s Statute; Migrants and
Refugees.
1. Introdução
505
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506
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3
A expressão segurança nacional é bastante controversa, em razão das práticas adotadas pela Ditadura Militar
no Brasil, que, em nome de um discurso patriótico, impôs, segundo Cerqueira (CERQUEIRA, 1981, p. 19),
surto de xenofobia por meio da edição do Estatuto do Estrangeiro de 1980. Este diploma ainda se encontra em
vigor, mas que tem sido paulatinamente alterado e interpretado segundo parâmetros da atual Constituição de
1988. Conforme adiante descrito em item específico, tramita atualmente no Congresso Nacional um anteprojeto
para substituição do atual Estatuto do Estrangeiro, que promete algumas alterações em relação à política de
segurança nacional, mas que, na verdade, pouco inova sobre essa questão.
4
No caso Nottebohm (1955), a Corte Internacional de Justiça determinou que, apesar da dupla nacionalidade
envolvida, deveria haver uma prevalecente, identificada por meio de efetivos laços entre o indivíduo e o Estado.
507
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509
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5
O Brasil ratificou e incorporou a CRER e seu PA ao ordenamento pátrio em, respectivamente, 1961 e 1972.
6
Artigo 1º, inciso III, da Lei 9.474 de 22 de julho de 1997.
510
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XV). A Lei nº 9.649, de 27 de maio de 1998, que dispõe sobre a organização da Presidência
da República e dos Ministérios, remete a política de imigração ao campo de atuação do
Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) (artigo 14, XIX, “g”) (BRASIL, 1988).
O Conselho Nacional de Imigração (CNIg), órgão colegiado criado pelo Estatuto do
Estrangeiro, é presidido pelo Ministério do Trabalho e Emprego, e tem sua organização atual
definida pelos Decretos n° 840, de 22 de junho de 1993, e nº 3.574, de 23 de agosto de 2000.
É responsável por, dentre outras atribuições, formular as políticas e coordenar e orientar as
atividades de imigração; efetuar o levantamento periódico das necessidades de mão de obra
estrangeira qualificada, para admissão, em caráter permanente ou temporário, de
trabalhadores; estabelecer normas de seleção de imigrantes, visando proporcionar mão de
obra especializada aos vários setores da economia nacional, captando recursos para setores
específicos; dirimir as dúvidas e solucionar os casos omissos, no que diz respeito a
imigrantes; e, por fim, opinar sobre alteração da legislação relativa à imigração, quando
proposta por qualquer órgão do Poder Executivo.
A atual política do CNIg sobre a imigração de trabalhadores para o Brasil reflete a
preocupação em restringir a entrada de estrangeiros. Segundo as regras da Resolução nº 99, de
12 de dezembro de 2012, a concessão de visto temporário dependerá de requisitos como
diplomas e comprovada experiência profissional. Indivíduos sul-americanos, todavia, estão
livres destas exigências, que também são flexibilizadas para outras nacionalidades quando
diplomas e atestados de experiência profissional não forem a única forma de demonstração da
compatibilidade do perfil profissional do estrangeiro com a função a ser desempenhada no
país7. A prorrogação do visto temporário ou sua transformação em permanente levará em
conta tanto a continuidade da necessidade do trabalho, quanto a evolução do quadro de
empregados da empresa requerente, bem como a justificativa apresentada pelo estrangeiro
para sua fixação no Brasil, quando for o caso.
O MTE também participa da Coordenação-Geral de Imigração (CGIg), a qual é
encarregada de coordenar, orientar e supervisionar as atividades referentes à autorização de
trabalho a estrangeiros e à contratação ou transferência para o trabalho no exterior. Essa
autorização é ato administrativo de competência do MTE e é exigida pelas autoridades
7
De acordo com o parágrafo único do artigo 2º da Resolução Normativa nº 99, a comprovação da qualificação e
experiência profissional do estrangeiro deverá ser feita pela demonstração de escolaridade mínima de nove anos
e experiência de dois anos em ocupação que não exija nível superior; ou experiência de um ano no exercício de
profissão de nível superior, contado este prazo da conclusão do curso de graduação que o habilitou a este
exercício; ou conclusão de curso de pós-graduação com, no mínimo, 360 horas, ou de mestrado ou outro grau
superior compatível com a atividade que irá desempenhar; ou experiência de três anos no exercício de profissão
cuja atividade artística ou cultural independa de formação escolar (MINISTÉRIO DO TRABALHO E
EMPREGO, 2012b).
511
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consulares brasileiras, por ser necessária para a concessão de vistos permanentes e/ou
temporários aos estrangeiros que desejem trabalhar no país. Tal órgão é subdividido em
diferentes setores, sendo estes: Divisão de Cadastro e Apoio; Divisão de Temporário e
Permanente; Divisão de Prorrogação e Transformação; e Atendimento Especializado.
A CGIg agrega, além da representação governamental, uma bancada de trabalhadores
e outra de empregadores, juntamente com representantes da comunidade científica. De acordo
com o artigo 49 da Lei 9.784, de 1999, o prazo para a decisão do pedido é de trinta dias, desde
que o processo esteja devidamente instruído. Da decisão que denegar a „Autorização de
Trabalho‟ caberá, no prazo de dez dias contados da data de publicação da referida decisão no
Diário Oficial da União (DOU), recurso administrativo. O recurso deverá ser dirigido à
autoridade que proferiu a decisão que, se não a reconsiderar no prazo de cinco dias, a
encaminhará à autoridade superior, na forma do artigo 56 da Lei 9.784/99 (BRASIL, 1999).
Para tanto, o MTE atua em parceria com o Ministério das Relações Exteriores (MRE),
responsável pela concessão de vistos no exterior, e com o Ministério da Justiça (MJ). A
Divisão de Cooperação Jurídica Internacional (DCJI), subordinada ao Departamento de
Imigração e Assuntos Jurídicos (DIJ), possui competência para atuar em assuntos de
cooperação jurídica internacional.
No caso do MJ, o Departamento de Estrangeiros é responsável pelos processos de
naturalização e expulsão, bem como por aprovar a permanência do estrangeiro no Brasil. Já o
Departamento de Polícia Federal, por intermédio das Delegacias de Polícia de Imigração
(DELEMIGs), tem como atribuições controlar as entradas e saídas de pessoas nos pontos de
fronteiras; realizar os registros de estrangeiros; realizar as deportações; bem como as demais
atividades próprias da polícia de imigração. Portanto, e por uma lógica jurídica ligada a tais
atividades, esse fornece a Carteira de Identidade ao Estrangeiro (CIE).
Para a obtenção da CIE e consequente início do processo de legalização, todo
estrangeiro precisa se inscrever no Sistema Nacional de Cadastramento de Registro de
Estrangeiros (SINCRE) junto à Polícia Federal (PF). O SINCRE foi criado, em 1987, para
unificar o cadastramento e o registro dos estrangeiros, antes efetuados pelas respectivas
Secretarias de Estado de Segurança Pública (SSP) de cada Estado da Federação. São
cadastrados os imigrantes permanentes, temporários, provisórios, fronteiriços, asilados e
refugiados. Consequentemente, o controle migratório das fronteiras brasileiras é executado
pela PF, órgão vinculado ao MJ, pois compete à União executar o serviço de polícia marítima,
aérea e de fronteiras, conforme o inciso XXII do artigo 21 da CRFB de 1988, e à PF exercer
as funções de polícia marítima, aérea e de fronteira, pelo que dispõe o artigo 144, parágrafo
512
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único do mesmo texto constitucional. Por sua vez, o Estatuto do Estrangeiro rege os
procedimentos desse controle através do disposto em seu artigo 22, cujo conteúdo determina
que a entrada, no território nacional, deve ocorrer somente nos locais onde houver fiscalização
dos órgãos competentes dos Ministérios da Justiça, da Saúde e da Fazenda.
Apesar da profusão de órgãos responsáveis pela regulamentação da entrada e da
permanência de estrangeiros no Brasil, existem poucas entidades governamentais capazes de
proteger os estrangeiros que se encontram em solo nacional. Neste vácuo da atuação
governamental, se situam algumas Organizações Não-Governamentais (ONGs) que agem
representando os migrantes e os refugiados, ainda que com limitações8.
Uma importante iniciativa é a „Política Nacional de Imigração e Proteção ao
Trabalhador (a) Migrante‟, aprovada, em 2010, pelo CNIg, mas ainda pendente de aprovação
pela Presidência da República. Essas diretrizes foram resultado do estudo feito pelo „Grupo de
Trabalho‟ formado, em dezembro de 2008, pelo CNIg, que reflete demandas sociais
importantes. A proposta prevê que seja adotada, no Brasil, legislação que melhor reflita os
compromissos internacionais sobre migração dos quais o Brasil faz parte, principalmente
aqueles firmados no seio da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Apresenta,
portanto, como objetivos, a garantia aos imigrantes do acesso a serviços como saúde e
educação, bem como a desburocratização de processos de regularização e naturalização
(MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO, 2010).
Salienta-se que as Convenções da OIT que tratam da migração são consideradas
promocionais, pois têm a finalidade de fixar objetivos e estabelecer programas para sua
execução no âmbito dos Estados, os quais devem tomar providências para implementá-las.
Contudo, nem todas as Convenções vigentes e que tratam da matéria na OIT foram ratificadas
pelo Brasil, como, por exemplo, a Convenção nº 157 que dispõe sobre a preservação de
direitos em matéria de seguridade social, e a Convenção nº 143, que cuida das migrações em
condições abusivas e da promoção de igualdade de oportunidade no tratamento dos
trabalhadores migrantes (ÁVILA, 2011, p. 64-65).
Entre as que constam na ordem jurídica brasileira, destacam-se: a Convenção nº 19,
que estipula a igualdade de tratamento entre estrangeiros e nacionais em questões referentes a
acidentes de trabalho; a Convenção nº 21, que garante a proteção de direitos de emigrantes
que estejam a bordo de navios sob inspeção; a Convenção nº 97, que trata especificadamente
8
No tocante à atuação das ONGs e demais entidades representantes da sociedade civil organizada em relação à
proteção e auxílio aos refugiados no Brasil, têm-se, como exemplo, a Cáritas Arquidiocesana e ADUS – Instituto
de Reintegração do Refugiado, os quais serão tratados mais a frente, no item 3 do presente artigo.
513
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9
Sobre o CONARE, consultar os artigos 11 a 16 da Lei 9.474 de 1997.
10
Artigo XVI, parágrafo 3º, da DUDH: “A família é a unidade de grupo natural e fundamental da sociedade e
tem direito a ser protegida pela sociedade e pelo Estado”.
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demais membros de sua família e que dele dependam economicamente, desde que todos se
encontrem também em território nacional. Sendo assim, após a finalização positiva de seu
processo administrativo no CONARE, não somente o refugiado terá direito a trabalhar
legalmente no país, mas, igualmente, todos os membros de sua família que, uma vez
comprovado o parentesco e a dependência financeira, estejam no Brasil.
Todavia, a possibilidade de emissão da CTPS não se inicia apenas após o término do
processo de reconhecimento da condição de refugiado. Ao contrário, e visando o bem estar e a
própria sobrevivência do solicitante e de sua família enquanto aguardam o deferimento ou não
de seu pedido de refúgio, bem como considerando a natureza alimentar de alguns direitos
trabalhistas, pode este trabalhar com carteira assinada antes da finalização do processo
administrativo de pedido de refúgio. Para tanto, segundo o artigo 21 da Lei 9.474 de 1997,
basta que o solicitante de refúgio e seus familiares levem, ao Ministério do Trabalho,
protocolo emitido pela Polícia Federal que os autorize a residir provisoriamente no país até o
término da análise de seus respectivos pedidos de refúgio. Nestes casos, a CTPS a ser emitida
será provisória e, enquanto aqui estiverem nestas condições, lhes será aplicável a legislação
pátria relativa aos estrangeiros em geral, isto é, o Estatuto do Estrangeiro11.
O governo brasileiro, até o presente momento, e segundo dados oficiais do Alto
Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) divulgados até janeiro de 2012
(UNITED NATIONS HIGH COMMISSIONER FOR REFUGEES, 2013), reconheceu a
condição de refugiado a 4.477 pessoas, de 76 diferentes nacionalidades. Apesar do número
não ser muito elevado e de, entre esses, 418 estarem ligados aos programas de reassentamento
(MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2009)12, a grande preocupação do Poder Público em relação
aos refugiados está ligada a dois fatores, sobretudo: i) à efetiva integração local dos mesmos à
realidade brasileira em sentido cultural, linguístico, gastronômico, econômico e social e; ii) à
proteção dos refugiados contra discriminações de qualquer gênero, direito este previsto no
artigo 3º da CRER e, logo, dever do Estado de acolhida. Para tal vigília, o Brasil conta com a
fundamental ajuda do escritório do ACNUR, localizado em Brasília/DF, bem como com a
11
Artigo 22 da Lei 9.474 de 1997.
12
Desde 2001, e buscando dar vigência aos artigos 45 e 46 da Lei 9.474 de 1997, o Brasil tem acolhido
reassentados em cidades como Mogi das Cruzes (SP), Santa Maria Madalena (RJ), Natal (RN) e Porto Alegre
(RS). A nacionalidade de origem destes é variada, mas se pode citar, sobretudo, colombianos, afegãos e
angolanos (JUBILUT, 2007, p. 200-201). Atualmente, em virtude dos conflitos que ocorrem na região da cidade
de Goma, verifica-se o grande número de congoleses que chegam ao Brasil e requerem a condição de refugiados.
Muitos deles estão submetidos a condições penosas, vivendo em favelas das grandes cidades, como Rio de
Janeiro, enfrentando problemas como moradias precárias, falta de trabalho e assistência, além de preconceito e
discriminação. Essa discriminação, inclusive, tem ocorrido em virtude da própria palavra refugiado, que soa para
alguns desconhecedores de seu real significado como sendo alguém que fugiu de um país por ter cometido um
crime (QUERO, 2013).
515
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13
Para maiores informações sobre as entidades citadas, acessar as seguintes páginas da web:
http://www.onu.org.br/onu-no-brasil/acnur/, http://caritas.org.br/novo/ e http://www.adus.org.br/refugiados/.
516
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Tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei 5.655, de 2009, que dispõe sobre o
ingresso, permanência e saída de estrangeiros no território nacional, o instituto da
naturalização, as medidas compulsórias, além de transformar o Conselho Nacional de
Imigração em Conselho Nacional de Migração, e outras providências. Depois de aprovado,
deverá substituir o atual Estatuto do Estrangeiro com dispositivos que estejam em
consonância maior em relação ao Estado Democrático de Direito. Como exemplo, no Projeto
de Lei são definidos os princípios que deverão nortear a sua aplicação, como a garantia dos
direitos humanos. Seguindo esse entendimento, a política nacional de migração deverá adotar
medidas para regular fluxos migratórios de forma a proteger os direitos humanos dos
migrantes contra práticas abusivas (BRASIL, 2009).
Está contido em seus dispositivos a previsão de entrada primordialmente no Brasil de
mão de obra especializada. Apesar de essa providência proteger em certo modo os
trabalhadores estrangeiros, não deixa de ser medida paliativa se não houver a contraprestação
do Estado brasileiro para o desenvolvimento educacional e do aperfeiçoamento dos
trabalhadores do país (BRASIL, 2009; ÁVILA, 2011, p. 320).
O Projeto de Lei também estatui a necessidade de autorização prévia para os
estrangeiros atuarem em áreas estratégicas como as de comunidades tradicionais ou de
floresta densa, como a Amazônia. Proíbe-se, contudo, que possuam terras em regiões de
fronteira, bem como outras barreiras trabalhistas já aplicadas, com algumas modificações.
Assim, estrangeiros ainda seriam impedidos de serem armadores, comandantes ou chefes de
máquinas de embarcações de bandeira nacional (a não ser no caso da finalidade ser para
esporte, turismo, recreio, pesca e pesquisa); proprietários de empresa jornalística e de
radiodifusão sonora e de sons e imagens; responsáveis pelo conteúdo editorial e atividades de
seleção e direção da programação veiculada em qualquer meio de comunicação social;
autorizados ou concessionários da exploração e aproveitamento de jazidas, minas e demais
recursos minerais e dos potenciais de energia hidráulica; proprietários ou exploradores de
aeronave brasileira; corretores de navios, de fundos públicos, leiloeiro e despachante
aduaneiro; práticos de barras, portos, rios, lagos e canais; proprietários, sócios ou empregados
de empresa de segurança privada e de formação de vigilantes. Segundo o art. 8º, também seria
vedado ao estrangeiro o exercício de atividade político-partidária, salvo o português com o
gozo dos direitos políticos no Brasil, conforme previsto no Tratado de Amizade, Cooperação
e Consulta (BRASIL, 2009; ÁVILA, 2011, p. 321-322).
517
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Todavia, são garantidos aos estrangeiros situações ligadas ao trabalho que hoje não
estão regulamentadas no âmbito legislativo como a livre associação para fins lícitos, nos
termos da lei, bem como todos os direitos civis e sociais reconhecidos aos brasileiros, o que
englobaria a administração de sindicatos, de associações profissionais e de entidades
fiscalizadoras do exercício de profissões regulamentadas. Em outro dispositivo, o Projeto de
Lei extingue a exigência de boa saúde para entrada e permanência no País e cria a categoria
de visto para tratamento de saúde, exclusivamente para tratamento em rede privada, sem que
sejam utilizados os recursos do Sistema Único de Saúde (SUS) (BRASIL, 2009; ÁVILA,
2011, p. 322).
O Projeto extingue a modalidade de visto de trânsito e une os vistos de turismo e
negócios, que passa a ter duração de cinco anos contatos da primeira entrada no Brasil. Como
já é previsto na legislação atual, esses vistos permitem aos estrangeiros múltiplas entradas no
País, com estada de 90 dias prorrogáveis por igual período, com limite de 180 dias por ano. O
portador de visto de estudo poderá exercer atividade remunerada em regime de tempo parcial,
mediante autorização do Ministério do Trabalho e Emprego. Os vistos de trabalho regem,
dentre outros dispositivos, a concessão de visto temporário para estrangeiros com ou sem
vínculo empregatício no Brasil. Professores, técnicos ou cientistas aprovados em concurso
público em instituição pública de ensino ou de pesquisa científica e tecnológica no Brasil,
terão visto temporário até findo o prazo para aquisição da estabilidade, quando poderá ser
transformado em permanente (BRASIL, 2009; ÁVILA, 2011, p. 322).
O Conselho Nacional da Imigração, por sua vez, se transformaria em Conselho
Nacional da Migração, abrangendo assim ações relativas a emigrantes, medida que pode
consolidar a adoção de políticas mais sólidas e menos casuísticas sobre a chamada e a
proteção os trabalhadores estrangeiros no Brasil e a garantia de diretos a brasileiros no
exterior (BRASIL, 2009; ÁVILA, 2011, p. 322). Vítimas de tráfico de pessoas tiveram
tratamento especial no projeto do Executivo, pois o Ministério da Justiça poderá conceder
residência temporária ao estrangeiro traficado para o Brasil por até um ano. Caso a vítima
colabore com a investigação, esse período poderá ser prorrogado por igual período ou
enquanto durar o processo, sendo que há a previsão dessa autorização poder se tornar
permanente.
O texto do projeto de lei, uma vez aprovado, introduziria um novo tipo penal ao
ordenamento jurídico brasileiro ao inserir o art. 149-A ao Código Penal. “Art. 149-A.
Promover, intermediar ou facilitar a entrada irregular de estrangeiro ou viabilizar sua estada
no território nacional, com a finalidade de auferir, direta ou indiretamente, vantagem
518
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indevida. Pena: reclusão de dois a cinco anos, e multa.” Essa providência configura a
preocupação com a repressão a esse tipo de prática, cada vez mais comum no Brasil, mas não
há mecanismos tão especializados quanto esse no documento para prevenir tais ações e evitar
essas violações tão graves aos direitos humanos. Caberá então aos órgãos que tratam da
política nacional referente aos migrantes a atuação mais vigorosa nesse sentido (BRASIL,
2009; ÁVILA, 2011, p. 323).
14
Como exemplo, o parágrafo 3º do artigo 12 da CRFB de 1988, que estabelece, em seus sete incisos, cargos
privativos aos brasileiros natos, a saber, os de Presidente e Vice-Presidente da República, o de Presidente da
Câmara dos Deputados, o de Presidente do Senado Federal, o de Ministro do Supremo Tribunal Federal, os
cargos da carreira diplomática, os de oficial das Forças Armadas e o de Ministro de Estado da Defesa.
15
No Habeas Corpus (HC) 94016 MC/SP relatado pelo Ministro Celso de Mello, de 07 de abril de 2008,
reconheceu-se ao estrangeiro não-residente no país o direito de impetrar HC (BRASIL, 2008).
519
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
16
De acordo com esse diploma legal, promulgado no Brasil pelo Decreto nº 3.927, de 2001, “os nacionais de
uma das Partes Contratantes poderão aceder a uma profissão e exercê-la, no território da outra Parte Contratante,
em condições idênticas às exigidas aos nacionais desta última” (art. 46). O art. 47 estende ao beneficiário do
direito as mesmas condições prescritas a outros nacionais de Estados que participem de processo integração
regional com a Parte Contratante. Desta maneira, direitos da União Europeia e do Mercosul, se houver
requerimento do interessado, serão observados. Sobre este ponto é importante frisar que o reconhecimento das
condições de igualdade entre os nacionais de Brasil e Portugal não é automático. Cabe requerimento formal ao
Ministério da Justiça, no Brasil, ao Ministério da Administração Interna, em Portugal. Conforme julgado do STF
(BRASIL, 2004), os pretendentes devem ser civilmente capazes e possuir residência habitual no país em que tais
direitos são pleiteados. Por fim, observados esses requisitos, a aquisição do benefício deve ser comunicada ao
Estado da nacionalidade do beneficiário.
17
Artigos 26, 27 e 28 da Lei 9.474 de 22 de julho de 1997.
520
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18
Só se expedirá a CTPS quando houver autorização expressa às Gerências pelo Superintendente Regional do
Trabalho e Emprego do respectivo Estado, conforme artigo 9º, parágrafo 1º, da Portaria n.º 1, de 28 de janeiro de
1997, da Secretaria de Políticas de Emprego e Salário (BRASIL, 1997).
19
As regras para tais procedimentos seguem as disposições de diferentes regras como, entre outras, as presentes
no Estatuto do Estrangeiro e na Portaria nº1 do Ministério do Trabalho e Emprego (1997).
20
A entrada da Venezuela no Mercosul foi oficializada internacionalmente em 31 de julho de 2012 e
internalizada no direito brasileiro pelo Decreto nº 7.859, publicado no DOU em 7 de dezembro de 2012.
Todavia, como tal incorporação ainda está em curso no bloco, inclusive em decorrência do prazo de quatro anos
para adoção da „Tarifa Externa Comum‟ e da „Nomenclatura Comum do Mercosul‟, as normas trabalhistas em
tela ainda não se aplicam a nacionais venezuelanos. No entanto, para todos os efeitos, vige em relação aos
nacionais daquele país que se encontrem em solo brasileiro a normativa que tutela todo e qualquer estrangeiro no
Brasil, inclusive as de natureza trabalhista.
521
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21
São exemplos: RR-129933/2004-900-01-00.2, Relator Ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, data
de julgamento 20/05/2009, 3ª Turma, data de publicação 12/6/2009; ROAR-55560/1999-000-01-00.0, Relatora
Ministra Kátia Magalhães Arruda, data de julgamento 02/10/2007, Subseção II Especializada em Dissídios
Individuais, data de publicação 26/10/2007 e; RR-376707/1997.1, Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen
Peduzzi, data de julgamento 12/12/2001, 3ª Turma, data de publicação 5/4/2002.
524
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
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COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
local de prestação de serviço do empregado ao empregador, mesmo que este tenha sido
contratado fora do Brasil.
Em outra demanda envolvendo um imigrante paraguaio que se encontrava em situação
empregatícia irregular no Brasil, a Sexta Turma do TST, em importante precedente, assegurou
ao trabalhador estrangeiro da cidade fronteiriça de Pedro Juan Cavallero, no Paraguai, o
direito de acionar a Justiça do Trabalho de Ponta Porã, Mato Grosso do Sul. O voto do relator,
Ministro Horácio Senna Pires, no Recurso de Revista RR-750094/2001.2, teve como base os
princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, dos valores sociais do trabalho e
da livre iniciativa, da promoção do bem estar de todos, sem preconceitos de origem, raça,
sexo, cor e idade e, finalmente, no princípio da isonomia jurídica conferido a brasileiros e
estrangeiros residentes no Brasil. A decisão também se fundamentou no „Protocolo de
Cooperação e Assistência Jurisdicional em Matéria Civil, Comercial, Trabalhista e
Administrativa‟, conhecido como „Protocolo de Las Leñas‟. Esse tratado, assinado em 1992 e
em vigor no país desde 1996, assegura o livre acesso dos estrangeiros beneficiados à
jurisdição do Estado Parte nas mesmas condições de seus nacionais (BRASIL, 1996).
Nesse caso, a decisão do TST reformou o acórdão do TRT da 24ª Região, Mato
Grosso do Sul, a qual havia declarado a nulidade e deixado de examinar os direitos
trabalhistas do estrangeiro com base na ausência da CTPS e da documentação que este
deveria portar como fronteiriço. Do contrário, direitos oriundos da relação de emprego de
cerca de dezessete anos entre um eletricista paraguaio e a Comercial Eletromotores Radar
Ltda., não seriam considerados.
É importante mencionar, neste sentido, que muitos imigrantes chegam ao Brasil em
condições irregulares, com baixa escolaridade e pouca qualificação, e, por isso, se sujeitam a
trabalhos mal remunerados para terem chances de sobreviver. Vários são submetidos a meio
ambientes insalubres e a precárias condições de trabalho que, em razão do receio de serem
deportados, não são denunciadas às autoridades competentes. Estrangeiros vindos da Bolívia e
do Peru, por exemplo, têm sido frequentemente encontrados pela fiscalização do MTE e do
Ministério Público do Trabalho (MPT) em condições análogas à escravidão, como, a saber, na
cidade de São Paulo, trabalhando em oficinas de costura de grifes conhecidas. O mesmo tem
ocorrido em frigoríficos com empregados mulçumanos especializados no abate de frangos
pelo método halal, exigido por países islâmicos para o consumo de carne. O MPT tem
proposto Ações Civis Públicas perante a Justiça do Trabalho, na tentativa de reprimir essa
prática deletéria aos direitos dos trabalhadores. A ação ajuizada pelo MPT de São Paulo
526
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
22
A „Convenção das Nações Unidas sobre Relações Diplomáticas‟, de 1961, e a „Convenção das Nações Unidas
sobre Relações Consulares‟, conferem, em certos casos, imunidades pessoais de jurisdição e de execução aos
527
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
mesmos sejam processados no direito interno de outros, como exceção à máxima par in
parem non habet judicium23. Este entendimento, relacionado à imunidade relativa dos Estados
em relação às questões trabalhistas, passou a ser adotado, pelo STF, a partir do julgado Genny
de Oliveira versus Embaixada da República Democrática Alemã, de 1989. No voto do
Ministro Francisco Rezek foram explanadas as mudanças ocorridas no âmbito do direito
consuetudinário internacional em relação à imunidade absoluta dos Estados, que não se
aplicava mais às questões trabalhistas desde os anos setenta do século passado (BRASIL,
1989). Contudo, comumente, apesar de terem seus direitos reconhecidos por sentenças
trabalhistas, os trabalhadores brasileiros de Embaixadas estrangeiras não conseguem receber o
crédito em decorrência da impenhorabilidade dos bens dos Estados estrangeiros em solo
brasileiro.
Procura-se resolver essa situação de duas maneiras: ou por meio da via judicial, em
razão da expedição de cartas rogatórias; ou pela via diplomática, mediante intervenção e
trabalho do MRE. Conforme aponta Bresciani (2012), apesar de a segunda via ser uma
solução informal, ela traz benefícios em relação ao caminho judicial, muito mais dispendioso
e demorado. Em razão do artigo 41 da „Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas‟,
de 18 de abril de 1961, que permite aos Estados realizarem acordos para modificarem em
parte tratados multilaterais (BRASIL, 1965), a Divisão de Cooperação Jurídica Internacional
do MRE trata do encaminhamento de ações trabalhistas movidas na Justiça brasileira contra
Missões Diplomáticas, Consulados estrangeiros e OIs no Brasil24.
Todavia, uma alteração na CLT que está em tramitação no Congresso Nacional pode
mudar o entendimento do TST sobre o assunto e, assim, tornar a posição brasileira ante o
Direito Internacional diferenciada em relação aos demais Estados. O Projeto de Lei do Senado
diplomatas e aos cônsules, mas não há dispositivo que preveja expressamente a imunidade de jurisdição do
Estado estrangeiro. Essa regra é derivada do direito costumeiro internacional.
23
Brocardo jurídico que significa que, de igual para igual, não há jurisdição, ou seja, uma máxima que exprime o
poder soberano do Estado e seu reconhecimento por seus pares no âmbito de suas jurisdições internas. Contudo,
a soberania, dantes considerada absoluta, tem sido relativizada ao longo do tempo, o que causo mudanças na
concepção de imunidade de jurisdição. O exemplo mais contundente das modificações sobre a teoria da
imunidade de jurisdição estatal partiu das Nações Unidas. Em 2 de dezembro de 2004, foi aprovada pela
Assembleia Geral da ONU a “Convenção sobre as Imunidades Jurisdicionais dos Estados e seus Bens” diante de
um Tribunal de outro Estado, do qual o Brasil não faz parte, e que ainda não entrou em vigor internacionalmente.
Esse documento, resultante de décadas de estudos aprofundados sobre o tema, reconhece a tese da imunidade
relativa. Desse modo, das negociações entre os Estados resultou um documento que uniformizou
internacionalmente o instituto da imunidade de jurisdição, tanto no que diz respeito a fases de conhecimento e
execução. Desse modo, nos termos da convenção, não há imunidade de jurisdição nas controvérsias relacionadas
a transações mercantis; contratos de trabalho; lesões a pessoas e danos a bens; propriedade, posse e uso de bens;
propriedade intelectual e industrial; participação societária; navios de propriedade de um Estado ou por ele; e
convenção arbitral firmada pelo Estado (NAÇÕES UNIDAS, 2004).
24
A Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas de 1961, em seu art. 22, § 3º, excepciona da jurisdição
doméstica bens afetados ao serviço diplomático de uma missão diplomática.
528
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
nº 423, de 2012, de autoria do Senador Paulo Paim, prevê a alteração do artigo 7º A da CLT,
para dispor sobre a aplicação da legislação trabalhista brasileira aos empregados de
Embaixadas e Consulados de Estados acreditados no Brasil e em OIs, ressalvados o disposto
em tratados internacionais. O parágrafo único prevê, ainda, a exclusão deste dispositivo em
relação aos agentes diplomáticos, no tocante aos serviços prestados no Estado acreditante, e
aos empregados em serviço exclusivo de Embaixadas e Consulados que não sejam brasileiros
e nem possuam residência permanente no Brasil. Também estão excluídos os trabalhadores
definidos na „Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas‟, de 1961. Atualmente, tal
Projeto de Lei encontra-se em análise pela Comissão de Constituição e Justiça (BRASIL,
2012a).
Apesar de a redação parecer, ao primeiro momento, apenas a legalização do que está
sendo aplicado no âmbito jurisprudencial em relação à aplicação das leis trabalhistas a
empregados brasileiros de Consulados e Embaixadas, uma questão no que diz respeito às OIs
coloca-se em discussão. Interpretações diferenciadas podem surgir, tornando, por vezes,
difícil a instalação de representações internacionais, regionais ou nacionais de OIs no Brasil,
ainda que os acordos de sede feitos com os Estados onde fixam seus aparatos estruturais e
funcionais lhes garantam ampla imunidade.
8. Conclusão
529
COLEÇÃO CONPEDI/UNICURITIBA - Vol. 9 - Direito do Trabalho
9. Referências
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legislativa nos contextos histórico, político e socioeconômico. São Paulo: LTr, 2011.
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naturalização, as medidas compulsórias, transforma o Conselho Nacional de Imigração em
Conselho Nacional de Migração, define infrações e dá outras providências. Câmara dos
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<http://www.tsf.pt/PaginaInicial/Internacional/Interior.aspx?content_id=1941375>. Acesso
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533
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